domingo, 2 de abril de 2023

Livro: A lenda da imortalidade da alma, sobre Mateus 10, 28

Mateus 10:28

 

Mas o autor está convencido de que alma é material, tangível, perecível com o corpo, e nunca, jamais, uma parte imaterial, espiritual, destacável do corpo que possa ser separada e ainda sobreviver. Porém, várias provas disso já foram dadas no decorrer do estudo.

Chegou a hora de enfrentar mais uma vez argumentos mortalistas baseados em Mateus 10, 28.

É um dois textos mais ricos para o debate. É impressionante. Os dois lados podem ver muitas e muitas implicações nele. E o que resulta disso tudo é um grande avanço no conhecimento bíblico.

Mas o mortalismo exige que a interpretação seja que no final há destruição da alma: “...do contrário o que o texto estaria dizendo é para não temer os que matam o corpo e não a alma, mas sim aquele que também só mata o corpo e não a alma (o que seria uma interpretação ridícula, para dizer o mínimo).” Como responder a isso?

É simples, porém não é fácil. Vejamos a simplicidade: a alma que não é atingia materialmente, só podendo ser atingida por Deus, é separável do corpo. Segue-se que ela deve permanecer após Deus matar o corpo. Por isso, Deus pode lançar ou destruir corpo e alma no inferno.

Agora, vejamos o motivo de não ser fácil. Mesmo com a explicação acima, o leitor mortalista não compreende que a morte física que pode ser causada pelo homem já inclui a morte da alma, o fim da vida física, a destruição do princípio vital na pessoa morta. Dessa forma, se Deus ferir mortalmente o corpo, a alma já desaparece também.

No entanto, eis que o texto afirma que matando o corpo, ainda sobre a alma que só Deus pode alcançar juntamente com o corpo. Eis a dificuldade para o mortalista.

Não se segue que o homem mata o corpo e não pode atingir um elemento que temos dentro de nós, que permanece vivo, enquanto Deus também poderia apenas matar o corpo, deixando vivo o elemento alma que sobrou. Essa foi a tentativa do autor para refutar a interpretação do texto, mas não logrou êxito.

De fato, o homem mata e a alma permanece. Deus pode destruir corpo e alma juntos no inferno. Assim, é o lançamento do pecador vivo no inferno. Dessa forma, destruir no inferno, ou lançar no inferno, não pode significar levar à inexistência, mas expressa o tormento infernal.

Mas o autor continua: “O simples fato da primeira parte do verso falar de morte literal e da segunda parte ser uma antítese da primeira já atesta que Jesus estava falando realmente de aniquilação.”.

O problema é que a morte literal para o mortalismo é a inexistência do ser. É uma aniquilação. Não há antítese. O homem que mata outro aniquilou-o no sentido mortalista, já que Deus deverá “recriá-lo” na ressurreição, que seria uma recriação. Refutado argumento, pelo que parece.

Segue a objeção: “O sentido claro e manifesto é que Deus mata mais do que os homens são capazes de matar – porque, enquanto estes matam só o corpo, Deus destrói corpo e alma.” Contudo, na doutrina mortalista Deus não pode matar mais, pois se a morte é aniquilamento, a segunda morte também o é, apenas não tendo mais chance de voltar à existência pois Deus não teria prometido outra ressurreição.

Do contrário, a morte é o sofrimento que o homem pode fazer ao outro. Assim, o homem pode atingir o seu próximo causando-lhe sofrimento físico, mas não espiritual. Deus o pode. Dessa forma, é a morte no sentido de sofrimento, talvez, o que explica que o sofrimento causado na morte física termina aí, pois o cadáver não sofre mais. No inferno, porém, o sofrimento corpo e alma não tem fim. De fato, essa morte é bastante pior. Parece mais uma vez refutado.

Imagine que Deus pudesse destruir o corpo primeiro, depois a alma. Conclui-se que a alma é separada do corpo e estava viva. De fato, isso é apenas uma imaginação, mas não se encaixa no mortalismo.

Agora, imagine que o inferno é o local de destruir o homem, no seu corpo, vivo, é claro, pois no mortalismo não há duas partes separáveis, mas dois aspectos inseparáveis. Matando corpo e alma é apenas afirmar que o inferno mata o homem inteiro.

O grande problema é que o homem pode causar sofrimento ao homem por um certo período de tempo em indescritíveis torturas e depois destruí-lo, ferindo-o de morte. Nesse sentido, para o mortalista, matando o corpo extingue-se a alma, cessa de existir o ser humano totalmente. Que diferença isso fez?

Certamente o que fica é que o inferno tem sofrimento maior, mas não diferença de morte. Em ambos o ser humano foi completamente extinto. Nos dois casos, usando a perspectiva mortalista, corpo e alma foram destruídos. As duas mortes foram idênticas. E o texto ficou sem explicação ainda: Jesus afirma que a alma não pode ser atingida pelo homem, como a doutrina mortalista afirma que pode. Portanto, o mortalismo está mais uma vez refutado.

A respeito do verbo appolumi, então, é verdadeiro que significa uma ruína no ser, uma destruição, não aniquilação do mesmo, um sofrimento terrível que o ser padece, não uma completa inexistência. E como a afirmação mortalista de que Deus só mataria o corpo, na comparação acima, que foi devidamente refutada, resta agora o mortalista aceitar a refutação com base nos verbos apokteino e apollumi.

A leitura feita no texto com o verbo “perder”, que sugeriria que Deus perderia Sua própria alma, não é razoável, visto que basta traduzir como “destruir” e concluir que Deus destruiria Sua alma também, não fazendo nenhum sentido. É fato que o texto é bem claro e não sofre dessas ambiguidades. É simples que tal tentativa não foi um bom argumento.

A questão sobre “matar de verdade”, ou seja, levar à inexistência, e “matar de mentirinha” no inferno, ou seja, deixando o ser vivo, que é criticada no mortalismo, é uma noção que o mesmo não percebe que está voltando contra si mesmo.

