quinta-feira, 26 de dezembro de 2024

Livro: O Cristão Reformado, sobre o Sola Scriptura

Comentário: Sola Scriptura

Se formos interpretar o Sola Scriptura de acordo com a doutrina católica, podemos afirmar que tudo deve estar na Bíblia, explicitamente ou implicitamente, e nada do que for ensinado na Igreja pode estar contra a Bíblia. Dessa forma, tudo pode ser provado, demonstrado, satisfatoriamente explicado, usando apenas a Escritura.

Os protestantes, a partir do padre Martim Lutero, do padre Zwínglio, do capelão João Calvino, e dos reformadores do século 16 em conjunto, formularam o princípio Sola Scriptura, de modo que tudo deve estar na Bíblia, nada fora dela, e nada contra ela. No entanto, esse princípio teve como objetivo negar a autoridade infalível da Igreja e da tradição. E é justamente nesse ponto que a doutrina protestante diverge da doutrina católica.

A Bíblia em si, a Palavra de Deus, ensina que a Igreja é coluna e sustentáculo da verdade, e ordena a guardar as tradições apostólicas ensinadas oralmente. Portanto, como a Bíblia é infalível, ao ensinar que a Igreja é coluna e sustentáculo da verdade, a Igreja também é apresentada como infalível, e ao instituir a tradição como obrigatória para a fé, tem-se também que a tradição tem ensinos infalíveis.

Os padres da Igreja ensinaram assim. Nenhum cristão católico pensa estar acima da Bíblia, pois ela é a Palavra inspirada de Deus. Os padres da Igreja também eram devotos da Escritura Sagrada.

O cânon da Bíblia foi escolhido pela Igreja Católica Apostólica Romana. Os livros do Novo Testamento foram sendo escritos a partir do ano 50 d. C., e sua autoridade apostólica foi reconhecida entre as igrejas nas quais eram lidos e conhecidos, de modo que foram circulando entre as comunidades cristãs do primeiro século, durante a vida dos apóstolos. Outros companheiros dos apóstolos também escreveram, como Marcos e Lucas.

Esses escritos autoritativos foram sendo considerados pelos cristãos em geral, mas com o passar do tempo, no meio de outras obras, alguns desses não ganharam status de inspirados por parte de alguns. Assim, duvidaram da 2ª Epístola de São Pedro, a Espístola doe Judas, a Epístola de Tiago, o Apocalipse, e outros, enquanto também pensavam ser inspirados os livros de Pastor de Hermas, a 1ª Epístola de São Clemente de Roma, e outros, de modo a surgirem muitas divergências entre os cristãos.

Obviamente, cada texto inspirado é escrito sob a moção do Espírito Santo, já nascendo como Palavra de Deus, de autoridade plena, digno de obediência e devoção. Desse modo, cada escrito, dos 27 livros do Novo Testamento, surgiram com toda autoridade, por terem sido escrito sob a inspiração do Espírito Santo.

No entanto, muitas informações foram sendo perdidas, de modo que não era possível ter certeza, em certos lugares, se um escrito era de origem apostólica, ou que continha o ensino apostólico, sendo inspirado por Deus, de forma que, como expresso acima, livros inspirados eram discutidos junto com outros não inspirados. O mesmo ocorria com livros do Antigo Testamento, pois vários escritos não inspirados, mas lidos com devoção, estavam junto com os livros inspirados, de modo que causavam dúvidas entre muitos.

O leitor está ciente que no momento em que o escritor inspirado escreve, a sua obra é a Palavra de Deus, por sua inspiração. Mas, se em algum lugar esse escrito é negado, aqueles cristãos estarão negando parte da revelação, que por si mesma tem autoridade, mas que não está sendo reconhecida, por vários motivos. E esses obstáculos, muitas vezes desculpáveis, foram retirados pela autoridade da Igreja Católica, que com seus concílios estabeleceu os princípios para a correta identificação dos livros santos, e definiu a lista, que é chamada cânon, a lista dos livros sagrados, nos anos de 393 d. C., 397 d. C. Assim, a Igreja definiu o cânon bíblico.

Por isso, está correto que a Bíblia tem autoridade por si mesma, pois é a Palavra de Deus, é assim está acima da Igreja, o povo de Deus, e é estudada e interpretada pelo magistério, que é servo de Deus, servo da Palavra de Deus, juntamente com a tradição, que contem a Palavra de Deus por meio de diversas formas, de modo que a Igreja deve reconhecer o que é tradição apostólica.

