quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Imortalidade da alma: Eclesiastes 9,5 e 10


5 Com efeito, os vivos sabem que hão de morrer, mas os mortos de nada sabem. Para eles não há mais recompensa, porque sua lembrança jaz no esquecimento. 10 Tudo o que tua mão encontra para fazer, faze-o com todas as tuas faculdades, pois que na região dos mortos, para onde vais, não há mais trabalho, nem ciência, nem inteligência, nem sabedoria.” (Eclesiastes 9,5.10)

A leitura desses dois versos do livro do Eclesiastes tem levado muitos a reforçar a sua crença de que a alma deixa de existir na morte, ou no mínimo que há um sono da alma na morte. Dessa última opinião teríamos que a alma continua a existir, mas que suas faculdades deixam de operar e essa cai em torpor profundo durante todo o tempo em que permanecer separada do corpo. Na primeira asserção a realidade seria outra, pois não havendo separação alguma do corpo e da alma, morrendo um o outro deixaria de existir completamente, e não haveria motivo de supor qualquer lugar além-túmulo como espaço espiritual onde as almas encontram-se.  Nessa acepção, o sheol que é o mundo dos mortos, no sentido espiritual de lugar das almas, seria a sepultura ou o pó da terra, e nada mais.

Para corroborar essa doutrina a passagem acima é uma das mais frequentemente mencionadas, e que parece não deixar o leitor com dúvidas quanto à posição defendida com ela.

No entanto, na interpretação atenta de ambos os versículos, a partir do contexto imediato, bem como o parecer de todo o livro sagrado do Eclesiastes, temos uma noção completamente diversa. Comecemos, então, por analisar o que diz o texto, e logo passemos a verificar o que mais podemos aprender da leitura total do pensamento encontrado nesse livro sobre o que estamos a averiguar.

Ao fazer a distinção de ação entre os vivos e os mortos, o texto afirma que “os vivos sabem que hão de morrer, mas os mortos nada sabem”. De fato, parece estar afirmando a inconsciência total dos mortos, não deixando espaço para a identificação de uma parte dos mesmos que pudesse ficar em estado ativo após a cessação da vida. Mas, além de afirmar que os “mortos nada sabem”, o texto continua a afirmar que “Para eles não há mais recompensa”. Essa cláusula já poderia deixar perplexo o leitor, pois além de não atribuir o conhecimento aos mortos, também nega-lhes a recompensa pelo que fizeram em vida.

Em continuação, afirma mais que a lembrança dos mortos “jaz no esquecimento”. Não haveria mais conteúdo em sua memória, já que não mais existiriam, se assumíssemos essa hipótese. Essa seria a leitura adotada pelas duas posições citadas acima. Até esse ponto foi o que contribuiu o verso 5 no âmbito que assumo como de leitura normal da passagem. Ao passar para o verso 10, temos que “na região dos mortos, para onde vais”, ou seja, isso seria o túmulo, na mesma leitura que estamos considerando, e que nessa região não há trabalho, ciência, inteligência e sabedoria. Estaríamos assim com uma apresentação satisfatória do estado dos mortos sem consciência e atividade. Porém diante de tudo isso ficou a “recompensa” por explicar. Esse fato importante seja talvez o contexto para o correto entendimento desses versos, pois pode estar nesse particular, diante dos debates acirrados que levantam-se em volta dessas passagens.

E como vimos é fácil esquecê-lo quanto lemos toda a passagem e ficamos com a ideia de que a mesma trata da inconsciência dos mortos e inexistência das almas, que não lhe damos a devida atenção. Se há em um texto afirmações diversas, cada uma delas devem ser consideradas de igual modo.

Antes de prosseguir, é importante citar o verso 6. Esse diz: “Amor, ódio e inveja acabaram. Não terão mais parte alguma, para o futuro, no que se faz debaixo do sol.

A expressão “debaixo do sol” é citada diversas vezes no livro do Eclesiástico, desde o seu início, como mostra o apologista Karlo Broussard, e é, acredito, a orientação do mesmo para que saibamos o que ele está tratando: ““Vaidade das vaidades!”, diz o Eclesiastes. “Vaidade das vaidades! Tudo é vaidade!” Que proveito tira o homem de todo o trabalho com que se afadiga debaixo do sol?” (Eclesiastes 1,2-3) O livro vem fazer uma revelação das vaidades de toda a existência que há “debaixo do sol”. Ele trata da realidade do mundo, da vida dos homens na terra. E, ainda, podemos compreender, não há explícita esperança de qualquer retribuição pós-morte, o que invalidade uma especulação do livro sobre a natureza da alma.