Se a morte física é matar de verdade causando inexistência do ser, como sugere a interpretação acima, enquanto que a morte no inferno seria “de mentirinha”, por não levar ao aniquilamento da pessoa, mais uma vez o mortalismo está afirmando que as duas mortes são iguais, como cessação da existência, e não explicou ainda o termo alma que é citado separadamente por Jesus.

A essa altura, o autor afirma: “Neste caso, o conceito é que Deus dá fim ao corpo e à alma, enquanto os homens dão fim somente ao corpo.” Parece que já crê na doutrina da imortalidade da alma. Agora, prestemos atenção como explica que os homens podem dar fim somente ao corpo, se no mortalimo a alma é aspecto do ser que chega ao fim junto com o corpo.

A noção mortalista não permite esses arrazoados feitos. Vejamos ainda o que o autor escreveu em seguida: “(e o contexto exige que o tipo de morte aqui seja a mesma que o corpo padece).”. Se a alma não tem existência à parte fora do corpo, matar o corpo seria o mesmo que matar a alma na mesma ocasião, e não teria razão em citar ambos em separado. O mortalismo está usando um arrazoado imortalista inconscientemente.

O autor sugere que o sentido de alma no texto de Mateus 10, 28 não é o habitual. O termo teria sido empregado com outro significado, como ensinou o Dr. Samuele Bacchiocchi, que foi refutado em outro lugar neste estudo. O problema é que a passagem não dá lugar para pensar em nenhum outro sentido para o termo, usado em  ambas as partes do versículo, sendo parte do ser humano. O que muda nos dois paralelos são os agentes, pois no primeiro os agentes são os homens, no segundo é Deus. O corpo e a alma é o mesmo nos dois momentos e diz respeito à constituição da natureza humana. Mais uma vez o mortalismo fica refutado aqui.

A alma estaria sendo usada nesse verso em sentido figurado, e não no habitual, como aparece em outras tantas centenas de vezes na Bíblia. Mas o problema é que isso não invalida a imortalidade da alma, bastando mostrar que nessa passagem o sentido de alma é outro, e não o de pessoa, de vida, de mente, de eu. Não contradizendo nenhum desses sentidos, a alma em Mateus 10, 28 é espírito imortal e parte da natureza humana.

Os homens não poderiam matar a pessoa? Ou matar a vida? Ou matar a mente? Ou matar o eu da pessoa? Claro que sim. Dessa forma, deve-se procurar de fato outro sentido, ainda que seja o único verso em que o mesmo apareça. Nisso o mortalismo acertou, nisso ele tem razão. Se o termo tem outros sentidos em outras partes, sendo lógico afirmar que nesses sentidos a alma morre, mas aqui a alma não morre, então é de se fazer uma boa exegese para averiguar o sentido dessa passagem específica.

Mas, Jesus teria usado o termo em outro sentido? Então esse não seria o único caso, mas em muitas outras passagens a alma teria o significado de algo imortal, não acessível aos homens.

O verso com o ‘novo’ sentido seria Mateus 10, 39. Contudo, nesse verso a psique tem o sentido de vida, como em outras tantas passagens “Quem acha a sua vida (psiquê) a perderá, e quem perde a sua vida (psiquê) por minha causa a encontrará””. Por exemplo, santo Estêvão, o primeiro mártir, perdeu sua alma, perdeu sua vida, foi morto. Dessa forma, foi salvo, e terá a vida de volta na ressurreição.

Assim, quando ele foi apedrejado sua vida foi atingida, e até o dia da ressurreição ele não a encontra novamente ainda. Portanto, não é o mesmo sentido de Mateus 10, 28, pois ali os homens não podem matar a alma. Então, no v. 39 psiquê pode ser perdida na morte e encontrada na ressurreição, enquanto que no v. 28 psiquê não pode perecer na morte e pode acompanhar o corpo no inferno após a ressureição, por ser imortal.

O próprio texto citado de João 12, 25 mostra que a vida eterna é “zoen aionion” e não psique, que é nessa passagem a vida física do homem. Essa vida pode ser perdida e pode ser preservada para a vida eterna. Isso acontecerá com os que estiverem vivos na Parusia, que já passam direto para a vida eterna sem morrer. Os que morrem conservam o direito de viver novamente para sempre, na vida eterna. Assim, não há quem receberá “psique” eterna, mas viverá a psique, que é a vida, na zoen (vida) aionios (eterna).

A linguagem de “conservar” a psique não é problemática aqui, já que nem assim a passagem indica a alma imortal, mas a vida física, pelo contexto.

Em Mateus 16, 25-26, alguém pode perder a vida e achá-la. Perder a psique e encontrá-la na ressurreição. Trata-se da vida. Em Mateus 10, 28 os que matam o corpo não matam a alma. Eles podem fazer morrer o corpo e a vida física, logicamente, mas não atingem a alma. Deus pode atingi-la. Essa alma não pode ser vida eterna, pois o texto diz que Deus pode jogar essa alma no inferno com o corpo.

Vejamos: quem é lançado na Geena é condenado. Esse é o que preferiu viver seus próprios prazeres. Ele perdeu a vida por amar sua vida. Perdeu a vida eterna. Nessa cena, ele não pode entrar no inferno com essa vida, já que não a possui, mas a perdeu. Prova-se assim que psique não é vida eterna.

Comentando Mateus 6, 25 há um erro sério de interpretação:

 

Na primeira parte, a psiquê se refere à vida presente (que Jesus diz para não se preocupar), definida em coisas como comer, beber e se vestir; e, na segunda, à vida futura (que Jesus diz que é mais importante que essas coisas da vida presente). Mais uma vez, somos instados a priorizar a vida futura em detrimento da vida presente, sendo ambas designadas pelo mesmo termo para alma (psiquê).

