quinta-feira, 19 de dezembro de 2024

A virgindade perpétua de Maria

A virgindade perpétua de Maria

O presente artigo refuta um vídeo de um apologista protestante, Juan Oliveira. 

O apologista protestante afirma que vai esfarelar o dogma da virgindade perpétua, dando uma refutação definitiva. Isso não é possível, por alguns motivos, citados abaixo aleatoriamente.

O primeiro é que na antiguidade cristã todos criam na virgindade perpétua de Maria, e quando a primeira negação importante dessa verdade foi feita, no século 4º, isso foi considerado uma heresia.

O segundo é que os cristãos falantes do grego sempre entenderam que a palavra irmãos usada para referir-se aos parentes de Jesus não tinha a conotação literal de filhos dos mesmos pais.

Terceiro, a Igreja pronunciou-se definitivamente diante das heresias, e definiu a virgindade perpétua de Maria. Uma vez que a Igreja é guiada à verdade, não pode haver erro em questões de fé e moral.

Quarto, mesmos reformadores protestantes, crendo na Bíblia como única regra de fé e prática, puderam defender a virgindade de Maria pela Bíblia, como o fizeram Lutero, Calvino e outros. Dessa forma, a doutrina contrária é uma novidade, ou um erro antigo renovado.

Quinto, em um estudo da Bíblia, um estudo robusto, sincero e profundo, todos os argumentos contrários se mostram fracos. O termo grego e hebraico para até que não necessariamente refere-se ao tempo posterior, frisando apenas o assunto tratado no momento. A palavra primogênito é termo técnico na Bíblia e indica o primeiro nascido, ainda que não nasça mais filhos. Nesse caso, o apologista já percebeu que o argumento com base no termo primogênito é falho. O termo irmãos possui sentido amplo na Bíblia, como marca da cultura judaica, e isso é traduzido no termo grego adelphos. Aliás, os irmãos de Jesus agem como se fossem mais velhos, o que indica não serem de fato filhos de José e Maria. Nunca são chamados de filhos de Maria. Uma tradição antiga aponta que são filhos de José de um casamento anterior, do qual ficara viúvo. Só aparecem na vida pública de Jesus, não sendo mencionados na infância de Jesus. O termo irmãos, para tratar dos parentes de Jesus, é usado na antiguidade por todos os que defendem a virgindade perpétua de Maria. E, por fim, os irmãos de Jesus, citados nominalmente, têm seus pais revelados na Bíblia, de modo bastante suficiente para convencer o estudioso das Escrituras.

 

Vejamos mais de perto os argumentos protestantes apresentados no vídeo.

1º) Até que

O texto de Mateus 1, 25. O “até que”, conjunção subordinativa temporal, a condição é a gravidez de Maria. Após esse tempo José poderia tocar sexualmente em Maria. A resposta apologética simples é: NÃO necessariamente.

Temos alguns textos citados.

E, sem que ele a tivesse conhecido, ela deu à luz o seu filho, que recebeu o nome de Jesus (Mateus 1, 25)

Ensinai-as a observar tudo o que vos prescrevi. Eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo (Mateus 28, 20).

Porque é necessário que ele reine, até que ponha todos os seus inimigos debaixo de seus pés (1 Cor 15, 25).

E Micol, filha de Saul, não teve mais filhos até o dia da sua morte (2 Sm 6, 23).

Os textos de 1 Cor 15, 25, onde é usado o termo áchri, para até que. Jesus vai parar de reinar? Não. Mas o reino mudará, seria a resposta. A ênfase, porém, é que Jesus deve reinar nesse período até colocar Seus inimigos sob Seus pés, não tendo nenhuma palavra sobre o que ocorrerá depois.

Mateus 28, 20. Eis que estarei convosco até o fim do mundo. Cristo ficará com a Igreja espiritualmente e depois da volta estará fisicamente. A ênfase é na companhia de Jesus com a Igreja até o fim do mundo, não tendo nada a tratar para o que ocorrerá posteriormente.

