quinta-feira, 28 de abril de 2022

Isaías 14 e a imortalidade da alma

O Sheol em Isaías 14


Para quem crer que a alma morre com o corpo, afirmar que o sheol é lugar de almas seria uma interpretação fora do contexto.  Mas vejamos. Ainda que seja uma metáfora, como se diz das árvores que falam, podemos notar noções que estão envolvidas nessas metáforas.

As árvores recebem qualidades humanas, como a fala. Mas, quando se refere a mortos no sheol, são as pessoas que são os sujeitos, nas suas almas, e não nos seus corpos.

Não parece exato afirmar que seja uma personificação dos mortos, porque os mortos são pessoas. Entretanto, pode-se afirmar que seja uma personificação das almas dos mortos. No entanto, a alegoria não nega, também, que as almas existem na região dos mortos.

Por isso, a cena é alegórica, mas ela remete à verdade que está representando. De fato, é de se crer que existe a alma que pode ser separada do corpo e ainda permanecer em existência.

É verdade que a personificação das árvores não pode ensinar que as mesmas possuem consciência. Mas, no caso dos mortos isso muda de figura, já que se trata de pessoas, que possuíam consciência, eram racionais, quando vivas. Há algo que leva a pensar no estado da alma na morte. E a cena bíblica não nega isso, como ficará claro abaixo.

O verso 11 certamente não é uma referência ao sheol, mas ao túmulo. Enquanto se diz que Tua majestade desceu à morada dos mortos, acompanhada do som de tuas harpas, parece indicar, de forma alegórica, que a alma desceu ao mais profundo abismo, como está no verso 15. Não parece nada com o túmulo.

Por isso, quando o verso 11 continua: Jazes sobre um leito de vermes, isso se refere ao corpo, mas não necessariamente está ligado ao sheol, pois parece referir-se a duas coisas, uma relativa à alma e outra ao corpo.

O fato de que todos os reis repousam no seu túmulo (מִֽקִּבְרְךָ֙ em hebraico), o rei da Babilônia não foi sepultado, não foi colocado no túmulo. Assim, o verso 19 diz: tu, porém, foste atirado para longe de teu sepulcro. E o verso 20 afirma que ele não se reunirá com os reis no sepulcro. Isso se refere ao corpo que não foi sepultado. Novamente, alusão às duas partes da pessoa aqui, a alma e o corpo.

Mas, da alma do rei, o verso 9 diz: Debaixo da terra se agita a morada dos mortos, para receber-te à tua chegada. O rei chegou ao sheol, chegou à morada dos mortos, foi recebido pelos grandes da terra que estavam mortos. De fato, é uma forma alegórica para afirmar que o rei morreu, mas é uma cena, do mesmo capítulo, onde o rei encontra-se no mesmo lugar dos demais mortos. Ao contrário, quando se refere ao túmulo, o rei não se junta aos demais. É a forma hebraica de falar do corpo e da alma.

Aliás, no sheol as almas encontram-se em quase vida, em um estado em que não há comunicação, e vivem na escuridão e longe de Deus, o que faz pensar em um sono, mas não em inexistência. Por isso, a metáfora de acordar as sombras que ali estão (v. 9).

A lição que toda a cena ensina é que o rei seria humilhado na morte, mais que os outros reis, pois aqueles encontraram sepultura e ele não. Pode-se entender a lição sem negar o que ficou explicado acima.

As árvores de Ezequiel 31 que vão ao sheol estão no contexto de uma parábola, e isso é compreensível. Basta pensar que literalmente as árvores não são enterradas em túmulos, como os corpos. Da mesma forma, elas não descem ao mundo dos mortos com suas almas. A noção de sheol  é diversa da de túmulo.

Por isso, o rei, com sua majestade, com o som da harpa, desce ao sheol, mas seu corpo não entra na sepultura. Usando de comparações que não são semelhantes à cultura grega, sem utilizar os termos corpo e alma, a cena é bastante indicativa dessas duas realidades, de que a alma do rei desce ao sheol, com sua pompa, ao encontro dos reis que levantam-se para recebê-lo, e do corpo que está sobre vermes, fora do sepulcro, longe da companhia dos reis.


Em refutação ao livro A lenda da imortalidade da alma, versão nova e atualizada, sobre o Sheol.

Gledson Meireles.

terça-feira, 26 de abril de 2022

Leandro Quadros: sobre a ressurreição de Moisés, uma palavra sobre o livro

Comentário respondendo, de forma geral, ao livro Porque você deve crer na ressurreição de Moisés, escrito pelo pastor adventista Leandro Quadros. O livro conta com textos do pastor adventista Sérgio Monteiro, que é teólogo e pesquisador, e de Marcos Alves, apologista adventista.

Já escrevi aqui no blog sobre a ressurreição de Moisés, afirmando que não é possível ensiná-la a partir da Bíblia, e que é uma doutrina que tem muito menos fundamento que a assunção de Maria, doutrina criticada pelo Protestantismo em geral. E não crida nem mesmo pelos adventistas.

Mas é preciso afirmar uma coisa: se Moisés ressuscitou, isso é menos problemático para a Igreja Católica, que ensina a imortalidade da alma, e que se esse for o fato não há necessidade de mexer na doutrina católica, do que para o adventismo, que torna necessária a ressurreição de Moisés, uma vez que ele apareceu a Jesus no dia da transfiguração.

O autor afirma que irá refutar argumentos infundados usados contra a ressurreição de Moisés.

 

Capítulo 1

 

No pressuposto 1, a discussão é feita em torno da mencionada disputa entre Miguel e Satanás pelo corpo de Moisés, e afirma que Deus já o havia sepultado. Então, para o adventismo essa disputa ocorre após o sepultamento de Moisés.

Para o argumento católico, podemos dizer, foi Miguel quem sepultou Moisés, por ordem de Deus. Esse episódio, portanto, refere-se ao dia do sepultamento e não que o arcanjo veio para ressuscitá-lo.

De fato, por que Deus sepultaria Moisés e logo mandaria um anjo para ressuscitá-lo? Não tinha ninguém mais ali. Nem depois alguém mais viu o túmulo do profeta.

Por que, então, não transladá-lo diretamente para o céu? Certamente, porque a morte de Moisés era uma punição por ter pecado, e por isso não entraria na terra prometida.

Mas, e por qual motivo logo em seguida ele entraria no céu? Não entrou na terra onde corre leite e mel, o que já é uma punição, mas recebe, logo mais, um prêmio maior, o cumprimento das profecias referentes à terra prometida, entrando no próprio céu. Isso já mostra a incoerência desse pensamento. É pelo menos uma dificuldade.

Isso não é um argumento baseado no tempo decorrido entre a morte e a suposta ressurreição, já que Lázaro ficou quatro dias no sepulcro e depois foi ressuscitado por Jesus, e o próprio Senhor permaneceu três dias no túmulo para depois ressuscitar vitoriosamente.

O que se está colocando aqui é o motivo de Deus ter anunciado a Moisés que ele ali morreria, e depois tê-lo sepultado, ocultando o lugar do seu túmulo, para depois ou quase imediatamente ou após alguns dias, talvez, certamente menos que quatro dias, mandar um anjo para ressuscitar o profeta.

O próprio fato da ressurreição de Moisés é uma inferência, uma dedução, já que se pode normalmente crer que Miguel tenha discutido com Satanás no dia do sepultamento e não que o arcanjo foi enviado para que ressuscitasse Moisés.

Ainda, é muito estranho, repetindo o argumento, que Deus tenha punido Moisés não permitindo que entrasse na terra prometida, mas logo em seguida o levasse para o céu. É algo para refletir, pois não é um argumento muito forte, apenas um indício de que há algum erro no pensamento a respeito da ressurreição de Moisés.

No pressuposto 2 é perguntado se o autor bíblico concebia a existência de uma alma sem o corpo. A resposta é positiva.

Mas o autor, citando em nota até mesmo autor católico, afirma que a Bíblia não ensina ser possível viver fora do corpo.

Então, afirma que há evidências bíblicas e extrabíblicas para a ressureição de Moisés. As passagens bíblicas não falam do tema, e não necessariamente levam ao entendimento de que Moisés ressuscitou.