Tendo esse princípio em consideração, vemos que há uma leitura conforme o mesmo que ressaltará coisas que a leitura anterior deixou despercebidas, e esclarecerá afirmações que não foram compreendidas. Ressalto ainda que o texto também não tem a ver com a vida após a ressurreição dos mortos, pois não trata do assunto.

Voltando aos versos 5 e 10 do capítulo 9 de Eclesiastes, com a atenção direcionada para a ordem presente de coisas sob a face da terra, ou seja, aquilo que está debaixo do sol, temos que os vivos estão cônscios de suas atividades, e os mortos nada sabem, pois não vivem mais sob o sol. De fato, para eles acabou o tempo das retribuições, e não há mais recompensa nessa terra, de tudo o que fizeram. A lembrança que deixaram apagar-se-á, será esquecida. No mundo dos mortos, as atividades mundanas não terão mais lugar, nem a ciência, nem a inteligência e nem a sabedoria. Tudo está terminado.

Prosseguindo para o comentário do verso 6, da mesma forma afirma que o amor, o ódio e a inveja chegaram a seu termo, pois os mortos não mais sentem e nem trabalham debaixo do sol. Por isso, ao concluir o verso 6 está escrito: “Não terão mais parte alguma, para o futuro, no que se faz debaixo do sol.” Portanto, não tem a ver com a imortalidade da alma, nem com a ressurreição dos mortos, assuntos esses que não entram nesse particular citado no livro.

Vê-se por todo o contexto que o ensino não toca a questão da consciência ou não dos mortos. Em nenhuma parte pode-se vislumbrar algo que gire em torno da condição dos mortos além-túmulo. Tudo passa-se em consideração ao mundo debaixo do sol.

O conhecimento refere-se ao que é obtido e exercido debaixo do sol, o trabalho é aquele feito debaixo do sol, a ciência é aquela que tem a ver com a vida na terra, a inteligência é aquela que é usada enquanto há vida, a sabedoria é o que obtem-se pela experiência de vida debaixo do sol. Em suma, tudo o que refere-se no texto aplica-se à realidade deste mundo. Nada destina-se a trazer qualquer informação para a condição das pessoas mortas nem no sepulcro nem no mundo dos mortos.

Poder-se-ia produzir uma síntese simples desse pensamento dizendo que essas passagens referem-se ao que há no mundo e não possuem qualquer revelação sobre o que passa-se com os mortos fora da realidade presente. Conhecimento, obras, lembrança, recompensa, ciência, inteligência, sabedoria, amor, ódio, inveja, tudo isso está em relação aos vivos, e não podem mais ser usufruído pelos mortos, pois já não habitam debaixo do sol. É disso que o texto do Eclesiastes trata.

Mas, alguém poderia retrucar de tudo o que foi dito, que essa apresentação do Eclesiastes implicaria em admitir que a imortalidade da alma não poderia ser harmonizada com essa revelação, pois a base para tal pensamento seria a inexistência das almas, e não a existência das mesmas. Ainda mais, que toda essa consideração estaria nesse âmbito de pensamento, não tendo como base a fé na imortalidade da alma.

Se assim fosse, também poderíamos negar a ressurreição pela mesma via. De fato, o texto afirma que os mortos não terão recompensa, e não serão mais lembrados. Se isso referisse a Deus, tal coisa estaria diametralmente oposta à revelação inteira das demais Escrituras. Mas não está. Por esse absurdo já pode-se rejeitar a interpretação que contraria a fé na imortalidade da alma. O que o texto afirma da recompensa, e do esquecimento, só para repetir dois fatos mais expressivos do texto para a elucidação do mesmo, mas também de tudo mais que o texto refere, como foi mostrado, mostra que tratam-se de coisas relativas aos mortos em relação ao vivos. Por exemplo, não terão recompensa na terra nesta realidade anterior à ressurreição, e não serão lembrados pelos vivos. No que refere-se à sua recompensa por parte de Deus, e a lembrança deles por Deus, isso a passagem não tem em vista, pois sabemos que os mortos serão recompensados por Deus de tudo o que fizeram em vida.

Portanto, a implicação dessa passagem não é a negação da imortalidade da alma, como também não prejudica a fé na ressurreição dos mortos, pois a mesma não atinge nenhuma dessas doutrinas, mas trata da realidade dos mortos em relação à vida normal desfrutada na terra.
Gledson Meireles.