Outro texto, o de 2 Samuel 6, 23. O termo hebraico para até que refere-se ao período de vida de Micol. Ela teve filhos após a morte? É claro que não.

Se o leitor percebeu, a força do “até que” continua. A Bíblia está ensinando que Jesus deverá reinar até que os inimigos sejam postos debaixo dos seus pés, e sabemos que continuará reinando no reino definitivo junto do Pai.

Jesus ficará com a Igreja até o fim dos tempos, e depois continuará com a Igreja na eternidade.

Micol, filha de Saul, não teve filhos até o dia de sua morte, e depois da morte não teve mais filhos.

A ênfase é dada ao que ocorre antes do até que, e não depois. Ou seja, o assunto é o que vem imediatamente anterior à expressão até que.

Vamos novamente, e repare nas respostas:

Jesus reina até certo período e deixa de reinar? NÃO.

Jesus promete ficar com a Igreja até o fim dos séculos, e depois a abandona? NÃO

Micol não teve filhos durante a sua vida, e depois, será que teve? NÃO.

José não conheceu Maria durante o período de gravidez, e depois, será que a conheceu? NÃO.

Interessante, para que o leitor entende de uma vez por todas, que o hebraico usa da expressão “até para sempre” (עַד־ עוֹלָֽם, ad owlam): “Toda a terra que vês, eu a darei a ti e aos teus descendentes para sempre”  (Gênesis 13, 15).

Isso é para que os protestantes entendam que essa partícula grega e hebraica para o até que tem em vista frisar um período de tempo sem ter em conta o que virá a ocorrer depois. Não se está negando o reino de Jesus após a ressureição, nem sua presença na Igreja após o fim do mundo, nem ensinando que Micol teve filhos após a morte. O que o texto bíblico está ensinando tem a ver com o que ocorre antes do “até que” e não pensa no que deve acontecer depois, pois não é o objetivo do ensino.

Desse modo, para saber o que vem após, é preciso conhecer outros dados da Bíblia. Esses dados vão além da expressão até que. Assim, sabemos que Jesus continuará a reinar, que continuará com a Igreja, que Micol não teve filhos e que Maria não teve outros filhos após o nascimento de Jesus.

Vamos pensar novamente: nesses casos o texto bíblico não quer ensinar que Jesus deixará de reinar, nem que deixará de permanecer com a Igreja, nem que Micol tenha tido filhos após sua morte, nem que José tenha conhecido Maria após o nascimento de Jesus. Agora, certamente ficou claro.

O estudioso da Bíblia não usa o argumento do “até que” contra a virgindade de Maria, pois o contexto não leva a isso.

 

2º) Irmãos

            Em Colossenses 4, 10, citando o primo de Barnabé, o apóstolo usa a palavra anepsios, sugerindo que haveria rígida acepção. Em 1 Cor 9, 5 é empregado o termo adelphos.

O Salmo 69, que é messiânico, não usa o versículo 8 para aplicá-lo  Jesus, o que mostra que Maria não teve filhos. Do contrário, esse versículo seria totalmente apropriado.

O texto de João 2, 16 é o texto do Salmo 69, 9. O texto de João 15, 25 é citação do Salmo 69, 4. São João escreve: “para que se cumpra a Palavra”, e cita o Salmo. Em João 2, 17 os discípulos lembraram do que está escrito: O zelo pela tua casa me consome, que é o Salmo 69, 10. Para o verso 8 não há nada.

“Lembraram-se então os seus discípulos do que está escrito: O zelo da tua casa me consome” (João 2,17). Salmo 69, 10: “É que o zelo de vossa casa me consumiu, e os insultos dos que vos ultrajam caíram sobre mim”.

“Salmo 69, 5: Mais numerosos que os cabelos de minha cabeça são os que me detestam sem razão. São mais fortes que meus ossos os meus injustos inimigos. Porventura posso restituir o que não roubei?”

“Mas foi para que se cumpra a palavra que está escrita na sua Lei: Odiaram-se sem motivo” (João 15, 25)

Salmo 69, 9: Tornei-me um estranho para meus irmãos, um desconhecido para os filhos de minha mãe. Nenhum versículo do Novo Testamento possui essas palavras. Assim, o Salmo não fala de Maria, não fala de irmãos de Jesus.

