sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

Livro: A lenda da imortalidade da alma: sobre a tradição

 Refutação: O apelo à tradição

Quando se nega a autoridade infalível da tradição, que é a tradição apostólica, o afastamento da verdade é inevitável. E mesmo entre os protestantes, quando é negada a grande autoridade dos concílios protestantes, o fiel busca para si, e tem diante de si, autoridades menores, que ele cria para si mesmo involuntariamente, como por exemplo, segue impensadamente o que ensinam outros eruditos que se afastaram da tradição por seus estudos e interpretações particulares que, com o tempo, começam a formar uma pequena tradição para si mesmos, tradição essa que condiciona as novidades teológicas, o que na prática volta a ser, de certa forma, o que sustenta o dogma. Pensam estarem incondicionados, mas seguem uma tradição, ou criam dogmas sustentados por sua própria autoridade.

Assim é que, quanto à doutrina mortalista, vários estudiosos protestantes adotaram o sono da alma ou a inexistência da alma na morte, formando assim, uma nova tradição.

A possibilidade de que a doutrina não tenha sido preservada infalivelmente abre espaço para toda e qualquer falsa doutrina. É um perigo. Humanamente falando é impossível manter a verdade infalivelmente, mas o que se crê na Igreja Católica é que em se tratando de certas verdades importantes o Espírito Santo guia a Igreja à verdade.

Se em determinada época e Igreja viu-se na controvérsia sobre a imortalidade da alma e fez pronunciamento de que a alma é de fato imortal, então é impossível que isso tenha sido errado, pois a Igreja, em sua universalidade, é coluna e sustentáculo da verdade, como ensina a Escritura. Isso é o que traz a certeza.

Ainda, cada dogma consegue ficar de pé diante das mais terríveis objeções, como está sendo provado aqui, onde cada argumento mortalista é enfraquecido e refutado à medida que se aprofunda em cada um deles.

E mais. Há momentos em que as implicações dos estudos bíblicos tornam impossível a doutrina da morte da alma com o corpo.

Interessante é que sempre nas melhores interpretações possíveis, em todos os assuntos bíblicos, o que se chega é ao que a Igreja Católica já ensina. Por isso, mesmo que os mortalistas tenham certos argumentos bons e plausíveis, eles não conseguem vencer os argumentos que sustentam a posição tradicional de que a alma é imortal. Os mais fortes argumentos imortalistas não conseguem ser respondidos pelos mortalistas.

 

O autor afirma que a missa não poderia ser mudada nunca, segundo doutrina católica, citando a bula Quo Primum Tempore (1570), e que não existe a Tradição, mas somente tradições divergentes, etc.

Um exemplo de mudança de tradição seria o milenarismo que deu lugar ao amilenismo. Mas, pelo que se vê na Igreja, ainda que no tempo em que renomados autores ensinavam o milenarismo, a opinião geral era de que isso não podia dividir, não era dogma, e que muitos ensinavam o amilenismo, ficando portanto conforme a tradição católica aquilo que o magistério defendeu, mais tarde, o que está mais de acordo com o amilenismo.

 

Então, tudo deveria ser discutido à luz da Bíblia através de uma hermenêutica séria, como se isso não fosse feito por todas as igrejas. Na verdade, isso acontece sempre entre sérios eruditos, mas ainda assim pode haver erros. O Espírito Santo é que dirige a Igreja e a defende do erro.

 

A base comum sendo a Bíblia para definir com a confissão protestante está mais próxima da verdade ainda é um pouco problemático, porque as consciências individuais divergem. Assim, o conjunto do dos clérigos, papa e bispos, em uma doutrina geral promulgada é o que cremos ser o que ensina o Espírito Santo.

 

A lógica que o autor apresenta para a existência do magistério não é bem assim. Não é tão simples assim, como se o magistério se reunisse para interpretar a Bíblia para os demais membros da Igreja.

 

Os teólogos católicos estudam muito, são os mais profundos que existem em todas as confissões cristãs, basta dar uma olhada nas doutrinas e teses teológicas, basta ver o que diz a doutrina católica sobre a imortalidade da alma, como está sendo mostrado aqui. Os estudos acadêmicos na teologia católica contribuem para que o magistério da Igreja, em determinada ocasião, se assim for preciso, colha dados, informações, argumentos, etc., para fazer suas afirmações ordinárias e mesmo extraordinárias. Portanto, os católicos, leigos e clérigos, eruditos ou não, vão à Bíblia e contribuem, com toda a Igreja, no sensus fidelium, para que as doutrinas sejam esclarecidas para todos.