9 comentários:

  1. De fato, o livro de Eclesiastes trata das observações do sábio Rei Salomão acerca de tudo que se passa "debaixo do sol" , isto é, aqui na terra(observação a pessoas vivas ). Ele, o rei , concluiu rapidamente que embora voce trabalhe muito ou pouco , coma , beba , tenha seu tempo para fazer tudo e muito mais, por exemplo, ao fim da VIDA, É TUDO VAIDADE/INUTILIDADE.É cristalino tal leitura em todo o livro supracitado. Com efeito, Amor, ódio, ciúme , RECOMPENSA , trabalhar e seja lá o que penses, deves fazê-los em VIDA.
    Agora vem o disparate, extraído do seu texto : Essa cláusula já poderia deixar perplexo o leitor, pois além de não atribuir o conhecimento aos mortos, também nega-lhes a recompensa pelo que fizeram em vida. Quem nega a RECOMPENSA em vida ? Ora, recompensa nada mais é uma contrapartida por uma ação feita por ti, assim : se trabalhas por hoje, ganharás teu pão de hoje. Isso é uma recompensa, logo só em VIDA , você pode TER, FAZER E RECEBER RECOMPENSAS. Outrossim, não se trata aqui da RECOMPENSA PÓS MORTE,pois esta irá a juízo e aí sim, TUDO o que tenhas feito DEBAIXO DO SOL , enquanto em VIDA, virá à tona.
    Por fim, você faz parte de um grupo de pessoas que ao ler foge do texto /contexto. Explico.
    1 – Na Interpretação de textos, temos a EXTRAPOLAÇÃO , ou seja, a interpretação vai além do texto, põe-se coisa aonde não existe. Assim, na sua interpretação , não pode prosperar a RESSUREIÇÃO, pois nada se fala além da morte. O texto vai até a morte .
    2 – Outro recurso de interpretação é o INFERIR, isto é, deduzir do texto. Sua dedução sobre a RECOMPENSA foge a boa interpretação. Como exemplo de inferir, posso citar :
    - “O pó volte para a terra como o era, e o espírito volte a Deus que o deu.” Ecles. 12:7
    Pó ? dedução correta : corpo espírito ? dedução correta : fôlego de vida
    Prova : “Do suor do teu rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, porque dela foste tomado; porquanto és pó, e ao pó tornarás.” Gênesis 3:19 / O Senhor Deus formou, pois, o homem do barro da terra, e inspirou-lhe nas narinas um sopro de vida e o homem se tornou um ser vivente(alma).Decorre daqui, que a ALMA É MORTAL.

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    1. Caro Anônimo:

      1º Vamos ao meu disparate, e àquilo que devo responder:

      “Quem nega a RECOMPENSA em vida?”

      “Outrossim, não se trata aqui da RECOMPENSA PÓS MORTE, pois esta irá a juízo e aí sim, TUDO o que tenhas feito DEBAIXO DO SOL , enquanto em VIDA, virá à tona.”

      Espere um pouco. Há diferença entre o que afirmei e o que você entendeu. Pelo menos é isso que está na frase de acordo com a sua construção. Eu escrevi que o texto, lido isoladamente, parece negar a RECOMPENSA pelo que os homens fizeram EM VIDA, e não que ele negue a recompensa em vida. Duas coisas diferentes.

      O que você escreveu foi resultado da interpretação, de acordo com o contexto bíblico geral, que afirma que todos teremos recompensa. Será que esqueci disso?
      E mais: você diz que Fui além do contexto. Será mesmo?

      “Assim, na sua interpretação, não pode prosperar a RESSUREIÇÃO, pois nada se fala além da morte. O texto vai até a morte.”

      Parece até que houve negação da ressurreição.
      MAS, eu coloquei um condicional “SE”. E ainda chamei esse resultado possível de “absurdo”.

      E veja o que está afirmado acima: “De fato, o texto afirma que os mortos não terão recompensa, e não serão mais lembrados. SE isso referisse a Deus, tal coisa estaria diametralmente oposta à revelação inteira das demais escrituras. Mas não está. Por esse absurdo já pode-se rejeitar a interpretação que contraria a fé na imortalidade da alma.”

      E mais: “Por exemplo, não terão recompensa na terra NESTA REALIDADE ANTERIOR À RESSURREIÇÃO, e não serão lembrados pelos vivos. No que refere-se à sua recompensa por parte de Deus, e a lembrança deles por Deus, isso a passagem não tem em vista, POIS SABEMOS QUE OS MORTOS SERÃO RECOMPENSADOS POR DEUS DE TUDO O QUE FIZERAM EM VIDA.”

