No canal Dois dedos de teologia foi publicado um
vídeo com argumentos contrários à presença substancial de Jesus na Ceia do
Senhor, que é a Eucaristia. São apresentados três argumentos, interessantes por
sinal, que propõem uma leitura simbólica, memorial e espiritual das palavras de
1ª Coríntios 11 a respeito da Ceia. Em outras palavras, a doutrina que não
teria possibilidade alguma seria somente a da presença real substancial, que é
explicada pela transubstanciação.
O conteúdo da argumentação
utiliza os termos fortes de presença física e presença material, para tornar
mais compreensível a contraposição com a ideia intelectual da presença apenas,
que está no ensino do mero simbolismo, ou mesmo da presença espiritual, por
meio da fé, mas não nos elementos, e da comemoração do memorial do Senhor, que
refere-se à morte de Cristo.
O versículo principal para
construir o argumento foi 1ª Coríntios 10, 16, partindo do conceito de
comunhão.
Em primeiro lugar, o
argumento debruça-se sobre o assunto tratado nos capítulo 8, 9 e 10 da 1ª
Epístola aos Coríntios. Dessa forma, o fato das comparações com a Ceia do
Senhor feitas, no contexto, seria suficiente para negar a presença real de
Jesus na eucaristia.
Deve-se ter em mente que a
presença real refere-se à presença de Jesus nos elementos da Ceia, e não uma
presença espiritual no momento apenas,
muito menos uma presença meramente simbólica.
O primeiro argumento é
tirado da metáfora de que “nós somos o pão”.
Em 1ª Cor 10, 17 está escrito:
“Uma vez que há um único pão, nós, embora
sendo muitos, formamos um só corpo, porque todos nós comungamos do mesmo pão”.
O que o texto acima afirma
não é que “nós”, a Igreja, somos o pão, mas que existe um só pão, que é Cristo,
e que nós, que somos muitos, nos tornamos um Corpo pelo fato de participar do
mesmo pão, que é Cristo. Somente secundariamente há lugar para o símbolo do pão
em relação à Igreja. O original grego não afirma que nós somos pão! Não há essa
fraseologia, e o contexto deixa claro que essa é uma construção claramente
simbólica.
Por isso, o argumento de que
a Igreja não está substancialmente no pão, que não é partida no pão, como se
fosse uma razão contra a presença real de Cristo no elemento eucarístico, não
tem validade, porque a Bíblia não afirma que a Igreja “é” o pão.
Sendo assim, da forma
apresentada, essa metáfora não existe. O que pode existir, e é o que faz
sentido, é tomarmos a Igreja como um pão, simbólico, porque faz comunhão com o
Corpo do Senhor. Não havendo, dessa forma, uma metáfora bíblica que compare a
igreja ao pão eucarístico, o argumento desaparece.
O texto grego dessa passagem
literalmente traduzido afirma o seguinte: Porque
um pão, um corpo os muitos somos nós, pois todos de um único pão participamos.
Se podemos ser considerados
metaforicamente “um pão” é porque participamos do único pão que é Jesus. Assim,
não existem dois pães, mas somente um. E aqui fecha-se o argumento. Ainda, o
motivo de podermos aproximarmo-nos da simbologia do pão é pela participação do Pão.
Por isso, não há, nem mesmo
na comparação, motivo para pensar que essa metáfora pudesse ser interpretada
como exigindo uma presença substancial da Igreja no pão mencionado, para salvaguardar a presença de Cristo, pois a
Igreja não é o pão!
Para ficar ainda mais claro:
só Jesus é o pão do céu. A Igreja é um pão pela multidão de fieis unidos num só
corpo. A Igreja é um pão, com artigo
indefinido, um corpo, porque (o
motivo de ser isso) participa da comunhão com Jesus, que é (em substância) o
Pão que alimenta a Igreja e a faz unida e única.
Portanto, o primeiro
argumento não tem força para negar a presença de Cristo na Eucaristia, mas
revela um erro interpretativo.
Mas, perguntaria alguém, a
metáfora da Igreja como um pão não estaria relacionada à outra metáfora de
Cristo como pão? De forma alguma, nos termos que se pretendeu acima, pois
Cristo não significa o Pão, mas é o Pão. A Igreja não significa o pão, nem é o
pão, mas em sentido simbólico é um pão ou corpo porque se faz uma em Cristo.
Para usar o artigo definido poderia dizer-se que a Igreja é o Pão, a Igreja é
Cristo misticamente significado. Mas, sabemos que isso é uma forma espiritual
de entender o mistério de Cristo e a Igreja. Assim, Cristo é um, e a Igreja é
formada por muitos, e assim em Cristo a Igreja é feita um só corpo.
A metáfora comparativa não
afeta a presença substancial de Cristo, mas a reforça, como ficará patente mais
adiante. E esperamos que o autor desses argumentos apresente resposta a esta
refutação.
Então, a Igreja não é mesmo
um pão literal, como ficou explicado acima, e não cabe o argumento que se faz
sobre essa suposição. A Igreja não está no pão eucarístico porque ela participa do pão e não que é ou está
simbolizada no pão. Isso é o que a Bíblia afirma. O pão é Cristo e faz a Igreja
tornar-Se misticamente ou espiritualmente o Seu corpo. É algo profundo. Em
espírito nos unimos a Cristo, e também nos unimos a Ele na eucaristia. Mas,
quem está na Eucaristia é Cristo.
Na última ceia Jesus fez uma
espécie de extensão do Seu Corpo, espiritualmente, tornando aquele Pão o Seu
próprio Corpo, em substância. Pelo poder do Espírito Santo. O entendimento real
através do conceito de fisicalidade ou materialidade é melhor descrito pela
substancialidade, que faz com que aquilo que Jesus tinha na mão naquele momento
não apenas simbolizasse ou indicasse algo espiritual, mas fosse o sacramento do
Seu corpo.