 

 

De fato, quando Jesus fala da psique é apenas à vida física que está tratando, e Ele não diz que isso está ligado ao comer, beber e se vestir. Pelo contrário, a vida está ligada ao “comer e beber”, e o corpo ao “vestir”. Assim, ele diz que a vida é mais importante que a comida, ou seja, que o comer e beber, que sustenta a vida, e o corpo é mais importante que a roupa, ou seja, que o vestir. Assim, nenhum sentido de alma como “vida futura” foi introduzido aqui. A perícope ensina a procurar o reino de Deus e a justiça, então tudo o mais (comida, bebida e vestimentas, etc.) será dado em acréscimo. É como dizer, não se preocupem com vossas vidas, mas com o reino e a justiça de Deus. Em nenhum lugar psique tem sentido de vida eterna.

Em Lucas 9, 55 a psique não é vida eterna, mas a vida dos homens que será salva para a vida eterna, como ficou explicado acima, por meio do texto original da Bíblia. De fato, Jesus não veio destruir a vida física mas salvar essa mesma vida física, diz o texto: não veio para destruir a vida (psique) dos homens, mas para salvá-la. A tradução da Ave Maria usa o verbo “perder”: Jesus não veio para perder a vida dos homens, o que explica esse verbo, e seu uso gramatical, que não causa problema de interpretação voltando a ação para a Pessoa de Deus, como sugeriu o argumento, para melhor entender a objeção feita antes, sobre o sentido de apollumi e sua devida refutação.

Mas a explicação causa um problema: “Jesus não veio ao mundo para privar as pessoas da eternidade, mas justamente ao contrário: para salvá-las e dar a elas uma oportunidade de viver para sempre.” Pareceria que todas as pessoas tem a eternidade! Não tenham medo que Jesus não veio vos tirar a eternidade que tendes! Não é isso que o texto diz, mas apenas que Jesus não veio tirar a vida que todos possuem, mas vai salvar essa vida. Não é a vida eterna que Jesus vai salvar, mas a vida que todos possuem para a entrada na eternidade.

O mesmo no texto citado de Lucas 21, 19 que diz literalmente: vós ganhareis as vossas almas. O texto grego é claro ao afirmar que se trata das “vossas” almas, ou das almas “de vocês”, ou seja, que eles possuem, que pode ser perdida e que ganharão novamente. Ninguém poderá objetar que todos já possuem vida eterna que será apenas devolvida. Um exemplo é Lázaro, que ganho a vida mas voltou a morrer. Sua alma foi-lhe entregue de volta, mas depois ele a perdeu novamente, pois ele não entrou na vida eterna. Na ressureição os salvos ganharão suas almas (terão vida de volta) para viver eternamente.

A tradução que o autor usou para argumentar traz “obterão a vida”, mas o original grego diz que “ganhareis as vossas almas”, ou seja, não perdereis as vossas almas, as vossas vidas, o que se a vida que eles já tinham. Basta relembrar do perder e achar a vida, perder a vida e reencontrá-la. Trata-se da vida (psiquê) que será dada de volta pela graça de Deus na ressurreição para entrar na vida eterna (zoe aionios).

O contexto afirma, no v. 16, que muitos serão mortos, mas que não se perderá um só cabelo de vossa cabeça, v. 18. Isso mostra que Jesus está garantido a vida de volta com tudo o que é parte do ser, como até um fio de cabelo. Dessa forma, sendo perseverantes, os salvos ganharão de volta a vida (psiquê), que possuíam, para viver a vida eterna. Não há nada que indique que o termo adquiriu o sentido de vida eterna. De fato, basta pensar que se muitos foram mortos, perderam a vida, e devem ganhá-la de volta, isso prova que o termo se refere à vida física que foi perdida. Essa é a vida que pode ser morta com o corpo, e não é a de Mateus 10, 28, pois essa não pode ser morta pelos homens. Mais uma tentativa mortalista que não resiste à refutação.

Assim, nenhum exemplo de alma no sentido de vida eterna foi apresentado. Então, a explicação “Não poder matar a psiquê significa não ter a capacidade de acabar com a vida futura”, não cabe, já que estaria colocando Deus como acabando com a vida futura, quando na verdade ele não dará a vida a quem for condenado, e não que acabará com a vida futura de alguém, como se esse já a tivesse. Isso faria Deus colocar corpo e vida futura no inferno o que não faz sentido.

E quando diz: “...já que os homens só podem nos matar nesta vida”, sugere que Deus poderia matar na outra, como se o morto na presente vida permanecesse vivo na outra, e Deus pudesse por fim ao corpo e à alma, e não só ao corpo. Nada disso responde suficientemente ao sentido claro do texto. Cada falha de argumento está sendo mostrada.

Então o argumento continua concluindo que: “Deus, no entanto, pode nos destruir tanto nesta vida, quanto na próxima – o que explica por que devemos temê-lo mais do que tememos aos homens.” Porém, Jesus não disse isso no evangelho, mas afirmou que Deus pode destruir corpo e alma no inferno, futuramente, e não que “pode nos destruir nesta vida”. Isso foi dito dos homens.

A tentativa de Richard Whately também foi frustrada. Vejamos: Ele afirma que os inimigos podem infligir morte temporária, enquanto Deus tem poder sobre “toda a nossa existência”. O problema é que no mortalismo a morte é o fim da existência. Uma vez que Deus não ressuscite alguém, criando-o novamente, esse já não existe. Dessa forma, é gratuito dizer que nesse caso “que o poder de Deus se estende a toda a nossa existência”, sugerindo, pela linguagem, que temos existência eterna (o que é verdade pela imortalidade da alma), e que os homens não podem atingir, somente Deus. Isso volta o argumento mortalista contra o próprio mortalismo, inconscientemente, pela noção indesejada que deixou transmitir pela linguagem empregada.

De outro modo, o argumento deixa transparecer que o tal fim temporário significa que o homem, uma vez morto, tem o poder de retornar, e que Deus teria o poder de infligir depois uma morte eterna. Isso soaria ridículo.

Então, o autor explica: “Em síntese, tudo o que os homens podem fazer é nos privar desta vida, mas não podem fazer nada para nos excluir da próxima, que recebemos pela graça mediante a fé.” Está correta a explicação.

No entanto, o mortalismo deve compreender que a vida eterna é contraposta ao opróbrio eterno, que é a morte eterna em tormentos, em destruição, em condenação, mas não em aniquilamento. É o que ensina Daniel 12, 2 e Mateus 25, 46.

