domingo, 16 de novembro de 2025

Mater populi fidelis: o título mariano de Corredentora

O sentido do título Corredentora dado à virgem Maria

A nota Mater Populi fidelis, do Dicastério para a Doutrina da Fé, trata sobre alguns títulos marianos, e tem causado debates entre os católicos e recebido enorme atenção dos protestantes.

Na internet há inúmeros vídeos e comentários sobre o tema. Há os que dizem que a Igreja mudou a interpretação, e que Maria não é mais corredentora. Outros sugerem que a interpretação não foi radical, mas que a Igreja Católica deu passos em direção à Reforma Protestante. Ou seja, essas duas opiniões afirmam que houve mudança essencial na doutrina.

O que diz a doutrina de que Maria é corredentora? Embora não seja um dogma, muito foi escrito a respeito do tema. É fé da Igreja a corredenção de Maria. E o documento do Dicastério o afirma no parágrafo 5: “A participação de Maria na obra salvadora de Cristo está atestada nas Escrituras...”.

Parece que poucos leram essa parte que tem o subtítulo de “A cooperação de Maria na obra da Salvação”.

Aos que dizem que a doutrina mudou, está aí a própria documento afirmando que não. Maria possui um papel na redenção, ela participa, como sempre ensinou a doutrina católica, como está nas Escrituras Sagradas.

No entanto, a Igreja está tratando do “título” de Corredentora e seu significado. Como se dá essa participação. É um título que tenta expressar a doutrina de sempre, mas que foi usado no século XV até o século XVIII, conforme o documento. Por isso, não é o título a própria doutrina, mas uma forma de expressá-la. E, pelo que se diz, o título não foi usado desde o início, mas foi uma expressão utilizada no século XVI para tratar do assunto que já existe.

É justa a preocupação da Igreja a respeito dos mal-entendidos que o título pode causar? A resposta é sim. Basta ver os vídeos que o tema inspira e notar que muitos não entendem a doutrina. Muitos católicos e, obviamente, os protestantes, estão entendendo a questão.

É óbvio que para o protestante Maria “não” tem cooperação nenhuma na obra da redenção. Mas a questão é debatida no orbe católico.

Claro também que Maria não é salvadora, não é redentora, não é corredentora, portanto, ela não pode salvar a ninguém, nem a si própria, pois o único meio capaz de salvar é Jesus Cristo por seu sangue derramado na cruz. Essa é doutrina católica.

E agora, qual é então essa participação de Maria na redenção? Por que os títulos de redentora e corredentora foram usados? Que papel teve Maria na redenção, que fez muitos darem o título a ela de redentora ou de corredentora? Esse é o ponto básico.

Assim, é de se esperar que as explicações não ultrapassem o dogma de que Cristo é o único Salvador. Tudo mais deve ser exposto por uma linguagem que não cause problemas o máximo possível.

Todos temos união com Deus, Pai, Filho e Espírito Santo. Mas a doutrina católica mostra a união de Maria com Deus de forma especial, pois ela foi criada para ser o meio do Filho de Deus tornar-Se Homem. Esse é ponto básico.

A relação de Maria com Seu Filho Jesus é espiritualmente usada por Deus no mistério da salvação da humanidade. Após ser salva, Maria entra no plano da salvação associada a Jesus. Assim, como ela, e depois dela, todos os salvos.

Toda a função de Maria no mistério de Deus é ser cooperadora de Deus. É o que afirma o padre Júlio Maria, no livro Por que amo Maria?. É uma forma de desenvolver uma secundária na doutrina: “Jesus é Redentor”.

Se Maria coopera em tudo com Ele, ela é corredentora. No entanto, esse título deve ser explicado para não contradizer a verdade de que Jesus é o Único Redentor.

Essa verdade vem por muitas afirmações bíblicas e patrísticas: Santo Agostinho afirma que por Maria veio a salvação. É óbvio que há um sentido para essa afirmação, e não é o de que Maria é a salvadora, mas de que por meio dela nasceu Aquele que é o Salvador. É uma forma de considerar a importância de Maria na salvação.

A doutrina bíblica de que a queda veio por um homem e por uma mulher leva a entender o mesmo da salvação. As devidas proporções devem ser mantidas. Este é o cerne da doutrina, de origem bíblica.

