sábado, 9 de maio de 2020

Comentando o Capítulo 4: Pedro era a cabeça dos apóstolos

Negando que Pedro fosse cabeça dos apóstolos, o livro afirma: “Isso entra em flagrante contradição com a afirmação paulina, de que a cabeça da Igreja é Cristo: “Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo” (Efésios 4:15)”. (p. 31)

Não é necessário afirmar novamente, com citação, o que está escrito no próprio Catecismo, número 1548, que Cristo é a Cabeça da Sua Igreja. Jesus é a Cabeça do Corpo espiritual da Igreja, que é o Corpo Místico de Cristo. Ele é o Cabeça, o Chefe Supremo, o Líder Máximo, o Sumo Sacerdote da nova e eterna aliança. Basta conferir. Essa é a fé cristã católica. Por ser a fé bíblica, é também a fé católica. Não há contradição com a verdade de que Pedro é líder dos apóstolos. São Pedro é chefe visível, numa autoridade secundária, recipiente, subordinada, delegada, estabelecida por Jesus Cristo.

Igualmente, não seria preciso recorrer a muitas palavras, nesse momento, para afirmar que Pedro é o cabeça da Igreja em sentido de governo ou chefe visível da mesma, instituído por Jesus Cristo. Não é o papa que dá força à Igreja, que a sustenta, que a vitaliza, que a protege. Ele é o sinal da unidade, da qual a Igreja vive, que é recebida de Deus, e que tem do Espírito Santo a garantia de vencer contra os ataques malignos. Já está provado. Mas, não deixemos de estudar e refletir. Faz-se necessário repetir.

Tentando enfraquecer o primado de São Pedro, o livro cita Atos 24,5 texto sagrado que é, em algumas traduções, vertido como que insinuando que o apóstolo São Paulo era chefe da seita dos nazarenos. Isso o faria uma das figuras mais importantes da época, talvez ultrapassando o papel de São Paulo. Assim sendo, o autor usa desse argumento com prova de que na verdade não havia autoridade central, não existia líder único da Igreja, e por o apóstolo São Paulo foi entendido como principal chefe dos cristãos.

A tradução Almeida Corrigida Fiel assim traduz: Temos achado que este homem é uma peste, e promotor de sedições entre todos os judeus, por todo o mundo; e o principal defensor da seita dos nazarenos.

      Por tratar-se de tradução protestante, que não tem o intuito de promover a doutrina do primado, a expressão “o principal defensor” enfraquece ainda mais a posição defendida no livro, de que são Paulo tinha tamanha reputação, que seria contrária à primazia de Pedro. O que essa versão afirma é que naquelas circunstâncias Paulo foi reconhecido como aquele que defendia a causa da Cristo de forma expressiva. Um líder que representada a Igreja de forma eloquente.

      E, ainda, a Bíblia do Rei Tiago [King James Version] põe um artigo indefinido antes do termo traduzido pela Almeida Corrigida Fiel por “defensor”. Aliás, a maioria das traduções em língua inglesa traz o artigo indefinido antes da palavra chefe (πρωτοστάτην).

      Isso acontece porque não há artigo definido no texto grego original. Essa é outro problema que o livro apresenta. Pelo que parece, a versão que é apresentada no livro como “original” trata-se do grego moderno, e não do grego original no qual foi escrito o Novo Testamento. Não se trata do texto inspirado, mas de uma versão atualizada do grego. Dessa forma, a língua grega moderna possui inúmeras diferenças daquela em que foi escrita a Bíblia, tanto em seu vocabulário, fraseologia, tempos verbais e etc. Sendo assim, não há autoridade o versículo grego usado para contrapor as traduções católicas.

O livro apresenta este texto:

Επειδη ευρομεν τον ανθρωπον τουτον οτι ειναι φθοροποιος και διεγειρει στασιν μεταξυ ολων των κατα την οικουμενην Ιουδαιων, και ειναι πρωτοστατης της αιρεσεως των Ναζωραιων”.

No entanto, o grego original da Sagrada Escritura é este:

εὑρόντες γὰρ τὸν ἄνδρα τοῦτον λοιμὸν καὶ κινοῦντα στάσεις πᾶσιν τοῖς Ἰουδαίοις τοῖς κατὰ τὴν οἰκουμένην πρωτοστάτην τε τῆς τῶν Ναζωραίων αἱρέσεως.

Dessa forma, a parte que foi mostrada para o argumento é esta: “και ειναι πρωτοστατης της αιρεσεως των Ναζωραιων”, que faz parte da versão moderna.