 

E se é a consciência individual que define tudo, então todos os católicos conscientes de que o magistério está correto e de acordo com a Bíblia e a Tradição estão certos e seguem corretamente a liberdade de suas consciências. E quanto à afirmação: “É o mesmo que dizer que você chegou à conclusão de que não pode interpretar a Bíblia interpretando a Bíblia”, certamente isso é um paradoxo e não uma contradição, já que todos sabemos que não podemos interpretar a Bíblia particularmente, pois a mesma é inspirada, e isso se conclui lendo a Bíblia.

 

Quem pensa estar livre para pensar, com sua consciência individual, que vai à Bíblia e usa as ferramentas hermenêuticas e exegéticas e tudo o mais que for possível, para concluir por si mesmo sem se submeter à tradição, ao magistério, e a quem quer que seja, ainda assim, em sua consciência individual terá que mostrar coerência, fé nas ferramentas que utiliza, dobrar-se diante das autoridades que cita, ainda que a contragosto e não admitindo, e com as quais concorda, que vieram antes dele e que indubitavelmente possui maiores conhecimentos naquele ponto do que ele, etc., trazendo tudo novamente para a mesma relação prática entre um católico fiel e a Bíblia, o magistério e a tradição.

 

A pesquisa que mostrou que mais da metade dos pastores nunca leu a Bíblia é bastante interessante. O autor diz: “imagine entre os padres”. Certamente, os padres, que supostamente leem menos a Bíblia que os pastores, na cabeça dos pastores é claro, em primeiro lugar, e da cultura geral em que os protestantes leem mais a Bíblia e possuem maior conhecimento dela. Certamente, os protestantes leem mais, mas não conhecem melhor a Bíblia.

 

Os padres devem ler a Bíblia e conhecê-la bastante bem para serem padres. Caso não a conheçam toda, nunca a tenham lido, vamos supor, ao se tornarem padres e participarem da missa diariamente, o que é comum acontecer, ao mesmo celebrarem a missa diariamente, estão lendo e ouvindo a leitura da Bíblia em sua quase totalidade em três anos, pois a liturgia católica apresenta aos fieis a Bíblia inteira em três anos litúrgicos.

 

A opinião de que a maioria dos padres, bispos e papas da história foram iletrados e etc., inclusive o magistério que se reunia em concílios, que não sabiam praticamente nada da Bíblia, e que os doutores de fato eram raros, é um equívoco.

 

De qualquer forma, é o Espírito Santo que guia a Igreja nesses momentos, e mesmo nos mais difíceis as doutrinas foram corretas, os dogmas podem ser estudados e confirmados pela maior erudição bíblica. A doutrina da imortalidade da alma está provada biblicamente. Alguém poderá ler a presente refutação é afirmar que ela não apresenta nenhuma refutação, que não mostrou nenhum argumento novo, que não merece resposta, que repetiu tudo o que já foi refutado no livro A lenda da Imortalidade da Alma, e etc. O mais difícil é apontar onde estão os erros, ainda que o leitor tenha diante de si o livro e a refutação, e é preciso apenas mostrar onde estão os erros, apresentando os motivos de serem erros. Esse tipo de abordagem é muito raro.

É certo que a verdade é imutável, e assim, as doutrinas verdadeiras não mudam, e são sinais da Igreja verdadeira. Por isso, os fieis são atraídos pela graça à verdadeira Igreja.

E sobre a leitura da Bíblia, que mais da metade dos pastores nunca leu, certamente isso não é a realidade dos padres, como os protestantes são inclinados a pensar, como se os pastores, que são solascripturistas, não leem a Bíblia como se imagina, os padres deveriam ler menos ainda. Porém, a realidade certamente é outra, e por que não pensar que os padres, por certo, na sua grande maioria, senão todos, leram a Biblia inteira.

Se os conciliares dos séculos passados, de cabelos grisalhos e barbas brancas, como afirma o autor do livro mortalista, tinham conhecimento questionável da Bíblia, e podem ter sofrido influências dos condicionamentos psicológicos do seu tempo, e que são tão humanos como qualquer pessoa, se esses tinham somente essas prerrogativas para decidirem questões de fé e moral nos concílios ecumênicos, então poderíamos duvidas. Mas, o que vemos é outro cenário. O que tudo evidencia é que esses homens de Deus tinham conhecimento profundo e viviam de acordo com a Palavra de Deus. E não somente isso. O Espírito Santo garante que tudo o que ali está decidido nas questões fundamentais para a vida espiritual e salvação das almas é  verdadeiro.