Quando se diz que somos um
pão e por isso devemos ser um corpo, está-se misturando as metáforas, porque é
o contrário: pela união a Igreja é comparada a um pão, a um corpo. A união faz
a comparação do pão e não o pão torna necessário compreender a união.
Certamente essa afirmação que o autor faz foi algo que não seja parte
necessária da sua argumentação, mas de qualquer forma coloca-se aqui esse
esclarecimento.
O segundo argumento é que
São Paulo faz a comparação da comunhão que acontece nos sacrifícios antigos e
da comunhão que é realizada pela Eucaristia. Então, da mesma forma que na
antiga Lei os sacrifícios não precisavam trazer a presença física de Deus para
que acontecesse a comunhão, a Ceia do Senhor não exigiria a presença física de
Jesus para efetuar a comunhão com Ele. Eis o argumento básico.
Pois bem. São Paulo compara
duas mesas, que são dois altares, pois fala de sacrifícios. Isso é algo
importante. A mesa dos demônios e a mesa do Senhor, ou seja, o altar dos
demônios e o altar do Senhor.
Naquele há comunhão com as
vítimas sacrificadas, e no verso 19 está escrito que essas vítimas não são
“alguma coisa”, mas o Demônio é que recebe o culto. Em si aquelas carnes não
são nada.
Portanto, a comparação com a
Eucaristia não se faz por essa via, pois a carne do Senhor que é oferecida na
Ceia é a carne juntamente com a Palavra poderosa de Jesus que a torna presente.
Ninguém poderia concordar que o corpo do Senhor pelo qual se faz a comunhão seja
nada! A comparação da comunhão prescinde da presença substancial, mas está de
acordo com ela.
O que o texto afirma é que
as carnes sacrificadas não faziam comunhão com as divindades porque as próprias
divindades não existiam. Mas, os cristãos oferecem o corpo do Senhor que
existe! Por esse lado, estabelece-se o caminho para a compreensão da
transubstanciação.
Outra consideração se dá com
a argumentação de que o Senhor não estava nos sacrifícios do Antigo Testamento.
De fato, Deus não poderia estar ali presente em substância corporal porque Deus
é Espírito, e no Antigo Testamento Israel estava à espera do Senhor Jesus.
Portanto, a comparação é inválida. Jesus não poderia estar presente nos sacrifícios
antigos pois ainda não havia assumido um corpo.
A comunhão era feita pela
fé, e não havia presença real substancial pelo motivo acima descrito.
No Novo Testamento, os
sacramentos são superiores, pois cumprem o que os antigos sacrifícios
simbolizavam. Eles possuem agora a possibilidade que os sacrifícios antigos não
possuíam. Agora, Cristo pode estar presente como Salvador, em Sua natureza
Humana glorificada, por meio do Sacramento. A comparação segunda também não
oferece argumento válido contra a Eucaristia como presença substancial de
Jesus.
A comunhão existente nos
sacrifícios antigos e no sacrifício do Novo Testamento é real. O que o
sacramento novo traz de superior ultrapassa o argumento que é feito a partir do
significado de comunhão.
É o mesmo que afirmar que os
salvos do Antigo Testamento foram salvos por Cristo, assim como o são os do
Novo Testamento. No entanto, a nova aliança é superior, e um dos motivos é o da
presença substancial de Jesus no sacramento da eucaristia. A graça é mais
abundante. Essa observação responde à segunda objeção apresentada. Ela se dá pela
comparação da “koinonia” que há nas duas partes comparadas, e essa comunhão não
afeta a realidade da presença real de Cristo na Eucaristia como está sendo
apresentada acima.
Ao mesmo tempo, essa
explicação responde à terceira objeção, que nasce da segunda, e que diz que São
Paulo poderia ter apresentado a superioridade da presença de Jesus na Ceia
quando comparou a comunhão nas duas mesas mencionadas. Mas o fato em si não
estava em questão, e isso explica que ulteriores explicações não são exigidas,
e pelo que o próprio objetor apresentou o contexto tratado era outro e não o de
apresentar uma doutrina da ceia. A eucaristia surge ali como parte de um argumento.
Ainda que a superioridade da
eucaristia ajudasse como argumento, o que de fato é verdade, ela não se faz
necessária pelo que já foi posto, pois é dito que as carnes sacrificadas aos
demônios não são nada, o que pode ser concluído que Cristo é tudo. De outra
forma, está afirmando que naqueles sacrifícios não havia divindade para a comunhão,
enquanto que para os cristãos há. Indiretamente se responde à terceira objeção.
Concluindo, São Paulo não
afirmou que somos o pão, mas que somos um pão, da forma que foi explicada
acima.
Mais. Os sacrifícios do
Antigo Testamento simbolizavam a comunhão, com presença espiritual de Deus, e
não física, porque Deus não tem corpo, e os sacrifícios eram sombra do que
havia de acontecer. No entanto, Jesus agora possui corpo.
Ainda, a comunhão do Novo
Testamento é feita pela fé, mas há a presença de Jesus, que tornou-Se carne, e
pode estar presente de forma sacramental. Por isso, afirmou que é necessário
para a salvação comer do pão e beber do cálice, e não se pode afastar essas
palavras de obrigatoriedade da Ceia, pois é nela que há o alimento de Cristo de
forma singular. Cristo alimenta pela Palavra, e de outras formas também, mas o
faz de maneira especial na eucaristia. Isso já leva à fé na presença substancial.
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