domingo, 17 de março de 2024

Livro: Conselhos de Ellen White: sobre Sola Scriptura

 

Livro: Conselhos de Ellen White sobre Sola Scriptura: o que a mensageira adventista realmente disse sobre o tema. Autor: Davi Caldas, 2021: Estudo do Capítulo 12:  O Sola Scriptura é bíblico?

A Igreja Católica ensina que o critério, o padrão, para se conhecer a doutrina verdadeira, aquilo que devemos crer e praticar, é composto por três elementos: a Bíblia, a tradição e o magistério. O Protestantismo aceita somente a Bíblia.

Ou o princípio Sola Scriptura está correto ou os irmãos católicos estão certos quando afirmam estar em pé de igualdade a Escritura, a Tradição e o Magistério. E agora?

Como a Bíblia é o único texto inspirado, a Igreja Católica ensina que ela tem uma posição singular na fé. Isso é afirmado, embora tenhamos a Tradição Apostólica e o Magistério da Igreja como estando em igualdade de autoridade para a fé e a moral. E o Protestantismo entende que a Bíblia possui uma posição única, de modo que nada mais pode ser de autoridade para definir o que é de fé e prática.

A questão é difícil, e mais difícil ainda é fazer-se entender. Tantos debates demonstram essa dificuldade. Há muito escrito sobre isso, e pouca compreensão. Muitos concluem coisas precipitadamente a respeito desse debate, e isso, na maioria das vezes, parece atrapalhar, já que o resultado é cada um terminar o debate ou a leitura do assunto e estar com a mesma ideia inicial, e com ideias pouco ou nada precisas da doutrina que está combatendo. A conclusão precipitada é uma lástima.

Pois bem. Vamos aos pontos específicos da questão. Quando se diz que a Bíblia é o texto padrão fundamental, única instância infalível, pelo qual toda a doutrina deve ser julgada, isso já pressupõe que alguém irá ler a Bíblia e com seu entendimento irá olhar para as doutrinas e concluir se estão de acordo com o texto bíblico lido ou não. E, portanto, aí começa um problema, ao invés desse princípio tê-lo resolvido.

De fato, todos tempos acesso à Bíblia, e, como cristãos católicos, cremos firmemente que ela é a Palavra de Deus. Assim, ao lermos a Bíblia, estamos diante da Palavra de Deus para nós, e cremos tudo o que ela ensina.

Continua o Protestantismo adventista afirmando que Bíblia é suficiente para conhecermos toda a revelação básica de Deus, não sendo necessário mais nada para acrescentar para que possamos chegar à salvação. Nessa questão não há muito o que objetar, desde que se faça correta interpretação dessa afirmação.

Entretanto, temos a verdade que a Bíblia possui, pelo menos de forma implícita, toda a revelação necessária para que conheçamos e sejamos salvos.

Então, como afirma o adventismo, não há necessidade de complemento doutrinário, ou seja, outra fonte de doutrina. Essa é uma afirmação muita usada no Protestantismo, não é de origem católica, mas é surpreendente que mesmo essa afirmação possui um bom sentido e pode ser admitida pelos católicos, como visto. A Bíblia não necessita de nenhum complemento.

Caso haja divergência entre fontes não doutrinárias e a Bíblia, a Bíblia possui primazia. Isso também está correto.

E, por fim, quando se diz que a Bíblia possui ferramentas para a interpretação de seu próprio texto, é preciso admitir que o leitor, seja ele católico, protestante ou ortodoxo, fará uso dessas ferramentas para interpretar a Bíblia e potencialmente pode falhar. Não há como garantir que a interpretação de alguém esteja correta.

Ainda que haja hermenêutica e exegese, é tamanha a realidade que não se pode negar, tão clara como o sol do meio dia em céu sem nuvens, de que os leitores, os mais bem intencionados, caem em muitas e muitas heresias.