Partindo do texto sagrado, se o mortalismo ensina que o mesmo significa que não se deve temer os que matam o corpo, tirando a vida temporária, mas Deus que pode matar corpo e alma, que é a vida eterna, isso sugere que a morte física não pôde desfazer a alma, que seria a vida futura, mas Deus atiraria o corpo e a vida futura no inferno. Se o homem integral é o corpo, ao matar o corpo o ser inexiste. A vida eterna só existe no ser vivo usufruindo dela. Ao morrer, não há uma “vida” à parte existindo fora do morto.

Se o corpo é o ser inteiro, os que matam o corpo matam tudo. Se a alma não é parte do ser, mas vida futura, e essa não existe sozinha, fica impossível que o texto tenha esse sentido.

Também, se o corpo é o ser inteiro, e Deus pode mandar corpo e alma para a Geena, então o ser inteiro e a vida futura irá para o inferno. Mas bastaria lançar o corpo no inferno, e não a vida futura (que seria o conceito de alma), como já explicado. Por tudo isso, o conceito de “vida eterna” ou “vida futura” para a alma em Mt 10, 28 é totalmente descabido.

De fato, Lucas 12, 4-5 supõe a ressurreição quando fala de lançar no inferno, e o motivo de não mencionar o estado intermediário é que a comparação é feita com aqueles que matam o corpo, onde Deus é mencionado tendo poder sobre o corpo e ainda mais, para lançar no inferno. Em Mateus isso é dito de outra forma, destruir o corpo e a alma no inferno. Ambos possuem o mesmo sentido que está em conformidade com a imortalidade da alma como ficou claro acima ao analisar cada argumento.Em Mateus a frase “mas não podem matar a alma” é escrita por Lucas como “e depois nada mais podem fazer”. E depois, “pode destruir tanto a alma como o corpo no inferno” equivale a “depois de matar o corpo, tem poder para lançar no inferno”.

Então, mesmo sabendo que tudo já supõe a ressurreição para destruir alma e corpo e lançar no inferno, usando ambas as afirmações, é preciso admitir que a alma que não pode ser tocada com o corpo na linguagem de Mateus está subentendida no lançamento corpo no inferno que, logicamente, está vivo, ou seja, possui alma.

Agora, vejamos: se os homens podem matar o corpo, que significa também a alma, no ser integral, mas não a alma que Jesus Se referiu, e Deus pode lançar no inferno esse corpo com a alma, que não é a vida física, mas aquela mesma parte que o homem não pode matar, conclui-se que a alma é a parte espiritual do ser humano. Chega-se à mesma conclusão de antes por ser irrefutável.

Dessa forma, o sentido é uma admoestação ao indivíduo, que pode sofrer no corpo pela ação humana, mas, o que é pior, pode sofrer no corpo e na alma pela condenação divina.

O humano não pode fazer sofrer a alma, então não é um sofrimento psíquico, mental, emocional, apenas, mas espiritual. Deus pode fazer sofrer na condenação o corpo com todas essas propriedades que estão na alma, ou seja, fazer sofrer ininterruptamente, já que o corpo com a alma não pode morrer.

Depois de matar, que é o que diz o texto grego de Lucas, que não traz também a palavra corpo, mas “depois de matar, tem poder para lançar no inferno”. Logicamente não é o lançamento de um cadáver, mas o lançamento da pessoa que foi morta por Deus, o que em Mateus é a ação de “destruir” o corpo, ou seja, condenar, e que foi lançada no inferno, que em Mateus equivale a “destruir” também a alma junto com o corpo. Então, essa alma só pode ser imortal. Assim, esse argumento do mortalismo está refutado.

Ainda há outra argumentação igualmente válida. Se o inferno é o tormento seguido de morte, o homem poderia fazer o mesmo. Mas Jesus diz que isso não pode ser feito pelo homem: não pode matar a alma, e após matar não pode nada mais.

Se a alma é a vida, então na tortura e na morte o homem pode atingir corpo e alma. Mas Jesus afirma que não pode. Então, a alma aqui não é a vida, pois como já afirmado várias vezes, se a destruição no inferno é a morte, isso é algo que o homem também pode fazer.

No entanto, se a alma é imortal, e Deus pode destruir corpo e alma no inferno, segue-se que esse tormento não tem fim. Portanto, prova-se a alma imortal, e o tormento que não cessa no condenado ressuscitado. Assim, esse argumento do mortalismo está refutado.


Refutação: Mateus 10:28

 

Mas o autor está convencido de que alma é material, tangível, perecível com o corpo, e nunca, jamais, uma parte imaterial, espiritual, destacável do corpo que possa ser separada e ainda sobreviver. Porém, várias provas da imortalidade da alma já foram dadas no decorrer do estudo.

Chegou a hora de enfrentar mais uma vez argumentos mortalistas baseadoa em Mateus 10, 28. O imortalista lê que a alma não pode ser morta materialmente. Isso é claro. No entanto, o mortalista frisa a segunda parte do texto, a qual diz que a alma pode ser destruída. Então conclui que ela é mortal. Porém, pode-se afirmar, se ela é mortal, o texto afirma que só Deus pode matá-la. Se isso acontecerá no juízo, ela não pode ser morta antes. Isso já refuta o mortalismo. Mas continuemos.

Esse é um dois textos mais ricos para o debate. É impressionante. Os dois lados podem ver muitas e muitas implicações nele. E o que resulta disso tudo é um grande avanço no conhecimento bíblico.

Contudo, o mortalismo exige que a interpretação correta seja que no final há destruição ou aniquilamento da alma: “...do contrário o que o texto estaria dizendo é para não temer os que matam o corpo e não a alma, mas sim aquele que também só mata o corpo e não a alma (o que seria uma interpretação ridícula, para dizer o mínimo).” Como responder a isso? A morte infligida por Deus seria igual àquela que os homens poderiam realizar? A força desse argumento depende dessa ideia.