O pressuposto 1 diria que a luta pelo corpo de Moisés é por causa da sua ressurreição, e o pressuposto 2 ensinaria que é impossível encontrar na Bíblia e separação de corpo e alma, onde a alma permaneceria consciente. Por isso, todas as “evidências” da ressurreição de Moisés devem ser aceitas.

Mas é possível entender que a disputa ocorreu no dia em que o arcanjo Miguel enterrou Moisés, e é provado na Bíblia que a alma separa-se do corpo na morte e permanece em lugar espiritual, no sheol.

 


Capítulo 2

 

Deus teria antecipado a ressurreição de Moisés? E por que você, caro cristão adventista, não crê que Deus antecipou a glorificação da virgem Maria, a mãe do Senhor Jesus, e que ela não dorme no pó da terra, mas está no céu agora? Por que você não crê nisso?

É verdade que a maioria dos protestantes não creem na ressurreição de Moisés, e nem na assunção de Maria. Mas, para os adventistas, é um questionamento válido.

Não há nada de mal na comunicação com os mortos em si, mas a proibição bíblica tem a ver com a evocação dos mortos, as práticas de necromancia, etc., próprias das religiões pagãs, que tentavam contato com os mortos para obterem benefícios. Isso já mostra que a fé na imortalidade da alma é antiga e não há exemplo bíblico contra ela. Apenas a proibição de consultar os mortos, não a impossibilidade de que eles existam em suas almas após a morte. Esse seria um argumento radical, que a Bíblia nunca emprega.

A citação de Judas 9 não é muita clara a respeito da disputa que ocorreu. Sabe-se apenas que foi “a respeito” do corpo de Moisés. A obra Assunção de Moisés é pseudoepígrafa, escrita no século I (ou como outro erudito afirma, entre 3 a. C. a 30 d. C), como diz o autor, e, portanto, no Antigo Testamento, certamente, ou possivelmente, ninguém creu que Moisés foi ressuscitado, ou foi uma crença de alguns, e não do judaísmo oficial. Isso teria sido ensinado nessa obra, por essa época, talvez, e não antes. Tal fato já substancia mais um argumento contrário à ressurreição de Moisés.

Se assim o for, realmente a Bíblia é totalmente silenciosa sobre o tema, não falando do fato diretamente nem proporcionando indícios ou provas indiretas. Ainda, o povo judeu não conheceu tal teoria, a não ser a partir do século I depois de Cristo.

Qual o motivo da disputa? A tese adventista afirma que só pode ser a ressurreição. É uma inferência, mas não é tão forte como prova. Diante das dificuldades, ela ainda torna-se mais frágil.

Até o momento, as provas apresentadas de que a disputa deve ter sido a respeito de algo muito superior do que apenas uma briga por um corpo morto, e de que a alma não existe sem o corpo, são coisas que não podem provar a ressurreição de Moisés. Ainda que faça sentido a disputa pela ressurreição de Moisés, a dificuldade permanece, sobre o motivo de Deus ter sepultado o profeta para depois mandar ressuscitá-lo? Por que o sepultamento não pode ter sido feito por Miguel, nessa passagem de Judas 9?

E sobre a imortalidade da alma, essa doutrina é bíblica e pode ser solidamente provada pelas Escrituras Sagradas.

 


Capítulo 3

 

Muitas vezes na Bíblia o que o anjo do Senhor faz equivale a dizer que é feito pelo próprio Deus. Assim, se o anjo Miguel sepultou Moisés, por ordem de Deus, foi Deus Quem sepultou Moisés, nesse sentido bem compreendido. Assim, o Senhor sepultou Moisés. Como foi feito isso? Através do arcanjo Miguel.

Ao tentar explicar João 1, 1-2, afirmando que Deus não teria revelado a assunção de Moises, visto que os israelitas fariam uma imagem dele para o idolatrar não é convincente, mas pressupõe que o fato ocorreu. Já que o fato não é provado, e o texto é lido naturalmente como afirmando que Moisés havia morrido, e não tendo dito nada mais, não há motivo de supor que algo mais tenha ocorrido.

É fato que a revelação é progressiva, assim com a assunção da virgem Maria é encontrada indiretamente na Bíblia e diretamente na tradição, como sendo de origem apostólica, e muitos tentam ofuscar essas verdades.

Mas, quanto à suposta ressurreição de Moisés, ainda que o princípio de revelação progressiva exista, e que se o fato realmente ocorreu não é problemático para quem crê na imortalidade da alma, é preciso reafirmar que não há a menor indicação de que tenha ocorrido, e há também inúmeros problemas que levam a afirmar que não ocorreu. Isso ficará patente em todo o arrazoado apresentado aqui, e que serve resposta ao livro.

Entende-se que São Judas usou parte da obra Assunção de Moisés para mostrar um exemplo de como o arcanjo Miguel comportou-se ao discutir com Satanás. Somente isso. O restante não é objeto direto da citação, não tendo seu sentido revelado. Sabe-se apenas que houve uma disputa entre Miguel e Satanás a respeito do corpo de Moisés. O restante é apenas inferência, é preciso repetir.

É muito boa a contextualização buscada para entender a questão, a citação de estudiosos de documentos como o Talmude Babilônico e Flávio Josefo, contendo indícios de crenças que incluíam até mesmo a ascensão de Moisés sem passar pela morte. Se essas crenças consubstanciam algo relativo ao fato de que Moisés foi ressuscitado, deve o estudioso considerar que o mesmo ocorre com a doutrina da assunção de Maria.

Entretanto, ressalta-se que no caso da assunção da virgem Maria ao céu os fundamentos bíblicos são superiores.

 

Capítulo 4

 

O fato é que o texto bíblico não é claro quanto à ressurreição de Moisés. As fontes extrabíblicas citadas é que dão maior ênfase a isso. Quando passando para o caso da assunção de Maria, as fontes extrabíblicas são claras e os princípios bíblicos são abundantes, em comparação com o que se encontra na defesa da tese sobre Moisés.

A afirmação de que Não há como negar que ele realmente foi ressuscitado é enfática demais, é exagerada.

Ainda, se Moisés ressuscitou, isso não é prova de que a alma não existe. O contrário é que seria problemático para o adventismo, pois se Moisés apareceu sem ressuscitar, então a alma é imortal, e o adventismo deve rever urgentemente sua crença na imortalidade condicional ou mortalidade da alma.

Em Daniel 12, 1-2 não se fala de Miguel tendo parte ativa na ressurreição, mas afirma somente que aparecerá Miguel, e depois afirma que muitos serão salvos e também menciona a ressurreição.

 


Apêndices

 

Aqueles que creem dogmaticamente na ressurreição de Moisés não sabem quando o mesmo ressuscitou, quanto tempo passou no sepulcro. Mas, como já dito antes, é curioso o motivo de haver um sepultamento por Deus, o que não é comum, é algo extraordinário que o Senhor sepulte alguém, e mais tarde o Senhor ressuscite Moisés.

As circunstâncias parecem não exigir tal procedimento, já que ninguém estava ali com Moisés. Isso não significa que não pode ter acontecido assim, esse não é o caso. O que se propõe com essa pequena dificuldade é uma abertura para pensar nesse particular, o que já é um elemento que entra na argumentação que indica que Moisés permanece no sepulcro.

A transfiguração de Jesus foi o momento em que Moisés apareceu. Para quem admite a imortalidade da alma, não há qualquer problema. Então, a passagem não exige que outra interpretação seja dada.

Em Romanos 5, 12-14, ao falar da Lei, e afirmar sobre o poderio da morte, o texto afirma que a morte reinou até Moisés, no contexto em que Moisés trouxe a Lei. Até à Lei o mal estava no mundo. Isso significa que antes da Lei o mal não era imputado, a morte reinava, antes da Lei. Isso é algo pacífico. Mas, o adventismo entende aqui algo que pode indicar a ressurreição de Moisés, pois se de Adão até Moisés reinou a morte, a ressurreição teria feito a morte ser derrotada em seu reinado. Embora saibamos que não é esse o contexto, fica o texto como “evidência” para os que acreditam que essa passagem é uma luz sobre o assunto.

E o outro texto é Judas 9, já comentado, que não trata da ressurreição de Moisés, mas que alude a uma obra apócrifa que testemunharia a crença de muitos judeus de que Moisés foi ressuscitado e levado ao céu.