Então, como cristãos católicos, reconhecemos que a Bíblia tem autoridade sobre a Igreja, e não a Igreja sobre a Bíblia.

Quando se diz que o magistério, e a tradição apostólica, precede o cânon, precede a Bíblia, isso é compreendido historicamente, pois a Igreja ensinou oralmente e depois alguns apóstolos e outros escritos inspirados escreveram o que Deus desejava que fosse escrito.

Assim, é historicamente, e teologicamente certo, que a Igreja nos deu a Bíblia, pois foi o meio usado por Deus para isso.

Sendo assim, a Igreja não “criou” o cânon, no sentido de criar os livros inspirados a partir de escritos que não eram inspirados, mas reconheceu o cânon, identificou os livros inspirados, e os distinguiu dos não inspirados, escritos esses que vieram do primeiro século, dos apóstolos e outros discípulos que estavam com os apóstolos, e assim, a Igreja definiu o cânon, de modo que não é mais possível acrescentar ou retirar livros dele. Assim, essa definição é infalível.

 

Comentário: Expectativa canônica

Interessante a explicação sobre a expectativa do surgimento de uma nova Escritura, já que surgiu a Nova Aliança, na tese de Köstenberger e Kruger.

 

Comentário: A consciência apostólica

Os apóstolos certamente sabiam que estavam escrevendo a Palavra de Deus, pois escreviam o que pregavam aos povos. Também é certo que seus escritos tinham na maioria das vezes o caráter apologético, de modo que doutrinas pacificamente aceitas não eram escritas, enquanto os pontos discutidos ganhavam toda atenção.

Assim, a doutrina da ressurreição, da justificação pela fé, da encarnação, da vinda de Cristo, são abundantes no Novo Testamento, porque eram combatidas pelos hereges. Foram escritas para o ensino da Igreja contra os erros.

O cânon já existia desde quando foi escrito, mas não era conhecido. Isso só foi possível no século quarto. Assim, estritamente falando, o cânon é expressão, a definição do número de livros inspirados, que a Igreja conheceu com infalível certeza a partir do quarto século. Antes disso, havia dúvidas, como já explicado acima.

O autor protestante costuma usar o termo cânon no sentido da realidade dos livros inspirados, que são originados como Palavra de Deus, e não se tornam depois de que foram escritos. No entanto, o cânon como é discutido na academia se trata da lista oficial e definida pela Igreja Católica a respeito dos livros sagrados, de modo que cânon é o reconhecimento geral dos livros bíblicos.

No primeiro sentido o cânon bíblico já existia no primeiro século, pois assim que o último livro foi escrito o cânon foi fechado. Mas, para o conhecimento de todos, de maneira total e infalível, não gerando dúvidas, só foi possível a partir do século quarto. Nesse sentido, o cânon nasceu no século quarto. Isso não significa que os livros se tornaram inspirados naquele tempo, pois já foram escritos de forma inspirada. Significa somente que agora é possível saber quais livros são inspirados para toda a Igreja. O pastor protestante não refutou a doutrina católica, mas a apresentou.

De fato, a Igreja Católica não inventou a ideia de cânon da Escritura. Os apóstolos sabiam de sua própria autoridade. Nesse ponto, crendo assim, o que é verdade, pois o ensino e os escritos dos apóstolos eram inspirados, eram canônicos, o protestante deve agir coerentemente, e crer que não há livre exame no Novo Testamento, de modo que os cristãos não podiam legitimamente confrontar os apóstolos em seu ensinamento, pois seriam refutados e deveria estar sob a autoridade dos mesmos. Assim, os judeus de Bereia o fizeram por não serem cristãos ainda, e com certeza os convertidos abaixaram a cabeça diante da autoridade dos apóstolos de Cristo.

Já está claro que os apóstolos e discípulos inspirados escreveram e sabiam estar ensinando a Palavra de Deus, e isso é aceito pela Igreja Católica. Não é isso que é o cânon, quando discute-se o assunto. O cânon é o momento em que a lista é definida e apresentada.