Por outro lado, o original bíblico é este: “πρωτοστάτην τε τῆς τῶν Ναζωραίων αἱρέσεως”.

Dessa forma, as diferenças são importantes:

Versão apresentada no livro
Versão original da Bíblia
kαι = e
ειναι= é
πρωτοστατης = principal líder
της = da
αιρεσεως = seita
των = de
Ναζωραιων = Nazaré
Πρωτοστάτην = líder
Τε = então
τς = da
τν = dos
Ναζωραίων = Nazarenos
αρέσεως = seita

 

O artigo definido em “τς” (em τε τῆς τῶν) refere-se à seita dos Nazarenos. A tradução, então, ficaria assim: “e líder da seita dos nazarenos”. Uma vez que não há artigo para “líder”, ele pode ser, e na maioria das vezes requer que seja, traduzido como “um líder”, pois a falta de artigo já indica essa imprecisão, essa indefinição. Mais literalmente seria: “e um líder da seita dos Nazarenos”.

 Atos 24,5 está afirmando que Paulo é um dos lideres do Cristianismo, um dos de mais destaque. Se não, vejamos.

O autor precisa explicar melhor a questão do artigo nessa passagem, e do texto que apresentou para desfazer-se das traduções católicas.

Mais. De acordo com as melhores traduções, São Paulo foi contado com um líder cristão, e não o líder dos cristãos, entretanto, isso não leva a algo que possa diminuir as prerrogativas de São Pedro. Não é forte argumento contra a autoridade de Pedro como papa.

Ainda, é necessário terminar com alguns questionamentos, ao que parece, importantes.

O autor quis usar esse texto para afirmar que uma vez que Paulo foi considerado o líder dos cristãos, isso significa que não havia outro nome que tivesse tal consideração na Igreja. Dessa forma, os cristãos não tinham líder único. Sendo assim, o argumento é inválido, pelas seguintes razões:

a)               Se o evangelista São Lucas empregou o artigo definido, mostrando assim que Paulo era a liderança maior dos cristãos, em seu tempo, isso o torna o chefe dos cristãos. De fato, a identificação de um chefe único previne que procuremos outro e não que isso signifique a inexistência de um único chefe. A própria referência ao chefe único prova que ele existe e não que não exista nenhum.

Mas, o autor do livro, e nenhum protestante desejaria, certamente, essa conclusão. Então, essa não é a intenção do argumento, embora ele seja inócuo para isso. Sendo assim, o argumento não serve.

b)               Se a concepção de “principal líder” não faz de Paulo uma autoridade suprema, mas sim “uma liderança proeminente no Cristianismo”, ou seja, “uma” (indefinida) liderança”, então não se pode com isso negar a existência de outras lideranças, mas reconhecê-las! Da mesma forma, a alusão a um líder não implica na inexistência de um líder máximo.

Se o trabalho de Paulo, inegavelmente grandioso, o tivesse levado a ser considerado o Líder do Cristianismo, como único, então pode-se afirmar que os não-cristãos erraram ao identificar a liderança cristã, pois Paulo era apenas um dos grandes líderes. Essa é a única alternativa, pois se eles acertaram, então o primado passa a ser de Paulo, ainda que contrarie passagens do Novo Testamento. Não é essa a intenção do argumento, novamente! Mais uma vez, o argumento é falho.

Se aquela expressão é apenas um erro de reconhecimento proveniente expressiva liderança de São Paulo, então ela não depõe contra o papado, já que errando assim, os pagãos mostravam que não conheciam a Igreja o suficiente, do contrário saberiam que haveria Pedro como chefe. Uma vez que o autor considera que os não-cristãos conheciam bem a Igreja, afirmando que “Tértulo, como advogado, devia ter bom conhecimento sobre os cristãos, (...)”, ele não pode ter dito que Paulo era o chefe universal, como o próprio autor reconhece, mas que Paulo era um dos líderes proeminentes do seu tempo.

Paulo era destaque a ponto de ser confundido como chefe único? Não. Isso é reconhecido pelo autor.

Paulo destacou-se no seu evangelismo, a ponto de ser apontado como um dos principais líderes? Sim.
Por que então afirmar que a tradução “um dos líderes” é adulteração? Se esse é o conceito, e está de acordo com o original, a tradução está correta.

Se Paulo é um dos líderes, isso o coloca como mais um dos nomes, embora grandes nomes. Isso implica em que não havia chefe supremo na Igreja? Não. Então o argumento cai por terra.

Sendo assim, não servindo de argumento contra o primado, mais um capítulo do livro está refutado. Portanto, essa passagem não depõe contra o primado petrino.
Gledson Meireles.

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