É só lembrar que muitos no próprio movimento adventista chegaram à conclusão de que Cristo não era Deus, negando a trindade, que é um dogma já definido, onde a Igreja, os primeiros cristãos, que combateram os erros com perigo de vida, proclamou nos antigos concílios, respeitados em toda a Cristandade, a verdade da Santíssima Trindade.

Assim, alguns protestantes, pela nova onda no século dezenove de ir à Escritura e fazer livre exame para chegar a novas luzes doutrinais, foram levando para longe da verdade em pontos que já estavam totalmente resolvidos. Estavam tentando reinventar a roda. Assim, no caso adventista, felizmente puderam voltar nesse ponto, novamente, à antiga fé, por outros meios, que serão mais adiante mencionados. Mas em outros, por não seguirem a luz da verdade já brilhante na Igreja Católica há séculos, foram criando outras doutrinas por meio de suas interpretações particulares, como nova denominação.

Então, o conceito Sola Scriptura é um dos que fazem a diferença entre católicos e protestantes, mas quando bem entendido, no seu bom sentido, ele é conforme a doutrina católica, e impossível de conciliar com a protestante. E, nesse caso, já que se está aqui estudando a doutrina em obra adventista, é impossível harmonizar o princípio com o adventismo.

Quando se diz que: “Para os católicos, a Bíblia não é o único padrão para julgar fé e prática, nem a suficiente revelação de Deus para as questões básicas da fé.”, está afirmando que a Igreja Católica possui fontes extra-bíblicas, extra-canônicas, que são consideradas como autoridades infalíveis para as questões de fé.

Assim, explicando de uma forma católica, as obras dos santos Padres, os sínodos, os concílios gerais ou ecumênicos, as encíclicas, as bulas papais, as obras dos teólogos, as revelações particulares, os ritos e cerimônias da liturgia, as festas religiosas e etc., contem a tradição apostólica, que por sua vez traz elementos de fé e prática não exarados explicitamente na Bíblia.

Isso é verdade, é como a Igreja Católica entende a questão. Portanto, não é tudo o que está escrito fora da Bíblia e que está na tradição da Igreja que é considerado tradição apostólica. A Tradição Apostólica está no meio de um inumerável número de tradições da Igreja que é transmitida durante os séculos.  Essas tradições contem a tradição apostólica que vem do primeiro século juntamente com a Bíblia.

Dessa forma, a Bíblia não poderia ser o “único padrão” para julgar questões de fé e prática, pois nos pontos onde há controvérsia haveria apenas o leitor diante do texto da Bíblia para extrair dali o sentido e compará-lo com outros e concluir segundo o ele mesmo como intérprete. É sempre um perigo. E, em termos gerais, nenhuma instituição funciona assim.

Assim, quando se diz que: “Ela requer a complementação da tradição da ICAR e de seu magistério, em especial o Papa.

Dessa forma, há que se entender o que é a doutrina da tradição apostólica. E, obviamente, toda doutrina da tradição deve estar conforme a Bíblia. Para certificar-se disso, deve-se estudar, extrair a doutrina revelada de suas fontes, esclarecer, proclamar oficialmente essas doutrinas cristãs que devem ser cridas por todos os cristãos. E quem faz isso não é apenas uma pessoa, nem qualquer grupo, mas aqueles que compõem o que se chama Magistério Eclesiástico, que é composto pelo papa e pelos bispos, e que estão na linha de sucessão apostólica, seguindo também o senso da fé geral da Igreja, não podendo contradizer nenhuma doutrina bíblica e da tradição já proclamadas.

Basta uma olhada para perceber como o princípio católico é robusto. Nenhum membro da Igreja, nem o papa, pode mudar um dado revelado. Assim, se o texto bíblico devesse ser o único padrão para ser lido e julgar tudo o mais em questão de doutrina, a harmonia acima não poderia mais ser garantida. O Espírito Santo deveria falar com um só, ou com um grupo que deveria ser conhecido como esse canal, e tal critério seria bastante duvidoso.

