Hoje talvez mais do que nunca as verdades do Evangelho devem
ser pregadas e alardeadas, visto que milênios de ensino e exatidão sobre pontos
divergentes, e suas resoluções, ainda continuam a ser negados e heresias têm
sido renovadas. São criações a partir de problemas naturais que surgem no curso
do entendimento da verdade revelada, mas que passam a ser eles o centro do
ensino, o que caracteriza uma heresia.
Na história mesmo recente, pós-reforma, não foram poucos os
debates sobre a literalidade ou o simbolismo de passagens bíblicas. Alguns caem
em literalismos errôneos, hiper-literalistas, que mesmo tendo intenções sadias
e seguindo princípios hermenêuticos retos, ainda negam o texto bíblico por não
lê-lo, por restringir uma passagem a uma palavra, como se isso fosse
literalismo!
Mas, também há a outra face da moeda, onde o simbólico, o
metafórico, o sentido figurado, toma o lugar de tudo, e até aquilo que antes
parecia óbvio torna-se “outra coisa”, impensada, nunca dantes imaginada, e, o
que é pior, refutada pela própria passagem da Escritura onde deveria ter seu
fundamento.
O evangelho afirma que Jesus estava com Deus “no princípio”,
o que aponta para o ponto do tempo em que a terra começou a existir, e o
momento que pode-se pensar como aquele que liga à eternidade. Pois, no
princípio o Verbo (Jesus) estava com Deus, antes de toda criação, e “era Deus”,
ali mesmo desde a eternidade e já no começo da criação inteira, sendo Deus
eterno antes de toda a criação, junto com o Pai. (cf. João 1,1.2)
E eis que em um momento da história o Verbo (Jesus) “se fez
carne”, ou seja, tornou-Se carne, criando para Si um corpo humano feito de
carne, e, diz a Escritura, “e habitou entre nos”. (João 1,14)
Ninguém poderia entender diferentemente, mas há quem o faça.
Então, tentemos ir adiante. O verbo reflexivo “fazer-se” ou “tornar-se” já
indica algo pré-existente. Jesus tornou a água em vinho. O vinho foi feito a
partir da água. Então a água fez-se vinho pelo poder de Deus, poderíamos usar
tal milagre para ilustra o “fazer-se”, embora a água como criatura bruta
irracional não possa “fazer-se”, mas foi feita, o que entra no mesmo conceito
pretendido nessa ilustração. O poder de Deus fez a água transformar-se em
vinho. Ela transformou-se não pela natural tendência de sua substância, mas foi
transformada pela ação do poder de Deus nela. Portanto, toda a glória e louvor
a Deus.
Pois bem. Jesus veio do céu, fez-se carne pelo poder de Deus,
que tem junto do Pai. O texto ainda afirma que Jesus tem “glória junto ao Pai”.
Essa glória vista pelo mundo já existia antes de ele nascer como homem, antes
de Ele existir como homem, antes de Ele nascer na terra. E isso fica claro
ainda pelas palavras de João Batista: “porque existia antes de mim”. Ou seja,
Jesus veio após João, pois foi concebido quando João já estava no ventre de
Isabel há seis meses. Por isso, João Batista nasceu antes de Jesus, era mais
velho que Ele, mas ainda assim afirma que Jesus existiu antes dele.
E no verso 18, algo que comprova essa leitura tão clara, é a
afirmação de ninguém viu a Deus, mas que o Filho Unigênito que “está no seio do
Pai, este o deu a conhecer”. Ou seja, Jesus viu o Pai, em comparação com a
criação inteira de homens que nunca viram a Deus. Ele o deu a conhecer, pois
está (não estava) no seio do Pai. (cf. João 1,18)
No entanto, Jesus comparou-Se ao maná que sustentou o povo de
Israel, alimentando-o durante quarenta anos no deserto. O maná veio do céu,
como o pão do céu para o povo eleito. E Jesus agora compara-se com o maná.
Entendem alguns que como o maná não existia no céu, e não
havia sido lá guardado para depois vir à terra, então Jesus também não poderia
estar no céu para então ser transferido para a terra. Ledo engando.