Ao explicar termos, como o tagma, que é um hápax legomen, mostrando que o mesmo pode indicar uma ordem, no sentido de grupo, e não necessariamente se referir ao tempo, já auxilia na compreensão de que a virgem Maria foi ressuscitada antes do dia final e já está no céu, sem que haja qualquer problema bíblica quanto a isso. Jesus foi o primeiro a ressuscitar, depois os que pertencem a Ele por ocasião da Sua vinda. Pelo contexto, não se diz que ninguém pode ressuscitar antes ou depois de Cristo, e, ainda, como explica o termo tagma, pode-se melhor entender a questão. Ainda mais, a virgem Maria foi glorificada após a ressurreição de Cristo, o que é uma objeção a menos, quando comparado ao caso suposto de Moisés.

De fato, se a morte reinou até Moisés e não depois, por causa da ressurreição, então Moisés seria aquele que venceu a morte, ou aquele que Deus usou para vencer a morte, para quebrar o seu reinado. Essa é outra questão que está entre os melhores argumentos, e que podem fortalecê-los.

É pedido apenas que o cristão adventista pense nisso e tente responder satisfatoriamente, ou seja, ao menos pela Bíblia e pela razão.

Moisés pode ter sido ressuscitado e glorificado, pois Enoque e Elias foram ao céu glorificados, antes da cruz. Portanto, essa não é um argumento válido contra a ressurreição de Moisés.

De fato, pelos méritos da cruz a virgem Maria foi perdoada do pecado original. Por isso, após a cruz, ela foi levada ao céu glorificada.

Assim, a ideia de que a cruz é o fundamento para coisas que acontecem antes dela é válida.

O que se diz sobre Moisés é que os argumentos bíblicos são bastante reduzidos em força, e não há na tradição viva da Igreja a crença de que Moisés tenha sido ressuscitado, e nem entre os judeus parece ter sido uma crença geral.

O que o livro não afirma, é preciso trazer aqui, para melhorar o entendimento da questão, e permitir maiores reflexões, diante de tantas dificuldades importantes.

A obra apócrifa “Assumptio Moysis”, segundo a Enciclopédia Judaica, certamente ensinava que Moisés não morreu, mas que foi arrebatado ao céu, como havia sido Elias.

Ainda, havia a crença de que Moisés foi preexistente, como o Messias, e etc. Contra isso, os rabinos ensinaram que nenhum homem subiu ao céu.

A Bíblia afirma que Moisés morreu, foi sepultado por Deus, e ninguém mais soube o lugar onde foi enterrado.

Mais uma vez, temos a autoridade de Ellen White para os adventistas. Embora sendo adeptos do Sola Scriptura, a IASD precisa interpretar a aparição de Moisés em Mateus 17 como sendo de Moisés ressuscitado e glorificado, pois é dogma adventista que a alma morre, o que é endossado pela sra. White. Para melhor compreensão dessa questão, leia os artigos no blog que versam sobre a IASD.


Gledson Meireles.

domingo, 10 de abril de 2022

Nisto Cremos, da IASD: estudando o sentido do mandamento do Sábado

Estudando o livro Nisto Cremos, da Igreja Adventista do Sétimo Dia – IASD, continuamos a aprofundar no sentido do mandamento sabático. Já foi explicado antes, no estudo do livro Questões sobre Doutrina, a respeito do assunto, de forma a dialogar com o texto daquela obra oficial do adventismo.

Agora, mais uma vez, a questão é aberta ao diálogo, tendo em conta outro texto oficial, aprovado, que apresenta o sábado como os adventistas devem crer e praticar. Dessa forma, compreende-se mais detalhes sobre o assunto.

Já no início o documento adventista explica que o sábado foi estabelecido por Deus como memorial da criação, para ser guardado por todas as pessoas, e inclui o símbolo da redenção, da santificação, e o antegozo do reino de Deus. Afirma ainda que o sábado é sinal eterno do concerto de Deus com seu povo. Isso já abre espaço para se dizer que o o descanso sabático no sétimo dia não pode ser mudado. Dessa forma, para o adventista, não é possível guardar o sábado em outro dia, como no domingo, por exemplo.

Tal não é uma afirmação totalmente baseada no texto bíblico, nos princípios que veremos que fluem da Bíblia, mas em uma leitura de que o sábado é moral e não cerimonial, o que já foi refutado nos estudos anteriores de forma suficiente.

Por isso, podemos afirmar com certeza que a guarda do domingo inclui a celebração dos atos criadores e redentores de Deus. Assim como os adventistas incluíram a comemoração na ressureição, da redenção e da santificação na guarda do sábado, os cristãos católicos mantém a celebração da criação e do repouso do Senhor Deus no sétimo dia quando guardam o domingo.

Quando observamos o domingo estamos cumprindo totalmente o dever de adorar a Deus, reconhecendo a distinção entre Criador e criatura. O preceito moral continua de pé e é observado na Igreja, com toda a riqueza doutrinal, toda a força cerimonial, toda a espiritualidade, todo o sentido escatológico.

Interessantemente, o adventismo considera o sábado em seu caráter memorial, espiritual e celestial, como ensina o Catecismo católico, e portanto reconhece, por isso, que o sábado é cerimonial nesse sentido. De fato, é esse aspecto do sábado que é entendido como cerimonial, e não apenas o que se refere àquilo que deveria ser cumprido em Cristo.

Muito boa a observação de que a obra de Deus termina com o sete dias. O mundo é criado em seis dias, e o sábado é criado pelo repouso do Senhor. Isso está conforme a semana cristã, que trabalha os seis dias e descansa no sábado, em honra de Deus.

A bênção de Deus no sétimo dia não cai literalmente no tempo, pois o sétimo dia do Senhor é o primeiro após a criação do homem, mas na sua formação segundo é entendida a partir da revelação bíblica da cronologia da semana em sete períodos de tempo de manhãs, tarde e noite, sendo cada um desse um dia. Os sete dias da criação, sendo o sétimo abençoado por Deus e santificado por Ele.

O domingo cumpre essa prescrição ritual, onde descansamos em honra de Deus, nos relacionamos com Deus, crescemos na graça e na fé.

Deus está presente quando o homem santifica o sábado em Sua honra. O domingo é o dia de celebração dos santos mistérios de Cristo, e isso faz do domingo o sábado cristão, cumprindo todo o mandamento.

O sábado foi para Israel, após a libertação da escravidão do Egito, sinal entre Deus e o Povo. De fato, na escravidão não podiam guardar o sábado, não podiam descansar condignamente nem adorar a Deus no Seu santo dia. Mas, após o evento do Sinai, tudo pode ser resgatado, a o povo passa a cumprir de fato os 10 mandamentos. Êxodo 16  ensina a profundidade da doutrina do sábado.

O Lembra-te é ensinado no catecismo como algo referente ao caráter cerimonial do sábado, que deve ser lembrado, quando à determinação do tempo, já que pela lei natural é impossível que se saiba qual dia se deve repousar. A IASD explica que o Lembra-te é ordem para não perder-se de vista a importância do sábado.

De fato, a explicação adventista está correta, mas não atingiu o cerne da questão, que está no catecismo, pois é sabido que o mandamento que prevê o descanso e a adoração a Deus em certo tempo é um dado acessível pela razão, mas o tempo em que isso deve ser feito não o é, e pela revelação, sendo o sábado o dia que é memorial da criação, deve, portanto, ser lembrado. Assim se explica sua parte moral e cerimonial.

Então, entra outro aspecto da discussão: O mandamento define o tempo de repouso e adoração. Correto, pois é o que o Antigo Testamento revelou. O sábado é o tempo dado ao povo de Deus para repousar e adorar a Deus, e não outro dia qualquer. É o dia em que se deve cumprir o mandamento moral, religioso e cerimonial, por assim dizer.

No entanto, a questão de sua cerimonialidade é que o faz aberto a mudança quanto ao tempo. Isso pode ser feito, sem infringir a lei moral, que é eterna. É certo que ninguém pode fazê-lo, se não tiver autoridade de Deus. Somente Deus pode mudar essas questões relativas à Sua Lei.

De fato, foi isso que aconteceu no Novo Testamento, quando vemos a Igreja celebrando os mistérios centrais da fé no primeiro dia da semana, corroborado pelo fato de que a tradição apostólica transmitida ao longo dos séculos mostra que o domingo tornou-se o dia de descanso e de culto a Deus na nova aliança.

