Refutação: O apelo à tradição
Quando
se nega a autoridade infalível da tradição, que é a tradição apostólica, o
afastamento da verdade é inevitável. E mesmo entre os protestantes, quando é
negada a grande autoridade dos concílios protestantes, o fiel busca para si, e
tem diante de si, autoridades menores, que ele cria para si mesmo
involuntariamente, como por exemplo, segue impensadamente o que ensinam outros
eruditos que se afastaram da tradição por seus estudos e interpretações
particulares que, com o tempo, começam a formar uma pequena tradição para si
mesmos, tradição essa que condiciona as novidades teológicas, o que na prática
volta a ser, de certa forma, o que sustenta o dogma. Pensam estarem
incondicionados, mas seguem uma tradição, ou criam dogmas sustentados por sua
própria autoridade.
Assim
é que, quanto à doutrina mortalista, vários estudiosos protestantes adotaram o
sono da alma ou a inexistência da alma na morte, formando assim, uma nova
tradição.
A possibilidade
de que a doutrina não tenha sido preservada infalivelmente abre espaço para
toda e qualquer falsa doutrina. É um perigo. Humanamente falando é impossível
manter a verdade infalivelmente, mas o que se crê na Igreja Católica é que em
se tratando de certas verdades importantes o Espírito Santo guia a Igreja à
verdade.
Se
em determinada época e Igreja viu-se na controvérsia sobre a imortalidade da
alma e fez pronunciamento de que a alma é de fato imortal, então é impossível
que isso tenha sido errado, pois a Igreja, em sua universalidade, é coluna e
sustentáculo da verdade, como ensina a Escritura. Isso é o que traz a certeza.
Ainda,
cada dogma consegue ficar de pé diante das mais terríveis objeções, como está
sendo provado aqui, onde cada argumento mortalista é enfraquecido e refutado à
medida que se aprofunda em cada um deles.
E
mais. Há momentos em que as implicações dos estudos bíblicos tornam impossível
a doutrina da morte da alma com o corpo.
Interessante
é que sempre nas melhores interpretações possíveis, em todos os assuntos bíblicos,
o que se chega é ao que a Igreja Católica já ensina. Por isso, mesmo que os
mortalistas tenham certos argumentos bons e plausíveis, eles não conseguem
vencer os argumentos que sustentam a posição tradicional de que a alma é
imortal. Os mais fortes argumentos imortalistas não conseguem ser respondidos
pelos mortalistas.
O
autor afirma que a missa não poderia ser mudada nunca, segundo doutrina
católica, citando a bula Quo Primum
Tempore (1570), e que não existe a Tradição, mas somente tradições
divergentes, etc.
Um
exemplo de mudança de tradição seria o milenarismo que deu lugar ao amilenismo.
Mas, pelo que se vê na Igreja, ainda que no tempo em que renomados autores
ensinavam o milenarismo, a opinião geral era de que isso não podia dividir, não
era dogma, e que muitos ensinavam o amilenismo, ficando portanto conforme a
tradição católica aquilo que o magistério defendeu, mais tarde, o que está mais
de acordo com o amilenismo.
Então,
tudo deveria ser discutido à luz da Bíblia através de uma hermenêutica séria,
como se isso não fosse feito por todas as igrejas. Na verdade, isso acontece
sempre entre sérios eruditos, mas ainda assim pode haver erros. O Espírito
Santo é que dirige a Igreja e a defende do erro.
A
base comum sendo a Bíblia para definir com a confissão protestante está mais
próxima da verdade ainda é um pouco problemático, porque as consciências
individuais divergem. Assim, o conjunto do dos clérigos, papa e bispos, em uma
doutrina geral promulgada é o que cremos ser o que ensina o Espírito Santo.
A
lógica que o autor apresenta para a existência do magistério não é bem assim.
Não é tão simples assim, como se o magistério se reunisse para interpretar a
Bíblia para os demais membros da Igreja.
Os
teólogos católicos estudam muito, são os mais profundos que existem em todas as
confissões cristãs, basta dar uma olhada nas doutrinas e teses teológicas, basta
ver o que diz a doutrina católica sobre a imortalidade da alma, como está sendo
mostrado aqui. Os estudos acadêmicos na teologia católica contribuem para que o
magistério da Igreja, em determinada ocasião, se assim for preciso, colha
dados, informações, argumentos, etc., para fazer suas afirmações ordinárias e
mesmo extraordinárias. Portanto, os católicos, leigos e clérigos, eruditos ou
não, vão à Bíblia e contribuem, com toda a Igreja, no sensus fidelium, para que as doutrinas sejam esclarecidas para
todos.