 

É simples, porém não é fácil. Vejamos a simplicidade: a alma que não é atingida materialmente, e não pode ser atingida assim diretamente, só podendo ser atingida por Deus, é separada do corpo. Segue-se que ela deve permanecer após Deus matar o corpo. Por isso, Deus pode lançar ou destruir corpo e alma no inferno.

Agora, vejamos o motivo de não ser fácil essa interpretação. Mesmo com a explicação acima, o leitor mortalista não compreende que a morte física, que pode ser causada pelo homem, já inclui a morte da alma, o fim da vida física, a destruição do princípio vital na pessoa morta. Dessa forma, na doutrina mortalista, se Deus ferir mortalmente o corpo, a alma já desaparece também.

No entanto, eis que o texto afirma que matando o corpo, ainda sobra a alma que só Deus pode alcançar juntamente com o corpo. Eis a dificuldade para o mortalista. O que é a alma nessa afirmação de Jesus, já que ela é imortal, e caso haja condenação ela será lança com o corpo no inferno?

Não se segue que o homem pode matar o corpo e não pode atingir um elemento que temos dentro de nós, que permanece vivo, enquanto Deus também poderia apenas matar o corpo, deixando vivo o elemento alma que sobrou. Essa foi a tentativa do autor para refutar a interpretação do texto, mas não logrou êxito.

De fato, o homem pode matar e a alma permanece mesmo assim. Pelo contrário, Deus pode destruir corpo e alma juntos no inferno. Assim, é o lançamento do pecador vivo no inferno. Dessa forma, destruir no inferno, ou lançar no inferno, não pode significar levar à inexistência, mas expressa o tormento infernal. Afinal, o que significa “destruir” nessa passagem?

 

Mas o autor continua: “O simples fato da primeira parte do verso falar de morte literal e da segunda parte ser uma antítese da primeira já atesta que Jesus estava falando realmente de aniquilação.”. Então há antítese de morte x aniquilação? Mas para o mortalismo, como já visto muitas vezes, a morte é aniquilação. A explicação não serve.

Desse modo, o problema é que é a morte literal para o mortalismo é a inexistência do ser. É uma aniquilação. Não há antítese. E se existe antítese aqui, é somente no fato de que os homens não podem condenar. O homem que mata outro homem, aniquilou-o no sentido mortalista, ainda que temporariamente, antes da ressurreição, mas já está aniquilado. Então, Deus deverá “recriá-lo” na ressurreição, que seria verdadeiramente uma recriação, para novo aniquilamento, no caso dos ímpios. Refutado argumento, pelo que parece.

Segue a objeção: “O sentido claro e manifesto é que Deus mata mais do que os homens são capazes de matar – porque, enquanto estes matam só o corpo, Deus destrói corpo e alma.

Contudo, na doutrina mortalista Deus não pode matar mais, pois se a morte é aniquilamento, a segunda morte também o é, apenas não tendo mais chance de voltar à existência, pois Deus não teria prometido outra ressurreição. O fato é que somente Deus pode condenar, é isso. Assim, o fato da morte em si não é o que está em questão.

Do contrário, a morte é o sofrimento que o homem pode fazer ao outro. Assim, o homem pode atingir o seu próximo causando-lhe sofrimento físico, mas não espiritual. Deus o pode.

Dessa forma, é a morte no sentido de sofrimento, talvez, o que explica que o sofrimento causado na morte física termina aí, pois o cadáver não sofre mais. No inferno, porém, o sofrimento corpo e alma não tem fim. De fato, essa morte é bastante pior. Parece mais uma vez refutada a doutrina mortalista.

Imagine que Deus pudesse destruir o corpo primeiro, depois a alma. Conclui-se que a alma é separada do corpo e estava viva. De fato, isso é apenas uma imaginação, que não se encaixa no mortalismo. Deve-se entender o que é a alma aí. Vemos que o mortalismo precisa de um sentido único para “destruir” e para “alma”, pois do contrário sua doutrina não permanece.

Agora, imagine que o inferno é o local de destruir o homem, no seu corpo, vivo, é claro, pois no mortalismo não há duas partes separáveis, mas dois aspectos inseparáveis. A expressão matar corpo e alma é apenas afirmar que o inferno mata o homem inteiro. E o que seria essa “morte”? Igual à morte física? O mortalismo também exige que a morte seja aniquilamento.

O grande problema é que o homem pode causar sofrimento ao homem por certo período de tempo em indescritíveis torturas e depois destruí-lo, ferindo-o de morte.

Nesse sentido, para o mortalista, a morte do corpo extingue a alma, e cessa de existir o ser humano totalmente. Que diferença isso fez? Obviamente, em se tratando de um mártir, Deus garante sua vitória, sua salvação, sua ressurreição para o Reino dos Céus. No entanto, a alma é expressa no texto como parte da natureza humana, que está com o corpo, com a diferença de que ela não pode morrer. Isso deve ser levado em conta.

Certamente o que fica claro, no caso da tortura aludida, é que o inferno tem sofrimento maior, mas não diferença de morte. No mortalismo, o ser humano foi completamente extinto, ou seja, nos dois casos, usando a perspectiva mortalista, corpo e alma foram destruídos. As duas mortes foram idênticas. E o texto ficou sem explicação ainda: Jesus afirma que a alma não pode ser atingida pelo homem, mas, de acordo com o sentido da doutrina mortalista, afirma que pode. Portanto, o mortalismo está mais uma vez refutado.

A respeito do verbo appolumi, então, é verdadeiro que significa uma ruína no ser, uma destruição, não aniquilação do mesmo, mas um sofrimento terrível que o ser padece, não uma completa inexistência. E como a afirmação mortalista de que Deus só mataria o corpo, na comparação acima, que foi devidamente refutada, resta agora o mortalista aceitar a refutação com base nos verbos apokteino e apollumi.

A leitura feita no texto com o verbo “perder”, que sugeriria que Deus perderia Sua própria alma, não é razoável, visto que basta traduzir como “destruir” e concluir que Deus destruiria Sua alma também, não fazendo nenhum sentido. Abmos são absurdos. É fato que o texto é bem claro e não sofre dessas ambiguidades. É simples que tal tentativa não foi um bom argumento.

