Eucaristia
Parte
2
Santo
Irineu (130-202)
Santo Irineu afirma que participar do corpo e
do sangue do Senhor é participar da vida. Então, por isso entende-se a graça
que é a comunhão. Praticamente todos os cristãos concordam com essa doutrina.
Fica claro que o pão comum é eucaristia “ao receber a invocação de Deus”. Os
dois elementos terreno e celeste são distintos, pois fala da unidade de carne e
Espírito. Essa passagem não é conclusiva para negar a transubstanciação. Embora
não forneça mais para que se possa entender a posição de Santo Irineu, pode-se
afirmar que ele acreditava no mesmo que a Igreja sempre ensinou, que é
explicado como transubstanciação. De fato, ele afirma que o pão comum após a
invocação de Deus é eucaristia.
O lugar da adoração é o céu, para onde a
adoração é dirigida. Quem é cristão católico sabe que é isso que a missa
realiza, a adoração a Deus, oferecendo o sacrifício de Cristo. A missa é
celebrada “continuamente e sem interrupção”. Os dons são oferecidos no altar. A
Igreja conserva essa liturgia. O protestantismo não tem sacrifício litúrgico, nem
dons nem altar. É óbvio que o autor não pretende que Santo Irineu seja
protestante ou que ensine o mesmo que o protestantismo quanto à ceia, mas
acredita que há alguma semelhança de doutrina. Ou acredita que o mesmo tenha
ensinado algo diverso do que a doutrina católica atual ensina. Lendo mais
atentamente pode-se ver que não há praticamente nenhuma semelhança com a
doutrina protestante, a não ser aquela que há entre a posição católica e
protestante. Existe então o altar na Igreja, na terra, que celebra os dons a
Deus, que sobe ao altar que está nos céus.
Pelas acusações frequentes e constantes dos
pagãos contra os cristãos, de que esses seriam canibais, torna-se impossível
que a Igreja pelo menos tentado aliviar as tensões apresentando uma doutrina
apenas simbólica. Era o literalismo que causava aquelas comoções entre os
pagãos.
A citação do Fragmento 13 prova a
transubstanciação, embora seja usada contra. Parece tratar-se de uma leitura
fragmentada. De fato, os escravos contaram o que haviam aprendido, de forma
literal, e não simbólica. Veja que eles não haviam aprendido essas sutilezas da
mera simbologia, para afastar as complicações de entendimento, mas afirmaram
que “a divina comunhão era o corpo e o sangue de Cristo”, coisa que um
protestante, por exemplo, facilmente explicaria como uma linguagem figurada, um
símbolo, um sinal. O problema era que os pagãos acreditavam que se tratasse de
carne e sangue humanos usados na celebração eucarística, e os escravos, ainda
não conhecendo a comunhão, afirmaram o que ouviram, o que não ajudou a
esclarecer a questão diante dos gregos.
Agora, a questão é sobre a eucaristia ser
sacrifício. Isso já seria óbvio para o católico, mas o protestante não é
convencido com essas afirmações, e entendem que o sacrifício aí descrito é
diferente do que a Igreja Católica ensina.
Ainda, a nova oferta, na nova aliança, de
acordo com Malaquias. A eucaristia é uma oblação espiritual. Essa oblação é com
o pão e o cálice da bênção, dando graças a Deus. A eucaristia é um sacrifício
espiritual. Ele não é literal, no sentido que Cristo morre de novo, mas
espiritual, porque renova o mesmo sacrifício. Por ser um antítipo, ele é real.
De alguma forma, o tipo do Antigo Testamento simbolizava a eucaristia.
O autor do artigo escreve: “Assim como outros Pais da Igreja do século II, o bispo
de Lyon desconhecia o sacrifício propiciatório da Missa.” Mas, a própria citação
afirma o contrário: “em ordenar que os receptores desses
antitipos podem obter a remissão dos pecados e a vida eterna”. E eucaristia é
propiciatória.
No livro 4, 33, 2, e também no livro 5, 2.2
São Justino argumenta sobre o verdadeiro corpo de Cristo, afirmando que Ele
reconheceu ser o pão o Seu corpo, e o cálice de vinho o Seu sangue, e ser Ele
mesmo o filho do homem, pois nasceu como ser humano. E, ainda, o pão Ele
estabeleceu como Seu próprio corpo, “do qual Ele dá crescimento a nossos corpos”.
Essa nutrição só pode ser espiritual, e isso coaduna com a transubstanciação, em
outras palavras, como feito por São Justino.
