quinta-feira, 18 de junho de 2020

A presença de Jesus na ceia

Respondendo a um vídeo sobre a Eucaristia

No canal Dois dedos de teologia foi publicado um vídeo com argumentos contrários à presença substancial de Jesus na Ceia do Senhor, que é a Eucaristia. São apresentados três argumentos, interessantes por sinal, que propõem uma leitura simbólica, memorial e espiritual das palavras de 1ª Coríntios 11 a respeito da Ceia. Em outras palavras, a doutrina que não teria possibilidade alguma seria somente a da presença real substancial, que é explicada pela transubstanciação.

O conteúdo da argumentação utiliza os termos fortes de presença física e presença material, para tornar mais compreensível a contraposição com a ideia intelectual da presença apenas, que está no ensino do mero simbolismo, ou mesmo da presença espiritual, por meio da fé, mas não nos elementos, e da comemoração do memorial do Senhor, que refere-se à morte de Cristo.

O versículo principal para construir o argumento foi 1ª Coríntios 10, 16, partindo do conceito de comunhão.

Em primeiro lugar, o argumento debruça-se sobre o assunto tratado nos capítulo 8, 9 e 10 da 1ª Epístola aos Coríntios. Dessa forma, o fato das comparações com a Ceia do Senhor feitas, no contexto, seria suficiente para negar a presença real de Jesus na eucaristia.

Deve-se ter em mente que a presença real refere-se à presença de Jesus nos elementos da Ceia, e não uma presença espiritual no momento apenas, muito menos uma presença meramente simbólica.

O primeiro argumento é tirado da metáfora de que “nós somos o pão”.

Em 1ª Cor 10, 17 está escrito: “Uma vez que há um único pão, nós, embora sendo muitos, formamos um só corpo, porque todos nós comungamos do mesmo pão”.

O que o texto acima afirma não é que “nós”, a Igreja, somos o pão, mas que existe um só pão, que é Cristo, e que nós, que somos muitos, nos tornamos um Corpo pelo fato de participar do mesmo pão, que é Cristo. Somente secundariamente há lugar para o símbolo do pão em relação à Igreja. O original grego não afirma que nós somos pão! Não há essa fraseologia, e o contexto deixa claro que essa é uma construção claramente simbólica.

Por isso, o argumento de que a Igreja não está substancialmente no pão, que não é partida no pão, como se fosse uma razão contra a presença real de Cristo no elemento eucarístico, não tem validade, porque a Bíblia não afirma que a Igreja “é” o pão.

Sendo assim, da forma apresentada, essa metáfora não existe. O que pode existir, e é o que faz sentido, é tomarmos a Igreja como um pão, simbólico, porque faz comunhão com o Corpo do Senhor. Não havendo, dessa forma, uma metáfora bíblica que compare a igreja ao pão eucarístico, o argumento desaparece.

O texto grego dessa passagem literalmente traduzido afirma o seguinte: Porque um pão, um corpo os muitos somos nós, pois todos de um único pão participamos.

Se podemos ser considerados metaforicamente “um pão” é porque participamos do único pão que é Jesus. Assim, não existem dois pães, mas somente um. E aqui fecha-se o argumento. Ainda, o motivo de podermos aproximarmo-nos da simbologia do pão é pela participação do Pão.

Por isso, não há, nem mesmo na comparação, motivo para pensar que essa metáfora pudesse ser interpretada como exigindo uma presença substancial da Igreja no pão mencionado, para salvaguardar a presença de Cristo, pois a Igreja não é o pão!

Para ficar ainda mais claro: só Jesus é o pão do céu. A Igreja é um pão pela multidão de fieis unidos num só corpo. A Igreja é um pão, com artigo indefinido, um corpo, porque (o motivo de ser isso) participa da comunhão com Jesus, que é (em substância) o Pão que alimenta a Igreja e a faz unida e única.

Portanto, o primeiro argumento não tem força para negar a presença de Cristo na Eucaristia, mas revela um erro interpretativo.

Mas, perguntaria alguém, a metáfora da Igreja como um pão não estaria relacionada à outra metáfora de Cristo como pão? De forma alguma, nos termos que se pretendeu acima, pois Cristo não significa o Pão, mas é o Pão. A Igreja não significa o pão, nem é o pão, mas em sentido simbólico é um pão ou corpo porque se faz uma em Cristo. Para usar o artigo definido poderia dizer-se que a Igreja é o Pão, a Igreja é Cristo misticamente significado. Mas, sabemos que isso é uma forma espiritual de entender o mistério de Cristo e a Igreja. Assim, Cristo é um, e a Igreja é formada por muitos, e assim em Cristo a Igreja é feita um só corpo.

A metáfora comparativa não afeta a presença substancial de Cristo, mas a reforça, como ficará patente mais adiante. E esperamos que o autor desses argumentos apresente resposta a esta refutação.

Então, a Igreja não é mesmo um pão literal, como ficou explicado acima, e não cabe o argumento que se faz sobre essa suposição. A Igreja não está no pão eucarístico porque ela participa do pão e não que é ou está simbolizada no pão. Isso é o que a Bíblia afirma. O pão é Cristo e faz a Igreja tornar-Se misticamente ou espiritualmente o Seu corpo. É algo profundo. Em espírito nos unimos a Cristo, e também nos unimos a Ele na eucaristia. Mas, quem está na Eucaristia é Cristo.