E se
é a consciência individual que define tudo, então todos os católicos
conscientes de que o magistério está correto e de acordo com a Bíblia e a
Tradição estão certos e seguem corretamente a liberdade de suas consciências. E
quanto à afirmação: “É
o mesmo que dizer que você chegou à conclusão de que não pode interpretar a
Bíblia interpretando a Bíblia”, certamente isso é um paradoxo e não uma
contradição, já que todos sabemos que não podemos interpretar a Bíblia
particularmente, pois a mesma é inspirada, e isso se conclui lendo a Bíblia.
Quem
pensa estar livre para pensar, com sua consciência individual, que vai à Bíblia
e usa as ferramentas hermenêuticas e exegéticas e tudo o mais que for possível,
para concluir por si mesmo sem se submeter à tradição, ao magistério, e a quem
quer que seja, ainda assim, em sua consciência individual terá que mostrar
coerência, fé nas ferramentas que utiliza, dobrar-se diante das autoridades que
cita, ainda que a contragosto e não admitindo, e com as quais concorda, que
vieram antes dele e que indubitavelmente possui maiores conhecimentos naquele
ponto do que ele, etc., trazendo tudo novamente para a mesma relação prática
entre um católico fiel e a Bíblia, o magistério e a tradição.
A
pesquisa que mostrou que mais da metade dos pastores nunca leu a Bíblia é
bastante interessante. O autor diz: “imagine entre os padres”. Certamente, os
padres, que supostamente leem menos a Bíblia que os pastores, na cabeça dos
pastores é claro, em primeiro lugar, e da cultura geral em que os protestantes
leem mais a Bíblia e possuem maior conhecimento dela. Certamente, os
protestantes leem mais, mas não conhecem melhor a Bíblia.
Os
padres devem ler a Bíblia e conhecê-la bastante bem para serem padres. Caso não
a conheçam toda, nunca a tenham lido, vamos supor, ao se tornarem padres e
participarem da missa diariamente, o que é comum acontecer, ao mesmo celebrarem
a missa diariamente, estão lendo e ouvindo a leitura da Bíblia em sua quase
totalidade em três anos, pois a liturgia católica apresenta aos fieis a Bíblia
inteira em três anos litúrgicos.
A
opinião de que a maioria dos padres, bispos e papas da história foram iletrados
e etc., inclusive o magistério que se reunia em concílios, que não sabiam
praticamente nada da Bíblia, e que os doutores de fato eram raros, é um equívoco.
De
qualquer forma, é o Espírito Santo que guia a Igreja nesses momentos, e mesmo
nos mais difíceis as doutrinas foram corretas, os dogmas podem ser estudados e
confirmados pela maior erudição bíblica. A doutrina da imortalidade da alma
está provada biblicamente. Alguém poderá ler a presente refutação é afirmar que
ela não apresenta nenhuma refutação, que não mostrou nenhum argumento novo, que
não merece resposta, que repetiu tudo o que já foi refutado no livro A lenda da
Imortalidade da Alma, e etc. O mais difícil é apontar onde estão os erros,
ainda que o leitor tenha diante de si o livro e a refutação, e é preciso apenas
mostrar onde estão os erros, apresentando os motivos de serem erros. Esse tipo
de abordagem é muito raro.
É
certo que a verdade é imutável, e assim, as doutrinas verdadeiras não mudam, e
são sinais da Igreja verdadeira. Por isso, os fieis são atraídos pela graça à
verdadeira Igreja.
E
sobre a leitura da Bíblia, que mais da metade dos pastores nunca leu, certamente
isso não é a realidade dos padres, como os protestantes são inclinados a
pensar, como se os pastores, que são solascripturistas, não leem a Bíblia como
se imagina, os padres deveriam ler menos ainda. Porém, a realidade certamente é
outra, e por que não pensar que os padres, por certo, na sua grande maioria,
senão todos, leram a Biblia inteira.
Se
os conciliares dos séculos passados, de cabelos grisalhos e barbas brancas,
como afirma o autor do livro mortalista, tinham conhecimento questionável da
Bíblia, e podem ter sofrido influências dos condicionamentos psicológicos do
seu tempo, e que são tão humanos como qualquer pessoa, se esses tinham somente
essas prerrogativas para decidirem questões de fé e moral nos concílios
ecumênicos, então poderíamos duvidas. Mas, o que vemos é outro cenário. O que
tudo evidencia é que esses homens de Deus tinham conhecimento profundo e viviam
de acordo com a Palavra de Deus. E não somente isso. O Espírito Santo garante
que tudo o que ali está decidido nas questões fundamentais para a vida
espiritual e salvação das almas é
verdadeiro.