No parágrafo 3 a argumentação torna-se ainda
mais robusta, pois é feita em termos bastante literais, sem prescindir de sua natureza
espiritual. Quando o cálice e o pão “recebem da Palavra de Deus, e a Eucaristia
do sangue e do corpo de Cristo é feita”, pergunta o santo padre, “de que coisas
a substância da nossa carne é aumentada”, pois afirma que, contrariamente à
opinião dos gnósticos, a nossa carne pode receber “o dom de Deus, que é vida
eterna”, e que a fé é alimentada pelo corpo e pelo sangue do Senhor. Esse
alimento que entra pelo corpo humano, que nutre o nosso corpo, “a substância da
nossa carne”, se transforma e metaboliza no corpo, produzindo efeito
espiritual, é a eucaristia, por meio da transubstanciação. Essa ideia já
comentada em outra parte é aqui mais clara. A substância do pão é normalmente
convertida em alimento para o corpo. Mas o que Santo Irineu está afirmando é
que, após a Palavra de Deus realizar a eucaristia, ela pode ser comunicada à
substância do nosso corpo, trazendo o dom de Deus através da nossa matéria.
Assim, refutava o gnosticismo, com a literal verdade do sacramento da
eucaristia.
Tertuliano
de Cartago (160 – 220)
Nota-se que o autor do artigo citou palavras
que tendem a levar a um entendimento espiritual do sacramento da Eucaristia, e
não compreendeu bem as demais que mostram a compreensão literal o mesmo. Pode
ser também que as palavras entendidas como meramente espirituais foram usadas
para interpretar as que mostram o caráter físico do sacramento. Outra
possibilidade é que não se entende corretamente o que a presença física de fato
significa. De qualquer maneira, uma leitura e uma análise mais profunda talvez
será suficiente para desfazer esses problemas. Não é esperado que o leitor
aceite a transubstanciação (seria muito bom que o fizesse), mas que não
diferencie o pensamento de Tertuliano da doutrina católica, no que se refere à
Eucaristia.
As palavras de Tertuliano sobre a eucaristia
em João 6, sobre devorar pelo ouvido e digerir pela fé, não são contrárias à
transubstanciação, e fazem parte da doutrina da Ceia Eucarística, onde temos
alimento eminentemente espiritual, que ensina que a fé é o canal pelo qual seus
efeitos chegam até nós. Por isso, é possível também, quando não possibilitados
de comungar da forma usual, fazer uma comunhão espiritual.
O autor protestante afirma de Tertuliano: “Ele deixa
claro que a interpretação literalista dos judeus e dos romanistas estava
errada.” E após isso afirma que a carne não serve para
vivificar, mas o ouvir e crer nas palavras de Jesus.
É preciso notar que o que Jesus reprovou
naquele momento foi o entendimento literal, de que Sua carne seria entregue aos
discípulos para que a comessem, o que seria bizarro. Então, não voltando atrás
na sua literalidade, afirma que essa é assim mesmo, mas em sentido espiritual.
Ninguém O veria dando a carne ali ou em outro momento como comida da forma como
os ouvintes imaginaram, mas de outra forma. Isso ocorreu na última ceia.
O que Tertuliano chama de figura? É falácia
tomar Tertuliano como testemunha da transubstanciação?
Pelo contrário, ele afirma que: “tendo tomado o pão e distribuído aos discípulos, fê-lo
seu corpo”. Jesus
fez do pão o Seu corpo. Portanto, mudou o pão em corpo, o que é
transubstanciação. Se Cristo tivesse instituído somente um símbolo do Seu
Corpo, isso não serviria para provar a realidade do mesmo, ou talvez seria uma
prova mais fraca, pois ainda assim poderia ser entendido um símbolo daquela
aparência assumida por Cristo na terra. Seria um meio de a heresia firmar-se. É
uma resposta possível. O que Tertuliano fez foi diferente. Abaixo será feita
uma análise do que Tertuliano está argumentando, para esclarecer a questão.
O capítulo 40 de Contra Marcião tem o intuito
de provar o corpo verdadeiro de Jesus, e não um corpo aparente. Seguindo os
argumentos de Tertuliano, que inclui a Eucaristia. Ele afirma que o pão é
figura do corpo de Cristo, porque Seu corpo era real. Então, continua,
pressupondo a doutrina de Marcião, se Jesus não tivesse corpo, e pelo pão ele
fingia ter um corpo, por faltar-Lhe a substância corporal, então Ele deveria
ter dado o pão por nós? Isso contribuiria para a teoria marcionita.