Mas, se a autoridade da Bíblia, como Palavra inspirada, inerrante e infalível de Deus, é única, por ser o único texto inspirado por Deus na terra, qual o papel da Bíblia na Igreja Católica e sua relação com a tradição e o magistério em termos mais precisos? Isso será respondido seguindo o raciocínio protestante na sua defesa do Sola Scriptura contra a tradição e o magistério. Que o leitor tenha a paciência de seguir o raciocínio na apresentação que segue.

São apresentadas cinco evidências para o Sola Scriptura. A primeira é que Jesus não teria falado das antigas tradições rabínicas nem defendido os escribas e fariseus, o magistério da época.

Mas é preciso responder a isso afirmando que: o magistério antigo não recebeu a mesma promessa do magistério cristão, pois Jesus afirmou que a Igreja nunca será vencida pelos poderes do inferno. É algo novo.

E, além disso, no que se trata de pontos fundamentais, Jesus afirmou que o magistério judaico devia ser ouvido, que suas doutrinas deveriam ser praticadas, e somente as ações hipócritas dos líderes não deveriam ser imitadas. Isso já refuta a objeção que se formou acima.

Com isso, temos que o fato da falibilidade humana dos líderes, e das tradições, não prova o Sola Scriptura, já que quando Cristo afirmou que todos deviam obedecer e fazer tudo o que eles dizem (cf. Mt 23, 1-4), referindo-se ao ensino do magistério judaico, isso mostra que eles conheciam e pregavam a doutrina bíblica correta, o que pressupõe correção nos pontos fundamentais e salvíficos, mas que agiam mal em suas vidas. Levando isso para o Novo Testamento, temos maior razão para crer na correção da doutrina da Igreja Católica ensinada pelo seu magistério, instituído por Jesus Cristo.

E aqui, entra novamente a Bíblia: “Por isso, ela tem autoridade superior.” De fato, diante da vida dos homens, das autoridades da Igreja, dos documentos doutrinais, de tudo o que é ensinado e conservado, a Bíblia possui autoridade suprema.

Desse modo, essa frase protestante é totalmente católica, e estamos aqui em um terreno onde o princípio está sendo estudado, compreendido e desenvolvido segundo a fé católica, com razões bastante claras. E, ao longo da discussão as objeções em defesa do Sola Scriptura estão sendo refutadas. Até o momento não há nada que possa ser afirmado como dificuldade para a doutrina católica.

É importante entender que o magistério possui autoridade de acordo com a Palavra de Deus, não para produzir doutrinas, mas para ensiná-las e defendê-las. Mas o princípio Sola Scriptura leva a afirmar: “Em suma, as tradições nem sempre são boas.”.

E de fato é assim. Por isso, a Igreja somente proclama dogmas em concílios por entender que esses dogmas não são parte de qualquer tradição, mas da tradição apostólica, que é Palavra de Deus e está em conformidade com a Bíblia. Não são todas as tradições da Igreja que são apostólicas.

O fato do Sumo Sacerdote não ter sido dito “infalível” e ter errado em condenar Jesus não é algo que pode ser usado contra a doutrina da infalibilidade papal, pelo já exposto antes, é já expressa certas incompreensões. Os judeus ensinavam corretamente a doutrina (Mt 23), mas foram repreendidos por sua conduta. As tradições que são condenadas e os seus motivos são expressos por Jesus de forma clara. Mas, de modo geral, estavam ensinando corretamente.

Ainda, é preciso entender que um erro jurídico não é o mesmo que um erro doutrinal em matéria de fé e prática. Nem mesmo o papa possui infalibilidade jurídica, política, científica, acadêmica, etc., mas somente naquilo que se refere à fé e à moral em momentos específicos, onde há clara intenção de conhecer, ensinar e proclamar a verdade salvífica a toda a Igreja com a autoridade recebida de Jesus Cristo, o que é entendido por falar ex cathedra. Isso é muito mais do que alguém fazer um estudo privado da Bíblia e ensinar sua interpretação de uma passagem. O papa tem consigo a companhia dos bispos, o estudo dos teólogos, o senso de fé dos fieis em todo o mundo, a tradição apostólica proclamada nos concílios. E, ainda, tem as revelações particulares dos santos e videntes cristãos católicos que atestam a verdade de muitas doutrinas, sem que essas revelações sejam fonte doutrinária.