Obviamente, também, é natural que o conhecimento verdadeiro seja feito por instituições apropriadas para tal, de modo que nem em coisas menos significantes se pode esperar que cada indivíduo faça seu estudo de tudo para que se certifique de algo, mas os instrumentos e métodos para o ensino são ferramentas que fazem da transmissão do conhecimento algo mais rápido e eficaz, de modo que com o tempo aqueles que já estão bem formados possam por si mesmos verificarem aquilo que aprenderam e estão aprendendo. Dessa forma, é natural que todos sejamos ensinados pela santa Igreja, e cresçamos na fé em comunidade.

Mas, eis uma afirmação bastante ríspida: “Só que esses pastores e padres também não sabem nada, e só repetem aquilo que é a doutrina oficial da igreja, seja ela qual for.” Essa afirmação já está bem entendida, e por certo pode ser tomada apenas como um mínimo exagero.

E sobre o analfabetismo dos tempos medievais, onde mesmo membros do clero não sabiam ler e escrever, o que é atestado pelo historiador Ivan Lins, como citado no livro, isso se deve dizer que de fato houve tempos em que isso ocorreu, mas que o ensino oral era bastante eficiente e tudo indica que em muitos períodos daquela grande era medieval as pessoas simples podiam conhecer muito da cultura letrada por ouvir e assistir de teatros, encenações, etc.,que eram instrumentos bastante comuns para propagação da cultura, e da cultura bíblica, que estava de modo íntimo interligado a tudo o que pensava e sentia o povo medieval, que era muito cristão.

Dessa forma, a iluminação do Espírito Santo nos corações dos homens da Igreja, nos concílios e sínodos, principalmente nos concílios ecumênicos, garante a infalibilidade da doutrina cristã católica que perpassa os séculos.

Se os votos que aprovavam as doutrinas eram de “bispos iletrados, ignorantes, trapaceiros e depravados”, a mão de Deus foi mais poderosa ainda para garantir que nada daquilo que tais homens tinham de si mesmos em termos de crença pudesse ao menos influênciar a límpida e pura doutrina de Cristo. No entanto, por certo, que haviam iletrados, ignorantes, trapaceiros e depravados, isso existia, mas é de se pensar que a Igreja de Cristo foi sempre dirigida por santos papas, bispos, presbíteros e diáconos.

A tradição de cada demoninação tem enorme papel no credo. No entanto, a tradição apostólica é mantida na Igreja Católcia pela ação do Espírito Santo, e não por força meramente humana.

A Bíblia mostra que a alma é imortal, e os padres da Igreja em consenso geral ensinam o mesmo. Por isso, não é apenas por ser uma doutrina tradicional, mas por ser bíblica, e os argumentos mortalistas não conseguiram manter-se diante de cada refutação.

Será que a doutrina da imortalidade da alma recebeu crédito imerecido e se tornou imune às críticas só por ser doutrina tradicional? É claro que não, e a presente refutação é prova cabal disso, já que pelo estudo bíblico derruba todos os argumentos mortalistas.

Basta pensar um pouco, e ver que a objeção de que o homem é alma, e que isso significa que não tem alma, e que a alma é a pessoa, uma coisa física, ou a vida física usufruída pelo ser humano na terra, e nada mais, basta ver que esse argumento não pode provar que a alma imortal não existe, mas apenas mostra um sentido muito comum da palavra alma nas Sagradas Escrituras.

E, diante disso, quando se mostra que o termo alma possui de fato vários sentidos, e que desses se pode perceber a existência da espiritualidade da alma humana, que não pode morrer, diante de outras tantas passagens que demonstram que há no ser humano uma parte que permanece viva e consciente na morte, que esse argumento mortalista é refutado por completo. Dessa forma, a doutrina da alma imortal não é algo sem solidez e irracional, mas sólido e racional e bíblico acima de tudo.

Assim, a imortalidade da alma é bíblica, é verdadeira, e portanto é tradicional. E como São Cipriano, citado no livro, afirma que devemos procurar a origem da tradição, se é do Senhor, e do evangelho, das epístolas e dos apóstolos, então é verdadeira. Dessa forma é a doutrina da imortalidade da alma.

E é bom lembrar que São Cipriano, naquele momento, como explica o livro mortalista, estava em uma discussão como papa sobre o batismo de hereges. No entanto, o papa estava correto, e a verdade prevaleceu. Um santo também erra em suas interpretações bíblicas, mas a Igreja em peso não pode cair em heresia, pois o Espírito Santo não permite.

E lembrando que não foi Atenágoras o primeiro a ensinar a imortalidade da alma, como ficou claro no estudo dos primeiros padres da Igreja, na refutação de cada uma dos padres estudados.

Dessa forma, aqui são feitos estudos minuciosos para provar pela Bíblia que a alma é imortal, com exegese séria, à luz do ensino bíblico, e considerando de perto cada objeção mortalista.

Gledson Meireles.

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