 

3º) Tiago

O apologista distingue os textos de:

Mateus 10, 2

Mateus 10, 3

Mateus 13, 55 e Gálatas 1, 19

Mateus 27, 55-56

Lucas 6, 16

Com isso, seriam pelo menos cinco homens com o nome de Tiago.

No entanto, Tiago menor é o mesmo em 5 textos citados: o mesmo Tiago está em Mateus 10, 3, Mateus 13, 55, Gálatas 1, 19, Mateus 27, 55-56 e Lucas 6, 16.

Portanto, há dois Tiago: o filho de Alfeu e o filho de Zebedeu. O filho de Alfeu é o irmão Judas.

Quando os protestantes tentam identificar as mulheres que estavam no calvário, no dia da crucificação de Jesus, afirmam que a Maria mãe de Tiago seria a mesma mãe de Jesus, pois são Marcos não omitiria a presença da mãe de Jesus aos pés da cruz.

No entanto, ao citar Marcos 15, 40, o texto não afirma que essas mulheres estavam aos pés da cruz, mas olhavam de longe. Somente depois, por certo, elas aproximaram-se da cruz, e lá encontraram Maria e João, como está em João 19, 25.

Além do mais, a leitura básica do texto de Marcos 15, 40-47 mostra que essa Maria não era a mãe de Jesus, pois o texto inteiro se refere a Jesus, mas ao tratar dessa Maria o evangelista mostra, mais uma vez, que ela é mãe de Tiago, o menor, e de José, e no verso 47 menciona a mesma como mãe de José.

Há certos relatos que os evangelistas omitem, o que podemos encontrar por meio da leitura dos outros evangelhos. Um exemplo é o texto de Marcos 15, 32: “...Também os que haviam sido crucificado com ele o insultavam”. Ou seja, os dois ladrões insultavam a Jesus. No entanto, em Lucas 23, 39-40 temos que um dos malfeitores blasfemava contra Jesus e o outro o defendeu. Assim, sabemos que um dos ladrões se converteu.

Façamos agora a exegese do texto de Marcos 15,40-41.46-47:

v. 40: Achavam-se ali umas mulheres, observando de longe, entre as quais Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, o menor, e de José, e Salomé.

Essas mulheres olhavam de longe a cena da crucifixão. O evangelista menciona três mulheres, a alude e outras, pois essas estavam entre elas. É de se esperar que são mulheres mais conhecida, visto que os evangelhos citam-nas nominalmente.

Uma dessas mulheres é Maria, mãe de Tiago, o menor, e de José. Esse Tiago é o apóstolo menor, nome que o distinguia do Tiago maior, filho de Zebedeu.

v. 41: Que o tinham seguido e o haviam assistido, quando ele estava na Galileia; e muitas outras que haviam subido juntamente com ele a Jerusalém.

Veja o leitor que o texto tem por referência a Jesus, narrando em 3ª pessoa: o tinham seguido; o haviam assistido; quando ele; e muitas outras que haviam subido juntamente com ele.

Portanto, essa Maria não é mãe de Jesus, mas subiu com Ele a Jerusalém, juntamente com as outras mulheres, pois eram suas seguidores e o assistiam no ministério.

Desse modo, enfatizando essa Maria, a frase é resumida da seguinte maneira: Achavam-se ali, observando de longe, algumas mulheres, entre as quais Maria, mãe de Tiago, o menor, e de José, que o tinham seguido e assistido com ele estava na Galileia, e havia subido com ele a Jerusalém. O texto é claro de que se trata de outra Maria, como diz o evangelho de Mateus 28, 1.

v. 46: Depois de ter comprado um pano de linho, José tirou-o da cruz, envolveu-o no pano e depositou-o num sepulcro escavado na rocha, rolando uma pedra para fechar a entrada.

