O
autor do livro afirma: “o que Clemente escreve em sua única epístola já é mais
que o suficiente para rejeitar a noção de que ele fosse imortalista”.
Vejamos:
A
primeira citação (Clemente 14,1-4), é considerada no livro a linguagem máxima
para denotar o aniquilacionismo. Contudo, ao contrário disso, ela pode ainda
assim ser ambígua e lida como não aniquilacionista, sem fazer qualquer
malabarismo.
Certamente,
a afirmação de que “mas os pecadores serão exterminados dela” e que “e não
existia mais” significam que os ímpios não estão mais na terra, ou mesmo na
nova terra dos novos céus e nova terra que esperamos. Como serão banidos do
reino, essa passagem pode estar se referindo a isso, e não uma aniquilação.
Nessa
mesma acepção pode ser lida a passagem de Provérbios 1,26, citada em segundo
lugar.
O
autor do artigo refere-se a Apocalipse 20,10, que seria um texto em sentido
hiperbólico, mas o texto é um dos mais claros a respeito do inferno. Está sim
em um livro de profecias por meio de símbolos, mas nada no versículo ordena a
ler nesse uma metáfora.
Afirma
uma cena que significa um tormento e não aniquilação. O Demônio é lançado no
lago de fogo, onde já estavam a Besta e o Falso Profeta, que denota existirem.
Alguém
pode ainda teimar e ler nisso o tormento temporário ainda em execução, ou seja,
Satanás entraria no inferno eterno antes que a Besta e o Falso Profeta
deixassem de existir. No entanto, o texto não dá a mínima pista para que se
pense nessa hipótese, pois continua afirmando com linguagem enfática o tormento
deles “dia e noite” e ainda “pelos séculos dos séculos”, uma expressão que é
usada quando se fala da vida eterna.
O
terceiro texto da Epístola aos Coríntios, de São Clemente de Roma 35,1-4,
afirma que a vida na imortalidade é algo preparado aos que aguardam Jesus. Esse
texto está de acordo com a fé na imortalidade da alma, pois todos os cristãos
que creem assim esperam o dom da imortalidade que será dado na ressurreição, e
não têm a imortalidade da alma como a imortalidade do homem, que são coisas
diversas, e quem já leu os demais capítulos publicados neste blog sobre a
imortalidade da alma entendeu bem essa questão.
A
próxima citação, de Clemente 36,2, afirma que por meio de Cristo experimentamos
o “conhecimento imortal”. Essa afirmação não nega, em qualquer sentido, a
imortalidade da alma. Se é interpretada, como é feito no livro, como afirmando
que a imortalidade é somente obtida através de Jesus Cristo, não há o que
objetar, e não há nada que pode opor-se à doutrina da imortalidade da alma.
Quando
Clemente fala ressurreição (26-27), também não há nada a objetar quanto à
imortalidade da alma. O mesmo acontece na citação de 35,1-4, onde “lutamos para
sermos encontrados no número dos que o espera” está de acordo com a fé de todos
os cristãos que creem na imortalidade da alma. Aliás, São Clemente continua
falando da vida de fé e obras para alcançar a salvação, o que mostra que
refere-se aos cristãos vivos à espera de Cristo, e não que os mortos O esperam.
A
afirmação de que os salvos serão manifestos quando vier o Reino de Deus não é
negação da imortalidade da alma. É algo que pode ser lido nesse contexto
igualmente.
Não
necessariamente afirma que os salvo somente entrarão no céu nesse momento, que
é uma leitura formada em relação a João 14, 1-3, mas que Clemente não menciona
nesse momento. E que os mortos estarão nas sepulturas até a ressurreição é
outra verdade que não nega a imortalidade da alma.
Em
Clemente 44,1-2, ao chamar a morte de sono, segundo a linguagem bíblica, não há
qualquer indicação de que seja condicionalista. Os cristãos que creem na
imortalidade da alma usam a mesma linguagem sem problemas.
Agora,
a passagem que fala de São Paulo que “se foi para o lugar santo” (Clemente 5,7),
que o autor afirma ser citada por muitos imortalistas, é digna de nota. Como
visto acima, nenhuma passagem é claramente condicionalista, e pode ser lida de
outra forma, portanto são ambíguas. Assim, essa menção ao apóstolo São Paulo,
que foi para o lugar santo, é mais uma prova da imortalidade da alma do que
todas as outras lidas como mortalistas, já que essa constitui o contexto sobre
o tema. Aliás, no mesmo capítulo, São Clemente afirma que o apóstolo Pedro “foi
para o lugar de glória”.
Ou
seja, os mortos já partem para algum
lugar, segundo os condicionalistas, ainda que não existam mais. Essa “partida” não é senão uma força de
expressão, pois eles não estão lá, ou melhor, não estão nem indo para lá, não
estão em lugar nenhum, na visão mortalista.
Explica
melhor o autor: “Se eu digo que uma missão espacial “partiu para Marte”, isso
não significa necessariamente que eles já estejam em Marte agora, significa
apenas que eles deram início a este processo.”
O
problema é que os astronautas existem e estão indo para Marte, nesse exemplo. Em
se tratando de uma viagem que requer certo tempo, já estimado, todos esperam,
sabendo disso, a chegada dos astronautas ao seu destino e sabem quando isso
deverá ocorrer. Contudo, segundo a doutrina condicionalista, os mortos não
existem, e não estão indo.
Pensar
que Clemente afirmou que Paulo e Pedro foram para o céu, mas não estão lá, é
forçar a interpretação da passagem, introduzindo nela o conceito oriundo do
mortalismo.
O
autor menciona sua explicação de Filipenses 1,23 para entender o que Clemente
afirma aqui. Se os leitores voltarem à explicação do mesmo texto já publicada
neste blog verá que a imortalidade da alma é bastante clara nessa passagem.
No
geral, pode-se afirmar, então, que São Clemente cria na imortalidade da alma, e
não na rebuscada doutrina do mortalismo, que afirma que Paulo “deixou o mundo e
se foi para o lugar santo”, mas lá não chegou, e não chegará até o dia da
ressurreição, um conceito novo, desconhecido da Bíblia e dos padres
apostólicos.
Gledson
Meireles.
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