Dessa forma, foi Deus quem guiou a Igreja para essa mudança de dia apenas, e não de doutrina. A doutrina, portanto, foi enriquecida, desenvolvida, cumprida em Cristo, já que no dia de descanso se celebra a salvação realizada por Cristo na cruz, a ressurreição do Senhor, e o sábado definitivo que virá.

Portanto, guardando o domingo temos o antídoto igual contra a idolatria, pois reconhecemos o único Deus soberano, criador e salvador e rei.

Assim, a Igreja Católica ensina igualmente que o sábado é o selo de Deus, fazendo melhor a observância de todos os outros mandamentos. Isso foi explicado nos artigos anteriores sobre o sábado do Senhor. O domingo é assim o sábado cristão.

Algo a ser repetido aqui, e com ênfase maior no ensino bíblico, é que a Bíblia apresenta os sábados como santas assembleias, como solenidades do Senhor (cf. Lv 23, 2).

O capítulo 23 de Levítico trata dessas solenidades, incluindo o sábado do sétimo dia, que é cerimonialmente colocado junto com os demais, nesse sentido, o que prova ser também de caráter cerimonial.

O pentecostes, por exemplo, é dia de santa assembleia, de repouso, e de natureza perpétua para o povo de Israel. Isso mostra que deveria sempre ser seguindo, por todo o tempo da Aliança, o que explica os cristãos judeus continuarem a seguir certas prescrições, ainda que não mais obrigatórias.

Nenhuma passagem distingue os sábados nesse capítulo, que os apresenta todos igualmente devendo ser seguidos, de igual forma, e com igual reverência.

Quando os adventistas reconhecem que Cristo adicionou ao sábado do memorial também a celebração da redenção do povo, a partir da páscoa dos hebreus, está aceitando a doutrina bíblica e católica a respeito do sábado, que é mais próxima do que o que se encontra na apologética protestante que não admite nenhum dia de descanso, como se todos os dias, nesse quesito, fossem iguais, e coisas desse tipo, que não fazem parte da apologética católica.

Quando Jesus afirma em Marcos 2, 27 que o sábado foi estabelecido por causa do homem, está explicando algo da Escritura. De fato, o homem precisa de descanso e de prestar culto a Deus. Dessa forma, o preceito serve ao homem e o prepara para seu melhor relacionamento com o Senhor.

Durante todo o seu ministério terrestre, Jesus exemplificou diante de nós a fiel observância do sábado.” (Nisto Cremos, p. 314). Assim também ensina o catecismo, quando diz: “O Evangelho relata numerosos incidentes em que Jesus é acusado de violar a lei do sábado. Mas Jesus nunca viola a santidade deste dia.” (CIC, 2173).

No entanto, afirmar que o fato de Cristo ter participado a adoração no sábado constitui prova de seu endosso do dia do sábado com dia de guarda para o cristão é algo que vai além do texto bíblico, pois Jesus veio sujeito à Lei, cumprindo todas as exigências legais, de bom grado, com filho de Deus, cumprindo a Lei de Deus, conforme dada a Moisés, nas Escrituras, sendo circundado, apresentado no templo, adorando aos sábados nas sinagogas, cumprindo as leis alimentares, reconhecendo as autoridades farisaicas, frequentando o templo, observando as festividades judaicas, etc. Nem todo o que o Senhor Jesus endosso na Lei é para ser cumprido pelo cristão, e o sábado foi entendido na Igreja, desde os apóstolos, como dia que não deve, quando ao tempo, ser continuado na Igreja, pois foi levado à realização no dia do Senhor, o domingo.

Em Mateus 24, 20 Jesus fala do sábado, no tempo da perseguição, com dia que continuaria a existir, tanto na tribulação do tempo da destruição de Jerusalém, como na tribulação final, como entende o adventismo. Mas isso é idêntico ao que está no livro do profeta Isaías, onde a lua nova e o sábado aparecem na eternidade, o que não faz nem de um nem do outro algo que deverá ser cumprido no céu.

Se o sábado continua no domingo cristão, há então maior compreensão dessa exortação do Senhor.

O sábado foi a consumação da obra da redenção da raça humana, de fato. Entretanto, a Igreja não entendeu com continuidade de observância desse exato dia, mas já foi realizado na prática os festejos da ressureição, celebrando o culto cristão no primeiro dia.

Dessa forma, observando o domingo, os seguidores de Cristo, igualmente, se regozijam com Ele das Suas obras em nosso favor, em favor da humanidade.

Muito é dito sobre os apóstolos continuarem a guardar o sábado. Isso já foi explicado que não se trata de ensinar algo que continua tendo validade e obrigatoriedade no tempo do Novo Testamento, mas como algo que podia continuar a ser seguido, sem qualquer problema, já que não era errôneo em si, mas piedosas práticas da Palavra de Deus, que havia se cumprido em Cristo.

As inferências que são feitas de muitas passagens, por exemplo, de Atos dos Apóstolos, é que São Paulo participou dos serviços sabáticos e por isso aceitou a guarda do sábado como cristão. Portanto, a afirmação que a IASD faz, de que “os discípulos adoraram no sábado do sétimo dia”.

Os textos que poderiam substanciar a afirmação são os seguintes, citados abaixo somente no que toca mais diretamente ao assunto, e podem ser conferidos na Bíblia, para maior compreensão do contexto:

Atos 13, 14: “e, entrando na sinagoga, num dia de sábado, assentaram-se”.

Atos 13, 42: “E, saídos os judeus da sinagoga, os gentios rogaram que no sábado seguinte lhes fossem ditas as mesmas coisas

Atos 13, 44: “E no sábado seguinte ajuntou-se quase toda a cidade para ouvir a palavra de Deus

Atos 16: 13: “E no dia de sábado saímos fora das portas, para a beira do rio, onde se costumava fazer oração; e, assentando-nos, falamos às mulheres que ali se ajuntaram.

Atos 17, 1: “E Paulo, como tinha por costume, foi ter com eles

Atos 18, “E todos os sábados disputava na sinagoga, e convencia a judeus e gregos”.

Os textos ensinam que os discípulos iam à sinagoga no sábado, que eram convidados a irem à sinagoga para pregar o evangelho, São Paulo tinha por costume pregar o evangelho aos sábados a judeus e gentios, nas sinagogas. Afirmar que os discípulos guardavam o sábado como cristãos, como parte da doutrina cristã, só pode ser feito por inferência, não dessas passagens, mas por outros meios. Isso é claro em Atos 21, 25, onde São Paulo, como judeu, podia guardar a Lei, para não escandalizar, mas que isso não era exigido dos cristãos gentios, a não ser o que foi estipulado no Concílio de Jerusalém.

Outra questão a ser analisada é a seguinte: “A fiel observância desse apóstolo, dos sábados semanais, estava em marcante contraste com sua atitude firme contra os sábados cerimoniais.”.

Oficialmente a Igreja Adventista do Sétimo Dia interpreta Colossenses 2, 16 como referindo-se aos sábados cerimoniais, o que não está correto, e tal equívoco é levado por questões teológicas da denominação. De fato, São Paulo fala nesse texto de todos os sábados, os cerimoniais e o semanal. É o mesmo que ocorre em toda a Escritura, com Levítico 23 que trata de todos os sábados juntos no mesmo capítulo.

Estudo sério da passagem mostra que realmente se trata do sábado semanal, e mesmo adventistas eruditos que reconhecem isso não deixam de guardar o sábado, mas entendem a passagem de forma a harmonizar o sentido com a fé adventista.

Assim, o Dr. Samuele Bacchiochi entendeu que o sábado foi negado por São Paulo como meio de salvação, mas aceito como sombra que leva à realidade em Cristo. Ele não conseguiu ultrapassar essa verdade, mostrando que a sombra já mostra que o dia em si pode ser deixado na prática cristã, permanecendo sua função moral, o que pode ser feito em outro dia. De fato, os cristãos católicos guardam o domingo.

E, ainda, o próprio texto usado para provar que o sábado será eternamente guardado, Isaías 58, 13, também cita a lua nova, que é um sábado cerimonial, e que a teologia adventista reconhece que foi cravado na cruz. Assim, o argumento perde o peso. Por isso, o entendimento adventista do sábado não pode refutar a doutrina católica.