Depois de compreender isso, é bom lembrar e entender por isso o motivo de Jesus respeitar a autoridade do Sumo Sacerdote, como está em Jo 18, 22, pois Suas palavras não tiveram a intenção de negar aquela autoridade, assim também em Atos 23, 5, onde São Paulo reconhece a autoridade do Sumo Sacerdote.

Dessa forma, o magistério judaico errou, e mesmo o magistério da Igreja Católica pode errar em questões que não estão ligadas diretamente à fé e à moral. Em aplicações da moral, em muitas expressões ordinárias do magistério, pode haver erro.

Assim, há vários exemplos em que atitudes magisteriais foram mal-sucedidas, como no caso específico da condenação de Santa Joana D´arc, e no caso de Galileu e etc., o que não afeta em nada a questão da infalibilidade do papa e do magistério, que versa sobre outras questões. Por isso, o próprio magistério reconheceu a santidade de Joana D´arc e a canonizou, quando soube do erro do processo de inquisição local que julgou aquela santa. Assim, não se pode por razões apresentadas dos erros dos sumos sacerdotes afirmar que o magistério não pode ser infalível em matéria de doutrina.

E a pergunta: “E se não o era em Israel, povo étnico de Deus, por que o seria entre os cristãos?” é um questionamento bastante compreensível, mas contem erro.

De fato, nessa pergunta há contraste e distinção entre Israel, povo étnico, e os cristãos, e deixa transparecer que se no Antigo Israel não houve o carisma da infalibilidade no seu magistério, também não haveria de existir entre os cristãos que “nem” são o povo étnico de Deus.

Essa ideia que é possível ser sentida no texto, e certamente não foi intenção do autor ensiná-la, é um equívoco. Primeiro, porque a Nova Aliança é eterna é superior. A antiga aliança foi provisória, imperfeita, não possuía a promessa da infalibilidade do magistério. Segundo, porque a Nova Aliança foi iniciada pelos judeus que reconheceram Jesus como Cristo, o Messias prometido, e converteram-se à fé cristã, sendo aqueles aos quais a Palavra de Deus foi pregada em primeiro lugar. E, portanto, os primeiros cristãos foram judeus étnicos e da promessa, e formaram o magistério católico, que é sucedido até os dias atuais pela sucessão apostólica. Terceiro, a parte endurecida étnica, que é da promessa, será outra vez enxertada na Oliveira verdadeira, onde já estão todos unidos na Igreja judeus e gentios, usufruindo da promessa que foi dada a Israel.

De fato, a Igreja é o novo Israel, aguardando apenas, por assim dizer, a plenitude dos judeus e dos gentios. Por tudo isso, corrigido o equívoco, como se o que não existiu no antigo povo étnico não poderia existir no novo Israel espiritual, que também contém o étnico, passemos a entender mais o que é infalibilidade, e fazendo as devidas distinções entre antiga e nova aliança, se pode conhecer mais a verdade. Eis as razões bíblicas para entender que o magistério cristão católico é de fato superior ao antigo: mudança de lei, mudança de aliança, mudança de sacerdócio, mudança de magistério, maior graça.

E, assim, tudo o que a primeira evidência mostrou foi que a Bíblia é suprema, e com isso a Igreja Católica concorda plenamente. Não provou nada contra a tradição apostólica nem contra o magistério eclesiástico que estão sempre em conformidade com a Bíblia. Até os exemplos dados sugeriram e deram ocasião para apresentar a verdade de que o magistério católico, por estar no Novo Testamento, deve ser mais robusto. Pelo que foi dito acima, foi possível entender que as razões católicas são sólidas.