      Depois você afirma: “Sua dedução sobre a RECOMPENSA foge a boa interpretação.” Mostrei que não foge. Eu escrevi que a recompensa virá após esta vida, e você escreveu o mesmo.

      Você entendeu que TODOS tem a recompensa, pois em vida todos recebem a recompensa pelo que fazem, e os mortos não mais estão nessa categoria. Então, após o juízo tudo recebem a recompensa pelo que fizeram em vida. Entendi o seu ponto de vista?

      Agora, voltemos ao texto para que fique mais claro o ponto que estou tratando. O texto diz que os mortos “não terão recompensa”. Se a Bíblia está ensinando como você propôs, que todos já tem a sua recompensa em vida (ela não ensinou disso), e que depois haverá a recompensa após o juízo pelo que fizeram em vida (isso é verdade), então o texto em apreço não tem explicação da sua parte, pois ele diz que NO FUTURO não terão recompensa.

      Sabemos que todos teremos a recompensa após a morte e juízo, mas o que expliquei é que o texto refere-se à vida natural neste mundo antes de tudo isso. Somente nesse sentido os mortos não terão mais recompensa. Entendeu?

      Assim, não terão recompensa, não mais serão lembrados, não trabalharão, não terão ciência e sabedoria, etc. Tudo isso em relação à vida que se passa debaixo do sol. Sendo assim, DESTE texto em si, não se pode dizer nada sobre a imortalidade da alma e sobre a ressurreição. Deve-se partir para o contexto geral, como você fez, mas que não explicou Ecl 9,5.10.

      Além do mais, você não refutou nada do que escrevi, apenas afirmou no final que “a alma é mortal”, não tratando de nada do que expus neste artigo e nos outros sobre o tema. Espero suas considerações.

      Gledson.

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    2. Pensando ainda no que você escreveu: "Ora, recompensa nada mais é uma contrapartida por uma ação feita por ti, assim : se trabalhas por hoje, ganharás teu pão de hoje." achei bom repetir: parece que todos morrem com recompensa, e que ninguém fica sem recompensa em vida. Essa foi a sua conclusão. Assim, a frase bíblica: "para eles não há mais recompensa" significa apenas que eles não vão trabalhar mais, e que por isso não terão recompensa? Mas sobre o trabalho o texto fala mais adiante. Aqui, ele diz que a lembrança caiu no esquecimento e os mortos não terão recompensa. Lembrança de quem? Dos próprios mortos, que não se lembram de mais nada, ou dos vivos que não mais se lembram deles? De fato, é dos vivos em relação a eles. A recompensa também. Ao invés de concluir que todos tem recompensa, todos os dias em vida, é melhor afirmar que ao morrer cessa a recompensa, muitos não terão mais recompensa natural pelo que trabalharam. É assim que o texto deve ser lido.

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    3. Nessa parte de Gênesis q diz sobre a criação do homem, o termo "alma" veio de uma outra tradução e nesse contexto significa "vida" e não a nossa parte imaterial

      Já eu não vejo sentido em acreditar q assim como os animais somos nosso próprio corpo e não uma parte imaterial q está dentro dele, certamente não seríamos inteligentes e racionais. Seríamos seres irracionais q apenas agem por instinto como eles

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  2. parabens analise biblica deu de lapada nesse anonimo. ele ficou sem palavras pra te refutar. contra fatos nao a argumentos que ja se vil mortalidade da alma. isso e conversa de adventista do setimo dia.equivocado.

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  3. Obrigado Ricardo. A série de artigos que escrevi sobre a imortalidade da alma contem a refutação dos principais argumentos que os adventistas e outros sobre esse tema. Aos poucos publicarei mais.

    Gledson Meireles.

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  4. Olá boa tarde!
    gostei do explicação de Eclesiastes 9:5-10.eu tava lendo essa passagem da bíblia e fiquei confusa.
    Pensei que debaixo "do sol"fosse mesmo que de baixo da terra,ou seja na sepultura.
    Mas com sua explicação vim que em baixo do sol é nessa vida agora,hoje.
    Então Salomão se referia em vida vc pode trabalho, pensar agir,construí, porém em morte vc não terá a recompensa de sou de seu trabalho.
    Correto?


    At,
    Sílvia Santos

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  5. Parabéns Análise bíblica, seu conhecimento é realmente uma benção.

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  6. não consigo entender como a pessoa olha para a parábola do rico e Lázaro e logo diz não é assim mesmo o rico estava vivinho no inferno agora pergunto se em Eclesiastes 9 5 fala que os mortos não sabe de nd e sua memória está no esquecimento e pq ele lembrou de sua vida? memória está se tratando de consciência não é mesmo?

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