É esse ponto da doutrina
protestante, e de forma particular, no ramo reformado, ensina que a totalidade
da salvação é pela graça, entendendo que o homem não tem participação nenhuma
quanto ao mérito, não podendo contribuir com nada, nem mesmo quanto à noção de
cooperação. Ainda que na santificação haja essa sinergia, os reformados não
entendem que isso tem qualquer ligação com a salvação, mas que é apenas fruto
dela.
Esse entendimento leva a
crer que tudo já está disponível, a eleição, a predestinação, a redenção, a
santificação, os dons, apenas devendo ser entregue ao eleito, e só ao eleito,
já que ninguém mais pode participar dessa realidade. Então, toda a vida cristã
é resultado da graça de Deus.
Algo que se deve considerar
aqui é a questão do pecado, já que também o reformado crê que não há liberdade
para viver no pecado. Há, porém, muitos que inebriados com a ideia de que nada
que façam pode afetar a salvação, que com frequência caem em pecados e vão
perdendo a capacidade de arrependimento, já que tudo é pela graça, que não se
merece nada, mas também não pode desfazer a graça de Deus, nem deve viver com a
ideia de punição. Isso pode levar a um grande relaxamento espiritual. Essa
segurança não raramente alimente o orgulho.
Essa é a doutrina e uma
pequena contribuição crítica sobre a mesma, da forma que é ensinada pela
teologia reformada.
No presente estudo, veremos
o que a Igreja Católica ensina sobre a graça, utilizando de fontes protestantes
para aprofundar a reflexão. Essa não é uma parte fácil de ser entendida na
teologia cristã católica, e por isso tantos a entendem mal. É por esse motivo
que apóstolos tiveram que várias vezes exortar os cristãos a não viverem no
pecado, pois a pregação da graça parecia insinuar que a vida de pecado era algo
irrelevante.
A teologia católica ensina
que a graça é o favor ou socorro gratuito que recebemos de Deus. Nós recebemos
a graça para poder responder ao convite de Deus. (Catecismo da Igreja Católica,
número 1996).
Ainda, ensina que a vocação
para a vida eterna é “dependente integralmente da iniciativa de Deus”. Não há
nada em nossa inteligência e nossa vontade que possa alcançar a Deus por si
mesma. (CIC, 1998)
A graça é fonte da nossa
santificação (2 Cor 5,17-18), é o motivo, o fundamento, a fonte para que nós
possamos nos santificar. É correto ter a santificação como resultado da graça e
do uso que dela fazemos. Quando o homem prepara-se para acolher a graça de
Deus, ele já está na graça, pois essa preparação é uma obra da graça.
Então, é que entra uma noção
bastante diferente entre a concepção católica e a reformada. A graça suscita e
mantem nossa colaboração na justificação e na santificação. A justificação pela
fé e a santificação pela caridade.
Diante disso, surge a
questão do mérito. Na doutrina católica há espaço para pensar em mérito,
enquanto na doutrina reformada a palavra mérito surge apenas no contexto de negação.
No entanto, a doutrina católica
exclui qualquer glória humana, qualquer jactância. Basta que creiamos como nos
é ensinado.
Os méritos são dons de Deus.
Isso mesmo, o mérito do homem lhe foi dado pelo Senhor. O parágrafo 2007 do
Catecismo ensina que diante de Deus o homem não tem mérito algum. Essa é a
parte que a doutrina reformada mantem. Esquece-se da outra parte.
O mérito das obras é de Deus
em primeiro lugar, e do homem em segundo. Isso acontece verdadeiramente. É um “direito
por graça”, ensina a Igreja.
Ninguém pode merecer a
graça. No entanto, após o recebimento da graça o homem pode merecer o que se
segue a ela. A iniciativa pura de Deus agora associa o homem na obra da
salvação, de forma que ele pode obter graça na graça. O catecismo ensina,
citando uma santa cristã, mostrando a pura graça do mérito, e diante de Deus apareceremos
de mãos vazias. Nossas obras e méritos são graça de Deus.
A santificação se dá por
renúncias e combate espiritual. Com a vida de boas obras feitas sob o influxo
constante da graça, como cooperação com o dom gratuito de Deus, esperamos,
também da graça, dom da perseverança final. Do começo ao fim é tudo graça. O
que envolve a diferença aqui em relação à doutrina reforma é a verdadeira liberdade
do homem, o livre-arbítrio que coopera com a graça da salvação.