“Só Jesus é nosso Redentor”, afirma o padre. É interessante notar como ficam perplexos os protestantes quando vêem os padres na internet comentando a doutrina mostrando que é fé cristã católica que Jesus é o único Salvador.

Eles não compreendem como pode então haver corredentora. De fato, o nome não expressa exatamente a doutrina. Por isso, o Dicastério acerta em dizer que o título é inoportuno.

Outra explicação do padre Júlio: “As preces e os méritos de Maria Santíssima são de ordem essencialmente inferior às de Jesus”. Portanto, são de outra ordem. Só Jesus possui preces e méritos de Redenção. Os de Maria são de criatura e associados a Cristo por vontade de Deus.

E, por isso, Maria tem preces e méritos essencialmente diferentes dos demais santos, ainda que todos os santos tenham preces e méritos também. É uma forma de mostrar o papel de Maria como mãe de Jesus e associada a todo o mistério da Sua vida. Apenas isso.

Então, o título de corredentora é explicado como de “associada ao Senhor”. Parece bastante claro agora.

Vamos assim tornar tão claro como o sol ao meio dia, no verão e o céu sem nuvens, para não ficar nenhuma dúvida quanto à expressão.

Deus associa criaturas à Sua obra. Deus ilumina o mundo. E como Deus faz isso? Através das estrelas, do sol e de todo foco de luz. Poderíamos afirmar que o sol não ilumina, mas é Deus que ilumina? Seria um contrassenso.  É claro que Deus é a fonte de toda a luz, mas criou um astro para iluminar a terra, e o astro serve o criador para isso.

E Deus usa também os anjos para iluminar os outros. É o ministério angélico. Quem ilumina? Deus. Mas podemos afirmar que os santos e os anjos podem iluminar o mundo. Estão associados a Deus nesse ministério.

Assim, na obra de salvação Deus associou a virgem Maria. Seguindo os exemplos percebemos o alcance da doutrina.

“O mundo inteiro é chamado a cooperar nessa obra”, afirma o padre Júlio. E nesse âmbito fala da cooperação excelente de Maria que foi chamada por isso de “corredentora”.

Assim, se alguém disser que na lógica de Maria ser corredentora nesse sentido todo nós o somos, de certa forma está correto, guardando as devida proporções, pois se fala da pessoa de Maria em união mais próxima de Cristo, pois foi a Sua mãe, ocupando o primeiro lugar entre os santos.

Todos os santos são nesse sentido “corredentores” por seus trabalhos no Reino de Deus, por seus sacrifícios, por suas preces. Maria o é em grau máximo, pois é a primeira crente em Cristo. Esse é o entendimento cristão católico. Ela não foi a causa da sua própria salvação e nem a causa da salvação de ninguém mais. No entanto, após ser salva foi associada no ministério de salvação por Cristo Senhor, onde a Igreja, em conjunto, também exerce esse múnus salvífico. Vê-se assim a que o título se refere.

Em outras palavras, Jesus agora utiliza dos santos remidos para santificar e salvar, para distribuir Sua graça uns aos outros. E Maria, sendo Sua mãe, é unida desde o início na obra da salvação do Senhor Jesus Cristo, é ela á primeira, a mais importante nessa “corredenção”.

Nada pode ser acrescentado ao infinito. A redenção de Cristo tem valor total e infinito. Portanto, a contribuição de Maria é apenas na aplicação dos méritos de Cristo, que em grau maior ou menor participam todos os santos.

A comparação com Eva é também essencial. Eva pecou, mas seu pecado pessoal não teria infectado a humanidade se Adão não pecasse. Assim, efetivamente o pecado de Adão foi o responsável pela queda geral da humanidade. A corredenção de Maria não poderia efetivar nada se não fosse a redenção de Cristo. Maria não poderia ter sofrido por ela e por alguém mais. E ainda assim, a redenção de Cristo, sozinho, salvou a todos, mesmo Maria, e somente a partir daí, já salva e santificada, pode associar-se a Jesus para cooperar na salvação das almas.

Essa é a doutrina católica. O dicastério entende um problema apenas em relação ao título, preservando a doutrina.

A Igreja nunca ensinou que Maria participou da redenção acrescentando algo, pois é impossível, mas ela recebeu na redenção operada por Cristo, a partir da obra da salvação, a capacidade de associar-se a Ele. Assim, com ela toda a Igreja.

Gledson Meireles.

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