“O batismo é realizado da maneira mais significativa pela
tríplice imersão na água batismal. Mas desde a antigüidade ele pode também ser
conferido derramando-se, por três vezes, a água sobre a cabeça do candidato”.
(CIC, 1239)
Depreende-se do
exposto que a maneira que melhor significa o batismo, exteriormente, é a
imersão. Mas que a infusão pode igualmente ser usada. Ainda que em muitos
lugares essa forma é uma possibilidade diante de circunstâncias que impedem o
uso da imersão, a Igreja escolhe por usar o segundo modo em geral, desde que a
doutrina permaneça intacta.
A forma usual
entre a maioria dos protestantes é a imersão. Ou seja, é justamente o contrário,
na prática, do que acontece no Catolicismo ocidental. Mas, não é a forma a
única diferença, pois de outro modo não haveria problema, como não há entre a
Igreja Católica e a Igreja Ortodoxa, quanto a isso, onde as três formas podem
ser aplicadas, segundo as circunstâncias, sem problema. O significado do
batismo é o mesmo nas duas igrejas. Diferentemente, o que difere a posição
católica daquela adotada em grande parte do Protestantismo gira em torno de
outra coisa: a própria essência do batismo.
Não
adianta brigar por algo que não é motivo de briga. Pelo menos quanto a alguns grupos,
pois é claro que a tradição batista tem ordinariamente o batismo de crentes e
por imersão a única forma válida. Nesse caso, o debate é inevitável.
No
entanto, a forma de batismo por imersão não é anatematizada pela igreja, como
visto acima. Não é também motivo importante frisar que a Igreja atual, no
Ocidente, prefere a forma menos usada durante séculos em vários lugares. Isso
não supõe mudança na essência da doutrina, mas apenas uma escolha entre formas
lícitas. A forma mais próxima do simbolismo batismal é a imersão, e a Igreja
crê nisso, e o admite no próprio Catecismo. Alguém poderia perguntar: Por que
então não usar a forma mais indicada simbolicamente? Trata-se, a meu ver, por
questões práticas, por uma escolha da Igreja.
Mas,
tendo que o batismo possui uma simbologia e uma realidade, a parte real não
pode ser mudada de forma alguma, assim também as formas exteriores possuem cada
uma sua característica.
Uma
pessoa batizada por aspersão, num lugar onde não foi possível fazê-lo de outra
forma, é igualmente sepultada com Cristo e ressurgida para uma vida nova, em
realidade, perdendo apenas a simbologia do ato de imersão, que faltou na forma conferida
no seu batismo. Não faltou, porém, a efetivação da ação do Espírito Santo.
Mas,
ao que parece, o artigo O batismo por imersão na
igreja primitiva reclama o fato da Igreja Católica adotar hoje justamente
a forma que era usada em caso de impossibilidade da forma padrão ser aplicada.
Isso é o que entende-se da publicação acima.
“Por que os cristãos da época teriam “piscinas” em
seus templos, se para realizar o batismo era necessário apenas um pouquinho de
água jogada na cabeça do batizado?” (citação do artigo acima)
Essa questão não cria problema algum, pois parece supor que o batismo somente era por imersão, sendo a infusão uma forma ilícita. O autor não quis dizer isso no artigo, é apenas o que pode-se deduzir desse questionamento em particular.
Essa questão não cria problema algum, pois parece supor que o batismo somente era por imersão, sendo a infusão uma forma ilícita. O autor não quis dizer isso no artigo, é apenas o que pode-se deduzir desse questionamento em particular.
Ainda,
a presença de piscinas-batistérios nas igrejas é prova arqueológica daquilo que
sabemos, ou seja, de que o batismo era feito por imersão em grande escala.
No
entanto, ao final do artigo o autor critica a escolha católica de um modo
não-padrão em comparação com aquele usado nos tempos antigos, e fecha o assunto
assim:
“Nada novo debaixo do sol para uma igreja
bastante conhecida por inovações doutrinárias travestidas de “desenvolvimento
da doutrina”.”
Por
isso, e sendo um tema de extrema importância, resolvi escrever algo que
contribua para o entendimento do que é mais importante nesse assunto, e que é a
doutrina do batismo.
Sabemos que a
forma da imersão é mais apropriada para simbolizar a descida às profundezas da
morte (ao sheol) e a subida para a vida (a ressurreição) como Cristo fez. Mas,
esse simbolismo não é o essencial do batismo. A realidade do mesmo o é: ainda
que pela infusão ou aspersão, há o efeito igual do batismo, ficando somente sua
forma exterior destituída dessa simbologia. A parte real permanece intacta.