Entendendo
o Sola Gratia
O teólogo batista Franklin
Ferreira cita o santo Concílio de Trento como aquele que negou totalmente “a
doutrina bíblica e reformatória da justificação somente pela fé...”. Pelo contrário, o Concílio de Trento definiu a doutrina bíblica, e isso pode ser provado ao estudar a Bíblia.
Afirma mais, que na declaração
conjunta de 1998 a doutrina católica não cedeu em nada e continua em
divergência com a doutrina protestante. Em relação a isso, é verdade,
pois a Igreja Católica não pode negar sua fé, mas houve grande acordo com os
protestantes luteranos que subscrevam a declaração.
O que deve ser entendido, e
o foi naquele documento, é que a fé que justifica não vem sozinha. Ela precisa
da resposta livre à graça, do arrependimento. É necessária a disposição do
homem. Ficou claro isso. Entre outros pontos.
O ensino do concílio tridentino sobre a justificação, pode
ser resumido em atenção aos pontos aqui discutidos, em relação ao Sola Gratia, como a condenação da doutrina da salvação pelas obras, tanto as
feitas pelas forças naturais do homem, ou aquelas que provêm da Lei. Esse
ensino está definido no cânone primeiro.
Também foi condenada a
negação do livre-arbítrio, de que o ímpio peca em tudo o que faz, a ideia de
que o salvo não pode perder a graça, e outras.
É também condenada a
concepção de que a graça é apenas um meio auxiliar, que de outro modo poderia
ser descartada, servindo apenas como facilitadora. Essa doutrina ensina que a
graça é absolutamente necessária.
(Concílio de Trento, cânones
sobre a justificação, Seção VII.)
Em Romanos 8, 26 está
escrito que o Espírito Santo ajuda nossa fraqueza. Essa é a graça de Deus
auxiliando o livre-arbítrio do homem, que é fraco, para praticar o que deve
praticar.
A constante ajuda da graça
para a salvação, pois não podemos ter um pensamento bom com sendo de nós mesmos.
(2 Cor 3,5) Devemos permanecer unidos à verdadeira videira (Jo 15,4).
Franklin Ferreira, no
intuito de realçar a graça, a justiça de Cristo imputada ao que crê, afirma que
somente Jesus foi salvo pelas obras, por ter sido o único a obedecer por toda a
vida.
Para isso, cita o texto de
Hebreus 5,7-10. Quando o cristão recorre às Escrituras para ensinar, temos uma
base sólida e suficiente para examinarmos o ensino.
Por isso, devemos prestar
atenção na afirmação e no que o texto bíblico ensina, para certificarmo-nos de
que está correto.
Está escrito:
“Nos dias de sua vida
mortal, dirigiu preces e súplicas, entre clamores e lágrimas, àquele que o
podia salvar da morte, e foi atendido pela sua piedade. Embora fosse Filho de
Deus, aprendeu a obediência por meio dos sofrimentos que teve. E uma vez
chegado ao seu termo, tornou-se autor da salvação eterna para todos os que lhe
obedecem, porque Deus o proclamou sacerdote
segundo a ordem de Melquisedec.”
O teólogo ressaltou a
obediência para afirmar a salvação pelas obras, pois o texto afirma: “aprendeu
a obediência por meio dos sofrimentos.”
No entanto, não percebeu o
que o texto ensina sobre nós cristãos, e que poderia tê-lo ensinado muito, e,
assim, abalado a estrutura do seu sistema reformado.
De fato, o texto afirma que
Jesus “tornou-se autor da salvação eterna”, e continua com a parte que devemos
igualmente firmemente considerar, que diz: “para todos os que lhe obedecem”.
A obediência de Cristo ao
Pai, e a nossa salvação por Cristo, desde que obedeçamos a Ele. Esse é o ensino
bíblico. Conhecendo as outras passagens já estudadas, fortalece-se o ensino de
que as obras têm efeito salvífico quando feitas em obediência ao evangelho.
O reformado poderia
retrucar, e é esperado que o faça, afirmando que o cristão obedece porque é
salvo, e não é salvo porque obedece.
Não muda nada essa objeção,
pois o texto afirma que Jesus salva os que Lhe obedecem, não tendo espaço para
que seja salvo só pela fé.
A
questão da imputação da justiça
A ideia de imputação é
verdadeira, mas não pode parar aí. Eis o problema. A justiça de Cristo é infusa
em nós na justificação, de forma a nos tornar justos, e não apenas nos
considerar justos.
Gledson Meireles.
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