O pão é verdadeiro alimento, uma substância
real. Dessa forma, na cruz Cristo teria dado pão por nós, porque Ele não tinha
corpo. O leitor consegue notar quão complicado tornou-se a posição gnóstica? Se
Jesus foi apenas um Homem aparente, e disse que o pão na Ceia da Páscoa era o
Seu corpo, conclui-se que o pão foi entregue na cruz, pois uma vez que o corpo
de Jesus não existia, sendo o pão uma verdadeira substância, então o pão foi
oferecido no calvário. Nesse entendimento de Marcião o pão não tinha substância
de Cristo, mas continuava a ser pão. Ele não acreditava que Cristo tivesse
substância humana. Ficaria, então, somente o pão.
Assim, Tertuliano passa a provar, através das
Escrituras, pelas profecias, porque o pão e o vinho e não outro alimento foi
usado para prefigurar o corpo de Cristo. Até aqui há concordância, pois o pão é
figura de um corpo verdadeiro. Tanto o que foi prefigurado no Antigo
Testamento, como o que está sendo usado na Ceia, por esse motivo. Não havendo
realidade do corpo, não poderia haveria figura do pão. E o motivo de usar pão,
está biblicamente fundamentado. Uma vez que o corpo de Jesus é real, o pão é
figura desse corpo real. Mas, então permanece que a Eucaristia é figura, como
concluiu o apologista protestante?
Definitivamente, não. O que Tertuliano está
mostrando é que o pão é o Corpo de Cristo e a figura de Seu corpo, porque ele
tinha verdadeiro corpo. Contudo, esse
corpo real de Jesus pode ser dado na Eucaristia. Se Jesus não tivesse corpo Ele
não estaria na Eucaristia, mas está porque tem corpo verdadeiro. Esse é o
raciocínio. Dessa forma, entende-se que a substância do corpo de Cristo é o que
torna a eucaristia, é o que faz o sacramento.
As palavras de Tertuliano são importantes
quando escreve: “Ele consagrou seu sangue no vinho”, dando a entender que a
consagração faz o sangue estar ali. O corpo se prova pela carne e a carne pelo
sangue, uma joia de explicação. Ele interpretou as vestes e o manto na profecia
como a carne de Cristo, e o vinho que as lava como o sangue. Para que o pão se
tornasse corpo de Cristo, o próprio Cristo deveria ter tido corpo real em Sua
vida na terra, o que era negado por Marcião. Portanto, provando que Cristo teve
corpo, o pão era seu corpo.
E “os “elementos desprezíveis” do Criador”?
Esse uso da matéria no sacramento serve para refutar o marcionismo. De fato,
ninguém nega que Jesus tomou o pão e o vinho para, na última Ceia, entregar-Se
de forma espiritual à Igreja, dando-lhe um alimento, que havia sido prometido
em João 6. O uso da água no batismo, do óleo na crisma, do pão e do vinho na
eucaristia, mostram que esses elementos criados são incorporados aos mistérios
de Jesus pelo seu uso na Igreja. Assim, Tertuliano oferecia meios de valorizar
a matéria. É fácil ver que em arrazoados protestantes aparecem, de alguma
forma, certa negação da matéria como veículo de graça, o que aproxima-se muito
do que o gnosticismo e o marcionismo concebiam.
E o título de sacramento? Esse nome continua
sendo usado nas denominações, mas não sem certa reserva e qualificações. É um
termo antigo, sempre usado na Igreja Católica, e não foi deixado pelos
reformadores, o que explica ser usado em igrejas que negam a transubstanciação.
O problema é que essas preferem o termo ou o entendimento de ordenança, com o
intuito de afastar a compreensão católica de transubstanciação, que preserva o
sentido na palavra sacramento.
Tertuliano pensa diferente a respeito da
eucaristia em comparação com o que a Igreja ensina hoje? Chamar os elementos de
pão e vinho depois da consagração não significa negar a transubstanciação. É
uma forma tradicional na Igreja, usada sem problemas. O apologista protestante
escreve: “Ele deixa claro que a
interpretação literalista dos judeus e dos romanistas estava errada.” De fato, o respeito
pelos objetos devocionais não prova presença física, porém, o que Tertuliano
afirma indica que havia uma preocupação muito intensa em relação aos elementos
da ceia, a ponto afirmar que “sofremos ansiedade” se algo cai no chão, o que
não é comum entre os que não creem na presença física, ou na transubstanciação.
Desse modo, no caso da eucaristia há um contexto maior que evidencia isso. Os
protestantes possuem devoção pela celebração da Ceia, mas não preocupam-se
assim com as espécies em si.
Não se espera que por meio deste artigo alguém
fique convencido da transubstanciação, mas pelo menos não que não afirmasse que
Tertuliano a negou ou que ensinou somente uma ceia simbólica.
