terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

Livro: A lenda da imortalidade da alma, sobre 2 Cor 12, 1-4.

 A respeito do tópico: estar fora do corpo.

Na concepção mortalista, onde não existe dualidade, mas o ser humano é entendido como fundamentalmente um ser holista, no qual cada parte, material e espiritual, é apenas aspecto do ser e não algo que se separe, que possa ser separada. Com isso, o significado de “fora do corpo” seria apenas o da imaginação ou de uma experiência ocorrida “no corpo” mas onde se vê algo como se fosse do corpo, distante.

Assim, o arrebatamento de São Paulo ao céu teria sido material, onde o apóstolo foi de fato levado em corpo e alma ao céu, ou teria sido apenas uma experiência mística, onde o mesmo viu coisas do céu em espírito, estando na terra, pois não poderia nunca “sair” e estar “fora” do corpo, já que no monismo holista defendido no livro essa possibilidade não existe. Do contrário, afirma o autor, conceber que algo seja possível fora do corpo seria explicar o texto na perspectiva platônica, onde almas saem do corpo, e que na concepção bíblica isso seria impossível.

Dessa forma, afirma: “Por «fora do corpo», os imortalistas entendem que Paulo só podia estar falando da sua alma ou espírito que teria abandonado o corpo e se projetado em outra dimensão (algo que os espíritas e adeptos da Nova Era chamam de “projeção astral”). Mas isso é o que os imortalistas imaginam partindo do pressuposto do dualismo entre corpo e alma, não o que o apóstolo tinha em mente.

Mas, o mortalismo explica a expressão “fora do corpo” em 2 Cor 12, 2-4 afirmando que o contexto não indica a imortalidade da alma, mas que deve ser entendido como são os textos que falam de “fora do corpo” em 1 Cor 6, 18, ou “fora de si” em Mc 3, 21, ou “em espírito” em 1 Cor 5, 4.

Se o texto grego aqui for de valor para o mortalista, saiba que ele serve para fortalecer o argumento da imortalidade da alma. Pois bem, o texto de 1 Cor 6, 18 foi citado para explicar a expressão “fora do corpo”: “Qualquer outro pecado que o homem comete é fora do corpo, mas o impuro peca contra o seu próprio corpo”. Aqui vemos que o próprio contexto explica que o pecado é “fora do corpo” no sentido de que é cometido contra algo que não está no corpo, mas está no mundo, fora do corpo.

Assim, a impureza, a porneia, a fornicação, é cometida “contra” o próprio corpo. O grego traz a partícula “eis”, que significa que o pecado é feito “ao” corpo, para o corpo, portanto, contra o corpo.

Dessa forma, o próprio corpo sofre com o pecado descrito acima, enquanto que os demais pecados são feitos em relação a outras coisas.

Vejamos agora que o texto grego diz: “ἐκτὸς τοῦ σώματός”, traduzido literalmente como “fora do corpo”. Textos como Mateus 23, 26 traz o termo ektos para falar do que está fora do prato. Em Atos 26, 22 o termo tem o sendo de “senão”, e em 1 Cor 14, 5 significa “exceto”. Portanto, ektos tou somatos e algo exterior ao corpo. Isso confirma o que está no contexto acima explicado.

Mas, eis que em 2 Cor 12, 4, a expressão usada é “χωρὶς τοῦ σώματος”, onde o termo “choris” traduzido por “fora” significa “sem”. Assim é que em Mateus 13, 24 diz que Jesus não fala sem parábolas. Em Mateus 14, 21 choris significa além: cinco mil homens, além das mulheres ou seja, sem contar as mulheres. Em Lucas 6, 49 a expressão “sem fundamento” é expressa com o termo choris.

Portanto, quando São Paulo afirma que não sabe se estava no corpo ou fora do corpo, o sentido mais literal foi que não sabia se estava no corpo ou sem o corpo, o que torna a doutrina da imortalidade da alma mais expressiva para explicar a passagem. Na concepção do apóstolo, é possível experimentar espiritualmente algo sem o corpo.

Porém, há o argumento de que se Paulo estivesse fora do corpo e “jamais teria dúvida” disso. Isso seria algo impossível de não ser notado. Então, São Paulo não sabia se estava no céu fisicamente ou apenas houve um êxtase, onde seus sentidos foram arrebatados, como em Atos 11, 15.

Essa explicação é plausível, é possui em si certa força. Assim, parece um ponto em que é possível explicar sem a doutrina da imortalidade da alma, mas o leitor pode perceber que nela não há nada contra a imortalidade da alma. Pelo contrário, há algo que se explica perfeitamente também pela doutrina da imortalidade da alma. Portanto, pode ser uma passagem neutra nessa discussão. E pelo que foi explicado acima usando o contexto e o texto grego, a posição mortalista se enfraquece ainda mais.

Agora, vejamos explicação que temos do texto citado de Atos 11, 5 com o fundamento da doutrina da imortalidade da alma. Vemos que São Pedro afirma que foi “arrebatado em espírito” e que teve “uma visão” onde algo como uma grande toalha “descia do céu até perto de mim”, diz o apóstolo. Isso significa que ele tinha completa certeza de que estava tendo uma visão do céu, onde um elemento vinha do céu até perto dele.

O verso 8 afirma que ele ouviu a voz que vinha “do céu” e que depois que tudo “tornou a ser levado ao céu” (v. 10). Portanto ele sabia que estava na terra, e que tudo foi um êxtase.

Isso é completamente diferente do que aconteceu com São Paulo, pois ele afirma que foi “arrebatado até o terceiro céu”, ou seja, que esse home foi até o terceiro céu e lá viu coisas impossíveis de serem descritas pela linguagem humana. Houve então um transporte dele até o céu e não um arrebatamento dos sentidos. Não foi nada que veio do céu até ele, mas que ele foi ao céu.

A dúvida então fica no seguinte: se no corpo ou fora do corpo, ou como vimos, se no corpo ou sem o corpo.  Essa expressão aparece duas vezes no verso 2 e 3. Da mesma forma, o fato do arrebatamento ao céu aparece no verso 2 como “arrebatado ao terceiro céu” e no verso 4 como “arrebatado ao paraíso”, afirmando que “ouviu palavras inefáveis”. Portanto, de alguma forma é dito que houve arrebatamento da pessoa mostrando que a mesma esteve lá, só não sabendo como isso foi realizado.

