Adoração
localizada no Antigo Testamento
Quando entendemos a
adoração a Deus no Antigo Testamento compreendemos melhor também o uso das
imagens. Devemos nos lembrar que o único Povo eleito por Deus foi o Povo de
Israel. Desse modo, para conhecer o verdadeiro Deus devia-se ter contato com o
povo judeu, e conhecer a revelação de Deus em seu meio.
Entretanto, o culto oficial
no Antigo Testamento existia no início somente na tenda da reunião. Mais tarde,
quando o templo foi construído, o único lugar de culto foi o templo, em
Jerusalém. Nos dias de Cristo era assim, embora houvesse sinagogas onde todos
os judeus reuniam-se para ler as Escrituras, rezar e adorar a Deus, o Templo constituía
o lugar onde os sacrifícios eram realizados, o lugar de peregrinação, o lugar
das festas, e o único lugar legítimo de adoração na terra.
Desse modo, quando os
judeus estavam fora da Palestina, quando iam rezar voltavam-se para o lado onde
está localizada Jerusalém. Esse era o modo que deviam observar.
Com a vinda de Cristo,
tudo isso foi mudado. De fato, Jesus afirmou que todos adorarão o Pai em
espírito e em verdade. (João 14,22-23). Ninguém precisará mais ir a Jerusalém
para adorar a Deus, pois a Igreja é universal, onde todos, em qualquer lugar
que estiver, podem adorar a Deus. Essa adoração ocorre no coração de cada fiel.
Em grego é expresso geralmente pela palavra sebomai
(adorar). Em Marcos 7,7 eles adoram é sebontai.
É o respeito, a alta estima, a veneração por alguém. É também usado para
falar da adoração a Deus.
Entendendo esse
cenário, vemos que o uso das imagens no Antigo Testamento estava restrito a um
único lugar: o Templo. A uma única cidade: Jerusalém. Os judeus não tinham
“templos” espalhados por onde passavam, nem onde moravam na dispersão, e,
então, mesmo os judeus da diáspora tinham Jerusalém como centro de sua religião,
e para adorarem publicamente iam anualmente a Jerusalém, e para oferecerem
sacrifícios deviam, ao menos, enviar suas ofertas a Jerusalém.
Assim, as imagens que
estavam no templo somente poderiam estar ali, e nem as sinagogas possuíam tudo
o que havia no templo. Muito menos nas casas. As sinagogas eram apenas lugares
de oração e de alguns serviços religiosos.
Fazendo a devida
transferência para os tempos do Novo Testamento, após a vinda de nosso Senhor
Jesus, é o único meio para que compreendamos o modo dos cristãos poderem
utilizar-se das imagens sagradas.
Desse modo, as imagens
do Novo Testamento podem estar em todas as igrejas, pois a adoração é
espiritual, não havendo mais limite de lugar, está dentro do fiel onde quer que
ele esteja, e os lugares de culto cristão podem ser construídos em qualquer
localidade, com o mesmo valor em toda a parte, e podem conter as mesmas
características.
Assim, as imagens podem
ser feitas para decorar e ensinar os mistérios cristãos, e servir de auxílio de
devoção, e serem colocadas em quaisquer igrejas, sendo usada na devoção e
ensino, pois a Igreja Católica é, como sua própria natureza diz, universal. O
que não podia ser feito no Antigo Testamento, por sua limitação, e por sua
adoração restritamente localizada, pode ser feito no Novo Testamento, em grande
escala, pois o Povo de Deus está em toda a terra, e o centro é o Templo do
Corpo de Cristo, não havendo mais lugar na terra para limitar alguns aspectos
do culto espiritual, racional e substancial cristão católico. Por esse motivo,
as imagens ocupam lugar importante no culto a Deus, e são usadas em vários
lugares, e podem ser multiplicadas.
Uso localizado das imagens no Antigo
Testamento
Em princípio, no Antigo
Testamento, como visto, já pode-se esperar a pouca quantidade de imagens, pois
seu culto é feito principalmente em um único lugar, em Jerusalém, que é o
centro da religião verdadeira antiga, mesmo para os judeus que estão na
diáspora.
Por isso, não se pode
pensar em termos do Novo Testamento, como se em cada localidade fosse
construído um templo, e que isso pudesse ser feito, e que em cada templo
houvesse infinidade de detalhes artísticos e objetos cultuais, e que as
sinagogas fossem a continuação do templo, diferindo apenas em quantidade de
utensílios religiosos. Não é isso.
