Na querela que surgiu entre São Jerônimo e Santo Agostinho sobre a passagem de Gálatas 2,11, São Jerônimo escreve que a oração de ambos os debatedores é que a verdade prevaleça.[i]
Um dos princípios cristãos
católicos de interpretação da Bíblia é descrito por Santo Agostinho, em sua
carta a São Jerônimo, e repetido por São Jerônimo, de que a interpretação deve
ser literal.[ii]
São Jerônimo inicia mostrando que
sua interpretação do evento em Gálatas aludido acima foi condicionada por
leituras de outros autores e que estava à disposição do leitor julgá-la correta
ou errônea.[iii]Não querendo ser dogmático naquela questão, sugere a Santo Agostinho escrever sua doutrina e procurar persuadir os bispos a concordar com ele na sua interpretação.[iv]
Falando sobre Gl 1, 18 explica
que São Paulo foi a Jerusalém por reconhecer a grande autoridade de São Pedro,
e que Paulo não confiaria em sua pregação se não fosse confirmado por Pedro e
pelos outros apóstolos.[v]
Pedro estava agindo como que em
clara discordância com sua própria regra.[vi] Essa afirmação mostra a
autoridade de Pedro.
Então, São Jerônimo escreve a
Santo Agostinho para que ele considere, pelo contrário, não as pequenas
opiniões dele em seus comentários, mas das seitas heréticas, dos Nazarenos, que eram e sua forma entremeada de Judaísmo e Cristianismo,
e tinham introduzido heresia pestilenta.
O ponto mais importante nessa
controvérsia, e que São Jerônimo não entendeu, foi que as cerimônias judaicas
observadas fortuitamente por um cristão judeu não deveria ser como se fossem
salvíficas. São Jerônimo não via motivo para observar algo que não servisse
para a salvação, e isso foi sua dificuldade em entender o que escreveu Santo
Agostinho.
Chegando ao fim da sua resposta
sobre o episódio de Pedro e Paulo na epístola aos Gálatas, São Jerônimo afirma
que sua opinião e a de Santo Agostinho são praticamente idênticas.[vii]
Expressando humildade em sua
opinião, São Jerônimo afirma que se Santo Agostinho escrever mais uma carta a
ele, que está tão distante geograficamente, a Itália e Roma conhecerão o
conteúdo da mesma antes que ele a leia.[viii] É como afirmar que, por
questão de resolução de São Jerônimo, as discussões ulteriores passarão
primeiro pela autoridade magisterial de Roma.
E no final, mencionando sua idade
avançada, e sua vida no monastério, fala a Santo Agostinho, que era jovem, e
bispo, a entregar-se ao ensino e trazer frutos espirituais do mesmo a Roma.[ix]
1. As
divergências entre Santo Agostinho e São Jerônimo não tocavam o dogma.
Divergiam na interpretação de passagens bíblicas, chegando no final à mesma
conclusão. Ambos criam que a Lei judaica havia sido abolida, e que não mais
obrigava os cristãos, e que os apóstolos Pedro e Paulo, quando praticavam a
Lei, faziam por motivos que não fossem contrários ao evangelho.
2. Magistério
infalível existia, embora não foi explicitamente citado na carta. Argumento do
silêncio. Mas, ao falar que a carta seria lida primeiro em Roma infere-se o
magistério, ou melhor, a autoridade do papa está implícita na carta.
3. Levando
logicamente o que entendeu de Santo Agostinho, disse que isso seria cair na
heresia de Cerinto e Ebion. Isso não significa que o mesmo acusasse santo
Agostinho de seguir Cerinto e Ebion, ou de ter doutrina semelhante, mas que por
suas palavras a lógica levaria a isso. Sabia, porém, que Santo Agostinho tinha
a mesma doutrina e prática que ele.[x]
4. Agostinho
não ensinava diferentemente de Jerônimo.
5. Portanto,
era uma questão de levar às últimas consequências as palavras de Agostinho que
poderia chegar a ser “doutrina de perdição”, e não que a realidade fosse essa.
Prova essa que Jerônimo pede a Agostinho que use sua pena contra as ideias da
seita de Cerinto e Ebion, e não contra as suas, que não passagem de um resumo
de comentários antigos.
Queira o Senhor Jesus que todas as divisões sejam tais como as
que tiveram Santo Agostinho e São Jerônimo como vimos acima.
Gledson Meireles.
[ii] but that all things in
Scripture are to be received literally as they stand.
[iii] By which I have made it
manifest that I did not adopt finally and irrevocably that which I had read in
these Greek authors, but had propounded what I had read, leaving to the
reader's own judgment whether it should be rejected or approved.
[iv] I do not presume to
dogmatize in regard to things of great moment.
[v] In the following context,
again, he adds: Then, fourteen years after, I went up again to Jerusalem with
Barnabas, and took Titus with me also. And I went up by revelation, and
communicated unto them that gospel which I preach among the Gentiles; proving that he
had not had confidence in his preaching of the gospel if he had not been
confirmed by the consent of Peter and those who were with him.
[vii] Nor is there, after all, a great
difference between my opinion and yours: for I say that both Peter and Paul, through fear of the believing Jews, practised, or
rather pretended to practise, the precepts of the Jewish law; whereas you
maintain that they did this out of pity, not with the subtlety of a deceiver,
but with the sympathy of a compassionate deliverer. But by both this is equally
admitted, that (whether from fear or from pity) they
pretended to be what they were not. As to your argument against our view, that
he ought to have become to the Gentiles a Gentile, if to
the Jews he became a
Jew, this favours our opinion rather than yours: for as he did not actually
become a Jew, so he did not actually become a heathen; and as he did
not actually become a heathen,
so he did not actually become a Jew. His conformity to the Gentiles consisted in
this, that he received as Christians
the uncircumcised who believed
in Christ, and left
them free to use without scruple meats which the Jewish law prohibited;
but not, as you suppose, in taking part in their worship of idols. For in Christ Jesus, neither circumcision avails
anything, nor uncircumcision, but the keeping of the commandments of God.
[ix] Do you, who are young, and who have been
appointed to the conspicuous seat of pontifical dignity, give yourself to
teaching the people, and enrich Rome with new stores from fertile Africa.)
[From Jerome to Augustine (A.D. 404) em http://www.newadvent.org/fathers/1102075.htm]
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