De fato, foram visões e revelações do Senhor (1 Cor 12, 1), mas o apóstolo cede à dúvida se isso foi no corpo ou fora dele, o que é bastante curioso. Ele não estava na terra tendo visão do céu, mas sentiu-se no próprio céu.

Caso não existisse nada possível fora do corpo, apenas o êxtase, como afirma o monismo holista defendido no livro, o apóstolo diria que não sabia se foi ao céu fisicamente ou se teve apenas uma visão do céu. Mas, caso algo fora do corpo seja possível, então o mesmo sabe que esteve no terceiro céu, não sabendo apenas se estava fisicamente lá ou em espírito, ainda que vivo. Esse modo de estar em algum lugar sem o corpo é algo sobrenatural.

A dúvida se explica por ter sido uma experiência muito real, de forma que ele não sabia se estava lá fisicamente ou não. Em um êxtase ele não estaria no terceiro céu, mas apenas estaria vendo coisas do terceiro céu. Essa é a força da interpretação tradicional, já que o apóstolo afirma ter estado no céu, que foi até (ἕως) o terceiro céu.

Tudo converge para a interpretação tradicional, e ainda que a explicação de que foi apenas um “êxtase” seja plausível, ela cria problemas, como foi mostrado, e mostra-se mais fraca.

Gledson Meireles.

sábado, 25 de fevereiro de 2023

Livro: A lenda da imortalidade da alma. Tópicos sobre cessação da existência e conceito de morte.

Cessação da existência

É verdade que os ímpios serão “destruídos”, mas apenas no sentido de condenados, não significando que deixarão de existir.

Deixam de existir na terra, enquanto os salvos duram para sempre. Eis que os ímpios não habitarão a nova terra, mas somente os salvos. Os condenados estarão no lago de fogo, o inferno, espiritual, que não estará na nova criação.

Mas, os salvos irão para o céu, e também habitarão a terra. Por isso o Apocalipse afirma que a Nova Jerusalém é a esposa do Cordeiro. Assim, temos que essa é a Igreja celestial. Portanto, a Igreja é simbolizada pela Cidade Santa de Jerusalém. Ela desce para a terra, tendo Deus com Ela. Isso não pode significar que os salvos irão habitar somente a terra, pois também significaria que Deus iria para sempre habitar a terra, esvaziando por completo o céu.

Por isso, Jesus ensinou que dos pobres em espírito é o Reino dos Céus e os mansos possuirão a terra (cf. Mateus 5, 1-8). Assim, temos que os salvos possuem o Reino dos Céus e também a terra. Magnífico. Viveremos para sempre com Deus no céu, mas também teremos a terra como nossa, podendo usufruir de todo bem que Deus nela criou.

Contudo, as Escrituras usam palavras fortes que denotam inexistência, aniquilamento dos ímpios, afirmando que deixam de existir, como o citado Sl 104, 35. Mas isso tem a ver com a existência na terra, e também na nova terra.

Uma explicação para a frase “como se nunca tivessem existido” talvez seja o sentido adquirido da perspectiva dos salvos, pois os ímpios serão como se nunca tivessem existido, não estarão no céu, e também não estarão na terra. Por isso diz o texto de Isaías citado: “Ainda que você procure os seus inimigos, você não os encontrará.

 

Morte na Bíblia significa “separação”?

Para o mortalismo a morte eterna é igual à morte física porque morte significa fim da existência. Assim, todos os que morrem caem na inexistência. A primeira morte e a segunda morte é igual em natureza na perspectiva mortalista. A diferença estaria na duração, na qual a primeira morte é desfeita na ressurreição e onde a segunda morte não tem fim.

Mas a Escritura afirma que a segunda morte é o lago de fogo e enxofre. Isso é curioso, porque a primeira morte não é outra coisa que o fim da vida física. Então, a segunda morte é algo espiritual, uma condenação, um lago de fogo e enxofre, o inferno.

Por isso, a segunda morte não é separação da alma e do corpo, pois a Bíblia afirma que a segunda morte é o lago de fogo e enxofre.

A morte dos animais é a separação da alma e do corpo, no sentido de que o princípio vital dos animais sai do corpo e perece, desaparecendo, caindo em inexistência. O ser humano possui algo diverso, por isso o livro do Eclesiastes sugere que o espírito do homem sobe a Deus, enquanto que o dos animais desce à terra.

Se o espírito aqui fosse apenas a energia vital que torna todos vivos, então seria que essa energia retornaria a Deus também. Mas, em algum sentido, Deus toma o espírito do homem para que o ressuscite no último dia, enquanto que isso não é feito com relação aos animais. Assim, Deus não guarda essa força vital que reunirá a alma e o corpo dos seres humanos. Dessa forma, os animais caem em inexistência.

O que Ecl 3, 19-20 está afirmando é que os animais e os homens morrem igualmente e sofrem a corrupção voltando ao pó, da mesma forma. Também, afirma que o espírito que vivifica ambos é o mesmo, ou seja, essa força vital de Deus que dá vida á criação.

No entanto, como explicado, o livro em Ecl 12, 7 afirma que o espírito do homem retorna a Deus. Isso mostra que há algo no homem que o diferencia do animal, fazendo com que o ser humano possa ter existência após a dissolução do corpo.

Então, afirma o sagrado livro do Eclesiastes: “Quem sabe se o sopro de vida dos filhos dos homens se eleva para o alto e o sopro de vida dos animais desce para a terra?” (cf. Ecl 3, 22).

Isso mostra que ninguém sabia responder a isso. Ninguém poderia afirmar diferença essencial entre homens e animais. Não se poderia saber o que acontece com o espírito de ambos. Mas, eis que em 12, 7 isso é respondido, como já ficou claro no tópico que trata diretamente desse assunto do Eclesiastes.

Por isso, a alma do ser humano permanece, e será reunida ao corpo pelo espírito de Deus na ressurreição. As almas dos animais são criadas com seus corpos, a partir de seus corpos, e não como o homem, que teve seu espírito criado dentro do corpo. Os animais que não possuem alma imortal, e que têm o espírito de vida cessando de existir com eles, pois esse espírito “desce à terra”, não podem ressuscitar. Isso é hermenêutica e exegese bíblica.

Então, os mortalistas que criticam a imortalidade da alma e citam bastante o conceito platônico para alma e para a morte, gostam de afirmar que a alma  “se liberta” do corpo na morte, o que não é conceito cristão, mas da filosofia grega.