Tertuliano usou a eucaristia para provar que
Jesus teve corpo verdadeiro. Por aquela doutrina marcionita, poder-se-ia
afirmar que Jesus não estava na ceia, porque não tinha corpo. Por outro lado,
para a doutrina cristã, Ele estava na Ceia. Essa ideia é mais esclarecida pelo
contexto geral das obras de Tertuliano.
Em Sobre a Idolatria, capítulo 7, ele escreve
contra a admissão de fazedores de ídolos na Igreja. Ele afirma: “e
trazer o corpo do Senhor aquelas mãos que levam corpos aos demônios?”, aludindo que agora
aquelas mãos estavam levando o corpo de Jesus, e que antes levavam corpo de
animais, etc., aos ídolos.
E mais adiante: “Uma vez os judeus puseram
marcas em Cristo, esses o mutilam diariamente”, falando dos que vieram do
paganismo, e que estavam então no sacerdócio, celebrando a missa todos os dias.
Os judeus puseram a mãos em Cristo uma vez, diz Tertuliano, e esses sacerdotes,
que Tertuliano estava criticando, tocam em Cristo, mutilando-o todos os dias!
Não poderia ser mais clara a fé na transubstanciação.
Está, pois, refutado que Tertuliano
acreditasse apenas em uma presença espiritual. Entende-se que o objetivo dos
artigos não é mostrar que os Padres da Igreja concordam com o Protestantismo,
mas tentar provar que discordam do Catolicismo. E, quando possível, aponta-se
que a opinião de algum padre em particular está em consonância com o que ensina
uma denominação protestante. Mas, em
geral, o que ensina esse escritor eclesiástico é bastante suficiente para crer
na transubstanciação.
Clemente
de Alexandria
O evangelho pregado belissimamente como é
feito por Clemente no seu Pedagogo e na Stromata
não é negação da transubstanciação. Pelo contrário, leva à sua compreensão.
As metáforas usadas ilustram bem a Palavra da
salvação. Talvez a linha de raciocínio de Clemente quando fala da moderação em
beber vinho, usando exemplo a última ceia, é a mesma quando se pensa que o
padre não pode beber demais do vinho consagrado (sangue de Cristo) por motivos
de sobriedade. Nem essa forma de pensar tem algo a ver com a negação da
transubstanciação. Ela prescinde da matéria. O alimento espiritual não
constitui “palavras incompatíveis com a doutrina literalista”. Estão contidas nela.
Pensar que o exemplo de Jesus bebendo vinho
na última ceia implica em negar a transubstanciação é uma incorreta conclusão.
Tudo o que ele afirma está sustentado na sua doutrina da eucaristia, a qual
santifica o corpo e a alma (cf. O Pedagogo, II, 2).
O sangue da uva é a Palavra, que é misturada
com água, como o Sangue de Cristo é misturado com a salvação. E, continua
Clemente, o sangue é de duas formas: o da carne pelo qual fomos redimidos da
corrupção e o espiritual pelo qual somos ungidos. Beber desse sangue é
participar da imortalidade. O Espírito é o princípio energético da Palavra,
como o sangue é da carne. A mistura do vinho com água representa o Espírito com
o homem, e o vinho com água nutre a fé, e o Espírito conduz à imortalidade.
Então, a mistura da ÁGUA COM A PALAVRA é
chamada de EUCARISTIA, e aqueles que participam dela com fé são SANTIFICADOS EM
CORPO E ALMA.
Essa é a mistura é “MISTICAMENTE COMPOSTA”
feita pela vontade de Deus, pelo Espírito e a Palavra, onde o Espírito junta-se
à alma e a carne é juntada à Palavra. E argumentando assim, usando as mesmas
palavras que usou na sua apresentação alegórica, ele fala da Eucaristia,
mostrando o alicerce literal sobre o qual está construindo sua pregação. Por
ensinar contra o vinho, e ao mesmo tempo ensinar o uso do vinho na eucaristia,
mostra que São Clemente fazia distinção de ambos.
A escola de interpretação bíblica de
Alexandria favorecia interpretações alegóricas. Isso é denunciado fervorosamente,
por exemplo, pelos protestantes dispensacionalistas fundamentalistas, adeptos
de uma interpretação gramático-literal e segundo certas divisões
dispensacionais que fazem no texto sagrado. Por isso, é comum encontrar em
Clemente passagens em que usa o método alegórico. Tal prática não nega a sua
literalidade, que é anterior e fundamento da interpretação. Mas, alguém poderia
pensar: isso não está em discussão, antes, o que Clemente afirma interpretando passagens
eucarísticas de forma simbólica é que importa para provar a asserção de que sua
doutrina está mais conforme uma intepretação espiritual da ceia, como é feita
nas igrejas reformadas. No entanto, pensar dessa forma é ir longe demais, é
modificar a doutrina de Clemente de Alexandria. De fato, ele apresenta a oferta
de Melquisedeque em Gênesis 14,18 como figura da eucaristia. Para quem não
sabe, a figura representa algo real. Deve-se tem em conta que a eucaristia é
real. Melquisedeque ofereceu um sacrifício. Da mesma forma, Cristo na
Eucaristia oferece um sacrifício.
