sábado, 11 de fevereiro de 2017

Adoração em Espírito e em Verdade

Adoração em Espírito e Verdade (João 14,22-23)

Adoração localizada no Antigo Testamento

Quando entendemos a adoração a Deus no Antigo Testamento compreendemos melhor também o uso das imagens. Devemos nos lembrar que o único Povo eleito por Deus foi o Povo de Israel. Desse modo, para conhecer o verdadeiro Deus devia-se ter contato com o povo judeu, e conhecer a revelação de Deus em seu meio.

Entretanto, o culto oficial no Antigo Testamento existia no início somente na tenda da reunião. Mais tarde, quando o templo foi construído, o único lugar de culto foi o templo, em Jerusalém. Nos dias de Cristo era assim, embora houvesse sinagogas onde todos os judeus reuniam-se para ler as Escrituras, rezar e adorar a Deus, o Templo constituía o lugar onde os sacrifícios eram realizados, o lugar de peregrinação, o lugar das festas, e o único lugar legítimo de adoração na terra.

Desse modo, quando os judeus estavam fora da Palestina, quando iam rezar voltavam-se para o lado onde está localizada Jerusalém. Esse era o modo que deviam observar.

Com a vinda de Cristo, tudo isso foi mudado. De fato, Jesus afirmou que todos adorarão o Pai em espírito e em verdade. (João 14,22-23). Ninguém precisará mais ir a Jerusalém para adorar a Deus, pois a Igreja é universal, onde todos, em qualquer lugar que estiver, podem adorar a Deus. Essa adoração ocorre no coração de cada fiel. Em grego é expresso geralmente pela palavra sebomai (adorar). Em Marcos 7,7 eles adoram é sebontai. É o respeito, a alta estima, a veneração por alguém. É também usado para falar da adoração a Deus.

Entendendo esse cenário, vemos que o uso das imagens no Antigo Testamento estava restrito a um único lugar: o Templo. A uma única cidade: Jerusalém. Os judeus não tinham “templos” espalhados por onde passavam, nem onde moravam na dispersão, e, então, mesmo os judeus da diáspora tinham Jerusalém como centro de sua religião, e para adorarem publicamente iam anualmente a Jerusalém, e para oferecerem sacrifícios deviam, ao menos, enviar suas ofertas a Jerusalém.

Assim, as imagens que estavam no templo somente poderiam estar ali, e nem as sinagogas possuíam tudo o que havia no templo. Muito menos nas casas. As sinagogas eram apenas lugares de oração e de alguns serviços religiosos.

Fazendo a devida transferência para os tempos do Novo Testamento, após a vinda de nosso Senhor Jesus, é o único meio para que compreendamos o modo dos cristãos poderem utilizar-se das imagens sagradas.

Desse modo, as imagens do Novo Testamento podem estar em todas as igrejas, pois a adoração é espiritual, não havendo mais limite de lugar, está dentro do fiel onde quer que ele esteja, e os lugares de culto cristão podem ser construídos em qualquer localidade, com o mesmo valor em toda a parte, e podem conter as mesmas características.

Assim, as imagens podem ser feitas para decorar e ensinar os mistérios cristãos, e servir de auxílio de devoção, e serem colocadas em quaisquer igrejas, sendo usada na devoção e ensino, pois a Igreja Católica é, como sua própria natureza diz, universal. O que não podia ser feito no Antigo Testamento, por sua limitação, e por sua adoração restritamente localizada, pode ser feito no Novo Testamento, em grande escala, pois o Povo de Deus está em toda a terra, e o centro é o Templo do Corpo de Cristo, não havendo mais lugar na terra para limitar alguns aspectos do culto espiritual, racional e substancial cristão católico. Por esse motivo, as imagens ocupam lugar importante no culto a Deus, e são usadas em vários lugares, e podem ser multiplicadas.

 

Uso localizado das imagens no Antigo Testamento

Em princípio, no Antigo Testamento, como visto, já pode-se esperar a pouca quantidade de imagens, pois seu culto é feito principalmente em um único lugar, em Jerusalém, que é o centro da religião verdadeira antiga, mesmo para os judeus que estão na diáspora.

Por isso, não se pode pensar em termos do Novo Testamento, como se em cada localidade fosse construído um templo, e que isso pudesse ser feito, e que em cada templo houvesse infinidade de detalhes artísticos e objetos cultuais, e que as sinagogas fossem a continuação do templo, diferindo apenas em quantidade de utensílios religiosos. Não é isso.

O Antigo Testamento tem o culto centralizado, um único templo, com o seu Santo dos Santos, com uma única arca, etc. O que acontecia nesse local primordial da adoração ao verdadeiro Deus é o que testemunha a doutrina a respeito do uso das imagens que ali estavam, e é o que foi provado acima.

Assim, os israelitas não fabricavam arcas da aliança, mas conservava somente uma, não faziam querubins e nem multiplicavam quaisquer outros utensílios, como não construíam mais templos e etc. Essa limitação não existe mais no Novo Testamento.

Da mesma forma, os cristãos não constroem templos no modelo idêntico ao templo antigo, nem usam réplicas da arca, nem fazem querubins, ou bois, ou a serpente de bronze e etc., nem usam os utensílios próprios do culto do Antigo Testamento, pois seguem nessa questão o princípio e não a cópia dos materiais.

Adoração íntima no Novo Testamento

O Novo Testamento mostra que o novo Templo é o Corpo de Jesus Cristo, que assumiu a natureza humana, e pelo Seu corpo, como instrumento de salvação, Jesus nos salvou.

“Destruí esse templo”.

“Falava do templo do Seu corpo”.

Jesus mandou destruir o templo, e disse que Ele o reconstruiria em três dias. Falava do Seu Corpo, não do templo literal de Jerusalém. Foi usada a figura do templo para mostrar que na Nova Aliança Seu Corpo é o novo Templo.

Esse é o lugar definitivo de adoração. Assim, a adoração verdadeira deve ser feita em Cristo e no Espírito Santo. É também no íntimo do coração e na verdade da doutrina ensinada por Jesus:

Mas vem a hora, e já chegou, em que os verdadeiros adoradores hão de adorar o Pai em espírito e verdade, e são esses adoradores que o Pai deseja. Deus é espírito, e os seus adoradores devem adorá-lo em espírito e verdade. (João 4,23-24)

Dessa forma, em todos os lugares da terra podemos adorar a Deus por estarmos espiritualmente em Jesus Cristo que é o Novo Templo.

 

Uso difuso das imagens no Novo Testamento

Ao passar para o Novo Testamento, a adoração eminentemente espiritual liberta a restrição estritamente “localizante” da liturgia antiga, e as profecias da propagação da fé cristã em toda a terra têm o seu cumprimento em Jesus Cristo de Nazaré, o Messias.

No entanto, não deveremos esperar que o aparecimento das imagens sagradas no Novo Testamento tenha ocorrido já nos primeiros dias, em larga escala, com o culto eminentemente desenvolvido como ocorreu mais tarde. Fazer isso é ter um olhar anacrônico. Ainda mais quando entendemos que o culto das imagens nunca foi essencial. O que deve ser apreciado é o testemunho doutrinal, como está sendo feito no presente estudo, e sua continuação e aperfeiçoamento no Novo Testamento.

Com as conversões dos primeiros pagãos, como a família de Cornélio (cf. Atos 10) e a evangelização das regiões em todo o Império pelas viagens de São Paulo, é natural que a arte cristã tomasse novo fôlego. Ainda que o culto cristão não pudesse ter sua expressão pública, pois eram constantes as perseguições, e que o uso das imagens fosse reduzido nesse tempo, no que concerne aos espaços abertos, pois era diferente os espaços escondidos, pois o que mostra a arqueologia em referência aos esconderijos cristãos é bastante diverso.

Na verdade, nas catacumbas de Roma é que os cristãos usavam a arte de forma constante, e as imagens pintadas foram a forma mais empregada nos lugares de culto. Há pinturas da Pomba, que é símbolo do Espírito Santo, pinturas de Cristo carregando a cruz, e de Cristo carregando a ovelha perdida, a pintura do Cordeiro e outras.[1] Não é possível verificar qual era honra que essas imagens recebiam, mas é possível ver, pelos princípios bíblicos já definidos, que não eram apenas decoração, mas serviam de instrução e inspiração para o culto. Disso é necessário discorrer um pouco mais.