Assim como Samuel aparece à necromante, como subindo da terra, em seu espírito, e em Isaías 14 vimos que a alma do rei desceu para o sheol e o corpo ficou fora da sepultura, e na parábola do rico e Lázaro ambos morrem e o mendigo é dito ser levado ao seio de Abraão, algo que ocorre antes do juízo final, e portanto, antes da ressurreição geral, temos que a morte significa separação do corpo e da alma.

Gledson Meireles.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

Livro: Apóstolos. Por que os protestantes negam o primado de São Pedro?

Estudo do livro “Apóstolos, verdade bíblica sobre o apostolado”, do reverendo Augustos Nicodemus Lopes, das páginas 58, 59, 60.

Há vários motivos pelos quais os protestantes não aceitam o primado petrino. Nesses motivos, podem ser percebidos erros na compreensão da doutrina. O presente artigo irá demonstra-los.

É verdade evangélica que o apóstolo Pedro foi o primeiro dos apóstolos, um fato, que não pode ser negado. No entanto, muitos dizem que isso não prova o primado de Pedro. Por quê? Porque há erro na compreensão da doutrina católica.

Vejamos: o reverendo Augustus reconhece que Pedro foi destacado por Jesus em várias ocasiões, que estava entre os primeiros discípulos, que foi citado como primeiro nas listas dos apóstolos, que estava entre os mais próximos de Jesus, que foi o primeiro a “responder” à pergunta de Jesus sobre a identidade do Messias, mas também o primeiro a repreender e a negar Jesus, teve a incumbência de fortalecer os irmãos na fé, de apascentar as ovelhas e os cordeiros na Igreja, é citado em destaque entre os apóstolos, foi o que presidiu a substituição de Judas, pregou às multidões, defendeu o evangelho no Sinédrio.

É muita prova de que Pedro de fato é um apóstolo especial, que foi destacado entre os demais, e que isso tem um motivo. Mas diante de tantas provas, por que os protestantes ainda não creem no primado de Pedro? Como é possível?

Isso é respondido no livro: o motivo é que no entendimento protestante o próprio Pedro, os demais apóstolos e as igrejas da época não reconheciam Pedro como chefe!!! Onde está escrito isso: em lugar nenhum. Onde estão os sinais de que isso era o que acontecia na Igreja do primeiro século? Não há tais sinais. E quanto às provas acima, de que Pedro tinha atenção especial de Cristo, e da revelação do Espírito Santo?  Não são provas suficientes de que ele sabia que tinha missão especial, de que os apóstolos também a reconheciam, e que as igrejas da época pacificamente havia ouvido o evangelho com esse dado revelado desde os primeiros dias? Parece que a responde é sim. Tudo isso já está provando que Pedro recebeu o primado.

Outro problema é que para os protestante o primado petrino significa que Deus fez de Pedro o único canal de revelação, por onde Deus revela, inspira infalivelmente, para toda a igreja, e ensina ao povo. Essa é a noção protestante que o livro apresenta, e não é a doutrina católica.

O livro afirma que Pedro não foi visto como cabeça da Igreja e nunca se sobressaiu entre os demais? Como? Se as passagens acima provaram que ele sempre se sobressaiu? Foi destacado, foi próximo de Jesus, foi primeiro, etc, etc, etc, e ainda não se sobressaiu nunca? É algo que o leitor deve pensar.

Outra vez: o papa é servo de Cristo, um cristão que cumpre um papel importante na igreja, sucessor de Pedro, mas não é inspirado, não é fonte de revelação, não é infalível em seus atos, e etc. Portanto, o que o livro supõe ser a doutrina da Igreja está equivocado, e a crítica perde o sentido a partir disso.

Algo que o livro citado não frisou é que Pedro não apenas foi o primeiro a responder a pergunta sobre Jesus, mas ele foi iluminado do alto, teve uma revelação de Deus sobre a messianidade de Cristo, o primeiro entre os apóstolos a reconhecer que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus por revelação do Espírito Santo. Isso é bíblico, é doutrina do primado, é um fato, e tal ênfase se torna necessária nesse pormenor.

Prossigamos no nosso estudo. Também negam que Pedro foi primus inter pares, o que muitos admitem. De fato, Pedro foi o primeiro, mas nunca creu que era o único canal inspirado e infalível, pois essa não é a doutrina de Jesus, e a Igreja Católica não a ensina.

Também, o livro afirma que 1 Pedro 2, 4-8 é interpretação da pedra em Mateus 16, 16-19, e que na Igreja do primeiro século ninguém entendeu que Pedro foi a pedra da Igreja. No entanto, isso vai contra o que foi apresentado antes, já que os muitos versículos citados provam que Pedro era o chefe, “a pedra” nesse sentido, instituída por Jesus, constituindo essas as provas do primeiro século. Para o segundo século em diante, temos mais provas da patrística, de que Pedro foi de fato o príncipe dos apóstolos e que dele sucedem os papas.

Outro equívoco é pensar que os sucessores dos apóstolos são “substitutos”, como iguais no cargo, como em idêntico patamar, como infalíveis iguais aos apóstolos, que pregavam e escreviam a doutrina inspirada de Jesus e etc. Essa é a noção que o livro combate, mas que não é a doutrina católica.

De fato, o autor afirma que os presbíteros que vieram após os apóstolos foram designados para interpretar e aplicar o legado apostólico. Muito bom. Mas isso é parte da doutrina da sucessão apostólica, não negando nada dela.

Ainda, a doutrina católica reconhece que os apóstolos, os Doze, e São Paulo, tiveram uma bênção única, exclusiva, e vitalícia para cada um deles, sendo temporário o ministério apostólico como dos Doze Apóstolos. Os bispos hoje são sucessores mas não são infalíveis na pregação, como eram os apóstolos, e não revelam ou escrevem inspiradamente como fizeram muitos dos apóstolos.

Gledson Meireles.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

Livro: A lenda da imortalidade da alma. Tópico sobre a aparição de Moisés

Segue refutação do respectivo tópico.

Entender como mais uma evidência a imortalidade da alma na aparição de Moisés é utilizar o verso fora do contexto? Não, por tudo o que já está sendo provado nesta refutação.