Quando na segunda evidência é citada a providência de Deus na conservação dos escritos entre tantos que existiram no Antigo Testamento no Povo de Israel, que iriam compor a Bíblia, devemos tem em mente que o Povo escolhido foi o meio de conservar esses escritos. Isso também aconteceu no Novo Testamente, onde a Igreja Católica teve essa incumbência da onisciente providência divina, e conservou os escritos inspirados do Antigo Testamento e do Novo Testamento desde os dias dos apóstolos, passando pela Idade Antiga, a Idade Média.

Embora tenham havido motivos para fechar a lista dos livros inspirados, isso não ocorreu no Antigo Testamento, e foi feito pelos judeus, já na Era Cristã, e pela Igreja, de forma separada. O cânon do Antigo Testamento foi definido nos mesmos concílios com o cânon do Novo Testamento, o que mostra que foi parte da providência de Deus para definir toda a questão. E, certamente, Deus guiou os concílios cristãos referentes ao cânon.

Na evidência 3 temos que a Bíblia no AT praticamente possui os mesmos conceitos quando se compara a Torah e os profetas, conceitos esses que foram aplicados, ampliados, desenvolvidos e explicados.

É bom lembrar que a tarefa dos concílios católicos também sempre envolve essas ações, de aplicar os conceitos da Palavra de Deus, de ampliá-los, de fazê-los conhecer melhor, de desenvolvê-los, de explicá-los, de tal forma a não deixar dúvidas. Enfim, é praticamente isso que faz a definição de um dogma.

Quando se reconhece que a Torah em certo sentido era suficiente, pois as revelações precisavam desenvolver pontos que já existiam na Torah, é uma ótima ocasião para entender também que nesse sentido a Bíblia é suficiente na Igreja Católica, pois tudo o que é preciso fazer para desenvolver certa doutrina e defini-la para o Povo de Deus tem de estar em conformidade com os conceitos revelados na Bíblia, nunca se desviando dela, com todos os conceitos de seu conteúdo inteiro. Todos os dogmas católicos estão em conformidade com a Bíblia.

E se Jesus ensinou algo que talvez não seja possível encontrar os conceitos na Torah e nos Profetas? A resposta é que Ele é Deus.

Correto, Jesus é o Messias e veio revelar tudo o que é necessário para fazer parte da Sua Igreja.

E, além disso, essa ideia é importante para entender que a Igreja Católica muitas vezes traz certas práticas e ensinos que estão menos claros no texto bíblico, mas ela é a Igreja de Jesus Cristo, que tem autoridade para ensinar e para exigir obediência. Enfim, tudo o que a Igreja ensina está em conformidade com a Bíblia. A Igreja não cria doutrinas.

Na evidência 4 temos que os escritos inspirados do NT tiveram aval e monitoramento dos apóstolos. Isso é formidável, e parte do plano de Deus para manter intacta Sua Palavra. De fato, a Providência mantém intacta a revelação escrita, e também oral.

E esse fato: “Embora, como no caso do AT em Israel, algumas comunidades cristãs divergissem um pouco quanto a quais livros deveriam compor o cânon do NT, a maior parte dos livros era aceita pela maioria dos cristãos.”. Essa afirmação requer a admissão de que foram os concílios católicos que definiram o cânon bíblico, pois se apenas um livro está em discussão geral, a autoridade da Igreja se tornou necessária para definir a questão. E sabe-se que vários foram objetos de divergências.

Na evidência 5 o argumento de que não havia Sola Scriptura durante a vida dos apóstolos, já que não havia Escritura ainda no Novo Testamento, pelo menos, é tida como argumentação frágil. Mas não é.

De fato, não há nenhum registro e nem o conceito de que os cristãos usassem do livre exame para garantir a correção da pregação apostólica. Muito pelo contrário.

Se a pregação dos fatos foram sendo julgados pelas Escrituras for a Sola Scriptura, então tudo bem, e isso não é tão divergente da doutrina católica. De fato, tudo o que a Igreja prega está em conformidade com a Bíblia, e pode ser verificado nela.