Nos tempos de terríveis perseguições os cristãos passaram a reunir em esconderijos. Em Roma eles viviam nas catacumbas, enterravam os mortos, celebravam a missa. Esses locais estão cheios de pinturas por todos os lados, com símbolos, sinais e desenhos, como reconhece a obra citada no início deste estudo. Permanece assim a diferenciação básica entre os ídolos e a arte cristã legítima, pois os cristãos não dobravam os joelhos e não faziam qualquer reverência às imagens do imperador e dos deuses (e da mesma forma não fariam para com pinturas, desenhos, figuras do imperador e dos deuses). Também não imitavam as mesmas figuras que os pagãos usavam.

É oportuno comentar Lucas 19,40, quando Jesus afirmou que se a multidão calasse, as pedras gritariam, usado na obra em referência à tamanha prodigalidade de pinturas nas catacumbas. O que devemos notar, porém, é que os cristãos nesse tempo não calaram, nem calariam por nada, enfrentando mesmo o martírio para ser leais a Jesus Cristo. Portanto, as artes das catacumbas não nasceram do silêncio na pregação do Evangelho, mas acompanhavam a expressão da grande espiritualidade desses fecundos tempos ungidos pelo Espírito Santo. Eles pregavam o Evangelho, e usavam a arte também.

Os protestantes consideram os sinais de veneração das imagens como “práticas idólatras”. Essa objeção foi refutada no presente estudo de forma cabal. Argumentam que por não encontrarem nada relacionado às imagens das catacumbas, isso seria o sinal de que os cristãos nada faziam endereçado a elas. Mas tal argumentação é inócua nesse assunto, pois o fato da existência de imagens (mesmo que sejam apenas pinturas) na igreja desse tempo, iniciado no século 1, é uma prova da prática cristã de sempre. E como deduz legitimamente desse fato das imagens serem usadas nos locais de culto, significa que eram veneradas, ainda que não tenhamos registros pormenorizados dos gestes, ritos e outras coisas relacionadas a essa veneração.

A hipótese de que os cristãos eram iletrados em número elevado, o que faziam-nos usar símbolos e desenhá-los, não explica tudo, pois os séculos foram desenrolando e a arte cristã continuou em desenvolvimento. Ainda quando a cultura letrada aumentou a arte cristã permaneceu, aumentando igualmente.

O autor tenta uma explicação tímida, e em nada harmoniosa com a doutrina protestante: “Todas essas representações demonstravam apenas o apego que aqueles crentes romanos tinham às Escrituras Sagradas.” (SILVA, p. 32) Mas a insistência de que as imagens não recebem “culto e veneração” é infundada. O que elas não recebiam era a adoração devida a Deus. O máximo que pode-se levantar é o que está explicado na Enciclopédia Católica, que afirma não sabermos como eram tratadas essas imagens nesse tempo, por falta de registros explícitos sobre isso. O que podemos conjecturar é que eram veneradas, pelo que representam e onde eram usadas, não sabendo apenas “o modo” como isso ocorria. Portanto, é incorreto afirmar: “Não existia o menor sinal de reverência por parte daqueles cristãos quanto a essas imagens pintadas.” Disso dizem que ninguém “dobrava o joelho”, “beijava”, “queimava incenso” “dirigia oração”, etc.

Obviamente ninguém fazia isso com o mesmo sentido que ocorria no paganismo. Mas, se havia algo semelhante e com conotação cristã, tal fato não pode ser negado. Afirma a Enciclopédia, citada à página 33 da obra em referência: “Por outro lado, o lugar de honra que dão aos seus símbolos e pinturas, o cuidado com o que decoram, indicam que tratavam as representações de suas crenças mais sagradas com pelo menos uma decente reverência”. Eis o que está conforme o princípio cristão da veneração das imagens, e o fato é inegável.

Contudo, o autor afirmou que a conclusão “do autor católico é forçada” por falta de provas de sinais de reverências às pinturas! Lamentável.

Isso não pode ser negado, pois isso provém da justa análise do fato e da correta dedução do mesmo. É negado pelos protestantes que a veneração de imagens tenha nascido da prática cristã às imagens das catacumbas, o que já configura uma acusação de que venha de outra fonte. O problema é que não há nenhuma prova, nem mesmo indireta, que possa substanciar essa objeção.

Incorreto, por afirmar algo que contradiz a realidade e não está e acordo com os indícios que dela decorrem.

Enfim, o homem deseja naturalmente ver mesmo aquilo que está relacionado ao domínio da fé. É assim que muitos judeus pediam sinais, para que vessem e pudessem crer, manifestando uma natural tendência humana, que deve ser orientada pela fé.
 

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