Mesmo que sabendo que Elias antes estava no céu, o apóstolo São Pedro, sem pensar bem no que estava propondo, sugeriu construir tendas, inclusive para Elias. Então, ainda que pensasse em Moisés como apenas uma alma aparecendo ali, não é prova contra a existência da alma o pensamento de construir uma tenda, já que se tratava de um momento singular, e onde os pensamentos não estavam fluindo muito claramente, de forma a não raciocinar sobre esses pormenores, ou seja, construir algo material para abrigar espíritos e corpos glorificados através com a materialidade comum das coisas terrestres.

 Então, não é fato algum afirmar que Pedro pensava em Moisés como ressuscitado. Não há isso no texto, mas apenas uma interpretação mortalista, que é o único meio encontrado para explicar a presença de Moisés ali, pois o mortalismo não crê na existência das almas conscientes após a morte.

 A ideia de que Pedro pensou em Moisés como alguém limitado ao mundo físico já é uma contradição com o que se pretende provar. Certamente isso só pode ser harmonizado como feito acima, ou seja, Pedro não sabia bem o que estava falando.

Assim, da mesma forma que seria absurdo pensar em abrigar uma alma, é igualmente desnecessário construir abrigo para um homem glorificado, que não está preso ao mundo físico. São Pedro não pensou nisso, então, não há qualquer objeção contra a imortalidade da alma, como não há contra a glorificação dos corpos. Não se exige na passagem a ideia de que Moisés estivesse ressuscitado.

Terá sido Moisés ressuscitado, como ensinam os adventistas? O autor tenta provar isso por meio da Bíblia, numa inferência formidável. Será que consegue? Vejamos.

Pelo que foi afirmado, parece sugerir que o arcanjo Miguel veio ressuscitar Moisés, desenterrando-o, após não se sabe quanto tempo, e que o Diabo veio para tentar impedir isso, querendo para si o corpo de Moisés. Pensando dessa forma, não parece ter sido muito após o sepultamento. Talvez até, segundo pensamento hebraico, fosse antes dos quatro dias, entre o primeiro e o terceiro.

Dessa forma, Deus teria sepultado Moisés para esconder sua sepultura, e no mesmo dia mandando ressuscitá-lo, ou um ou dois dias após. De fato, ao se pensar que a ressurreição semelhante à de Lázaro, que ainda tinha seu corpo no sepulcro. Do contrário, tratar-se-ia da ressurreição como se dará no juízo final, recriando o corpo já desfeito no pó da terra. Tudo isso é bastante estranho, não é inferência do texto bíblico, mas suposições das explicações mortalistas.

Diga-se de passagem que a ressurreição de Maria é símbolo da ressurreição da Igreja em geral, pois foi a primeira criatura glorificada com Jesus. O seu fato é encontrado em obras dos primeiros séculos e concorda com os dados bíblicos.

A própria aparição de Moisés é praticamente prova da imortalidade da alma. Não é de se esperar outra coisa. A suposta ressurreição de Moisés é uma explicação quase obrigatória para quem nega a existência da alma imortal. E possui muitos inconvenientes.

Também não há nenhuma passagem bíblica que indique que Moisés ressuscitou. O livro afirma que “grande soma de passagens” falam disso, mas não há nenhuma. Nenhuma que indique que Moisés ressuscitou. Não há nem mesmo indicação.

Por outro lado, da ressurreição de Maria há passagens que indicam, fortemente, e uma teologia bastante desenvolvida que ultrapassa a doutrina da ressurreição de Moisés. Baseando-se na fraseologia do autor do livro, a doutrina da assunção de Maria possui indícios que a demonstram sem deixar dúvida.

É óbvio que não há necessidade de que todas as crenças bíblicas tenham de ser “explicitamente” afirmadas. Por isso a Igreja Católica crê na assunção de Maria e outras doutrinas. Assim, nenhuma delas é invenção, não são criadas pela tradição.

Interessante que a simples aparição de Moisés, que qualquer um leitor da Bíblia entende que se trata da alma de Moisés, é dito que esse entendimento é ultraje às Escrituras, ou que endosse o espiritismo.

Há duas formas bíblicas de estar com o Senhor diretamente, nesse caso, antes da ressurreição, a saber: a ressurreição ou a alma ir ao céu.

Elias e Moisés aparecerem por serem os representantes da Lei e dos Profetas. A argumentação de que isso se deve ao fato de que estariam vivos, um arrebatado e o outro ressuscitado, não é um fato, nem há como ter essa informação exegeticamente.

Assim, Jesus não trouxe mais ninguém, não porque não existiam outras pessoas no mundo dos mortos (e não no céu, como supôs o autor), pois ele poderia ter chamado Enoque, caso fosse uma ocasião em que estariam todos os mortos conscientes. Portanto, essa única constatação invalida esse exemplo que o autor utilizou para reforçar sua posição.

Em outras palavras, da mesma forma que Jesus não invocou o panteão de santos do céu, como disse o autor, desconhecendo a doutrina católica que afirma sempre que ninguém entrou no céu antes de Jesus, então prossegue afirmando que apareceram dois que não eram almas sem corpo. Isso indica que Jesus teria chamado mais outros, caso estivessem conscientes na morte. Mas, essa implicação não existe, visto que Enoque, que também foi arrebatado, não aparece na cena.

Outro problema é afirmar que Jesus foi o primeiro a ter o corpo glorificado para habitar permanentemente na glória, uma explicação que parece ter sido forjada para fundamentar a ressurreição de Moisés, que teria corpo não glorificado, mas que há milênios habita a glória de forma imortal, com todas as características dos corpos glorificados, como aparecer e desaparecer, e etc. É uma explicação fraquíssima em termos bíblicos.

Ou Moisés teria sido ressuscitado como Lázaro, por exemplo, para aparecer a Jesus, e voltado a morrer, se esse é o objetivo da explicação. É o que parece sugerir a mesma. Mas, como já refutado, se é essa a explicação, então não há como comparar a suposta ressurreição de Moisés com a de outros antes de Cristo, já que ninguém foi recriado fisicamente do pó da terra antes.

Contudo, se Moisés já havia sido ressuscitado há milênios para um dia aparecer a Cristo como representante da Lei, e Elias arrebatado para ser o representante dos profetas, não se explica como Moisés poderia ter sido ressuscitado como os outros que o foram antes de Cristo. Explicação que não se sustenta de uma forma ou de outra.

O que é conclusivo no texto é compará-lo com as outras inúmeras provas de que a alma é imortal. O texto apenas corrobora esse fato.