Apresentar exemplo de apóstolo indo ao templo, orando no tempo, indo às sinagogas, comendo alimentos judaicos, evitando contato com gentios, fazendo promessas, circuncidando, guardando o Pentecostes, não é prova de que ele ensinava todas essas coisas como continuando após a promulgação do evangelho por Jesus Cristo e a fundação da Igreja. Significa somente que os cristãos judeus podiam manter certas coisas da fé judaica sem problemas, pois não eram em si erradas, mas santas e preparatórias para a fé cristã, e fizeram parte da vida desses cristãos. Não podiam, no entanto, ensinar como necessário para a salvação e nem como continuando com o evangelho.

Assim, também, os apóstolos continuaram a guardar muitas das festividades judaicas, incluindo o sábado semanal, sem impô-lo aos convertidos, sem também proibi-lo, já que não havia motivo, nem circunstâncias.

Repousar no domingo igualmente cumpre o preceito do memorial da criação. Mas, havia, sim, no sábado, algo figurativo, com vimos, do repouso em Cristo na graça e o repouso definitivo no reino do céu. Não se deve esquecer que esse sentido é mantido no sábado, como explica Hebreus 4. Adorar a Deus como criador faz do domingo o memorial da criação, o sábado cristão, e como salvador, faz memória da redenção, a doutrina mais importante (paixão, morte e ressurreição) do Novo Testamento.

A leitura adventista do sábado a partir da cruz, leva ao mesmo entendimento que há na guarda do domingo: “É quando contemplamos a cruz que o descanso sabático se nos apresenta como símbolo especial de redenção.” É com esse olhar que os cristãos católicos não mais guardam o sétimo dia da semana, mas o primeiro, que se tornou, por isso, o sábado cristão. Nele podemos experimentar o perdão, a paz e o descanso de Cristo, como faz a citação do livro Nisto Cremos.

Quando se lembra Ap 14, 12, 9, de que os cristãos leais a Deus guardam os mandamentos de Deus e a fé em Jesus, isso mostra claramente que a Igreja Católica tem toda razão de manter a verdade em todas as épocas da história e ensinar os 10 Mandamentos de Deus, certamente poucas igrejas da cristandade insistem na guarda dos mandamentos quanto a Igreja Católica.

No domingo pode-se ter comunhão com Deus, meditação da palavra, etc., tudo o que se faz no sábado por ser também realizado no domingo. E a respeito do trabalho, a mesma dificuldade têm as pessoas de compreender o motivo de não trabalhar aos domingos, e por que o trabalho aos domingos se torna pecado.

A razão mostrada para a guarda do sábado, que é a ordem de Deus, é suficiente para o cristão, como foi durante milênios para todos os que serviram a Deus. No entanto, o mesmo deve ser dito do domingo, que é guardado por ser entendido como ordem de Deus no Novo Testamento, e não como proveniente de qualquer autoridade humana.

Interessante que no sétimo dia o Senhor Deus descansou, e o homem criado podia, já no início da sua existência, acompanhar Deus em Seu repouso.

O sétimo dia em repouso com símbolo da entrada do crente no descanso do evangelho faz sentido, porque o repouso em sentido espiritual é feito em Cristo. No entanto, o repouso no primeiro dia é igualmente propício para isso, e não interfere no sentido nem no fato, não prejudica em nada o entendimento do evangelho. É preciso refletir sobre isso.

Os adventistas creem que Satanás quis alterar a guarda do sétimo dia. Mas, isso seria verdade apenas se a guarda em outro dia interferisse no evangelho da salvação, fosse um empecilho da graça, prevenisse o pecador de ser salvo, o que não faz sentido, não corresponde ao fato, não é compreensível em termos de doutrina.

Em sua observação histórica, a guarda do sábado não foi um problema, assim com a guarda de qualquer outro distintivo judeu, até que as circunstâncias mudaram.

Afirmar que não há evidências bíblicas de que Cristo ou os apóstolos mudaram o dia de observância não é de todo certo, já que os sinais são tão fortes que, em conjunto, são evidências para isso. Em apoio a essa leitura, tem a interpretação e reconhecimento posterior, já nos primeiros escritos a respeito do tema, vindo de almas piedosas.

Outra força para a questão, é que a Igreja em seus pronunciamentos oficiais corroborou a interpretação de que o domingo e não o sábado é o dia de repouso cristão. Não houve na história dúvida a respeito, e a Igreja, em concílios e pronunciamentos papais, sempre ensinou a guarda domingo.

Assim, as passagens bíblicas mostrando os cristãos reunidos liturgicamente no domingo, as obras dos primeiros cristãos, os pronunciamentos da Igreja, são um baluarte que provam que o domingo é o sábado, dia de repouso e culto a Deus, para o cristão. Ainda, a doutrina do domingo é maravilhosa, mantendo toda a verdade que o sábado trouxe até os dias de Cristo.

A Bíblia é a primeira prova de que os cristãos guardavam o domingo com dia de adoração. O segundo século já traz maiores explicações a respeito. Não se diz claramente sobre o repouso, mas já mostra a adoração feita nesse dia, o que já pressupõe o repouso que os cristãos tinham para celebrar os sagrados mistérios da fé.

Não é exato afirmar que o motivo da Igreja em Roma afastar-se do sábado tenha sido sua busca para distinguir-se dos judeus. O sábado era guardado como dia de jejum, por exemplo, para honrar a Cristo, que permaneceu no túmulo nesse dia. Não é dogma de fé, nem costume universal, e a igreja particular de Roma não introduziu o costume em outras partes, nem na igreja inteira.

Afirma-se que o sábado continuou a ser guardado do segundo ao quinto século. O que o historiador Sócrates escreve é interessante, pois afirma que as igrejas celebravam os sagrados mistérios no sábado, não falando do repouso, como foi a aludida exigência acima.

Certamente referindo-se a escritos de tais épocas sobre o fato, afirma-se que cristãos do quarto e quintos séculos muitos adoravam no sábado e no domingo. Sabendo da razão para a observância dominical, o adventismo não a aceita. A ressurreição de Cristo e a autorização dEle para que isso ocorresse não é explicação reconhecida na IASD, e o documento afirma que não há no segundo e terceiro séculos nenhum autor citando um texto bíblico para a autorização da mudança.

Mas, para isso acontecer deveria ter uma controvérsia a respeito, uma importante opinião em relação à continuação do sábado em lugar do domingo, ou uma forte negação da guarda do domingo, para que as obras apologéticas apresentassem argumentos nesse âmbito. Sendo algo pacífico, não haveria controvérsia.

Se Barnabé, Inácio, Justino, Ireneu, Tertuliano, Clemente de Roma, Clemente de Alexandria, Orígenes, Cipriano, Vitorino, etc., ou outro autor que viveu próximo ao tempo de Jesus, não forneceu instrução sobre o domingo, não é prova de que não a conhecesse. De fato, não há nas obras desses cristãos algo que possa indicar que ensinassem o sábado.

Se o dia do sol era o primeiro da semana, para o paganismo, o segundo, o terceiro, o quarto, o quinto, o sexto e o sétimo também tinham seus deuses, e sua importância na vida dos gentios. Dessa forma, muitos traziam suas crenças e superstições que estavam ligadas às divindades de cada dia da semana. Afirmar que o dia do sol tenha sido um fator para a guarda do domingo não é correto, nem que algo do sol tenha sido introduzido na liturgia, de forma a se considerar influência pagã no Cristianismo, visto que Jesus é a luz do mundo, o sol da humanidade, ressuscitou no primeiro dia da semana, após o sábado, e isso explica biblicamente esses conceitos que estão presentes na liturgia católica, sem recorrer a qualquer outra fonte.

Os pagãos criam no solis dies, dia do Sol, que era o primeiro da semana judaica, como também no saturni dies, o dia de Saturno, o sábado judaico, como os dia da Lua, de Marte, de Mercúrio, de Júpiter e de Vênus. Em português não foi herdada tal influência nos nomes, que ficaram Domingo (dia do Senhor), Sábado (Shabbath hebraico), e os demais com segunda, terça, quarta, quinta e sexta feiras, com influência católica.

A Bíblia não afirma que a observância do domingo tem origem no “mistério da iniquidade”, em nenhum lugar, basta procurar um texto para isso e não encontrará. Os apóstolos teriam sido os primeiros a tratarem do tema, se isso tivesse ocorrido, se houvesse tido mudança do dia de adoração e repouso sem a devida autoridade de Deus.