Na última ceia Jesus fez uma espécie de extensão do Seu Corpo, espiritualmente, tornando aquele Pão o Seu próprio Corpo, em substância. Pelo poder do Espírito Santo. O entendimento real através do conceito de fisicalidade ou materialidade é melhor descrito pela substancialidade, que faz com que aquilo que Jesus tinha na mão naquele momento não apenas simbolizasse ou indicasse algo espiritual, mas fosse o sacramento do Seu corpo.

Quando se diz que somos um pão e por isso devemos ser um corpo, está-se misturando as metáforas, porque é o contrário: pela união a Igreja é comparada a um pão, a um corpo. A união faz a comparação do pão e não o pão torna necessário compreender a união. Certamente essa afirmação que o autor faz foi algo que não seja parte necessária da sua argumentação, mas de qualquer forma coloca-se aqui esse esclarecimento.

O segundo argumento é que São Paulo faz a comparação da comunhão que acontece nos sacrifícios antigos e da comunhão que é realizada pela Eucaristia. Então, da mesma forma que na antiga Lei os sacrifícios não precisavam trazer a presença física de Deus para que acontecesse a comunhão, a Ceia do Senhor não exigiria a presença física de Jesus para efetuar a comunhão com Ele. Eis o argumento básico.

Pois bem. São Paulo compara duas mesas, que são dois altares, pois fala de sacrifícios. Isso é algo importante. A mesa dos demônios e a mesa do Senhor, ou seja, o altar dos demônios e o altar do Senhor.

Naquele há comunhão com as vítimas sacrificadas, e no verso 19 está escrito que essas vítimas não são “alguma coisa”, mas o Demônio é que recebe o culto. Em si aquelas carnes não são nada.

Portanto, a comparação com a Eucaristia não se faz por essa via, pois a carne do Senhor que é oferecida na Ceia é a carne juntamente com a Palavra poderosa de Jesus que a torna presente. Ninguém poderia concordar que o corpo do Senhor pelo qual se faz a comunhão seja nada! A comparação da comunhão prescinde da presença substancial, mas está de acordo com ela.

O que o texto afirma é que as carnes sacrificadas não faziam comunhão com as divindades porque as próprias divindades não existiam. Mas, os cristãos oferecem o corpo do Senhor que existe! Por esse lado, estabelece-se o caminho para a compreensão da transubstanciação.

Outra consideração se dá com a argumentação de que o Senhor não estava nos sacrifícios do Antigo Testamento. De fato, Deus não poderia estar ali presente em substância corporal porque Deus é Espírito, e no Antigo Testamento Israel estava à espera do Senhor Jesus. Portanto, a comparação é inválida. Jesus não poderia estar presente nos sacrifícios antigos pois ainda não havia assumido um corpo.

A comunhão era feita pela fé, e não havia presença real substancial pelo motivo acima descrito.

No Novo Testamento, os sacramentos são superiores, pois cumprem o que os antigos sacrifícios simbolizavam. Eles possuem agora a possibilidade que os sacrifícios antigos não possuíam. Agora, Cristo pode estar presente como Salvador, em Sua natureza Humana glorificada, por meio do Sacramento. A comparação segunda também não oferece argumento válido contra a Eucaristia como presença substancial de Jesus.

A comunhão existente nos sacrifícios antigos e no sacrifício do Novo Testamento é real. O que o sacramento novo traz de superior ultrapassa o argumento que é feito a partir do significado de comunhão.

É o mesmo que afirmar que os salvos do Antigo Testamento foram salvos por Cristo, assim como o são os do Novo Testamento. No entanto, a nova aliança é superior, e um dos motivos é o da presença substancial de Jesus no sacramento da eucaristia. A graça é mais abundante. Essa observação responde à segunda objeção apresentada. Ela se dá pela comparação da “koinonia” que há nas duas partes comparadas, e essa comunhão não afeta a realidade da presença real de Cristo na Eucaristia como está sendo apresentada acima.

Ao mesmo tempo, essa explicação responde à terceira objeção, que nasce da segunda, e que diz que São Paulo poderia ter apresentado a superioridade da presença de Jesus na Ceia quando comparou a comunhão nas duas mesas mencionadas. Mas o fato em si não estava em questão, e isso explica que ulteriores explicações não são exigidas, e pelo que o próprio objetor apresentou o contexto tratado era outro e não o de apresentar uma doutrina da ceia. A eucaristia surge ali como parte de um argumento.

Ainda que a superioridade da eucaristia ajudasse como argumento, o que de fato é verdade, ela não se faz necessária pelo que já foi posto, pois é dito que as carnes sacrificadas aos demônios não são nada, o que pode ser concluído que Cristo é tudo. De outra forma, está afirmando que naqueles sacrifícios não havia divindade para a comunhão, enquanto que para os cristãos há. Indiretamente se responde à terceira objeção.

Concluindo, São Paulo não afirmou que somos o pão, mas que somos um pão, da forma que foi explicada acima.

Mais. Os sacrifícios do Antigo Testamento simbolizavam a comunhão, com presença espiritual de Deus, e não física, porque Deus não tem corpo, e os sacrifícios eram sombra do que havia de acontecer. No entanto, Jesus agora possui corpo.

Ainda, a comunhão do Novo Testamento é feita pela fé, mas há a presença de Jesus, que tornou-Se carne, e pode estar presente de forma sacramental. Por isso, afirmou que é necessário para a salvação comer do pão e beber do cálice, e não se pode afastar essas palavras de obrigatoriedade da Ceia, pois é nela que há o alimento de Cristo de forma singular. Cristo alimenta pela Palavra, e de outras formas também, mas o faz de maneira especial na eucaristia. Isso já leva à fé na presença substancial.
Gledson Meireles.

Fonte: vídeo sobre a eucaristia que foi respondido acima. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário