segunda-feira, 12 de agosto de 2024

Livro: Teologia e Prática da Igreja Católica Romana

Refutação a respeito do cânon bíblico e da interpretação bíblica oficial

O cânon da Escritura

 

Não é possível afirmar que os livros da tradução dos LXX, a Septuaginta, não estavam contidos na Bíblia hebraica, e que nunca fizeram parte dela, simplesmente porque o cânon não estava fechado no tempo de Cristo, no primeiro século.

Essa afirmação de Gregg Allison é gratuita. Se não havia cânon, não se pode afirmar que tal livro nunca fez parte de uma lista. É o primeiro ponto refutado.

Ainda, se a Igreja usou a Septuaginta e não fez qualquer crítica a seus livros no primeiro século, é outra evidência de que o cânon estava em aberto.

Existem evidências a favor de ambas as posições? Vejamos. A lista de Melito em 170 d. C. não contém Ester. E Ester é um livro inspirado. Ele não era reconhecido em toda a Igreja da época. Então, o cânon estava em aberto.

Orígenes, no século III, inclui a cara de Jeremias, o que prova que o cânon estava em aberto.

Santo Atanásio, no ano 367 d. C., inclui a Carta de Jeremias e Baruque. Também, Santo Atanásio não inclui Sabedoria, Eclesiástico, Ester, Judite e Tobias. Então o próprio livro de Ester estava sendo rejeitado por muitos, e certamente não poderia ser usados para fundamentar doutrina, o que mostra que o cânon estava em aberto.

São Cirilo optou pelo cânon hebraico. A falta dos Deuterocanônicos na maioria dos escritores dessa época não mostra que eram rejeitados sempre, assim como a rejeição de Ester e a aprovação de Baruque não prova que sempre foi assim. Eram tempos de discernimento.

E mais. A contagem dos livros divergia entre os escritores cristãos.

Gregg fala da intervenção decisiva de Santo Agostinho ao aceitar o cânon com os deuterocanônicos, seguindo os apóstolos.

A lista dos livros inspirados, conforme aceito por Santo Agostinho, foi também definida em Concílios regionais, como o de Hipona em 383, o terceiro de Cartado em 397 e o quarto de Cartago em 419.

Isso evidencia que a questão havia sido fechada, pois em todos esses concílios o cânon era idêntico, com os 46 livros par ao Antigo Testamento e 27 para o Novo Testamento.

Santo Agostinho não poderia ser o influenciador de todo esse consenso, mas a decisão dos concílios é testemunho histórico da unidade da Igreja da época sobre o cânon, e que Santo Agostinho refletia essa unidade.

Assim, o teólogo protestante mostra que essa decisão foi adotada sem contestação significativa até o século 16. Essa constatação comprova a verdade do cânon católico.

É evidente que o cânon cristão estava fechado, pelo que se pode notar nas decisões anteriores, mas que ainda surgiam algumas dúvidas, talvez pela falta de comunicação e pelas dificuldades existentes na época, e porque a Igreja não havia sido plenamente clara nesse ponto ainda.

Fica claro também que o Protestantismo rejeitou os deuterocanônicos por motivos doutrinais, e pelo equívoco de que o cânon de 22 livros hebraicos estava fechado no primeiro século. Essa decisão dos judeus foi feita mais tarde. E quando o Protestantismo adere a essa decisão e não a da Igreja, está agindo equivocadamente, mostrando sua cisão com a tradição bem desenvolvida.

Gregg Allison cita um argumento de Peter Kreeft. Esse afirma que a Bíblia foi escrita pelos apóstolos e santos e definidas pelos bispos que os sucederam, ou seja, a Igreja escreveu a Bíblia e a Igreja definiu a Bíblia.

Mas Gregg afirma que isso é uma perspectiva equivocada. E para provar sua asserção, afirma que essa visão de Kreeft não considera o real desenvolvimento do cânon.

Seria uma negligência não reconhecer que Santo Agostinho “rompeu com uma tradição bem desenvolvida”, que era adotada por São Jerônimo. E qual seria essa tradição? A tradição de não incluir os escritos deuterocanônicos, que são chamados pelos protestantes de apócrifos. No entanto, como citado acima, em pleno século IV Santo Atanásio reconhecia a inspiração de Baruque. Então, não existe tal tradição aludida por Gregg.

Entretanto, conforme mostrado pelo próprio Gregg, havia divergência desde o início, e a Carta de Jeremias e Baruque foram reconhecidos por alguns escritores cristãos, assim como o livro de Ester foi rejeitado por muitos. Isso mostra ignorância, pois tanto uma posição como a outra não é encontrada no cânon protestante. Assim, não há uma tradição bem desenvolvida.

De fato, Santo Atanásio fala de 22 livros da Bíblia, o que sugere o cânon idêntico ao protestante, mas a contagem que faz desses livros inclui Jeremias, Baruque, Lamentações e a Carta de Jeremias em um só livro. Essa tradição à qual alude Gregg não existe.

Também, ao afirmar que os concílios que definiram o cânon, como citado acima, eram concílios regionais que refletiam a influência de Santo Agostinho, não ajuda o argumento. Pense bem. O Protestantismo nega a unanimidade da Igreja antiga sobre o cânon bíblico. De fato, é inegável que a prova está do lado do cânon católico.

Primeiro, não há unanimidade na rejeição dos deuterocanônicos, como provado acima.

Segundo, a posição de Santo Agostinho menciona a posição dos apóstolos, o que é digno de nota.

Terceiro, os concílios da antiguidade foram unânimes na definição dos livros do cânon católico, o que mostra que o consenso da Igreja na época.