De fato, ao falar sobre as heresias e vãs filosofias, cita o sábado entre as questões que não deviam mais obrigar os cristãos. Ninguém deverá julgar os cristãos por questões de comida ou bebida, nem de festas, luas novas e sábados, que são sombras do que havia de vir, sendo que a substância pertence a Cristo (cf. Cl 2, 16-17). Esse é o sábado do sétimo dia, que não é de obrigação cristã. Lendo Hebreus 10, 1, aprendemos que Lei tem a sombra das boas coisas que deviam vir.

A Bíblia fala dos holocaustos ao senhor, aos sábados, luas novas e nas solenidades, os holocaustos da manhã e da tarde, dos sábados, do princípio de cada mês e das festas do Senhor, e afirma é segundo a lei eterna prescrita a Israel, e ainda os sacríficos aos sábados, nas neomênias e nas três festas do ano, ou solenidades, conforme o que está em 1 Crônicas 23,31; 2 Crônicas 2, 4, 8, 12-13, 31, 3.

Portanto, era essa afirmação de São Paulo, de que as festas ou festividades ou solenidades ou festivais, nem as luas novas ou neomênias e nem os sábados obrigavam mais os cristãos, refere-se também ao sentido cerimonial do sábado.

 Não há qualquer texto que indique que o dia de adoração seria mudado como exemplo de corrupção doutrinal. Nenhum dos padres da Igreja afirma isso, e o consenso do padres a respeito do domingo prova que a doutrina é de origem apostólica.

As profecias mostram que a Igreja Católica é o Reino de Deus na terra, fundando nações, influenciando culturas com o evangelho, dando origens a santas e belas instituições, e nunca como poder que massacra, oprime e persegue. A Igreja reconhece seu papel em instituir leis conforme o evangelho, e nunca mudar leis divinas, instituir leis contrárias, etc.

Como provado acima o sábado não foi quebrado, mas permanece na guarda do domingo, que mantem toda a doutrina. Isso não ocorria em Israel, conforme Isaías 56 a 58, onde nenhum exemplo há de que os israelitas guardassem outro dia, mas profanavam o dia de sábado, que deveria ser restaurado. Os cristãos nunca fizeram isso, de forma geral, em sua doutrina. Antes, sempre guardaram o sábado do Senhor no dia do Senhor. Assim, o sábado continua a ser observado.

Gledson Meireles.

quinta-feira, 7 de abril de 2022

Questões sobre Doutrina: analisando a questão 16, o sábado como mandamento moral e cerimonial

 Questão 16

 

Os adventistas negam que o elemento tempo seja cerimonial. Para isso, basta pensar se é possível conhecer o sábado do sétimo dia naturalmente, pela lei natural impressa no coração humano. Sendo impossível, está respondida a questão. Veremos como respondem a isso.

Em primeiro lugar, exige-se, no adventismo, uma declaração na Bíblia de que esse elemento tenha mudado. Por isso, acreditam que não haveria mudança e o sábado continuaria em vigor. Acreditam em implícito reconhecimento da continuidade do sábado.

Diante isso, deve-se ter em mente que os princípios da lei moral são escritos no coração do homem, antes mesmo da queda. No entanto, alguns elementos veem por revelação divina, através da fé, e muitos são coisas que agregam sentido, valor e auxiliam na compreensão das verdades. O sábado para o dia de descanso é algo ensinado por Deus, uma lei positiva, assim como o motivo para a guarda, que é o descanso de Deus, e a libertação da escravidão do Egito por exemplo. Esses últimos elementos não se podem conhecer pela razão pura, mas nos vem da revelação divina.

Quando o cristão descansa no domingo, ele está cumprindo a lei natural, que é a Lei de Deus, também revelada, e cumprindo o preceito de lembrar do descanso do Senhor na criação. Também, agora, honra a ressurreição de Cristo, que cumpre todas as figuras da Lei e inaugura a nova criação. As bases do sábado e do domingo estão unidas.

O aspecto cerimonial do sábado está até mesmo no fato de Deus não se cansar, e continuar trabalhando, apenas descansando da obra da criação e revelando esse término da Sua obra ao homem, para que O imitemos e tenhamos motivação para o fazer.

Se o pecado não tivesse entrado no mundo, todos deveriam guardar o repouso sabático, assim como honrar e adorar a Deus, honrar pai e mãe, etc. O cansaço advindo pelo trabalho não seria motivo para comemorar o sábado, mas também a inexistência da morte e das ofensas, e etc., não seriam motivos para não cumprir os mandamentos relativos ao próximo. Assim, todos cumpririam fielmente e absolutamente a Lei de Deus.

O sábado é a lembrança e o memorial da força poderosa do Criador. Mas isso é feito igualmente no domingo, com o acréscimo do memorial da paixão e morte de Cristo, que está ordenado cumprir na Nova Aliança, e é o centro da fé, a ressurreição. Por isso o Novo Testamento revela que havia reunião cristã para esse fim no domingo.

Se o cristão trabalha seis dias e repousa no sétimo, em honra do Criador e Redentor, sendo o sétimo dia, o dia de repouso, de fato no primeiro dia da semana, dia em que Cristo levantou-Se dentre os mortos, o cristão cumpre todo o memorial da Lei de Deus.

O sábado sendo parte integrante do plano de Deus para o homem, não tendo nada de prefiguração, como afirma a teologia adventista, ainda não explica o motivo do repouso cristão em honra a Deus não poder ser realizado no Dia do Senhor que é o domingo. No entanto, há algo no sábado em que ele é uma figura, uma sombra do que virá.

O plano e provisão de Deus para o homem, no repouso físico e espiritual, é cumprido no domingo, como sempre fez a Igreja, desde os apóstolos. E ainda, o sábado tem a prefiguração do repouso no céu, a começar pelo repouso na graça de Cristo. É certamente disso que trata Colossenses 2, 16.

Assim, quando a teologia adventista quer honrar a Cristo como Criador e Rei, adicionando o fato dele ser o Redentor, fazendo do sábado do sétimo dia mais precioso e glorioso como Dia do Senhor, isso não difere de realizar tudo isso no domingo, o sábado do primeiro dia, como sempre fizeram os cristãos. O Dia do Senhor, que é o domingo, desde o tempo dos apóstolos, e é assim por instituição divina, compreende o sentido de memorial da criação primeira e festejo da nova criação em Cristo.

É importante notar que na Lei havia uma grande conexão entre os sábados cerimoniais, onde o repouso era feito no primeiro e no sétimo dia. Parece mesmo uma preparação para o tempo cristão, dessa relação do sábado da Antiga Aliança para o domingo da Nova Aliança. E, certamente, foi o motivo de Deus ter feito o Pentecostes no domingo, quando envia o Espírito Santo sobre a Igreja Católica.

O sábado do repouso de Deus foi cumprido por Cristo, por toda a Sua vida, e até na morte, quando repousou no túmulo. Como a ressurreição pode ser adicionada ao memorial do sábado, o repouso de Deus na criação pode ser celebrado no domingo.

Em Levítico 23, 3 temos a Lei do Sábado semanal. Esse é dia de santa assembleia, onde não se faz trabalho algum, como repouso consagrado ao Senhor.

No versículo 7, está escrito: Tereis no primeiro dia uma santa assembleia, e não fareis nenhum trabalho servil, e, no fim do versículo: No sétimo dia, haverá uma santa assembleia. Não fareis nenhum trabalho servil.

Outra obra religiosa no dia seguinte ao sábado, no verso 12. A partir do dia seguinte ao sábado inicia-se a contagem das semanas para realização do Pentecostes. É uma lei perpétua, como está no verso 21.

No sétimo mês, no primeiro dia do mês deveria haver repouso, assim como no décimo dia, um sábado absoluto, v. 32. Assim, havia muitos sábados anuais.

No oitavo dia, tereis uma solene assembleia e a cessação de todo o trabalho servil (Nm 29, 35).

Em tudo isso, há uma ligação interessante entre os repousos do sétimo dia e do primeiro dia nas festas, algo que ajuda a entender a relação do sábado e do domingo na doutrina bíblica.

Ainda que é dito que o sábado semanal não tem significância cerimonial ou típica, podemos ler em Colossenses 2, 16 algo que está no sábado semanal e que se trata de uma sombra das coisas que viriam.