O Antigo Testamento tem
o culto centralizado, um único templo, com o seu Santo dos Santos, com uma
única arca, etc. O que acontecia nesse local primordial da adoração ao
verdadeiro Deus é o que testemunha a doutrina a respeito do uso das imagens que
ali estavam, e é o que foi provado acima.
Assim, os israelitas
não fabricavam arcas da aliança, mas conservava somente uma, não faziam
querubins e nem multiplicavam quaisquer outros utensílios, como não construíam
mais templos e etc. Essa limitação não existe mais no Novo Testamento.
Da mesma forma, os cristãos
não constroem templos no modelo idêntico ao templo antigo, nem usam réplicas da
arca, nem fazem querubins, ou bois, ou a serpente de bronze e etc., nem usam os
utensílios próprios do culto do Antigo Testamento, pois seguem nessa questão o
princípio e não a cópia dos materiais.
Adoração
íntima no Novo Testamento
O Novo Testamento
mostra que o novo Templo é o Corpo de Jesus Cristo, que assumiu a natureza
humana, e pelo Seu corpo, como instrumento de salvação, Jesus nos salvou.
“Destruí esse templo”.
“Falava do templo do
Seu corpo”.
Jesus mandou destruir o
templo, e disse que Ele o reconstruiria em três dias. Falava do Seu Corpo, não
do templo literal de Jerusalém. Foi usada a figura do templo para mostrar que
na Nova Aliança Seu Corpo é o novo Templo.
Esse é o lugar
definitivo de adoração. Assim, a adoração verdadeira deve ser feita em Cristo e
no Espírito Santo. É também no íntimo do coração e na verdade da doutrina
ensinada por Jesus:
“Mas vem a hora, e já chegou, em que os verdadeiros adoradores hão de
adorar o Pai em espírito e verdade, e são esses adoradores que o Pai deseja.
Deus é espírito, e os seus adoradores devem adorá-lo em espírito e verdade.
(João 4,23-24)
Dessa forma, em todos
os lugares da terra podemos adorar a Deus por estarmos espiritualmente em Jesus
Cristo que é o Novo Templo.
Uso
difuso das imagens no Novo Testamento
Ao passar para o Novo
Testamento, a adoração eminentemente espiritual liberta a restrição estritamente
“localizante” da liturgia antiga, e as profecias da propagação da fé cristã em
toda a terra têm o seu cumprimento em Jesus Cristo de Nazaré, o Messias.
No entanto, não
deveremos esperar que o aparecimento das imagens sagradas no Novo Testamento
tenha ocorrido já nos primeiros dias, em larga escala, com o culto eminentemente
desenvolvido como ocorreu mais tarde. Fazer isso é ter um olhar anacrônico.
Ainda mais quando entendemos que o culto das imagens nunca foi essencial. O que
deve ser apreciado é o testemunho doutrinal, como está sendo feito no presente
estudo, e sua continuação e aperfeiçoamento no Novo Testamento.
Com as conversões dos
primeiros pagãos, como a família de Cornélio (cf. Atos 10) e a evangelização
das regiões em todo o Império pelas viagens de São Paulo, é natural que a arte
cristã tomasse novo fôlego. Ainda que o culto cristão não pudesse ter sua
expressão pública, pois eram constantes as perseguições, e que o uso das
imagens fosse reduzido nesse tempo, no que concerne aos espaços abertos, pois
era diferente os espaços escondidos, pois o que mostra a arqueologia em
referência aos esconderijos cristãos é bastante diverso.
Na verdade, nas catacumbas
de Roma é que os cristãos usavam a arte de forma constante, e as imagens
pintadas foram a forma mais empregada nos lugares de culto. Há pinturas da
Pomba, que é símbolo do Espírito Santo, pinturas de Cristo carregando a cruz, e
de Cristo carregando a ovelha perdida, a pintura do Cordeiro e outras.[1]
Não é possível verificar qual era honra que essas imagens recebiam, mas é
possível ver, pelos princípios bíblicos já definidos, que não eram apenas
decoração, mas serviam de instrução e inspiração para o culto. Disso é
necessário discorrer um pouco mais.