Gledson Meireles.

domingo, 5 de fevereiro de 2023

Livro: A História não contada de Pedro, refutação do capítulo 15

Será que essa resposta é “fraca”?

 

Capítulo 15

A Missão Secreta de Pedro

Roma é a Sé Apostólica, desde São Pedro, o primeiro dos apóstolos. O tempo em que Pedro viveu em Roma não é de todo conhecido. É um período que não é fácil calcular. No entanto, sua estadia lá é histórica, não uma “lenda”. Os 25 anos do episcopado de Pedro foram sugeridos por uma hipótese gerada de cálculos feitos a partir de listas episcopais, e registrada no Chronicon.

Portanto, mesmo esse período de vinte e cinco anos está registrado em obra histórica do século quarto.

A Bíblia não nega que São Pedro esteve em Roma, e isso já é um começo de conversa para quem tem tanta “certeza” de que o apóstola jamais pisou na capital do Império Romano da época.

No máximo, lendo as páginas sagradas do Novo Testamento, haveria um silêncio sobre isso. Não se falaria nada sobre Pedro estar em Roma, ter ido lá, ter lá permanecido, nem haveria qualquer negação desse fato histórico.

No entanto, há evidências desse fato em 1 Pedro 5,13, que será tratado em capítulo específico.

Quando Jesus menciona que Seu Nome será pregado em Jerusalém, Judeia e Samaria, que foram os primeiros centros do Cristianismo, isso não indica que Roma não fosse considerado importante local de introdução do Evangelho. É procurar demais em um versículo uma prova contra tamanha evidência histórica.

De modo algum, quando o Senhor fala de Jerusalém, a primeira e mais antiga sede, Judeia e Samaria, Ele sugere algo nesse sentido.

Certamente, nosso Senhor estava apenas falando dos primeiros locais onde o evangelho iria estabelecer-se, até chegar aos confins da terra. E antes de chegar aos confins da terra, com total certeza, iria à capital do Império, sob o qual estava a Palestina do tempo de Cristo. Ou alguém duvida que a fé cristã, tão importante, essencial, vida e salvação para a humanidade, não seria pregada em Roma logo no início? É óbvio que isso não faz parte da argumentação, e nem precisaria, mas é bom refletir.

 De fato, a Epístola aos Romanos prova que Roma tratava-se de local singular e de importância tamanha, que a fé dos romanos era conhecida em todo o mundo (cf. Rm 1,8; At 23,11). Isso é digno de nota, pois em outros lugares os cristãos do primeiro século já elogiavam, já tinham como algo de certa fama, a fé dos cristãos de Roma.

É verdade que até Atos 8,1 nenhum apóstolo arredou o pé de Jerusalém! É muito provável, pelo que os dados bíblicos apontam.

Pedro permanecia em ambiente Palestino. O livro passa boa parte de sua argumentação tentando desmentir os 25 anos do papado de Pedro em Roma. Mas isso não é preponderante, ou seja, os vinte e cinco anos sendo o período total ou não, não importa. Sendo que esse tempo não é essencial para a doutrina do primado, o livro desperdiça considerável parcela de energia contra algo de pouca monta, de importância menor.

Já temos aqui dois argumentos que caem fragorosamente: as fontes históricas falam da estadia de Pedro em Roma, e o Novo Testamento não nega isso, mas sugere fortemente, e evidencia esse dado histórico. Ainda, o tempo que São Pedro permaneceu em Roma não é importante para a doutrina do papado. O importante é o fato.

No tempo do Concílio de Jerusalém, Pedro estava naquela cidade, portanto, Pedro estava em Jerusalém. Esse Concílio se deu em 49 d. C. Possivelmente, e não com total certeza, São Pedro foi a Roma em 42 d. C. Certamente, porém, não permaneceu por lá, mas saiu com a expulsão dos judeus sob o imperador Cláudio. Então, é muito claro que não se pode afirmar que São Pedro nunca teria saído de Jerusalém até aquele tempo. Ele foi a Roma em 42 d. C., e estava em Jerusalém em 49 d. C. Ninguém poderia supor que o apóstolo não pudesse viajar naqueles tempos. Apenas há silêncio sob a questão.

O Edito do Imperador expulsou os judeus em 49 d. C., não de 41 a 54. Certamente, de 49 a 54 d. C., conforme Mark Bonocore.

Nesse tempo, é provável que Pedro foi expulso de Roma, com todos os judeus, e, por isso, estava em Jerusalém. O imperador reinou de 41 d. C. a 54 d. C., mas expulsou os judeus após cerca de 8 anos do seu reinado, em 49 d. C. Isso confirma os dados bíblicos.

Pensar que o tempo inteiro do governo de Cláudio identifica aquele período de expulsão dos judeus é um erro que o livro supõe para impossibilitar a presença de Pedro em Roma nesse período. É uma suposição falha do livro. É pensar que do primeiro ano de império daquele governante até o último nenhum judeu pisou mais em Roma. É um argumento falho.

Na época, se Pedro era perseguido, e havia sido libertado da prisão por Providência Divina, e pregou em Roma nessas condições, entende-se que não havia lá uma estrutura semelhante à do Vaticano atual, com construções imponentes, como uma basílica, e numa organização comparável à encontrada 20 séculos mais tarde. Não há lugar para isso no tempo de perseguição do século 1. Por isso, São Paulo mora em casa alugada, e não numa igreja que funcionasse como sé apostólica. Certamente, esse item já está respondido.

Considerando o período de 42 a 61 d. C. São Pedro deve ter estado em Roma de 42 a 48, ou 49. Se residiu lá ou não, não é possível afirmar com certeza. Pode certamente ter morado em Roma durante esses anos.

A respeito das saudações na carta aos Romanos, e a não referência a Pedro, deve-se ao fato de que nessa época o apóstolo estava em Antioquia (57-58). Pelo que consta, a volta de Pedro a Roma deu-se após os anos 60 d. C. Mais uma vez os dados bíblicos são confirmados por essas informações históricas.

A essa altura, o livro mostra que esse é o ponto do argumento mais forte que poderia apresentar contra o primado: “Se isso não é suficiente para mostrar que Pedro não era bispo de Roma sob nenhuma circunstância, não sabemos que argumento poderia ser capaz de abrir os olhos espirituais daqueles que “tem seus olhos tampados, e não conseguem ver; e suas mentes fechadas, e não conseguem entender” (Is.44:18).” [ênfase no original] (p. 160).