O versículo é citado para o propósito atual, o de demonstrar que todo o contexto trata de Jesus, e ao mencionar a outra Maria, o evangelista afirma que ela é mãe de outra pessoa, como está, novamente, no versículo seguinte.

v. 47: Maria Madalena e Maria, mãe de José, observavam onde o depositavam.

O mesmo é escrito em Mateus 27, 60s.

v. 60: E o depositou num sepulcro novo que tinha mandado talhar para si na rocha. Depois rolou uma grande pedra à entrada do sepulcro e foi-se embora.

v. 61: Maria Madalena e a outra Maria ficaram lá, sentadas defronte do túmulo.

Portanto, está provado de que essa Maria não é a mãe de Jesus, mas é mãe de Tiago e José, a outra Maria. Então, Marcos não fala da mãe de Jesus, pois estava falando das mulheres que estavam longe da cruz. Somente São João relata o momento da entrega de Maria a João, quando Maria estava ao pé da cruz, e as outras mulheres aproximaram-se. Depois, pelo relato, essas mulheres voltaram a observar de longe.

Outra observação importante, é que Maria, mãe de Jesus, ficou aos pés da cruz, e nunca observando de longe. Também, ela não foi até o túmulo na manhã de domingo, pois sabia que Jesus iria ressuscitar. Sua fé não vacilou um só instante.

As mulheres se lembraram das palavras de Jesus, sobre a ressurreição, apenas após a visão do anjo (Lucas 24, 8). Os apóstolos, e as mulheres, discípulas, estavam tristes e caíram em dúvida, mas não a mãe de Jesus (cf. Lucas 24, 11). São Pedro foi ao sepulcro e voltou para sua casa (Lucas 24, 12). Assim, também, João, que acreditou na ressurreição naquele momento, quando entrou no túmulo e não viu o corpo de Jesus. Ele voltou para sua casa (João 20, 10). E, como sabemos, Maria estava na casa de João. Esse é um exemplo da fé inabalável da virgem Maria, ficou com Jesus até o fim, aguardou a ressurreição, não foi ao sepulcro, pois já tinha fé perfeita na divindade e creu na ressurreição.

E São Jerônimo nota com grande perspicácia que os texto de Mateus 13, 56 fala de “todas” as irmãs de Jesus, o que sugere serem muitas, não apenas 2 ou 3. De fato, a palavra todas é usada para todas as gerações, todas as tribos, todas as igrejas, e todas as pessoas, em contexto de um número bem maior que três. Assim, mais uma vez sugere que essa parentela de Jesus era proveniente de outros genitores, que não a Sua mãe.

4ª) Ossuário de Tiago

A teoria mais antiga na Igreja afirma que José tinha filhos de um casamento anterior. Esses certamente seriam reputados como irmãos de Jesus. Sendo eles, Tiago, José, Judas e Simão, então, ao encontrar uma inscrição “Tiago, filho de José, irmão de Jesus”, seria apenas uma comprovação dessa explicação. Nada que negue a virgindade de Maria, pois esses mencionados irmãos de Jesus não são seus filhos.

Quando cremos que Maria permaneceu virgem para sempre estamos vislumbrando a dignidade da origem de Jesus como Homem. Sua mãe, concepção, nascimento foram preparados por Deus. Crer na virgindade de Maria tem a ver com a fé no Deus-Homem Jesus.

Esse fato foi como que uma pregação aos contemporâneos de que Jesus veio do céu. De fato, como poderia uma mãe com diversos filhos afirmar que o primeiro apenas era de origem divina?

A própria apresentação de Jesus diante dos povos como vindo do céu foi melhor aceita ou teve menos obstáculos porque era filho único. Assim, eles podiam afirmar que seu pai era José, sua mãe Maria, e mencionar seus irmãos, sendo parentes, é claro, como algo que não condiria com Sua origem divina.

Desse modo, aqueles contemporâneos deveriam saber que José não era biologicamente pai de Jesus, e que aqueles irmãos não eram filhos de Sua mãe. Tudo ali era fruto da Providência Divina, obra da graça.

Então, crer na concepção virginal é um dado bíblico de suma importância. Segue-se a virgindade perpétua.

Gledson Meireles.

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