Orígenes
Orígenes serve-se de muita alegoria. Sua
posição quanto à eucaristia é a mesma de Clemente. O “desprezo pela matéria em
si” e o uso do “símbolo” para referir-se à Eucaristia é reconhecido pelo autor
do artigo como algo, não só mais próximo da visão protestante, mas que “Essa posição se amolda perfeitamente ao ponto de vista
simbólico da Eucaristia(...)”. É preciso então explicar o motivo do respeito pelas espécies
eucarísticas que Orígenes tinha, e que a Igreja Católica continua a ter,
explicar por que isso não prova a transubstanciação, quando nas Igrejas que
ensinam o ponto de vista simbólico isso não acontece, mas ensina-se que o
respeito é apenas durante a celebração, e que depois seria até supersticioso
qualquer tratamento e diferente quanto ao pão e vinho ou suco de uva. É uma
primeira observação.
Algo sutil está por detrás do argumento que
considera a referência ao pão e ao vinho após a consagração como negação da
transubstanciação. Essas palavras não poderiam provar mais do que as palavra de
Cristo quando identifica o pão e o vinho respectivamente com o corpo e o
sangue, quando o que importa seria a compreensão dessas palavras. Essa é a
posição do apologista protestante. Embora há algo de verdade no que está
envolvido esse argumento, não se pode usá-lo assim rigidamente. Da mesma forma, pode-se responder que a
Escritura utiliza a mesma fraseologia, às vezes, referindo-se ao pão após ser
consagrado, e esse uso continua na Igreja. Se o uso dos termos que Jesus empregou
explica a fraseologia da Igreja, não se pode considerar “simplista e falacioso”
o argumento e ao mesmo tempo lançar mão de outro argumento sobre a conservação
da palavra “pão” mesmo na eucaristia, quando se deveria usar “corpo”, se isso
também ocorre na Escritura. Tal modo de tratar o assunto demonstra a fraqueza do
argumento. Deve-se considerar que as palavras de Jesus por si só provam o
entendimento da transubstanciação, e que estão em outra categoria em relação às
passagens mencionadas sobre a porta, a videira, o caminho.
Então, o autor considera refutado o ensino da
transubstanciação a essa altura do artigo: “Isso mostra que ele ter dito em outras passagens que o
pão é o corpo de Cristo não prova em nada que sua crença era literal.” Dito doutro modo, se
Orígenes escrever em outra parte de suas obras que o pão é o corpo de Cristo,
isso não irá provar nada, pois ele usou a palavra pão depois de falar da
eucaristia, o que levaria a pensar que ele considerou o elemento após a
consagração como não tendo mudado de substância. Dessa forma, o argumento
começa negando com base no uso das palavras através da consideração quanto ao
uso das palavras, o que torna o mesmo argumento nulo em si mesmo. Ele
prescindiu da própria exigência: “como as palavras do Filho de
Deus foram compreendidas”.
No Comentário
sobre Mateus, 85, são citadas algumas passagens que afirmam que o corpo e o
sangue não são o pão e o vinho, mas a Palavra. Dessa forma, Orígenes, ao usar
essa metáfora, é apresentado com alguém que não cria literalmente na Ceia. A
afirmação não é satisfatória.
É necessário ainda
explicar o motivo dos cristãos de guardar o corpo do Senhor com toda cautela e
veneração, conservando as espécies eucarísticas, acreditando que perder o
mínimo que seja constitui pecado. Esse modo de entender é o mesmo que o ponto
de vista simbólico da Eucaristia? Ou mesmo o ponto de vista meramente
espiritual no momento da Ceia? O
cuidado especial e respeito não respondem satisfatoriamente. É verdade que os
protestantes demonstram respeito pela ocasião, o respeito pela celebração, por
tudo o que a envolve, mas não às espécies em si. Ainda mais fora do culto. Isso
difere de toda tradição católica. Esse argumento deve ser respondido, e se
possível exemplificado, pois é algo que explica a transubstanciação e não
demonstra a crença protestante.
Gledson Meireles.
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