Se Pedro não estava em Roma nesse tempo, da escrita da Epístola aos Romanos, e esse é o motivo porque Paulo não o menciona, está respondido tal argumento que o livro julgou ser tão incisivo. Além do mais, por algum motivo silencia-se, em vários lugares, a respeito de Pedro. Quando Pedro saía de Roma, isso não significa que deixasse de ser o líder daquela Igreja. É muito simples entender isso.

Não é necessário referir-se pormenorizadamente ao argumento sobre a saudação da Igreja na “Ásia”, aludida no livro como premissa presente na apologia em sites católicos. O que foi escrito acima já é suficiente para mostrar que Pedro, na época em que Paulo escreve aos Romanos, está em Antioquia.

São Paulo deveria dar testemunho de Jesus em Roma. Mas, tal não significa que os romanos não conhecessem o Nome de Jesus, e que não fossem cristãos. Pelo contrário, São Paulo elogia sua fé. Quem havia evangelizado Roma? A História incontestavelmente mostra que foi São Pedro.

Há indícios de que os primeiros cristãos em Roma foram aqueles que vieram de Jerusalém após o Pentecostes, mas que o estabelecimento da Igreja na cidade eterna foi feito, em especial, por São Pedro, e também por São Paulo.

Em Atos 28,15 São Paulo chega, com prisioneiro, a Roma. São Pedro não é mostrado entre os visitantes do apóstolo. Onde estava? É possível que estivesse em Roma. Desde Atos 12,17, como mostra Bonocore, Pedro estava sendo procurado pelas autoridades judaicas, e não poderia visitar Paulo nessas condições, visto que o mesmo estava no cativeiro para ser julgado. Certamente, esse é o motivo pelo qual Pedro desaparece de cena a partir de Atos 12.

É um dado bíblico que mostra fundamento para não mencionar Pedro. De fato, nem mesmo o lugar o Espírito Santo quis revelar, por motivos óbvios da perseguição, e apenas afirma que o apóstolo foi para outro lugar.

Na página 159 o livro menciona a viagem de Paulo a Jerusalém, onde foi recebido por Tiago. Interessantemente, visto seu estilo, bastante esclarecedor de sua posição, o autor não elucida que essa ocasião se deu pela visita de Paulo a Pedro. Ou seja, São Paulo foi justamente a Jerusalém, onde São Tiago era bispo, para ver o apóstolo São Pedro. Ele não foi visitar Tiago, mas Pedro, é necessário frisar, visto que o livro não o fez, mas a Bíblia é clara nesse ponto.

Quando o autor faz menção desse fato, em outro lugar, não aponta essa especificidade importante, de modo a não refletir sobre o fato. São Paulo foi a Jerusalém justamente para conhecer o apóstolo São Pedro.

Mais tarde, em toda sua estadia em Roma, certamente Paulo viu a Pedro. Não o sabemos, porém. Mas é muito provável. A Bíblia não afirma, nem nega. E o argumento ex silencio é inócuo.

Na página 160 o livro alude à ideia de que em Roma havia apenas alguns cristãos, e por isso os judeus de lá não conheciam bem o Cristianismo. Mas, fica difícil entender que a fé dos “alguns” cristãos de Roma fosse tão elogiada, e conhecida em todo o mundo!

Isso não parece harmonizar com pequena quantidade de cristãos. Aliás, a História mostra que por nessa época Roma era habitada por grande quantidade de judeus cristãos, bem como de muitos cristãos gentios. Uma afirmação: Paulo foi visitar a Pedro em Jerusalém, não a Pedro e Tiago. Necessário frisar.

De fato, ele viu Tiago por acaso, e mais nenhum outro apóstolo. Há inconscientemente algo tentando fazer ofuscamento do status de Pedro nesse argumento!

Além do mais, se aqueles judeus que viviam em Roma não tinham conhecimento básico do Cristianismo, deve-se ao fato de ser imigrantes recentes, chegados em Roma após o fim do Edito de Cláudio, que havia proibido a estadia de judeus na capital do Império.

Desse modo, aqueles judeus não sabiam realmente muito a respeito do Cristianismo. No entanto, algo mais é necessário saber. Mark Bonocore mostra que os judeus queriam informação sobre o ministério de Paulo, sobre o Cristianismo entre os gentios, pois parece conhecer as características do Cristianismo em si, como aquele já fundado em Roma, por Pedro. Sabiam, porém, de forma rudimentar, como se fosse uma seita judaica. Assim, afirmam que não sabiam da referência de Paulo enviada de Jerusalém. Pediram a ele suas explicações, e desejavam saber o que Paulo pensava.

Certamente, esse era o motivo por que queriam conversar com Paulo. Além do mais, pode-se atentar ao fato de que se tratavam de judeus não abertos à mensagem cristã, para os quais o cristianismo católico não passava de “seita”.

Na página 165 o livro refere-se a Gl 1,18, e nesse momento tem de reconhecer que Paulo quis conhecer a Pedro, e por isso foi a Jerusalém. Obviamente, nesse tempo, São Pedro nunca tinha ido a Roma, mas essa viagem ocorreu após o ano 42. Quanto a Roma nessa época, estava repleta de judeus.

Sobre a questão do apostolado entre os judeus e entre os gentios, de Pedro e de Paulo, diz o livro: “É lógico que Paulo jamais imaginou que Pedro assim como ele também atuasse entre os gentios.” (p. 167). Essa afirmação deve ser entendida biblicamente.

Para quem lê Gálatas 2,7-8 como "prova" contra o primado de Pedro, e sua estadia em Roma, é necessário um conhecimento bíblico correto e mais aprofundado.

O ministério apostólico não foi instituído para um grupo de cristãos somente. De fato, Cristo ordenou aos apóstolos a pregar o Evangelho a toda criatura (cf. Mt 28, 19-20). Não disse que uns deveriam pregar aos judeus e outros aos gentios. Esse ministério restrito aos judeus foi o ministério de Cristo, antes da Sua morte, antes da cruz, preparando o povo Judeu.

De forma geral, os doze apóstolos iniciaram a evangelização entre os judeus, partindo do modelo deixado por Jesus, e somente depois voltaram-se aos pagãos, como havia ordenado o Senhor.