No entanto, é preciso frisar que não havia espaço para alguém ensinar algo diferente do que os apóstolos pregavam. Do contrário, seria anátema. Imagine um cristão afirmando que é necessário circuncidar-se para ser salvo, ainda que os apóstolos em concílio chegaram à conclusão contrária. Assim, a Igreja pregava com autoridade, ensinava o evangelho, e todos aderiam conforme a autoridade de Deus dada à Sua Igreja.

Os bereanos foram elogiados, mas não eram cristãos. Eram pessoas que ouviram a pregação e crendo estarem os apóstolos de fato de acordo com as Escrituras, que prometiam o Messias, abraçaram a fé. A partir dali, se viram sob a autoridade dos apóstolos para aprenderem o evangelho. Isso é Sola Scriptura somente no sentido harmonioso com a fé católica. Ninguém julgava a pregação apostólica por pelo livre exame.

Em outras palavras, quando um católico vai à Bíblia para julgar uma doutrina com que teve contato, estaria fazendo uso do princípio Sola Scriptura, no sentido católico, já que ele faz interpretação correta, conformando-se à autoridade eclesiástica, que está em harmonia com a interpretação oficial. Pode ser que encontrou em algum lugar uma doutrina, e percebeu pela sua leitura da Bíblia que ela está correta e aceitou seu ensino. Assim, fez uso do princípio Sola Scriptura, se essa doutrina de fato está correta e, portanto, é ensinada pela Igreja.

Se os bereanos ficaram convencidos de que os apóstolos pregavam o verdadeiro Messias, por ter ido às Escrituras e se certificado do fato, essa atitude do Sola Scriptura não contradiz a fé católica.

Somente se depois os bereanos se pusessem a julgar a pregação apostólica alegando estarem fazendo comparação do que estava na Bíblia do Antigo Testamento e, talvez, em algumas partes do Novo Testamento já escritas, e discordassem do ensino apostólico, então estariam fazendo livre interpretação contra a autoridade dos apóstolos, o que fere o princípio cristão católico.

De fato, esse modelo não se encontra em lugar nenhum na Bíblia, nem em toda a história da Igreja, sendo sempre algo errôneo. É preciso entender isso para compreender a argumentação católica sobre o assunto.

Na verdade, aqueles judeus se converteram à fé cristã por reconhecerem Jesus como Messias. Eles aceitaram a fé cristã e se submeteram ao batismo, à ceia, não mais creram na circuncisão como meio de salvação, etc., etc., sem questionar nada mais, pois sabiam que ali estavam os representantes da Nova Aliança. Partiram das Escrituras e, por isso, foram à autoridade da Igreja e lhes deram crédito. Por outro lado, isso está conforme o modelo Bíblia, Tradição e Magistério.

Há atitudes do modelo Sola Scriptura que estão conforme a fé católica, enquanto que outras, que estão no entender católico, e são de fato Sola Scritptura, mas refutam as objeções protestantes do Sola Scriptura.

Ainda, a Tradição era recente no primeiro século, mas já começaram algumas disputas sobre a fé, e essas foram resolvidas pela autoridade dos apóstolos, e não pela interpretação bíblica de alguém.

Então a Bíblia está em conformidade com a Tradição e o Magistério. Portanto, não há como a tradição apostólica ser “avaliada de acordo com a Bíblia” por cristãos de outras épocas, pois essa tradição vem juntamente com a pregação da Bíblia na vida da Igreja, ininterruptamente ensinada. Ela é expressa autoritativamente nos concílios.

Ainda, lembrar que o cânon bíblico foi definido séculos após os apóstolos, pela autoridade católica, e que por isso não se sabia exatamente, durante séculos, quais eram os livros inspirados com seu número exato. A doutrina da Igreja, pregada oficialmente, garantia a pureza da fé, estando sempre em conformidade com a Bíblia.

Gledson Meireles.

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