Assim, é entendido que o sábado foi cumprido por Jesus Cristo em toda a Sua vida, até o dia em que passou o sábado no sepulcro, selando a Antiga Aliança. De fato, a mudança de Aliança muda algo na Lei, não na Lei eterna, moral e natural, mas em aspectos positivos e cerimoniais. O sábado, quanto ao tempo, possui esse sentido. Por isso, é preciso entender esse aspecto cerimonial do sábado, que é ligado ao seu sentido moral.

Agora, os cristãos são instados a guardar o memorial da ressurreição, o que deve incluir a honra do memorial da criação. Assim, antes de incluir no sábado o sentido da ressurreição, foi no domingo que se manteve na Igrjeja o memorial da criação. O memorial está ligado à criação, no sábado do sétimo dia, e também referente à ressureição, no sábado do primeiro dia, ou seja, no repouso do domingo.

Os adventistas não creem que o sábado contenha algo de cerimonial, como foi provado acima, mas não podem provar que ele não possua. De fato, servir de memorial da criação não requer necessariamente que se descanse no sábado do sétimo dia, em total concordância com o dia da Antiga Aliança.

Um fato importante, apenas para refletir, é que o sábado foi feito para o homem. A partir da criação, o homem deve esperar os seis dias para cumprir o mandamento do sábado, no sétimo dia. Para Deus, o sexto dia foi o primeiro dia do homem. A quinta-feira seria assim o sábado do homem, referindo-se a Deus, que descansou após seis dias de criação. Entretanto, entende-se que a semana consagrada de sete dias é o modelo pelo qual os judeus e os cristãos se referem para cumprir o mandamento.

Também, os cristãos trabalham seis dias, da segunda-feira ao sábado, descansando no domingo, que é nessa contagem o sétimo dia. Isso cumpre o mandamento moral e o cerimonial, de memorial da ressureição, dentro dos sagrados mistérios, e da criação do mundo, honrando a Deus como salvador e criador.

Dessa forma, o tempo específico e a natureza da observância são tratados pelos adventistas. Observam que a Escritura não diz expressamente que o tempo do sábado é de natureza cerimonial. Mas, parece algo diverso o que se está tratando. O sentido que o livro dá ao termo cerimonial não parece ser o mesmo que o catecismo.

De fato, ser cerimonial é entendido como algo gravado no coração, na natureza do homem, podendo ser acessado pela pura razão. No entanto, o sentido de cerimonial, na doutrina adventista, e entendido como sendo algo que deveria ter sido instituído após o pecado original e da necessidade de um salvador.

Assim funcionam as leis cerimoniais. Nesse sentido, o sábado não estaria na Lei cerimonial, mas na Lei moral. No entanto, como já explicado antes, o sábado está na Lei moral, pela necessidade do repouso em honra a Deus e a necessidade física do homem, mas seu aspecto cerimonial está no elemento tempo, que pode ser cumprido diversamente.

A Escritura ordena a guarda do sábado como memorial da criação. Essa ordem positiva de Deus está atrelada a Sua Lei moral, como já explicada, mas o tempo do sétimo dia é facilmente cumprido no modelo semanal cristão, que mantem os seis dias de labor e um de repouso.

A primeira semana de Deus é o modelo para a guarda do sábado pelo homem. A primeira semana para o homem deve ser o memorial da semana da criação. Entretanto, a guarda do domingo não quebra esse modelo e não introduz qualquer problema para o memorial, expandindo, como é necessário, para o memorial da salvação, comemorando a vitória de Cristo sobre a morte.

Por isso, se o descanso e o tempo do sétimo dia semanal não foram ab-rogados por Cristo na cruz, a doutrina católica responde isso de forma magistral, mantendo ambos no Novo Testamento, na Lei de Deus, e cumprindo o sábado (repouso) no santo domingo. Algumas objeções, portanto, não tocam a doutrina católica, mas apenas a protestante, que utiliza de outros argumentos contra a guarda do sábado.

O importante é notar que o tempo específico do sábado, como está na semana judaica, não é característica imutável da Lei, assim como não o é a sua motivação, visto que primeiro foi dado como memorial da criação e depois como memorial da libertação. O domingo é assim o memorial da nova criação e da libertação do pecado.

De fato, os mandamentos de Deus são eternos, não podem ser abolidos, e a Igreja não possui autoridade para mudá-los. A apologética muitas vezes pode produzir expressões fortes para ensinar algo.

No entanto, a Igreja (os apóstolos e discípulos, no primeiro século) seguiu a ordem de Cristo e a inspiração do Espírito para transferir a guarda do sábado para o domingo, como atestam vários exemplos na Bíblia, e que é assim entendido durante os séculos na tradição da Igreja.

Não se trata da autoridade da Igreja em qualquer tempo para mudar uma Lei, através de decretos, sínodos, concílios, mas da tradição recebida de Cristo e dos apóstolos, que não foi a da guarda do sábado para os cristãos, mas a do domingo. Foi Deus quem transferiu o descanso sabático para o domingo. O sábado continuou a ser honrado, mas não mais da forma antiga, mas segundo a devoção cristã.

Quando se diz que o domingo se tornou o sétimo dia, após seis dias de trabalho, não se está afirmando um princípio subjetivo, onde a segunda, ou a quarta-feira, por exemplo, poderiam tornar-se o sétimo para toda a Igreja. Essa argumentação não faz parte da teologia e apologética católica. Essa não é a forma tradicional de entendimento católico.

O que afirma a doutrina católica é que o Senhor guiou a Igreja Católica a guardar o domingo, como atestam as Escrituras, e esse foi modo de entender a questão desde sempre. O foi seguido pelos apóstolos.

Afirmar que o domingo foi sendo incorporado às festividades cristãs não é correto. De fato, talvez, o modo e a forma de entendimento dão a entender isso, não o fato, já que os cristãos primitivos se reuniam no primeiro dia da semana para celebrar o partir do pão.

A Igreja em Roma costumava jejuar devotamente no sábado por causa da morte de Cristo. Em outras localidades, como em Milão, não havia o costume. Assim, os cristãos podiam jejuar ou não em certos dias, conforme o lugar em que se encontrassem, conforme o costume local.

É oportuno notar que Santo Agostinho menciona a Sagrada Escritura e a tradição da Igreja católica para dirimir questões de fé. É o mesmo entendido hoje pela Igreja Católica.

O livro o Grande Conflito afirma que o sábado foi se tornando dia de jejum, fomentando tristeza e pesar, ao invés da guarda tradicional judaica que deveria ser feita pelos cristãos. Mas, pelo que parece é que o jejum no sábado, feito em Roma e outras igrejas católicas locais, não era para lançar qualquer negatividade sobre o dia, mas era feito em honra de Cristo, que passou o sábado na sepultura, sendo antes uma questão de ênfase em certo conteúdo do evangelho. E, ainda, não era algo universal, imposto pela Igreja.

Quando a Igreja ensina a guarda do domingo como doutrina revelada, está mantendo a tradição recebida, conforme fé geral da Igreja, de que os mesmos apóstolos guardaram o domingo e não o sábado. Considerar que onde o sábado era guardado se tratava de exemplo de “remanescentes” cristãos de seu tempo não é correto, visto que em geral eram todas igrejas particulares católicas, que nos primeiros séculos puderam, pelas circunstâncias, continuar a honrar o sábado. No entanto, concílios sempre entenderam o domingo como dia de guarda e foram sempre contrários aos judaizantes.

No Novo Testamente o dia mais propício para o cristão nascido de novo celebrar sua nova recriação é o domingo. Com efeito, Cristo é nossa páscoa, o memorial da morte de Cristo é um sacramento cristão, e a Igreja sempre entendeu que o dia adequado para a celebração desses mistérios é o dia da ressureição de Cristo. Essa doutrina foi recebida desde os dias apostólicos.

Quando se diz que Cristo não ordenou a guarda do domingo, isso se dá porque diretamente ou explicitamente essa ordem não aparece no Novo Testamento, ou uma inspiração clara do Espírito Santo não é narrada nesse sentido, mas se sabe que os apóstolos seguiram o evangelho em sua inteireza, e muitas coisas Jesus deixou para ensinar em tempo oportuno, e o Espírito Santo foi enviado para lembrar tudo o que Jesus ensinou e guiar a Igreja para a verdade. Dessa forma, a guarda do domingo, como aparece já no primeiro século, é de inspiração do Espírito Santo, vinda de Cristo aos apóstolos e a toda a Igreja. Assim é entendida a questão na Igreja Católica. Não se trata de uma autoridade para mudar leis, mas de autoridade de sustentar a verdade.

