Se ele especifica “curvar-se
em veneração”, fica a possibilidade de curvar-se em outro contexto, o que já
seria lícito. Talvez o mesmo tenha em mente o gesto de curvar-se diante de
pessoas para cumprimentar, por exemplo. Assim, afirma que os casos em que a
Bíblia aprova curvar-se diante de criaturas não estão no contexto religioso,
são todos do contexto social. Essa é uma ideia errada, já refutada no estudo
sobre as imagens.
Afirma ainda o apologista,
que é proibido fazer imagens. Norman Geisler afirma, conforme mostrou Dave
Armstrong, que não há veneração de relíquias na Bíblia, nem veneração de
objetos, mas há uma condenação a isso. Por isso, não se poderia fazer imagens e
nem curvar-se diante delas para ter “devoção religiosa”.
Os exemplos bíblicos de
curvar-se diante de alguém, exemplos que são usados pelos católicos (como
Gênesis 18,2), demonstrariam uma confusão de contextos. E explica: as pessoas
não estavam curvando-se diante de uma imagem, mas de uma pessoa, e era por respeito,
não reverência.
Mas, então a Geisler deveria
responder a isso: pode-se curvar diante
de uma pessoa por respeito, não tendo, nem chegando a ter reverência por ela?
Essa é uma distinção descabida.
E o Dave termina o conjunto
de citação de Geisler com a de que o assunto, a ser tratado, não é orar a uma
imagem, mas orar usando imagem. Geisler concede que podemos mostrar respeito
por uma pessoa, mas não reverência.
Pois bem. Usando o mesmo
método que o Protestantismo costuma usar, de exibir o sentido dos termos
segundo o seu significado nos dicionários, o termo reverência, empregado por
Geisler como ilícito de ser feito a pessoas e imagens, significa, entre outros,
a “honra ou respeito sentido ou mostrado”,
“adoração profunda...”, “gesto de respeito” (como curvar-se),
segundo o dicionário Merriam-Webster online. O mesmo dicionário mostra que
respeito é ter “um sentimento de profunda
admiração por alguém ou algo...”.
É necessário saber o que o
autor tem em mente quando usa “respeito” e “reverência” como duas coisas tão
diferentes a ponto de uma ser aceita e a outra recusada, pois o termo
reverência igualmente traz o sentido de i) respeito e de ii) gesto de respeito.
No que concerte às imagens,
certamente, o maior ataque contra elas feito no Protestantismo foi
sistematizado por João Calvino, nas suas Institutas, Livro I, cap. 11, onde
estabelece os princípios que deverão reger a religião protestante, entendendo
ser esses princípios aqueles que foram estabelecidos por Deus nas Escrituras.
O reformador afirma que a
Escritura opõe Deus em particular aos ídolos. Isso introduziria uma distinção
essencial entre Deus e a matéria, tornando absolutamente proibido fazer imagens
de Deus, e que tal não configura uma mera lei positiva.
Falando dos ídolos, menciona
os deuses que os homens fazem para si mesmos, os homens que desejando a forma
visível de Deus começaram a fazer imagens. Quando uma forma é atribuída a Deus,
afirma Calvino que “sua glória é
corrompida por uma mentira ímpia”.
Para ele, Deus rejeita todas
“as formas e figuras, e outros símbolos,
pelos quais os supersticiosos imaginam poder trazê-lo mais perto deles”.
Fabricar imagens seria rebelião contra Deus. (Is 40,18; 41:7,
29; 45:9; 46:5)
Afirma que a majestade de
Deus é desonrada quando o que é incorpóreo é assimilado à matéria corpórea.
Isso é posto como uma rebelião e um ultraje à divindade. Como um tipo de
insulto à sua majestade de Deus.
Por tudo isso, seria uma
evasão afirmar que “quando pretendem que
os judeus foram proibidos de usá-las por causa da sua inclinação à superstição.”
A proibição estaria de acordo com a essência eterna de Deus e “o uniforme curso da natureza”. Não seria
restrita a uma nação somente.
Quanto às imagens do Antigo
Testamento, afirma que todos os sinais empregados estavam em apto acordo com o
esquema de doutrina.[1] (Dt 4,11).
Ensina que o cristão deve ficar
contente com o poder e graça do Espírito. Quando Deus apareceu em forma humana
foi em antecipação à encarnação. Mas, segundo o parecer de Calvino, isso não
deu aos judeus pretexto de levantar símbolo de Deus sob a forma humana.