Obviamente,
também, é natural que o conhecimento verdadeiro seja feito por instituições
apropriadas para tal, de modo que nem em coisas menos significantes se pode
esperar que cada indivíduo faça seu estudo de tudo para que se certifique de
algo, mas os instrumentos e métodos para o ensino são ferramentas que fazem da
transmissão do conhecimento algo mais rápido e eficaz, de modo que com o tempo
aqueles que já estão bem formados possam por si mesmos verificarem aquilo que
aprenderam e estão aprendendo. Dessa forma, é natural que todos sejamos
ensinados pela santa Igreja, e cresçamos na fé em comunidade.
Mas,
eis uma afirmação bastante ríspida: “Só que esses pastores e
padres também não sabem nada, e só repetem aquilo que é a doutrina oficial da
igreja, seja ela qual for.”
Essa afirmação já está bem entendida, e por certo pode ser tomada apenas como
um mínimo exagero.
E
sobre o analfabetismo dos tempos medievais, onde mesmo membros do clero não sabiam
ler e escrever, o que é atestado pelo historiador Ivan Lins, como citado no
livro, isso se deve dizer que de fato houve tempos em que isso ocorreu, mas que
o ensino oral era bastante eficiente e tudo indica que em muitos períodos
daquela grande era medieval as pessoas simples podiam conhecer muito da cultura
letrada por ouvir e assistir de teatros, encenações, etc.,que eram instrumentos
bastante comuns para propagação da cultura, e da cultura bíblica, que estava de
modo íntimo interligado a tudo o que pensava e sentia o povo medieval, que era
muito cristão.
Dessa
forma, a iluminação do Espírito Santo nos corações dos homens da Igreja, nos
concílios e sínodos, principalmente nos concílios ecumênicos, garante a
infalibilidade da doutrina cristã católica que perpassa os séculos.
Se
os votos que aprovavam as doutrinas eram de “bispos iletrados, ignorantes,
trapaceiros e depravados”, a mão de Deus foi mais poderosa ainda para garantir
que nada daquilo que tais homens tinham de si mesmos em termos de crença pudesse
ao menos influênciar a límpida e pura doutrina de Cristo. No entanto, por
certo, que haviam iletrados, ignorantes, trapaceiros e depravados, isso
existia, mas é de se pensar que a Igreja de Cristo foi sempre dirigida por
santos papas, bispos, presbíteros e diáconos.
A
tradição de cada demoninação tem enorme papel no credo. No entanto, a tradição
apostólica é mantida na Igreja Católcia pela ação do Espírito Santo, e não por
força meramente humana.
A
Bíblia mostra que a alma é imortal, e os padres da Igreja em consenso geral
ensinam o mesmo. Por isso, não é apenas por ser uma doutrina tradicional, mas
por ser bíblica, e os argumentos mortalistas não conseguiram manter-se diante
de cada refutação.
Será
que a doutrina da imortalidade da alma recebeu crédito imerecido e se tornou
imune às críticas só por ser doutrina tradicional? É claro que não, e a
presente refutação é prova cabal disso, já que pelo estudo bíblico derruba
todos os argumentos mortalistas.
Basta
pensar um pouco, e ver que a objeção de que o homem é alma, e que isso
significa que não tem alma, e que a alma é a pessoa, uma coisa física, ou a
vida física usufruída pelo ser humano na terra, e nada mais, basta ver que esse
argumento não pode provar que a alma imortal não existe, mas apenas mostra um
sentido muito comum da palavra alma nas Sagradas Escrituras.
E,
diante disso, quando se mostra que o termo alma possui de fato vários sentidos,
e que desses se pode perceber a existência da espiritualidade da alma humana,
que não pode morrer, diante de outras tantas passagens que demonstram que há no
ser humano uma parte que permanece viva e consciente na morte, que esse
argumento mortalista é refutado por completo. Dessa forma, a doutrina da alma
imortal não é algo sem solidez e irracional, mas sólido e racional e bíblico
acima de tudo.
Assim,
a imortalidade da alma é bíblica, é verdadeira, e portanto é tradicional. E
como São Cipriano, citado no livro, afirma que devemos procurar a origem da
tradição, se é do Senhor, e do evangelho, das epístolas e dos apóstolos, então é
verdadeira. Dessa forma é a doutrina da imortalidade da alma.
E é
bom lembrar que São Cipriano, naquele momento, como explica o livro mortalista,
estava em uma discussão como papa sobre o batismo de hereges. No entanto, o
papa estava correto, e a verdade prevaleceu. Um santo também erra em suas
interpretações bíblicas, mas a Igreja em peso não pode cair em heresia, pois o
Espírito Santo não permite.
E
lembrando que não foi Atenágoras o primeiro a ensinar a imortalidade da alma,
como ficou claro no estudo dos primeiros padres da Igreja, na refutação de cada
uma dos padres estudados.
Dessa
forma, aqui são feitos estudos minuciosos para provar pela Bíblia que a alma é
imortal, com exegese séria, à luz do ensino bíblico, e considerando de perto
cada objeção mortalista.
Gledson Meireles.
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