domingo, 26 de março de 2017

Livre exame e interpretação errada

Sai mais um artigo contrário ao magistério da Igreja Católica:


O autor afirma: “Ou seja, ninguém é realmente livre para ler e interpretar as Escrituras, o único livre de fato é o papa, e o resto que se lasque, vai ter que concordar com a interpretação do papa querendo ou não, sendo ela boa ou não.

Nada mais falso. O papa Francisco não pode interpretar a Bíblia particularmente, no sentido de que possa chegar a qualquer intepretação que ache correta e que entre em conflito com um interpretação do magistério, ou melhor, de forma contrária à interpretação consagrada há séculos na Igreja. Ninguém admite isso que isso tenha a legitimidade concedida para acontecer.

Nem o católico, que sabe ter de obedecer às interpretações tradicionais, nem o protestante, que deve obedecer às interpretações pertencentes à sua tradição específica, e à tradição geral que caracteriza o Protestantismo.

Se há diversos níveis de “liberdade” de acordo com a denominação, ou na comparação entre o Catolicismo e o Protestantismo, isso fica no rol das marcas triviais respectivas, não contradizendo o essencial.

Assim, o artigo sobre Barnabé não traz novidade para um católico, de modo algum “enterra” o magistério infalível, mas ensina algo para o protestante que pensa ser o livre exame, conforme entende o Catolicismo, a simples leitura e interpretação pessoal do leitor, e não aquela que tira conclusões heréticas.

E o autor escreve: “Ou seja, a liberdade de interpretar a Bíblia nunca esteve em xeque, em momento nenhum. O problema sempre foi a interpretação errada que culminasse em heresias, que é o mesmo rejeitado por protestantes como o autor deste blog. Uma coisa é poder interpretar a Bíblia, outra coisa é essa interpretação estar certa. Protestantes não creem que qualquer interpretação esteja certa, da mesma forma que a Igreja antiga não cria, mas também não proíbem a livre interpretação, da mesma forma que a Igreja antiga não proibia.”

A distinção entre “livre exame” e “interpretação errada” ajuda a compreender o ponto que quero frisar: o livre exame é entendido na Igreja Católica como dando liberdade total para interpretar a Bíblia, incluindo a “interpretação errada”. Por isso é combatido. Doutro modo, no interior do Catolicismo, há livre exame também, como fazia São Barnabé.

Gledson Meireles.

3 comentários:

  1. Olá, Gledson, tudo bem?

    O ponto central dessa discussão parece ser o conceito de livre exame. Para você e outro católico que comentou no meu artigo (e que reproduzo parcialmente a minha resposta aqui), o livre exame é aceitável desde que não se contradiga o magistério. Mas não é isso o que se vê na apologética católica em geral. Qualquer um que entrar em sites de apologética católica ou em comunidades de debates percebe mais claro que a luz do dia que vocês rejeitam o próprio livre exame em si, e não apenas o livre exame que não entre em contradição com algo afirmado pelo magistério. Quando se digita “livre exame” no Google, um dos primeiros artigos que aparece em se tratando de religião é esse aqui de um site católico chamado “Paraclitos”:

    http://www.paraclitus.com.br/2012/apologetica/protestantismo/a-falsidade-do-livre-exame/

    O que eles dizem logo no segundo parágrafo? Vejamos:

    “Liberdade de interpretar a Bíblia, cada qual por si mesmo, contando com a iluminação pessoal e direta do Espírito Santo. Nada de Papa ou de palavra definitiva do Magistério, o que configura uma suma subjetividade. Inventor de tal absurdo, Martinho Lutero, (1483-1546)”

    O que eles estão dizendo aí? Que todo mundo é realmente livre para interpretar a Bíblia e praticar livre exame DESDE QUE esta interpretação não confronte a do magistério? Não. Eles condenam A PRÓPRIA prática do livre exame em si mesma, por considerar algo “subjetivo”, e que só a palavra definitiva do papa ou do magistério é que pode ser levada em consideração. O que me lembra um debate que tive há tempos atrás com certo católico que tentava desmerecer a minha interpretação a priori, pelo simples fato de ser “apenas” a minha interpretação e eu não ser “infalível” (os prints estão no artigo):

    http://heresiascatolicas.blogspot.com.br/2015/05/como-desmascarar-e-destruir-o-argumento.html

    E na “Rádio Macabeus”, o apologista católica afirmava: “Jamais o católico seguirá suas opiniões próprias sobre religião. Católico segue a Igreja [Romana]”. Ou seja, está claro que para eles o problema não é ter uma opinião que contradiga o magistério. O problema é TER opinião. O único que pode tê-la é o magistério, porque supostamente é o único “infalível”, e só podemos seguir algo se for afirmado “infalivelmente”. Por incrível que pareça, é essa a lógica dos apologistas católicos, como os do Veritatis, visível claramente neste artigo:

    http://www.veritatis.com.br/livre-exame/

    Eles já descartam a interpretação protestante de antemão, pelo simples fato de não ser “infalível”, por não ser do magistério católico (que o católico considera infalível). Mas Barnabé também não era infalível, também não era o magistério, também não estava seguindo as orientações de algum papa ou Igreja infalível. Pela lógica, o que Barnabé diz seria tão descartável de antemão quanto o que os protestantes dizem.

    O muito conhecido apologista católico americano Dave Armstrong afirma em seu site que a Igreja tem interpretação oficial para SETE textos bíblicos. Mas mesmo se um protestante interpretar por conta própria qualquer outro texto que não faça parte desse seleto “grupo infalível dos sete”, ele já é rechaçado a priori pelos apologistas católicos, por não ser a interpretação do magistério mas apenas a interpretação pessoal e “subjetiva” dele.

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  2. Em resumo: se os apologistas católicos passarem a seguir a linha argumentativa que você propõe, eles teriam que reformular TUDO o que argumentam em TODO lugar contra os protestantes acerca desta questão. O que seria um avanço sem sombra de dúvidas, mas não creio que eles estariam dispostos a tanto.

    No demais, seu último parágrafo me pareceu bastante contraditório. Ele indica que o livre exame é permitido, desde que não seja para “errar” (entendo o “erro” como sendo uma interpretação contrária à interpretação da Igreja Romana). Mas isso é exatamente o oposto à definição de “livre”. Dizer que alguém é “livre” sendo livre só para agir de determinada maneira não é liberdade real. Na Alemanha Nazista, os alemães eram “livres” para aceitar o regime nazista (e nunca para condená-lo). Na Coreia do Norte atual, os cidadãos também são “livres”: livres para aceitar o regime comunista, senão vão para os campos de concentração. E no catolicismo romano as pessoas também são “livres” para interpretar a Bíblia: mas só se for para concordar com a interpretação do magistério. É claro que isso não é liberdade real, mas um mero trocadilho ou jogo de palavras para o oposto a isso.

    Abs!

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  3. Tudo bem, Lucas.
    O livre exame a que me referi necessita de uma qualificação. É que somos livres para interpretar, mas nunca de forma a contradizer algum dogma. Caso isso ocorra, devemos nos submeter à interpretação que contraria a nossa. Penso que o mesmo seja o caso do Protestantismo, já que nenhum protestante poderia propor uma interpretação concluindo que Maria é intercessora, por exemplo. Mas há outros pontos mais graves. Não se tem essa liberdade. Sendo assim, o livre exame é para certificar-se, por si mesmo, da verdade, e não esperar que outro interprete. Vou usar essa oportunidade para ler os links que você indicou, e aprofundar nessa questão do livre exame.
    Até mais.

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