Comentário: A Igreja não construiu, mas recebeu o cânon

Os sinais de apostolicidade, a leitura comum na Igreja, A Igreja esforçou-se por encontrar os textos apostólicos. O pastor afirma que isso não significa que a igreja os definiu. Obviamente está se referindo ao fato de que o texto é inspirado mesmo antes que alguém o conheça. É claro. Mas a definição que estamos falando é o momento em que o catálogo completo e indubitável é feito, de modo que a Igreja pode afirmar que são esses os livros e não outros. Isso é definição.

Assim, é verdade que a Igreja recebeu o cânon, mas o caminho para isso foi árduo. No tempo de Santo Irineu, por exemplo, o cânon não era conhecido. Os livros inspirados já existiam, estavam todos escritos, circulavam pelas igrejas, mas ao lado de outros, que também eram reputados como sagrados, trazia um problema impossível de ser resolvido naquele momento, ou seja, de definir o cânon. O pastor estuda a palavra apodexometha, que significa receber, para explicar que a Igreja não criou o cânon mas o recebeu, o que é a própria explicação católica de toda essa história. Assim, não há nada de novo, apenas o fato de que os protestantes não conhecem esse ponto da doutrina católica.

A ideia de que a Igreja deu caráter sagrado aos livros, que escolheu arbitrariamente os livros, que foi um processo “de cima para baixo” da Igreja, que entregou os livros para a comunidade, é uma ideia errada, combatida pelo pastor, mas que também é combatida pela Igreja Católica. Assim, o autor está refutando uma ideia que não é a doutrina católica.

Pois bem. A Igreja Católica Apostólica Romana definiu o cânon. Esse cânon, conhecido por Deus, foi dado à Igreja. A santa Igreja o recebeu. Assim, com o consenso da Igreja, expresso em seus muitos concílios, Deus entregou o cânon à Igreja e essa o definiu infalivelmente.

 

Comentário: O único registro fiel da tradição

Quando a Bíblia ordena a guardar as tradições, essas foram ensinadas pelos apóstolos, oralmente, e não escritas naquele momento. Assim, esses ensinos foram sendo transmitidos, pelos bispos, naquelas igrejas antigas, à posteridade, de modo que a autoridade da Igreja distingue a tradição apostólica em meio a muitas tradições.

Entre os escritos patrísticos, os sínodos, concílios, documentos papais, há a tradição apostólica, Nem tudo o que é escrito reflete a tradição apostólica, embora seja tradição geral da Igreja Católica.

Assim, quando a Bíblia manda seguir as tradições, como em 1 Coríntios 11, 2 e 2 Tessalonicenses 2, 15, essas tradições não foram escritas, pois do contrário o apóstolo não as teria mencionado por nome, mas as identificado uma por uma. Então, há tradições que não foram escritas, mas que os cristãos, seguindo a Bíblia, como os textos acima, guardaram. Isso pode ser acessado por meio do ensino da Igreja oficial, nos seus concílios. Assim, o cânon que foi definido em Cartago, em 397 d. C., é o mesmo de hoje, pois foi o que os apóstolos deixaram.

Então, como acessar o cânon bíblico? Pela leitura da Bíblia? Não diretamente, pois não há a lista dos livros inspirados escrita na Bíblia. Mas, uma vez que a Bíblia manda ouvir a Igreja, descobrimos o cânon ouvindo a Igreja, em seus concílios, e acessamos o cânon bíblico inteiro. Por tudo isso, o Sola Scriptura, da forma em que ensinado no Protestantismo, está refutado.

 

Comentário: O livre-exame da Escritura

Então, precisamos mais do que temos na Bíblia? Não, se isso significa que há algo que esteja falando na Palavra de Deus. Mas, sim, de alguma forma, como foi ensinado acima: o cânon da Bíblia não foi escrito infalivelmente na Bíblia, mas essa instrui a ouvir a Igreja, que é infalível, e uma vez que a Igreja ensina o cânon, temos certeza do mesmo.

O mesmo ocorre com todas as doutrinas que são discutidas e definidas em concílios. A Bíblia aponta a autoridade da tradição, e da Igreja, em seu magistério.

O texto bíblico possui um significado próprio, e esse é ensinado pela Igreja, nos pontos discutidos, aqueles que geram dúvidas, que não são claros a todos. Isso ficou claro acima.

O mesmo problema é posto pelo pastor aqui. Ele tenta refutar a ideia de que a Igreja confere autoridade ao texto, o que não é verdade. A Igreja interpreta a Bíblia para descobrir o seu sentido. Ela está à serviço da Palavra de Deus.