Assim o fez Nosso Senhor, que veio primeiro às ovelhas perdidas da casa de Israel. Ainda assim, voltava-se circunstancialmente aos pagãos.

Os primeiros doze apóstolos foram iluminados pelo Espírito Santo para anunciar a salvação ao Povo de Israel primeiramente. Então, Deus suscita São Paulo a pregar, também ele, primeiro aos judeus, e depois aos gentios, porém, com o ministério específico entre os gentios, de forma que ficou conhecido na Igreja Católica como o Doutor das Nações.

Tendo esse contexto em mente, sabe-se que São Pedro foi a Roma e ministrava para todos, embora sua especificidade evangélica estivesse endereçada aos cristãos de origem judaica.

Entende-se, portanto, que como chefe da Igreja sempre pregou a ambos os povos. Assim o foi em Antioquia, sua primeira e provisória sede episcopal. A sé do papa era, portanto, nesse tempo, a cidade de Antioquia, pois ali primeiramente lançou as bases da Igreja o apóstolo Pedro.

Mais tarde, foi para Roma. Mas, como visto na carta aos gálatas, Pedro convivia tanto com judeus, como com os gentios. Isso fica claro no fato que deu ocasião para que fosse repreendido por São Paulo. Isso prova cabalmente que o ministério petrino não era restrito aos judeus, como se não pudesse habitar com os pagãos, e falar de Cristo a eles. Nada disso. Trata-se, assim, do foco geral e do objetivo principal do ministério apostólico dos apóstolos Pedro (e dos outros onze) e Paulo (com seus colaboradores) [cf. Mark Bonocore].

O que o livro julga ser o golpe mortal contra o primado, afirmando que São Pedro permaneceu em Jerusalém, pois seu ministério não podia ser entre os gentios, está, portanto, refutado.

Como afirma Bonocore, a consideração de 2 Tm como referindo-se à “segunda” prisão de Paulo, isso se deve à Tradição da Igreja, pois não é um fato revelado explicitamente na Escritura. Se o livro aceita esse dado da Tradição, por que não render-se às provas de que Pedro foi bispo de Roma, que a História mostra sem rodeios?

O que houve foi uma leitura pouco atenta da História da Igreja na consideração desse fato. O que foi provado acima é incontestável, mas o livro não o citou corretamente. Por isso, sua argumentação assemelha-se a construir sobre fundamento arenoso.

Em Cl 4,11 São Paulo fala dos únicos colaboradores cristãos judeus entre os gentios. Isso não significa que não havia outros cristãos em Roma!!!! O livro conclui isso: Portanto, ao dizer “únicos”, ele exclui a possibilidade de haver algum judeu além daqueles citados que estivesse com ele em Roma.(p. 170).

Assim, em 2 Tm 4, ao afirmar que somente Lucas estava com ele, isso não significa que não havia cristãos em Roma, mas que do círculo mais próximo do apóstolo, dos seus colaboradores, somente Lucas continuava consigo naquele momento. Excluir a presença de autoridades cristãs em Roma, ou do Cristianismo em geral, no tempo de São Paulo, é algo que a Bíblia não o faz, e o livro conclui isso de um verso que não se refere à questão.

A própria presença de São Paulo em Roma, com seus colaboradores, indica a presença importante de cristãos naquela capital. A Epístola aos Romanos constitui outra prova de considerável peso nessa questão. Assim, de dois versos que não afetam o assunto, o livro usa-os para afirmar que os cristãos e suas autoridades, como conclui, não habitavam Roma. É lastimável tal conclusão.

Afirmar que o fato de Pedro não ser mencionado nas epístolas seria que ele estava sempre de viagem, realmente não explica o caso. Mas, acima, o mesmo foi explicado sem recorrer a tão simples afirmação.

Contudo, lendo os textos bíblicos que o Protestantismo apresenta, e que o livro cita, como prova contra o primado, os mesmos não afirmam o que o livro entende que o façam.

E Jesus, chamado Justo; os quais são da circuncisão; são estes unicamente os meus cooperadores no reino de Deus; e para mim têm sido consolação. (Cl 4,11).

É necessário entender que São Paulo fala dos seus cooperadores no Reino de Deus, como afirmado, indicando aqueles com os quais trabalhava no ministério. Não está afirmando que inexistiam cristãos naqueles tempos fora os citados. Não se pode deduzir isso.

Igualmente em 2 Tm 4,11:Só Lucas está comigo. Toma Marcos, e traze-o contigo, porque me é muito útil para o ministério. Será que São Paulo está afirmando que em Roma somente havia ele e São Lucas como cristãos? Pela intepretação do livro essa é a única via para se chegar à resposta.

Mas, a Bíblia, e a história, em nenhum lugar afirmam isso. Apenas, a Bíblia mostra que o apóstolo estava sozinho na prisão, porque seus colaboradores o haviam deixado: Demas por apostasia, Crescente e Tito haviam ido, respectivamente, para a Galácia e Dalmácia. Somente Lucas permaneceu com ele. Esse é o assunto.

O livro tentou tirar a possibilidade de Pedro estar em Roma a partir desses versos, e por eles chegou a esvaziar Roma de cristãos. Provou demais. E, por isso, não provou nada.

Dessa forma, com intuito de “provar” algo além do argumento ex silencio, atribuiu-se a dois versos uma informação que os mesmos desconhecem, e que outras partes da Bíblia desaprovam. Ainda, a tradição mostra justamente o oposto daquilo que o livro tentou inculcar. Outra lacuna do mesmo.

Sendo assim, é necessário repetir que a Igreja não afirma categoricamente que houve um episcopado de 25 anos de São Pedro em Roma, mas que o apóstolo esteve naquela cidade, nela permaneceu, pregou lá o Evangelho, estabeleceu a Igreja e, por fim, foi martirizado sob o império de Nero. Foi o primeiro bispo de Roma, sucedido por Lino.

Gledson Meireles.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

Livro: A lenda da imortalidade da alma. Tópico sobre punição eterna por Deus ser eterno

Respondendo ao tópico: A punição precisa ser eterna porque Deus é um ser eterno?

O autor afirma que esse argumento é ainda mantido por alguns “embusteiros” que se passam por filósofos. A punição poderia até mesmo ser eterna, mas não como tormento. Por que Deus não poderia escolher a morte eterna? Então, o argumento é que Deus decidiu aniquilar os réprobos.

A premissa que é atacada seria que a punição pelo pecado estaria ancorada na idade ou magnificência do ofendido.