A questão sobre “matar de verdade”, ou seja, levar à inexistência, e “matar de mentirinha” no inferno, ou seja, deixando o ser vivo, que é a visão criticada no mortalismo, é uma noção que o mesmo não percebe que está voltando contra si mesmo. Ela depende do conceito de morte.

Se a morte física é matar de verdade causando inexistência do ser, como sugere a interpretação acima, enquanto que a morte no inferno seria “de mentirinha”, por não levar ao aniquilamento da pessoa, mais uma vez o mortalismo está afirmando que as duas mortes são iguais, como cessação da existência, e não explicou ainda o termo alma que é citado separadamente por Jesus. Por que essa alma, que é parte da natureza humana, não pode morrer?

 

A essa altura, o autor afirma: “Neste caso, o conceito é que Deus dá fim ao corpo e à alma, enquanto os homens dão fim somente ao corpo.” Com essa afirmação, parece que o autor já crê na doutrina da imortalidade da alma. Agora, prestemos atenção como explica que os homens podem dar fim somente ao corpo, se no mortalimo a alma é aspecto do ser que chega ao fim junto com o corpo. Não há como escapar. Na morte física, como vista no mortalismo, os homens dão fim ao corpo e à alma natural do ser humano. Se o termo alma é parte da natureza, e o mortalismo deve concluir que sim, diante do fato, então sua explicação cai por terra.

A noção mortalista não permite esses arrazoados feitos. Vejamos ainda o que o autor escreveu em seguida: (e o contexto exige que o tipo de morte aqui seja a mesma que o corpo padece).”. Se a alma não tem existência à parte fora do corpo, matar o corpo seria o mesmo que matar a alma na mesma ocasião, e não teria razão em citar ambos sem separado. O mortalismo está usando um arrazoado imortalista insconscientemente.

O autor sugere que o sentido de alma no texto de Mateus 10, 28 não é o habitual. O termo teria sido empregado com outro significado, como ensinou o Dr. Samuele Bacchiocchi, que é refutado em outro lugar neste estudo.

O problema é que a passagem não dá lugar para pensar em nenhum outro sentido para o termo, usado em ambas as partes do versículo, como sendo parte do ser humano. Se a alma tivesse aqui outro sentido, o texto seria confuso.

O que muda nos dois paralelos são os agentes, pois no primeiro os agentes são os homens, e no segundo é Deus. O corpo e a alma são o mesmo nos dois momentos e diz respeito à constituição da natureza humana. Mais uma vez o mortalismo fica refutado aqui.

De fato, seria estranho afirmar que os homens não podem atingir a alma que é um atributo dos homens, se o termo “alma” trouxesse outro sentido aqui.

A alma estaria sendo usada nesse verso em sentido figurado, explica o mortalismo, e não no habitual, como aparece em outras tantas centenas de vezes na Bíblia, onde a alma está atrelada ao sentido da natureza do ser humuno.

Mas o problema é que isso não invalida a imortalidade da alma, bastando mostrar que nessa passagem o sentido de alma é outro, e não o de pessoa, de vida, de mente, de eu. Não contradizendo nenhum desses sentidos, a alma em Mateus 10, 28 é espírito imortal e parte da natureza humana.

Os homens não poderiam matar a pessoa? Ou matar a vida? Ou matar a mente? Ou matar o eu consciente da pessoa? Claro que sim. Dessa forma, deve-se procurar de fato outro sentido, ainda que seja o único verso em que o mesmo apareça. Nesse sentido, a alma tem de ser imortal.

Nisso o mortalismo acertou, nisso ele tem razão. Se o termo tem outros sentidos em outras partes, sendo lógico afirmar que nesses sentidos a alma morre, mas aqui a alma não morre, então é de se fazer uma boa exegese para averiguar o significado dessa passagem específica.

Mas, Jesus teria uado o termo em outra acepção? Então esse não seria o único caso, mas em muitas outras passagens a alma teria o significado de algo imortal, não acessível aos homens.

O verso com o ‘novo’ sentido seria Mateus 10, 39. Contudo, nesse versículo a psique tem o sentido de vida, como em outras tantas passagens: “Quem acha a sua vida (psiquê) a perderá, e quem perde a sua vida (psiquê) por minha causa a encontrará””. Por exemplo, santo Estêvão, o primeiro mártir, perdeu sua alma, perdeu sua vida, foi morto. Dessa forma, foi salvo, e terá a vida de volta na ressurreição.

Assim, quando ele foi apedrejado sua vida foi atingida, e até o dia da ressurreição ele não a encontra novamente ainda. Essa alma foi destruída pelos homens. Portanto, não é o mesmo sentido de Mateus 10, 28, pois ali os homens não podem matar a alma.

Então, no v. 39 a psiquê pode ser perdida na morte e encontrada na ressurreição, enquanto que no v. 28 a psiquê não pode perecer na morte e pode acompanhar o corpo no inferno após a ressureição, por ser imortal.

O próprio texto citado de João 12, 25 mostra que a vida eterna é “zoen aionion” e não psique, que é nessa passagem a vida física do homem. Essa vida pode ser perdida e pode ser preservada para a vida eterna. Isso acontecerá com os que estiverem vivos na Parusia, que já passam direto para a vida eterna sem morrer, ou que, como explica a doutrina tradicional, morrer e ressuscitam na transformação do corpo, instantaneamente.

Os que morrem conservam o direito de viver novamente para sempre, na vida eterna. Assim, não há quem receberá “psique” eterna, mas viverá a psique, que é a vida, na zoen (vida) aionios (eterna).

A linguagem empregada na Bíblia, de “conservar” a psique, não é problemática aqui, já que nem assim a passagem indica a alma imortal, mas a vida física, pelo contexto.

Em Mateus 16, 25-26, alguém pode perder a vida e achá-la. Perder a psique e encontra-la na ressurreição. Trata-se da vida. Em Mateus 10, 28 os que matam o corpo não matam a alma. Eles podem fazer morrer o corpo e a vida física, logicamente, mas não atingem a alma. Deus pode atingi-la. Essa alma não pode ser vida eterna, pois o texto diz que Deus pode jogar essa alma no inferno com o corpo.

