sábado, 21 de janeiro de 2017

A prostração (parte 3)

Temos ainda outro exemplo a respeito da prostração. Para entender como esse gesto era experimentado por um israelita, e como tal reverência era considerada, a passagem de Absalão em 2 Samuel 15,5 é indispensável. Está escrito:

E se alguém se aproximava para se prostrar diante dele, estendia a mão, detinha-o e beijava-o. Assim fazia Absalão com todos os israelitas que vinham procurar o rei para qualquer julgamento. E desse modo conquistou os corações dos israelitas.” (2 Samuel 15,5-6)

O gesto de prostração mostrava profunda reverência diante de quem se prostrava. Isso exprimia a humildade daquele que se prostrava, era um modo de humilhação do coração. Dessa forma, Absalão pôde ganhar muitos para o seu partido ao dispensar os que vinham a ele de se prostrar.

Assim, quando alguém aproximava-se para ir prostrar-se, como era de se esperar, Absalão logo tomava a atitude de impedir que isso fosse feito, e ele mesmo mostrava outros gestos para convencer o outro, como o beijo, passando-se como alguém humilde. Os israelitas sentiram-se lisonjeados por ter sido elevados por Absalão naquela atitude de reverência, pois quando iam fazer a prostração Absalão tocava-os e detinha-os do gesto, fazendo ele mesmo uma reverência diversa. Ele devolvia ao súdito a reverência através do beijo.

Com essa escritura, temos expresso o valor do ato de prostrar-se. Sendo ele uma atitude bastante humilde, quando isso foi dispensado naquele momento, a pessoa entendia aquilo como uma demonstração de notável caráter, por não fazer questão de uma reverência que lhe era devida, mostrando assim uma atitude lisonjeira. Não demorou, portanto, para que os israelitas ficassem do lado de Absalão.

A prostração diante do rei era um dever. Assim, vemos a mulher da cidade de Tícua, que foi mandada por Joab à presença do rei, para uma trama contra Absalão. Ela foi até o rei Davi: “A mulher veio, pois, de Tícua e apresentou-se ao rei; lançou-se por terra e prostrou-se, dizendo: “Salva-me, ó rei, salva-me!”. (2 Samuel 14,4)

Após o rei Davi perceber que aquilo era um plano de Joab, perguntou à mulher que confessou a verdade. Então, ela disse a Davi: “... és tão sábio como um anjo de Deus, para saber tudo o que se passa na terra.” (2 Samuel 14,20) São palavras que denotam a veneração de uma pessoa perante o rei, e que está de acordo com a dignidade real. Em outras palavras, essa veneração é mostrada na prostração, nas palavras e no reconhecimento: o rei é comparado a um anjo do Senhor que possui conhecimento além do humano.

Quando Davi fala a Joab sobre sua resolução, após ter ouvido a mulher, observemos como foi a atitude de Joab:

Joab prostrou-se com o rosto por terra e abençoou o rei, dizendo:Agora, o teu servo reconhece que ganhou o teu favor, ó rei, meu senhor, pois que o rei cumpriu o desejo de seu servo”. (2 Samuel 14,22)

Passando dois anos Absalão vai à presença de Davi: “Joab foi ter com o rei e contou-lhe tudo. Absalão foi chamado, entrou na presença do rei e prostrou-se diante dele com o rosto por terra. E o rei o beijou”. (1 Samuel 14,33) Vemos assim que Absalão fazia com o rei, beijando aquele a quem ele amava, como fez com seu filho Joab. O que mudou, porém, foi deter que os outros viessem até ele e o saudasse com a prostração, sinal da servidão. Ele mesmo devotava aqueles gestos e sentimentos, e alegava não exigir isso dos outros para com ele.

Absalão queria tomar o trono real, e proclamou-se rei em Hebron. Davi fugiu, pois sabia não poder resistir a um ataque de Absalão.

Então, transportaram a arca, o sacerdote Sadoc e os levitas, e mostrou Davi a veneração que tinha para com a arca e o tempo:

Veio também Sadoc com todos os seus levitas, trazendo a arca da aliança de Deus. Depuseram-na, enquanto Abiatar subia e até que tivesse passado todo o povo que tinha saído da cidade. Disse então o rei a Sadoc: “Reconduz a arca de Deus à cidade. Se eu achar graça aos olhos do Senhor, ele me reconduzirá e me fará revê-la, bem como o lugar de sua habitação.” (2 Samuel 15,24-25. Cf. prostração em 2 Reis 2,15 e 2 Reis 5) Davi deseja viver, e voltar a Jerusalém, e por isso pede a graça de rever a arca e o templo onde ela habita.

Diante desses fatos incontestáveis, temos a prostração como gesto de veneração importante praticado pelos judeus, em diversos contextos, tanto social como político e, sobretudo, religioso. Acrescentam-se ao fato as palavras de reconhecimento, tais como “senhor”, e o testemunho da “graça” alcançada diante o soberano humano, como as expressões floreadas afirmando que o rei é um “anjo” que tudo ou muito conhece do que se passa na terra. Ainda, é importante a distinção que se faz da arca do Senhor e do templo em que ela habita, fato já demonstrado, expressando o sentimento tanto por um como pelo outro, e devotando gestos de veneração igualmente por ambos.
 
1)      Coloque-se no lugar de um fiel israelita, e veja se você é capaz, como servo de Deus no Novo Testamento, de curvar-se ou mesmo prostrar-se diante de um servo de Deus, e expressar-lhe homenagens chamando-o de anjo, afirmando que obteve dele a graça de ser atendido, ou que você é capaz de ter os sentimentos tão altos como tinham os judeus para com a arca e o templo.
 
Gledson Meireles.

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