O processo de interpretação, que é possível a todos, é entregue de forma oficial por Jesus à Igreja: Quem vos ouve, a mim ouve. Essas palavras possuem sentido desde os dias dos apóstolos até a parusia.

A exegese do grego, a oração ao Espírito Santo para que nos revele a verdade, a comparação com as histórias interpretativas da tradição, que qualquer um pode fazer, com a formação necessária, é claro, não está com a promessa de Jesus à Igreja inteira, por meio do seu magistério. De fato, os apóstolos foram os únicos que receberam a autoridade para ensinar e batizar, e assim o passaram aos sucessores.

A Igreja docente é que possui a promessa de ser coluna e sustentáculo da verdade, e assim, quando há dúvidas, é necessário recorrer à tradição, ao magistério, e não se ater à própria interpretação nem a qualquer interpretação nova que surja por alguém em contraposição à autoridade legítima.

O pastor fala da perspicuidade da Escritura. O homem comum dotado de mínima habilidade de leitura pode entender as doutrinas da Escritura, e as doutrinas mais difíceis são poucos.

Portanto, em primeiro lugar, os protestantes devem reconhecer que para a salvação os cristãos católicos já possuem o conhecimento da Palavra de Deus.

O autor protestante, citando Chesterton, afirma de passagem: “que ironicamente era católico”. Não se trata de ironia, mas Chesterton conseguiu compreender a verdade católica, e todos os que a compreendem se convertem à fé cristã católica.

O pastor fala de “cristãos da cidade de Bereia”, citando Atos 17, 11. No entanto, eles ainda eram judeus não cristãos. Os judeus de Bereia tinham as Escrituras, mas a revelação a respeito de Cristo veio dos apóstolos. Após a pregação apostólica, eles examinaram as Escrituras e se converteram.

Nenhum cristão podia discordar da interpretação dos apóstolos, já que eles eram inspirados, tinham consciência de sua autoridade, e estavam certos daquilo que ensinavam. Os de fora, judeus e pagãos, podiam discutir com os apóstolos, e uma vez convertidos se colocavam sob a sua autoridade, que era conferida pelo próprio Jesus Cristo.

Não aceitando isso, o pastor contraria sua própria compreensão da inspiração dos apóstolos, que o mesmo expõe em seu texto.

 

Comentário: A suficiência da Escritura

A respeito da suficiência da Escritura, ao citar 2 Timóteo 3, 14-4,5, em si mesma a Bíblia é suficiente. Mas, e para o leitor? Se for mal compreendida, pode ser motivo de perdição, porque aqueles que são ignorantes das coisas de Deus distorcem as Escrituras para sua própria ruína (cf. 1 Pedro 3, 16).

Desse modo, é preciso ter o sentido correto da doutrina bíblica. Assim, o texto de Efésios 4, 11-16 ensina a suficiência da Igreja, o que está conforme já explicado acima. E ainda assim, os que não ouvem a Igreja estão fora do rebanho de Cristo. A Bíblia aponta para a Igreja Católica, e a Igreja Católica ensina o que está na Bíblia.

 

Comentário: Conclusões e aplicações

O cânon foi definido em concílio. Antes disso, havia dúvidas. Dessa forma, a Igreja reconheceu e recebeu o cânon. As tradições são poucas que estão fora da Bíblia, mas são importantes, por serem Palavra de Deus e serem ordenadas na própria Escritura. Assim, algumas doutrinas, a forma de batizar, o sinal da cruz, o modo essencial de celebrar a liturgia, certas festas litúrgicas, e etc, que são todas bíblicas, estão mais claras na tradição, são de origem apostólica. É preciso obedecer a Bíblia, e assim devemos crer na tradição e na Igreja.

 

Comentário: Para concluir, cinco aplicações para a vida:

Os cristãos católicos têm a Bíblia na mais alta conta. Pelo exposto acima se vê como é que devemos entender o Sola Scriptura segundo a doutrina católica. Os pronunciamos infalíveis da Igreja ensinam as verdades bíblicas. A Palavra de Deus é a norma. Tudo o que a Igreja Católica ensina está conforme a Bíblia.

Esse estudo foi feito a partir do capítulo um do livro O Cristão Reformado, do pastor Yago Martins.

Gledson Meireles.

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