Vejamos: quem é lançado na Geena é condenado. Esse é o que preferiu viver seus próprios prazeres. Ele perdeu a vida por amar sua vida. Perdeu a vida eterna. Nessa cena, ele não pode entrar no inferno com essa vida eterna, já que não a possui, mas a perdeu. Prova-se assim que psique não é vida eterna.

 

Comentando Mateus 6, 25 há um erro sério de interpretação:

 

Na primeira parte, a psiquê se refere à vida presente (que Jesus diz para não se preocupar), definida em coisas como comer, beber e se vestir; e, na segunda, à vida futura (que Jesus diz que é mais importante que essas coisas da vida presente). Mais uma vez, somos instados a priorizar a vida futura em detrimento da vida presente, sendo ambas designadas pelo mesmo termo para alma (psiquê).

 

De fato, quando Jesus fala da psique nessa passagem é apenas à vida física que está tratando, e Ele não diz que isso está ligado ao comer, beber e se vestir. Pelo contrário, a vida está ligada ao “comer e beber”, e o corpo ao “vestir”. Assim, ele diz que a vida é mais importante que a comida, ou seja, que o comer e beber, que sustenta a vida, e o corpo é mais importante que a roupa, ou seja, que o vestir. Assim, nenhum sentido de alma como “vida futura” foi introduzido aqui. A perícope ensina a procurar o reino e Deus e a justiça, então tudo o mais (comida, bebida e vestimentas, etc.) será dado em acréscimo. É como dizer, não se preocupem com vossas vidas, mas com o reino e a justiça de Deus. Em nenhum lugar psique tem sentido de vida eterna.

Em Lucas 9, 55 a psique não é vida eterna, mas a vida dos homens que será salva para a vida eterna, com ficou explicado acima, por meio do texto original da Bíblia. De fato, Jesus não veio destruir a vida física, mas salvar essa mesma vida física, diz o texto: não veio para destruir a vida (psique) dos homens, mas para salvá-las.

A tradução da Ave Maria usa o verbo “perder”: Jesus não veio para perder a vida dos homens, o que explica esse verbo, e seu uso gramatical, que não causa problema de interpretação voltando a ação para a Pessoa de Deus, como sugeriu o argumento mortalista. Isso para melhor entender a objeção feita antes sobre o sentido de apollumi e sua devida refutação.

Mas a explicação causa um problema: “Jesus não veio ao mundo para privar as pessoas da eternidade, mas justamente ao contrário: para salvá-las e dar a elas uma oportunidade de viver para sempre.” Pareceria que todas as pessoas tem a eternidade! Não tenham medo que Jesus não veio vos tirar a eternidade que tendes! Não é isso que o texto diz, mas apenas que Jesus não veio tirar a vida que todos possuem, mas vai salvar essa vida. Não é a vida eterna que Jesus vai salvar, mas a vida que todos possuem para a entrada na eternidade.

O mesmo no texto citado de Lucas 21, 19 que diz literalmente: vós ganhareis as vossas almas. O texto grego é claro ao afirmar que se trata das “vossas” almas, ou das almas “de vocês”, ou seja, que eles possuem, que pode ser perdida e que ganharão novamente. Ninguém poderá objetar que todos já possuem vida eterna que será apenas devolvida. Um exemplo é Lázaro, que ganhou a vida mas voltou a morrer. Sua alma foi-lhe entregue de volta, mas depois ele a perdeu novamente, pois ele não entrou na vida eterna. Na ressurreição os salvos ganharão suas almas (terão vida de volta) para viver eternamente.

A tradução que o autor usou para argumentar traz “obterão a vida”, mas o original grego diz que “ganhareis as vossas almas”, ou seja, não perdereis as vossas almas, as vossas vidas, a vida que eles já tinham. Basta relembrar do perder e achar a vida, perder a vida e reencontrá-la. Trata-se da vida (psiquê) que será dada de volta pela graça de Deus na ressurreição para entrar na vida eterna (zoe aionios).

O contexto afirma, no v. 16, que muitos serão mortos, mas que não se perderá um só cabelo de vossa cabeça, v. 18. Isso mostra que Jesus está garantindo a vida de volta com tudo o que é parte do ser, como até um fio de cabelo. Dessa forma, sendo perseverantes, os salvos ganharão de volta a vida (psiquê), que possuíam, para viver a vida eterna. Não há nada que indique que o termo adquiriu o sentido de vida eterna.

De fato, basta pensar que se muitos foram mortos, perderam a vida, e devem ganhá-la de volta, isso prova que o termo se refere à vida física que foi perdida. Essa é a vida que pode ser morta com o corpo, e não é a de Mateus 10, 28, pois essa não pode ser morta pelos homens. Mais uma tentativa mortalista que não resiste à refutação.

Assim, nenhum exemplo de alma no sentido de vida eterna foi apresentado. Então, a explicação “Não poder matar a psiquê significa não ter a capacidade de acabar com a vida futura”, não cabe, já que estaria colocando Deus como acabando com a vida futura, quando na verdade ele não dará a vida a quem for condenado, e não que acabará com a vida futura de alguém, como se ele já a tivesse. Isso fazia Deus colocar corpo e vida futura no inferno o que não faz sentido.

Esse sentido, como visto antes, é apenas a implicação de toda a cena, mas os termos corpo e alma deve ser lidos como parte do ser humano, e não com outro signficado.

E quando diz: “...já que os homens só podem nos matar nesta vida”, sugere que Deus poderia matar na outra, como se o morto na presente vida permanecesse vivo na outra, e Deus pudesse por fim ao corpo e à alma, e não só ao corpo. Nada disso responde suficientemente ao sentido claro do texto. Cada falha de argumento está sendo mostrada.

Então o argumento continua concluindo que: “Deus, no entanto, pode nos destruir tanto nesta vida, quanto na próxima – o que explica por que devemos temê-lo mais do que tememos aos homens.” Porém, Jesus não disse isso no evangelho, mas afirmou que Deus pode destruir corpo e alma no inferno, futuramente, e não que “pode nos destruir nesta vida”. Isso foi dito dos homens.

A tentativa de Richard Whately também foi frustrada. Vejamos: Ele afirma que os inimigos podem infligir morte temporária, enquanto Deus tem poder sobre “toda a nossa existência”. O problema é que no mortalismo a morte é o fim da existência. Uma vez que Deus não ressuscite alguém, criando-o novamente, esse já não existe. Dessa forma, é gratuito dizer que nesse caso “que o poder de Deus se estende a toda a nossa existência”, sugerindo, pela linguagem, que temos existência eterna (o que é verdade somente pela imortalidade da alma), e que os homens não podem atingir a alma, somente Deus.

Isso volta o argumento mortalista contra o próprio mortalismo, inconscientemente, pela noção indesejada que deixou transmitir pela linguagem empregada.

De outro modo, o argumento deixa transparecer que o tal fim temporário significa que o homem, uma vez morto, tem o poder de retornar, e que Deus teria o poder de infligir depois uma morte eterna. Isso soaria ridículo.

Então, o autor explica: “Em síntese, tudo o que os homens podem fazer é nos privar desta vida, mas não podem fazer nada para nos excluir da próxima, que recebemos pela graça mediante a fé.” Está correta a explicação, em seu sentido último, como já aludido.

No entanto, o mortalismo deve compreender que a vida eterna é contraposta ao opróbrio eterno, que é a morte eterna em tormentos, em destruição, em condenação, mas não em aniquilamento. É o que ensina Daniel 12, 2 e Mateus 25, 46.

Partindo do texto sagrado, se o mortalismo ensina que o mesmo significa que não se deve temer os que matam o corpo, tirando a vida temporária, mas Deus que pode matar corpo e alma, que é a vida eterna, isso sugere que a morte física não pôde desfazer a alma, que seria a vida futura, mas Deus atiraria o corpo e a vida futura no inferno. Se o homem integral é o corpo, ao matar o corpo o ser inexiste. A vida eterna só existe no ser vivo usufruindo dela. Ao morrer, não há uma “vida” à parte existindo fora do morto.

Se o corpo é o ser inteiro, os que matam o corpo matam tudo. Se a alma não é parte do ser, mas vida futura, e essa não existe sozinha, fica impossível que o texto tenha esse sentido.

Também, se o corpo é o ser inteiro, e Deus pode mandar corpo e alma para a Geena, então o ser inteiro e a vida futura irá para o inferno. Mas bastaria lançar o corpo no inferno, e não a vida futura (que seria o conceito de alma), como já explicado. Por tudo isso, o conceito de “vida eterna” ou “vida futura” para a alma em Mt 10, 28 é totalmente descabido.

De fato, Lucas 12, 4-5 supõe a ressurreição quando fala de lançar no inferno, e o motivo de não mencionar o estado intermediário é que a comparação é feita com aqueles que matam o corpo, onde Deus é mencionado tendo poder sobre o corpo e ainda mais, para lançar no inferno.

Em Mateus isso é dito de outra forma, destruir o corpo e a alma no inferno. Ambos possuem o mesmo sentido que está em conformidade com a imortalidade da alma como ficou claro acima ao analisar cada argumento.

Em Mateus a frase “mas não podem matar a alma” é escrita por Lucas como “e depois nada mais podem fazer”. E depois, “pode destruir tanto a alma como o corpo no inferno” equivale a “depois de matar o corpo, tem poder para lançar no inferno”.

Então, mesmo sabendo que tudo já supõe a ressurreição para destruir alma e corpo e lançar no inferno, usando ambas as afirmações, é preciso admitir que a alma que não pode ser tocada com o corpo na linguagem de Mateus está subentendida no lançamento corpo no inferno que, logicamente, está vivo, ou seja, que possui alma.

Agora, vejamos: se os homens podem matar o corpo, que significa também a alma, no ser integral, mas não a alma que Jesus Se referiu, e Deus pode lançar no inferno esse corpo com a alma, que não é a vida física, mas aquela mesma parte que o homem não pode matar, conclui-se que a alma é a parte espiritual do ser humano. Chega-se à mesma conclusão de antes por ser irrefutável.

Dessa forma, o sentido é uma admoestação ao indivíduo, que pode sofrer no corpo pela ação humana, mas, o que é pior, pode sofrer no corpo e na alma pela condenação divina. Não uma inexistência temporária e outra eterna, mas um sofrimento temporário e outro eterno.

O humano não pode fazer sofrer a alma, então não é apenas um sofrimento psíquico, mental, emocional, mas espiritual. Deus pode fazer sofrer na condenação o corpo com todas essas propriedades que estão na alma, ou seja, fazer sofrer ininterruptamente, já que o corpo com a alma não pode morrer.

Depois de matar, que é o que diz o texto grego de Lucas, que não traz também a palavra corpo, mas afirma: “depois de matar, tem poder para lançar no inferno”. Logicamente não é o lançamento de um cadáver, mas o lançamento da pessoa que foi morta por Deus, que foi condenada, o que em Mateus é a ação de “destruir” o corpo, ou seja, condenar, e que foi lançada no inferno, que em Mateus equivale a “destruir” também a alma junto com o corpo. Então, essa alma só pode ser imortal.

Ainda há outra argumentação igualmente válida. Se o inferno é o tormento seguido de morte, o homem poderia fazer o mesmo. Mas Jesus diz que isso não pode ser feito pelo homem: não pode matar a alma, e após matar não pode nada mais.

Se a alma é a vida, então na tortura e na morte o homem pode atingir corpo e alma. Mas Jesus afirma que não pode. Então, a alma aqui não é a vida.

No entanto, se a alma é imortal, e Deus pode destruir corpo e alma no inferno, segue-se que esse tormento não tem fim. Portanto, prova-se a alma imortal, e o tormento que não cessa no condenado ressuscitado. Assim, esse argumento do mortalismo está refutado.

Gledson Meireles.

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