Todas essas invectivas
contra imagens de Deus também referem-se às outras imagens religiosas, como as
dos santos. Seria uma obsessão “defender
imagens de Deus e dos santos”.
Calvino afirma que os
querubins significavam que as imagens eram inadequadas para representar os
mistérios de Deus.
Nesse ponto, o reformador
coloca um dos seus mais fracos argumentos, pois da presença da imagem dos
querubins, da sua existência fatual, afirma que os mesmos serviram para mostrar
a inutilidade das imagens em mostrar os mistérios de Deus, já que os mesmos
cobriam o propiciatório, escondendo os mistérios divinos das vistas e de todo
sentido humano.
Porém, quando penetramos no
sentido mesmo desse argumento, vemos que não há valor intrínseco nele que ofereça
qualquer dificuldade contra o uso de imagens.
De fato, o que Calvino
expôs, a saber, que são inadequadas as imagens para retratar a pura essência de
Deus e dos Seus mistérios, volta-se contra ele e destrói o próprio argumento,
pois não é algo que recai contra as próprias imagens que são meios de transmitir
lição que ele apontou.
Uma vez que as imagens dos
querubins serviram para mostrar a transcendência de Deus, escondida através de
suas asas de ouro sobre o propiciatório, e por elas essa ideia sublime foi
mostrada ao homem, está estabelecida a importância da imagem no ensino sagrado.
Afirma ainda que os
querubins pertenciam ao período da lei, “período de puerilidade”. Afirma também
que todas as formas de adoração feitas por homens são detestáveis. Calvino diz
que o Senhor proíbe qualquer imagem dEle, seja na forma de estátua ou figura.
De Jer 10,8 e de Habacuque o
reformador infere a doutrina que “toda
coisa que diz respeito a Deus que é aprendida de imagens é fútil e falso.”
(V)
Temos contra essa doutrina a
própria Escritura que mostra o ensino de Deus ao Povo por meio das imagens.
Por isso, ao afirmar que os
profetas condenam a ideia que as imagens são substitutas dos livros, Calvino
extrai uma doutrina de passagens que não tratam do assunto especificamente.
Outro ponto tratado é a ideia
idolátrica de que Deus não está presente a menos que sua presença seja
carnalmente exibida.
Assim, os idólatras passa a
adorar a Deus como estando na imagem. Não que creiam que a imagens seja deus,
mas que o poder da divindade de alguma forma habita na imagem.
E afirma: “Portanto, seja Deus ou uma criatura que é
feita em imagem, o momento que você prostra-se diante dela em veneração, você
está grandemente fascinado por superstição.”[2]
Cita o argumento pagão de
que adoram a divindade que habita invisivelmente na imagem. Aliás, esse é outro
ponto que não há nenhuma ligação com o Cristianismo, mas é recusado pela sã
doutrina.
Falando dos seus dias,
Calvino pergunta o motivo de prostrar-se diante das imagens. (Trata da dulia,
etc. em see infra, s. 16,
and chap. 12 s. 2)
Finalmente, Calvino afirma
não ser tão supersticioso para pensar que todas as imagens são ilícitas. É mais
um momento em que ocorre lampejos da verdade. As imagens históricas (eventos)
ou pictóricas (formas e figuras)
Calvino afirma que por
quinhentos anos não havia nem mesmo esse tipo de imagem. (ver prefácio see Preface, and Book 4, c. 9 s. 9)
Das lições de Calvino pode-se dizer que o uso das imagens é uma revolta
contra Deus, não podem ser usadas no contexto religioso, não servem para o
ensino, já que o ensino através delas é inútil, e que durante cinco séculos não
havia imagens nas igrejas. Todas essas afirmações foram devidamente refutadas
no estudo sobre as imagens.
Para os cristãos, desde sempre foi ensinado que as imagens de deuses falsos são proibidas, bem como a adoração das imagens, sejam quais forem. Também, as imagens de Deus não são
possíveis, e por isso proibidas, exceto como símbolos de alguma qualidade
divina, mas que as demais imagens sagradas podem ser usadas, podem receber reverência
pelo que simbolizam, são meios de instrução, e sempre existiram no meio
cristão, desde o primeiro século.
Gledson Meireles.
[1] ...but all the signs he ever employed were in apt accordance with the scheme
of doctrine…. (Institutas, Livro I, cap. 11)
[2] Therefore, whether it be God or a creature that is
imaged, the moment you fall prostrate before it in veneration, you are so far
fascinated by superstition.”. (Institutas, Livro I, cap. 11)
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