sábado, 17 de novembro de 2018

Imortalidade da Alma: apócrifos

A doutrina da imortalidade da alma está cada vez mais atacada, e, não raro mais, pessoas de diferentes denominações que creem nessa doutrina estão abandonando-a, até mesmo católicos, pelo que se sabe de algumas fontes, como a do canal do pastor adventista Leandro Quadros.

Por isso, é necessário continuar investigar as razões desses convencimentos. Uma obra especial, ancorada especialmente, ao que parece, nos estudos adventistas, para o caso, é certamente os livros do apologista Lucas Banzoli, que estão disponíveis e contém inúmeros argumentos, e que estão sendo veículos da doutrina de que a alma é mortal, e tem convencido pessoas de muitas igrejas.

Desse modo, mostra-se plausível empreender estudos nessas fontes, como já feito em alguns artigos publicados neste blog com o título inicial de Imortalidade da alma. Para aqueles que estão lendo os escritos adventistas, das testemunhas de Jeová, do Lucas Banzoli, e etc., sobre o tema, e que venham a conhecer os comentários feitos nesta página a respeito do assunto, que possam com igual fervor analisar os argumentos e formular suas decisões.

O livro Os Pais da Igreja contra a imortalidade da alma inicia a discussão com a avaliação do tema em escritos apócrifos, mostrando que nesses a imortalidade da alma é ensinada claramente e sem rodeios, e que sendo fonte de doutrina gnóstica, que combatia nos séculos II e III a doutrina cristã, serviriam de prova de que a Igreja não ensinava em concordância com o gnosticismo a doutrina da imortalidade da alma.

Por essa comparação pensa-se em descobrir a forma pela qual a doutrina deveria ser expressa nos escritos apostólicos e sub-apostólicos, e que não sendo assim já estaria estabelecida a prova de que o Novo Testamento e os Padres Apostólicos teriam ensinado diferentemente dos gnósticos nesse particular.

Sendo assim, a doutrina da imortalidade da alma teria base puramente pagã, e não constituiria patrimônio cristão.

Por isso, é bom que nos aproximemos dos argumentos mais uma vez, em terrenos novos, como são outras partes dessas obras citadas, e continuemos a vasculhar nos dados as verdades que podemos adotar. E se erros forem encontrados serão igualmente considerados, porem, para sua merecida refutação.

A primeira constatação que se pode fazer, como preâmbulo nesse campo, é que os apóstolos não empreendem nenhum esforço contrário a essa doutrina dos gnósticos, que é, como o autor mostra, tão sagaz, clara e insofismável, o que seria bastante provável receber dura repreensão do Novo Testamento se fosse diferente sua posição quanto à mesma. Nenhuma palavra se encontra nesse sentido, o que já é um dado de importância.

A primeira observação no que concerne à crença na imortalidade da alma é o texto citado da obra “A Vingança do Salvador”. A “descrição fantástica” que autor faz na citação dessa obra é algo que não condiz com a imortalidade da alma, mas ao que seria esperado o mortalista perceber: o mesmo parece, pela tradução utilizada, afirmar que Jesus foi ao hades depois de ressuscitado!

O Lucas apresenta o seguinte texto: “Sem dúvida alguma morreu; foi dependurado numa cruz e depois de morto dependurado dela; esteve três dias no sepulcro; depois ressuscitou de entre os mortos e baixou aos infernos, onde libertou os patriarcas, profetas e a todo humano com descendência; depois apareceu aos seus discípulos e partilhou a refeição com eles; e, finalmente, viram-no subir ao céu”.

A cronologia seria: a (1) morte de Jesus, (2) ser colocado na cruz, (3) ser tirado dela, (4) estar três dias no sepulcro, (5) ressuscitar, (6) baixar aos infernos), (7) aparecer aos discípulos e (8) subir aos céus. [1]

Em um texto escrito no período apontado como de máxima clareza no ensino da imortalidade da alma, e ainda assim transparecer algo que não coaduna com essa doutrina, em um assunto que esperaria a mesma clareza, como é o da descida de Jesus ao hades, é fatal para o caso defendido pelo autor. Em outros termos, é possível que em um texto imortalista alguém introduza uma ideia mortalista, mas é possível refutá-la ao apresentar o texto em sua completude.

Portanto, a imensidade de obras citadas que ensinam a imortalidade da alma é bastante pungente para o fato de que nos séculos II e III essa doutrina era bastante disseminada. Obras usadas pelo autor, como o Apocalipse de Pedro, Apocalipse de Tomé, Apocalipse de Baruque, Evangelho de Judas, Evangelho de Maria Madalena, Evangelho de Filipe, A Vingança do Salvador, Evangelho de Bartolomeu, Evangelho de Valentino, A História de José Carpinteiro, Apocalipse de Moisés, Testamento de Abraão, Evangelho de João, todas elas com textos claros sobre a imortalidade da alma.

O que o livro objetiva é traçar um contraste desses textos com os escritos dos padres pós-apostólicos e provar que os mesmos não ensinavam a imortalidade da alma.

É seguramente impossível fazer isso, já que pela Bíblia foi provada que a imortalidade da alma é a doutrina original.

O que acontece é normalmente a diferença essencial da doutrina, com diferença linguística, e outras, mas que nesse específico não apresenta divergência. Os padres da Igreja, desde os apostólicos, não ensinam a morte da alma, mas a imortalidade.

E como nos outros escritos, os apócrifos, isso ficou claro, não é preciso gastar tempo para provar que se tratava de doutrina muitíssimo conhecida.

Fonte: Banzoli, Lucas. Os pais da Igreja contra a imortalidade da alma, capítulo 1.

Gledson Meireles.



[1] O parâmetro aludido acima de que é mais difícil para o mortalista expressar sua crença não é robusto. Ele nasce apenas de uma comparação dos textos selecionados mostrando o imortalismo dos gnósticos com inúmeros textos bíblicos que são interpretados como mortalistas. Parece ser apenas uma constatação particular e não garante a formulação de um parâmetro para a discussão geral. Assim sendo, a base tirada dos apócrifos para interpretar os Padres da Igreja não é tão segura, a ponto de esperar a mesma linguagem, os mesmos elementos, etc. Para mostrar melhor esse modelo seria preciso muitos textos de autores mortalistas que podem ser interpretados facilmente como imortalistas. O exemplo do texto de A Vingança do Salvador é fortíssimo. Aliás, o termo alma aparece no capítulo 9 aberto para a conotação que lhe queira dar um mortalista: “com todo o meu coração e com toda a minha alma”. Mesmo no capítulo 33 isso é possível, já que usa a mesma linguagem bíblica, e essa é interpretada pelos mortalistas conforme seu sistema: “mas sim confirma minha alma e meu corpo e coloca-os em teu reino”. Mas o capítulo 7 permite uma leitura já um tanto ambígua: “com minhas próprias mãos teria dado a morte aos corpos daqueles judeus”. Estaria concedendo à alma sua natureza imortal¿ No capítulo 20 e em outros fala-se dos corpo de Jesus. Assim, esse é um exemplo de texto que pode ser lido pelo viés mortalista, ainda que o autor tenha indicado o mesmo como exemplo de fonte claramente imortalista. E tal documento é datado do século 8. O que não é possível é formular uma tese robusta do mortalismo a partir dessas fontes. Como não é possível pela Bíblia.

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