Em Romanos 6,3-4
o batismo é mostrado como para o sepultamento na morte com Cristo e para a
ressurreição, e em Colossenses 2,12 São Paulo afirma que fomos sepultados no
batismo e ressuscitamos com Cristo mediante a fé. Não há simbologia aqui, mas o
tratamento do efeito interior do batismo. O texto afirma o efeito do batismo.
Certamente, o
protestante tem outra opinião, e não lê literalmente o que está posto acima.
Mas, isso não afeta o caso que proponho refletir, que é a unidade de fé sobre o
batismo que há entre os cristãos católicos hoje e aqueles dos séculos
anteriores.
O autor critica
a ‘inovação’ da Igreja Católica em mudar a forma usual, aplicada durante
séculos na Igreja, para adotar mais comumente uma das formas menos usadas, que
é a infusão. Isso foi o que entendi.
Mas, uma coisa merece ser lembrada: as três formas foram usadas, as três
possuem, então, a mesma eficácia, e as três são reconhecidas até os dias de
hoje pela Igreja Católica, sendo muitas vezes usadas no Ocidente, e mesmo no
Brasil, e que o sentido do batismo permanece o mesmo, sem qualquer mudança.
Não é preciso
muito esforço para ensinar a um cristão católico que a forma antiga de batismo
na Igreja foi naturalmente a imersão. O Catecismo, em seu número 1214, explica
que o sentido de batizar é “mergulhar”, “imergir”, e que “o “mergulho”
simboliza o sepultamento do catecúmeno na
morte de Cristo.”
Se alguém
estudar o Catecismo verá que a mensagem é, em resumo, que o batismo sepulta na
morte de Cristo, e chama-se “banho” porque
realmente lava. Para essa explicação o Catecismo cita São Gregório de Nazianzo.
Não se trata, portanto, de uma simbologia apenas, mas de uma simbologia atrelada
a uma realidade efetivada no instante mesmo do ato batismal.
São Barnabé
escreve que descemos às águas batismais cheios de pecado e subimos para dar
frutos, ou seja, limpos e transformados. É o que devemos entender.[1]
Usando a versão
citada no artigo que citei: “Isso
significa que descemos para a água carregados de pecados e poluição, mas
subimos dela para dar frutos em nosso coração, tendo no Espírito o temor e
a esperança em Jesus. ‘Quem comer deles viverá eternamente’, quer dizer: quem
escutar, quando tais palavras são ditas, e crer nelas, viverá eternamente”
A descida para o
batismo é feita repleta de pecados, enquanto que na saída da água já não há
mais pecado, pois afirma Barnabé que “subimos dela para dar frutos em nosso
coração”. O perdão ocorreu no batismo, segundo ensina Barnabé. O Catecismo
Romano explica o batismo, no mesmo sentido: “Por
natureza, nascemos de Adão como filhos da ira, mas o Batismo nos faz renascer
em Cristo como filhos da misericórdia.”
São Justino
(100-165) explica a forma com que os cristãos dedicam-se a Deus, quando os
cristãos são “feitos novos através de Cristo”.
E continua afirmando: “Então eles são trazidos por
nós aonde há água, e são regenerados na mesma maneira na qual nós mesmos fomos
regenerados.” (1ª Apologia 61,3.10)
Como citado no
artigo que comento, Tertuliano escreve o mesmo sobre o significado correto do
batismo:
“O ato do batismo em si é carnal, pois
estamos mergulhados na água, mas o efeito é espiritual, pois somos
libertados do pecado”.
(ênfase acrescentada no artigo citado)
Aqui podemos
enfatizar não somente a forma do batismo, que é a imersão, mas o efeito, que é
a libertação do pecado. Vamos ler novamente com essa ênfase:
“O ato do batismo em si é carnal, pois
estamos mergulhados na água, mas
o efeito é espiritual, pois somos libertados do pecado”.
Tertuliano faz a
distinção do ato material de batizar, e o efeito interno conferido por Deus,
que é a libertação do pecado.
Tertuliano sabia
disso muito bem. Por esse motivo, havia sugerido que fossem batizados aqueles
que tivessem realmente o desejo para tal, e que devessem pedir o batismo, para
não ocorrer que uma vez assim lavados dos pecados, voltassem à iniquidade.
Conferir o batismo aos bebês seria um ‘perigo’, digamos, pois sem o saber, sem
conhecer a grandiosidade desse sacramento, talvez pudessem negligenciá-lo em
sua vida. Essa é portanto a opinião de Tertuliano.