Nos tempos de terríveis
perseguições os cristãos passaram a reunir em esconderijos. Em Roma eles viviam
nas catacumbas, enterravam os mortos, celebravam a missa. Esses locais estão
cheios de pinturas por todos os lados, com símbolos, sinais e desenhos, como
reconhece a obra citada no início deste estudo. Permanece assim a diferenciação
básica entre os ídolos e a arte cristã legítima, pois os cristãos não dobravam
os joelhos e não faziam qualquer reverência às imagens do imperador e dos
deuses (e da mesma forma não fariam para com pinturas, desenhos, figuras do
imperador e dos deuses). Também não imitavam as mesmas figuras que os pagãos
usavam.
É oportuno comentar
Lucas 19,40, quando Jesus afirmou que se a multidão calasse, as pedras
gritariam, usado na obra em referência à tamanha prodigalidade de pinturas nas
catacumbas. O que devemos notar, porém, é que os cristãos nesse tempo não
calaram, nem calariam por nada, enfrentando mesmo o martírio para ser leais a
Jesus Cristo. Portanto, as artes das catacumbas não nasceram do silêncio na
pregação do Evangelho, mas acompanhavam a expressão da grande espiritualidade
desses fecundos tempos ungidos pelo Espírito Santo. Eles pregavam o Evangelho,
e usavam a arte também.
Os protestantes
consideram os sinais de veneração das imagens como “práticas idólatras”. Essa
objeção foi refutada no presente estudo de forma cabal. Argumentam que por não
encontrarem nada relacionado às imagens das catacumbas, isso seria o sinal de
que os cristãos nada faziam endereçado a elas. Mas tal argumentação é inócua
nesse assunto, pois o fato da existência de imagens (mesmo que sejam apenas pinturas)
na igreja desse tempo, iniciado no século 1, é uma prova da prática cristã de
sempre. E como deduz legitimamente desse fato das imagens serem usadas nos
locais de culto, significa que eram veneradas, ainda que não tenhamos registros
pormenorizados dos gestes, ritos e outras coisas relacionadas a essa veneração.
A hipótese de que os
cristãos eram iletrados em número elevado, o que faziam-nos usar símbolos e
desenhá-los, não explica tudo, pois os séculos foram desenrolando e a arte
cristã continuou em desenvolvimento. Ainda quando a cultura letrada aumentou a
arte cristã permaneceu, aumentando igualmente.
O autor tenta uma
explicação tímida, e em nada harmoniosa com a doutrina protestante: “Todas
essas representações demonstravam apenas o apego que aqueles crentes romanos
tinham às Escrituras Sagradas.” (SILVA, p. 32) Mas a insistência de que as
imagens não recebem “culto e veneração” é infundada. O que elas não recebiam era
a adoração devida a Deus. O máximo que pode-se levantar é o que está explicado
na Enciclopédia Católica, que afirma não sabermos como eram tratadas essas
imagens nesse tempo, por falta de registros explícitos sobre isso. O que
podemos conjecturar é que eram veneradas, pelo que representam e onde eram
usadas, não sabendo apenas “o modo” como isso ocorria. Portanto, é incorreto
afirmar: “Não existia o menor sinal de reverência por parte daqueles cristãos
quanto a essas imagens pintadas.” Disso dizem que ninguém “dobrava o joelho”,
“beijava”, “queimava incenso” “dirigia oração”, etc.
Obviamente ninguém
fazia isso com o mesmo sentido que ocorria no paganismo. Mas, se havia algo
semelhante e com conotação cristã, tal fato não pode ser negado. Afirma a
Enciclopédia, citada à página 33 da obra em referência: “Por outro lado, o
lugar de honra que dão aos seus símbolos e pinturas, o cuidado com o que
decoram, indicam que tratavam as representações de suas crenças mais sagradas
com pelo menos uma decente reverência”. Eis o que está conforme o princípio
cristão da veneração das imagens, e o fato é inegável.
Contudo, o autor
afirmou que a conclusão “do autor católico é forçada” por falta de provas de
sinais de reverências às pinturas! Lamentável.
Isso não pode ser negado,
pois isso provém da justa análise do fato e da correta dedução do mesmo. É
negado pelos protestantes que a veneração de imagens tenha nascido da prática
cristã às imagens das catacumbas, o que já configura uma acusação de que venha
de outra fonte. O problema é que não há nenhuma prova, nem mesmo indireta, que
possa substanciar essa objeção.
Incorreto, por afirmar
algo que contradiz a realidade e não está e acordo com os indícios que dela
decorrem.
Enfim, o homem deseja
naturalmente ver mesmo aquilo que está relacionado ao domínio da fé. É assim
que muitos judeus pediam sinais, para que vessem e pudessem crer, manifestando
uma natural tendência humana, que deve ser orientada pela fé.
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