Ainda assim, o maná tem perfeita correlação com o Senhor
nessa comparação. O maná é o pão do céu, criado por Deus nas alturas e caído do
céu à terra para alimentar o povo, fisicamente, para que andasse no deserto
peregrinando em direção à terra prometida.
Do mesmo modo, Jesus veio do céu para o ventre de Maria,
criando para Si um corpo, como o maná, um corpo físico, material, de carne e
osso, sendo então a Sua origem humana na terra, a criação do Seu corpo, a
geração da Sua natureza humana no ventre da virgem Maria, a filha de Sião.
Ele tem “em comum carne e sangue” (cf. Hebreus 2,14) com os
filhos, participando da mesma condição dos homens. A Bíblia explica a
encarnação dessa maneira, pois Jesus veio do céu, e não seria necessário
explicar, se isso fosse a sua natureza única, igual aos homens apenas nesse
sentido, pois assim seria necessariamente humano como todos, não necessitando
de ulteriores esclarecimentos sobre o modo e o foto como participa da
humanidade ao lado de todos os homens.
Por isso, como o maná foi criado por Deus e caiu do céu, o
corpo de Jesus foi formado e criado por Deus no ventre de Maria (cf. Hebreus
10,6), e a Pessoa divina de Jesus veio nele habitar. Por isso, Jesus veio do
céu.
No próprio capítulo 1 de João, temos que a origem celestial
de Jesus é manifesta. Por exemplo, João Batista é “enviado” por Deus, seu
batismo é “do céu” (Mateus 21,25), mas a Bíblia não afirma que o próprio João
veio do céu, nem usa a expressão desceu do céu para falar de sua origem. O
batismo veio do céu, João não.
Mas, quanto a Cristo, Ele mesmo diz: “Desci do céu”. Não é apenas
o seu ensinamento, a sua doutrina, a sua missão: Ele próprio desceu do céu.
Agora, sem precisar ser mais exato, mas continuando na precisão doutrinal
exigida dos amados de Deus, continuemos a vislumbrar a verdade do Senhor que
veio do céu à terra salvar os pecadores.
Quando os judeus incrédulos diante das palavras de Jesus: “Eu
sou o pão descido do céu”, não compreenderam suas palavras, mas antes a
negavam, pois viam em Jesus um homem como os outros, “o filho de José, cujo pai
e mãe conhecemos”, essa incredulidade contrasta com a verdadeira teologia, que
mostra o Senhor descido do céu, e não tendo origem absoluta na terra. Ele veio
do céu, assumindo natureza de Homem, formando-Se segundo as regras da natureza
humana, e vivendo em tudo, 100% como homem, sendo 100% Deus, mas que os homens não podiam isso
tudo compreender. Pensavam: não é esse o filho de José, homem como nós, como
disse ter vindo do céu? É mesmo assim, as palavras claras de Deus impactavam
aqueles corações petrificados pela falta de vontade de crer.
Crentes no Senhor, cremos que como o Senhor Deus fez chover
do céu a comida celestial que alimentou milhares, aparecendo após a secagem do
orvalho que caíra naquela noite de abençoada fartura (Êxodo 16,4.14), o Senhor
Jesus desceu do céu, e habitou entre nós.
Aliás, como fazer introdução em algum lugar se não estava
antes em outro lugar que não aquele? E é isso que a Bíblia diz quando afirma
que o Filho foi introduzido no mundo, pois veio do céu e entrou na terra. O
Espírito Santo veio formar o corpo de Jesus no seio de Maria, trazendo o Filho
do céu à terra. (cf. Lucas 1,35) Eis o Filho do Homem, pois descendente de
Davi, membro da raça humana, o novo Adão.
Ele esvaziou-Se tomando a forma humana. Não teria sentido se
Sua origem fosse puramente humana. Esvaziar-Se de quê, se não existia antes?
Assim, Cristo veio do céu, tomando forma de servo, vivendo antes como Deus
passou a habitar na terra como homem. Eis o Evangelho.
Gledson Meireles.