Quarto, deve-se lembrar que o próprio São Jerônimo concede traduzir os livros que Santo Agostinho propôs, o que mostra que sua posição não era ratificada pela Igreja da época.

Tudo na direção que evidencia a autenticidade do cânon católico. Se o protestante não puder refutar cada argumento acima, que aceite a verdade do cânon católico.

Ainda, refutando a segunda objeção de Gregg, a autoridade da Igreja leva em conta a Escritura redigida anteriormente, de modo que essa foi reconhecida pela Igreja. Essa Escritura contem 73 livros.

O fato é que não havia cânon judaico no tempo dos apóstolos, e quando a Igreja definiu os livros inspirados ela o fez sem a participação dos judeus, pois esses não seguiram Jesus e não aceitavam o evangelho.

É claro que a Palavra de Deus precede a Igreja. A Igreja reconheceu o cânon.

O que está sendo discutido é a definição dos livros para os fieis, que foi produto da Igreja, o que não torna a Igreja acima da Bíblia, mas continua mostrando que a Igreja é serva da Palavra. A Bíblia está acima da Igreja, ela é seu alimento e força.

Portanto, a perspectiva protestante para o cânon que rejeita os deuterocanônicos possui essas dificuldades insolúveis. Deve-se, portanto, reconhecer que o cânon foi fechado após o século primeiro.

Na Igreja não havia unanimidade para rejeitar ou adotar os deuterocanônicos em geral.

Não há tradição que sugira que os sete livros deuterocanônicos devessem ser rejeitados como inspirados.

Os concílios da Igreja definiram o cânon que continua até hoje na Igreja Catolica.

São Jerônimo cedeu ao pedido de Santo Agostinho para traduzir os outros livros, e não o faria se tivesse certeza que a posição oficial os rejeitava. Portanto, a opinião anterior de São Jerônimo era particular.

E, como Gregg não mencionou, concílios ecumênicos posteriores confirmaram o mesmo cânon daqueles antigos concílios regionais, inclusive o Concílio de Trento, que usou da máxima clareza ao definir novamente os mesmo livros.

Esse dado histórico inegável e irrefutável, refuta o que Gregg tentou provar, ou seja, que o cânon curto já existia no primeiro século. Ele partiu dessa suposição para apresentar toda a questão, que fez de modo interessante, e que contraria a suposição do autor.

Foi a única prova que o mesmo sugeriu em sua apresentação. As demais objeções fluem dela. Sendo essa prova refutada, e cada objeção também, não fica de pé a posição de Gregg Allison.

As objeções que apresentou foram todas refutadas. Desse modo, basta que, uma vez provado historicamente, e racionalmente, que o protestante aceite o cânon com todos os 73 livros inspirados.


A interpretação oficial da Escritura

 

Quando a Igreja afirma que tem o direito exclusivo de interpretar a Bíblia, está agindo razoavelmente. De fato, o protestante também não pode interpretar a Bíblia contra a interpretação oficial do Protestantismo.

Gregg afirma que os protestantes não possuem um magistério para julgar se a intepretação da Escritura é autêntica e autorizada. As igrejas protestantes insistem que cada crente utilize princípios sólidos de interpretação, sob a orientação do Espírito Santo e com ajuda dos líderes divinamente ordenados e capacitados. Ou seja, os protestantes possuem o mesmo que os católicos nesse quesito. O que resta saber é se os lideres protestantes são ordenados por Deus como os líderes católicos. Ainda, Gregg não afirmou, mas é preciso lembrar, que a interpretação dos crentes protestantes só será autêntica e autorizada se estiverem conforme as doutrinas aceitas pelo Protestatnismo geral. Caso não, serão desconsideradas. Nesse ponto, agem como a Igreja Católica.

Os protestantes afirmam a clareza da Escritura. Gregg também afirma que o quádruplo sentido da Escritura gera desconfiança entre os protestantes por causa da clareza bíblica mencionada.

Ao dizer que as palavras da Escritura apresentam sentidos ocultos que podem comunicar graça, é algo desconhecido na teologia católica. Falando a protestantes, Gregg ensina algo que não se encontra na doutrina católica.

Conforme a doutrina católica, expressa no Catecismo, todo sentido da Escritura é fundamentado no literal. Então, quando os protestantes propõem uma interpretação para chegar a um sentido simples, verdadeiro e gramatical do texto, está agindo como católico.

Em resumo, os princípios de interpretação bíblica de Lutero e Calvino, elencados por Gregg Allison, são: 1.falimiaridade com a carta aos Romanos. Os cristãos católicos estudiosos da Bíblia têm essa familiaridade. Todos os católicos podem e deveriam estudar a Bíblia, segundo suas possibilidades.  2. Sólida estrutura teológica. Todos os católicos são aconselhados a isso. 3. Visão Cristocêntrica. Essa visão é essencialmente católica. O catecismo ensina que toda a Escritura fala de Cristo. 4. Contexto. É tipicamente católica a interpretação que tem apreço primordial pelo contexto. 5. Analogia da fé. Essa analogia do ensino de toda a Escritura. 6. Humildade, etc. Isso é parte da prática católica. Assim, todos esses conselhos são compartilhados por católicos e protestantes.

Foi refutado o sola scriptura e mostra a importância da tradição. A interpretação literal é preeminente, e a espiritual é fundada no literal. Os quatro sentidos mostram a riqueza da interpretação católica. Basta notar o quanto é superior quando se compara a interpretação católica e a protestante. Para uma constatação dessa realidade, que o leitor leia o livro sobre a imortalidade da alma.

Quanto ao cânon, a Igreja Católica recebeu de Cristo e dos apóstolos os livros inspirados e os definiu nos concílios regionais e ecumênicos.


Gledson Meireles.


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