Ele escreve que “a demora do batismo é preferível, principalmente,
portanto, no caso de crianças pequenas”. (tradução do autor) E por isso
aconselhava que esperasse que as crianças fossem “capazes
de conhecer a Cristo”. Os motivos não são que o batismo fosse “simbólico”,
ou que somente a fé individual seria a base para a realização do mesmo, mas que
por ser o momento de remissão dos pecados, adoção de filho de Deus, alguém não
fosse batizado sem a devida preparação, e para que não ocorra o “desenvolvimento de uma má disposição” no batizado
quando esse tiver em uma certa idade. O período de inocência poderia esperar
para que o mesmo pedisse a salvação. Esse é o argumento de Tertuliano, que não
enquadra-se perfeitamente nos argumentos dos fautores do batismo de crentes,
mas que mantém a essência da doutrina católica.[2]
São Cirilo de
Jerusalém ensina que o batismo purifica a alma: “Pois
assim como o homem é de natureza dupla, alma e corpo, a purificação também é
dupla, uma incorpórea para a parte incorpórea, e a outra corporalmente para o
corpo: a água limpa o corpo, e o Espírito sela a alma, para que possamos
aproximar de Deus, tendo nosso coração aspergidos
pelo Espírito, e nosso corpo lavados com
a pura água.”[3] (tradução
do autor). E para provar essa asserção, de que o batismo é necessário para a
salvação, São Cirilo cita João 3,3.[4] A
teologia batismal ensinada por São Cirilo é magnífica.
Na outra citação
de São Cirilo, feita no artigo comentado, que havia enfatizado o fato do
batismo por imersão, podemos fazer uma comparação à doutrina católica do
batismo que afirma serem as águas santificadas no momento do batismo de Cristo
no Jordão.
Primeiro a
ênfase na forma de imersão:
“Ele [Jesus], quando banhado no rio
Jordão e comunicando às águas a força da Divindade, delas saiu e se produziu
sobre ele a vinda substancial do Espírito Santo, pousando igual sobre igual.
Também a vós, ao sairdes das águas sagradas da piscina, se concede a
unção, figura daquela com que Cristo foi ungido” (citação usada no artigo
comentado)
Agora, com a
ênfase nesse outro aspecto:
“Ele [Jesus], quando banhado no rio Jordão e comunicando às águas a força da
Divindade, delas saiu e se produziu sobre ele a vinda substancial do
Espírito Santo, pousando igual sobre igual. Também a vós, ao sairdes das águas sagradas da piscina,
se concede a unção, figura daquela com que Cristo foi ungido”
O efeito do
batismo é também ratificado por São Cirilo, quando ensina que recebemos o
Espírito Santo como Cristo recebeu em Seu batismo: “ao sairdes das águas
sagradas da piscina, se concede a
unção”.
Assim, também, quanto a um dos efeitos do batismo, São Justino escreve: “possamos obter na água a remissão dos pecados
anteriormente cometidos”.
Aprendemos com
isso que a Igreja Católica ensina o mesmo que todos esses documentos citados
ensinam, ainda que esses testemunham a norma familiar, naquele momento, como
sendo o modo de imersão do batismo.
É interessante o
ataque por motivo de mudança na forma exterior adotada no batismo, e o silêncio
e a aceitação quanto à profunda transformação da doutrina em sua acepção
invisível adotada hoje em muitas igrejas. Não falo do fato de muitas igrejas
ensinarem diferentemente do que ensinam os documentos citados neste artigo, mas
sim do fato de que há mudança entre o que ensinam hoje, quanto ao efeito do
batismo, e o que ensinaram, por exemplo, a Didaqué, Tertuliano, São Justino,
São Cirilo de Jerusalém, Santo João
Crisóstomo.
Nada de novo
debaixo do sol do que discutir por questões superficiais (não que isso não seja edificante também) deixando aquelas de
cunho mais profundo de lado.
Obs.: em contato com o autor do artigo que comentei, soube que ele crê na remissão dos pecados no batismo e que o batismo lava os pecados. Portanto, o que está escrito acima dirige-se particularmente a quem nega esses efeitos batismais.
Gledson
Meireles.
Comentário do artigo: <http://heresiascatolicas.blogspot.com.br/2015/11/o-batismo-por-imersao-na-igreja.html>
[1]
“This
means, that we indeed descend into the water full of sins and defilement, but
come up, bearing fruit in our heart, having the fear [of God] and trust
in Jesus in our
spirit. And whosoever shall eat of these shall live for ever, This means:
Whosoever, He declares, shall hear you speaking, and believe, shall live for
ever.”
[2] Do Batismo, c. 18
[2] Do Batismo, c. 18
[3]
“For
since man is of twofold nature,
soul and body, the
purification also is twofold, the one incorporeal for the incorporeal part, and
the other bodily for the body: the water cleanses the body, and the Spirit
seals the soul; that we may draw
near unto God, having our heart sprinkled
by the Spirit, and our body washed with pure water.”
[4]
“For,
in the name of God,
the Father and Lord of the universe, and of our Saviour
Jesus Christ, and of
the Holy Spirit, they
then receive the washing with water. For Christ also said,
Unless you be born again, you shall not enter into the kingdom of heaven.John 3:5”
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