São citadas as palavras a partir da menção da transferência da sábado para o domingo, no Concílio de Trento, conforme doutrina exposta no Catecismo Romano, como que a igreja-mãe Católica, na plenitude de seu delegado poder, autoridade...transferiu a solenidade do sétimo para o primeiro dia da semana, conforme palavra de Donovan, Catecismo do Concílio de Trento, 1867, pp. 340-342 etc.

São muitas fontes citadas, que pretendem mostrar que a Igreja Católica ensina que sua autoridade é o motivo da transferência do dia de repouso para o domingo. Mais adiante será feito um estudo do Catecismo Romano sobre o mandamento do sábado, para vermos se isso é de fato o que a doutrina católica ensina sobre a questão.

Outra coisa importante é o argumento apologético, lembrado pelos adventistas, que a Igreja Católica desafia os protestantes a respeito do Sola Scriptura por guardarem o domingo sem expressa ordem para isso, o que faz seguirem a autoridade da Igreja Católica. Isso de fato é verdadeiro, não porque sigam uma autoridade extrabíblica, mas porque a tradição apostólica é mais clara nessa questão do que o texto bíblico, fazendo da tradição uma exposição da doutrina bíblica para a Igreja.

Tudo índica que Jesus introduziu a guarda do domingo na Igreja, sem no entanto lançar qualquer proibição quanto ao sábado, o que não era necessário nos dias apostólicos. Os apóstolos não introduzem nenhuma mudança a não ser que isso tenha vindo de Cristo ou da inspiração direta do Espírito Santo. É nesse sentido que a guarda do domingo foi realizada, e não em concílio posterior.

O sábado é o memorial de um fato imutável, a criação do mundo e o repouso de Deus em dia específico. Esse fato não necessita ser guardado no sábado de Deus, mas em referência ao sábado de Deus, ou no sábado dado ao homem, como sétimo dia, no sentido de ter uma exata relação com o tempo em que Deus descansou, mas pode ser feito no domingo, após os dias de trabalho do homem, contanto que o descanso caia no sétimo dia em honra do Senhor, como a antiga lei, e como memorial da ressurreição, a doutrina central do Novo Testamento.

O sábado possui o sentido do repouso espiritual em Cristo e do descanso eterno no céu. E a nova criação, conforme o Salmo 118, 24, e todas as passagens sobre o primeiro dia da semana, indicam que o domingo é o dia escolhido por Deus para comemorar a nova criação efetuada pela graça.

Agora, um estudo do que ensina o Catecismo Romano. O Catecismo explica que o Preceito do sábado regula o culto externo a Deus, e é ligado ao preceito anterior, referente também a Deus. E, depois, afirma: “Ora, como esse dever não pode ser facilmente cumprido, enquanto nos deixamos absorver por negócios e interesses humanos, foi marcado um tempo fixo, para que se possam comodamente satisfazer as obrigações do culto externo”.

Ensina, ainda, que o Preceito traz admiráveis frutos e vantagens. A Escritura exorta à lembrança - Lembra-te – por tratar-se da parte cerimonial do mandamento. Entretanto, aprendemos que a exata observância do preceito induz mais facilmente a guardar os outros preceitos.

O mandamento do sábado contém nexo com os outros mandamentos, e apresenta igualmente pontos de diferença. Os outros são naturais e perpétuos “porque eles correspondem à própria natureza das coisas, cuja força intrínseca impele os homens a observá-los”. “O Preceito, porém, de observar o sábado, no que se refere à determinação do tempo, não é fixo nem perpétuo, mas passível de mudança. Não pertence aos Preceitos morais, mas antes às prescrições cerimoniais”.

Quando se diz que o povo de Israel somente passou a tributar o culto público a Deus no sábado depois da libertação, é para mostrar que esse preceito, quanto ao dia específico, não é natural, mas está no rol dos mandamentos morais, porque é um aspecto cerimonial que acompanha o mandamento.

Citando Gl 4, 10-11, onde a prescrição das leis no calendário judaico não mais obriga aos cristãos, e Cl 2, 16, onde o sábado não é mais observado como dever, e que o cristão não deve ser julgado por isso, explica que o sábado como dia específico foi cumprido em Cristo, que nos dá o repouso sabático espiritual, mas não revoga a lei moral que deve ser cumprida como adoração a Deus e para a prática devocional do cristão salvo, em um dia. Dessa forma, o dia foi deslocado para o primeiro dia da semana com o significado espiritual preservado e enriquecido.

Os pontos comuns do sábado que se liga à moral e à lei natural porque pela nossa própria natureza sabemos que devemos o culto a Deus, de forma a devotar certo tempo a Ele, em adoração, em ação de graças, em atitudes da criatura para com o Criador.

E continua: “Desde que deve reservar-se um tempo à ocupação com as coisas divinas e ao culto devido a Deus, é indubitável que o presente Preceito faz parte da Lei Moral”.

Assim, quando os adventistas percebem que o sábado é parte da Lei Moral, estão corretíssimos, e de acordo com a fé católica, enquanto que, qualquer opinião que contrarie isso está contra a Bíblia, já que o decálogo não perdeu um mandamento, mas continua a ser dez.

Então, continua o Catecismo, explicando que “resolveram os Apóstolos consagrar ao culto divino o primeiro dos sete dias da semana”. Assim, pela fé Católica, não foi um concílio do segundo, do terceiro, do quarto, do quinto, do sexto século, etc., nem mesmo uma deliberação conciliar, mas os próprios apóstolos herdaram essa prática do Senhor Jesus, e assim estabeleceram a guarda do domingo como cumprimento do mandamento do sábado moral.

Entre outras coisas importantíssimas, o catecismo explica que sábado significa a cessação de trabalho. Interessantemente, os cristãos católicos, que sempre guardaram o domingo, têm em mente o descanso de Deus no sétimo dia, conforme a Escritura, honrando esse memorial, em primeiro lugar, mantendo esse preceito, esse sentido, no coração. Também, com isso, honram a ressurreição de Jesus Cristo. O texto de Isaías 58, 13 é citado para ensinar o sábado.

Ensina a fé católica, também, que o sábado é de instituição divina. Cremos que esse dia é o dia do memorial do descanso do Senhor.

A doutrina é maravilhosa, belíssima, profunda, mostrando que o sábado é santificado, é um momento da admirável criação do Universo, é um memorial israelita da libertação do Egito, e era também sinal do sábado espiritual, bem como do sábado celestial. A passagem de Isaías 35, 8-9 também refere-se ao sábado celestial.

Santo Tomás explica que o sábado é uma festa religiosa celebrada a cada semana, em memória da obra da criação do universo, a lua nova é comemorada a cada mês, celebrando o governo divino, e outras festas anuais, como a páscoa, pelos benefícios divinos conferidos sobre o povo. O sábado semanal é figurativo do repouso espiritual dado por Cristo, conforme Hebreus 4. Ainda resta o repouso sabático (em grego: sabbatismos) para o povo de Deus.

Então, como já explicado antes, pode-se agora entender a afirmação, tão negada pelos guardadores do sábado: “A Igreja de Deus, porém, achou conveniente transferir para o domingo a solene celebração do sábado”. Não se trata de uma mudança arbitrária, de algo feito para mudar a Lei de Deus, mas apenas uma transferência que os apóstolos fizeram, certamente por ordem de Jesus ou pela inspiração do Espírito Santo, como o foi para entender a questão da circuncisão e guarda da Lei em relação à salvação. Dessa forma, a Igreja observa o sábado do descanso no primeiro dia da semana.

Outro ensinamento, que os cristãos católicos mantem, é que o sábado, como dia de descanso, referindo-se ao dia de domingo, deve ser guardado, e não é qualquer dia que seria propício para isso. Dessa forma, mantém-se o decálogo intacto, preserva-se o mandamento moral e cerimonial, assim com a tradição apostólica. Entretanto, não é interpretação particular, subjetiva, mas a preservação do mandamento de Deus conforme a Bíblia e a tradição.

Gledson Meireles.