Outra coisa atacada é a proporcionalidade das penas no inferno. É preciso dizer que não há necessidade de tentar relativizar o período eterno, que não é possível.

Se diz, antes, das penas de cada condenado, que são eternas na duração, mas não iguais na intensidade. Portanto, é algo que já está respondido sem cair nesses problemas.

Isso já responde a objeção de que se a base é a eternidade de Deus todos deveriam receber mesma punição, o que não ocorre. A punição é de duração infinita, por ser pecado não perdoado, eterno, por ofender a Deus que é eterno, mas proporcional à falta cometida.

Afirmar que Deus decide pela aniquilação, e que a filosofia medieval não pode se impor contra isso, careceu de maiores argumentos.

Não é que a punição varie segundo a idade e magnificência do ofendido, mas essa é uma das explicações da eternidade da punição no inferno.

Obviamente, quando a teologia fala da punição como um “tormento com fogo” não se parte do nada, de alguma ideia racional apenas, mas vem já da autoridade da Bíblia, da revelação, que fala do fogo eterno preparado para o Diabo e seus anjos.

A teologia católica estudou esse argumento sobre a aniquilação. A principal razão para não aceita-lo é a revelação que fala da punição eterna (cf. Mt 25, 46). Mas, os mortalistas esforçam-se por mostrar inúmeros textos bíblicos que sugerem aniquilação.

Santo Tomás responde que a punição corresponde à falta em respeito à desordem na falta, não na dignidade da pessoa ofendida (S. T. Q. 99. A. 1, VI). O pecado não merece em si a aniquilação, poder-se-ia dizer.

Isso porque, continua, a intensidade da punição deveria então ser dada a todo pecado. O homem não perde o ser ou a existência por causa da desordem que há no pecado cometido, e a perda do ser não é devida a essa desordem do ato.

Explica, então, que o ser é pressuposto ao mérito e ao demérito. Certamente, o que significa que a punição é dada ao ser, e não privando o ser da existência, não aniquilando o ser. Portanto, termina concluindo que a privação do ser não pode ser punição para nenhum pecado.

Em Mt 25, 46 o “castigo eterno” e contrastado com a “vida eterna”. Isso é muito emblemático. A palavra usada nesse verso não é morte eterna, mas castigo, que pode ser tormento, privação de algo, correção.

No verso 41 Jesus fala do fogo “eterno” que foi preparado para o diabo e seus anjos, que são espíritos. Então, trata-se de um fogo espiritual, que faz sofrer mesmo os anjos, e os réprobos ressuscitados, que vão para a morte eterna, no sentido de castigo eterno. Nas duas passagens é descrito o fogo eterno e o castigo eterno como sinônimos. Então, o fogo castiga sem consumir e levar à inexistência.

Em Judas 13 está escrito que está reservado aos anjos a escuridão das trevas para toda a eternidade, e não que os anjos serão destruídos. Sabendo que Jesus fala do fogo eterno reservado para os anjos, se trata da existência dos anjos por toda a eternidade.

O mesmo afirma Apocalipse 20, 10, onde há tormento “dia e noite” pelos séculos dos séculos. Isso é patente prova da doutrina do inferno.

Gledson Meireles.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2023

Livro: A lenda da imortalidade da alma, no tópico "Paulo insiste que Jesus está vivo"

Paulo insiste que Jesus está vivo

Ninguém que acredita a imortalidade da alma afirma que os mortos estão vivos. Não no sentido de que a morte não existe. É óbvio que em “certo” sentido afirma-se que a morte, não dando fim à existência, não põe fim à vida, e acredita-se que de certa forma os mortos estão vivos em espírito. Mas isso não muda em nada a realidade em que estão mortos aqueles que deixaram a vida física, com os corpos que vão à corrupção e que não participam de mais nada sobre a terra.

Dessa forma, São Paulo nunca iria contender com Festo para provar que Jesus estava vivo em outro lugar e de outra maneira, como vivo em sua alma, mas estava afirmando algo que ninguém concebia até os dias de Cristo, ou seja, que Cristo ressuscitou, venceu a morte, não conheceu a corrupção, e estava vivo para sempre.

 Essa ressurreição da carne é que está em pauta, e não a existência consciente em qualquer outro lugar. O próprio fato de, certamente, ser acreditado por Festo que a alma é imortal deixa claro que é a ressurreição física que faz toda a diferença aqui, e que é a fé dos cristãos que se distingue das demais.

 A afirmação: “Isso corrobora o fato de que, para Paulo, é só através da ressurreição que alguém que já morreu vive, não através de uma alma imortal que passa ilesa à morte.”, não contem prova alguma. Vamos repetir: Festo acreditava na imortalidade da alma, e ficou perplexo ao saber que se dizia que Jesus estava vivo, ou seja, que tinha ressuscitado. Então, a crença da imortalidade da alma não estava em discussão e não tinha qualquer peso nessa questão. Portanto, o que São Paulo pregava não toca nesse ponto.

 Caso Festo cresse que os mortos estão vivos, ao afirmar que Jesus está vivo ele poderia naturalmente dizer que isso era o mais normal que poderia existir. Mas, Festo ficou curioso a respeito disso. Isso está nas próprias palavras de Festo: “um certo Jesus, já morto”, ou seja, na concepção de Festo e de toda a humanidade, o morto estava morto. Era preciso saber algo mais, ou seja, conhecer o fato da ressurreição.

Mas foi afirmado: “Mas isso é inverter a proposição pela causa da proposição.” Não procede. Ao dizer que Jesus está vivo todos sabiam que se tratava em afirmar que estava fisicamente vivo, já que não havia a crença de que não existia a morte. A imortalidade da alma não nega a morte, mas é a própria explicação da morte, ou seja, de que há a separação da alma e do corpo, constituindo a morte.

De fato, se se diz que alguém está vivo já significa que não morreu fisicamente, e não que esteja consciente em sua alma. É o mais natural possível isso.

Se se diz que “a vida após a morte que estava em jogo”, que era discussão o “estar vivo”, então Festo não cria a imortalidade da alma também, e não conhecendo a ressurreição, não cria em nada, sendo total materialista. Isso é o oposto do que certamente ocorria, ou seja, Festo por certo cria na imortalidade da alma, e conhecia essa doutrina. Assim, esse arrazoado está errado.

Gledson Meireles.