Refutação da doutrina reformada sobre a eleiçaõ:
Capítulo
3
Eleição
Incondicional
Deus
nos abençoou e nos escolheu para sermos santos, nos predestinou para sermos
Seus filhos em Cristo, segundo Sua livre vontade, nos gerou pela Palavra (1 Pd
1, 23), fomos selados com o Espírito, que é o penhor da herança eterna (cf.
Efésios 1, 1-14), e formos predestinados a sermos a imagem de Jesus Cristo (cf.
Rm 8, 29). Portanto, o eleito deve dar testemunho de vida cristã em obediência
a Cristo, na obediência da fé, como está em Romanos 1, 5.
O
momento que temos o penhor da vida eterna se dá pelo recebimento do Espírito
Santo. A eleição que temos é concretizada quando o Espírito Santo é derramado
em nossos corações (cf. Rm 5, 1-5). Por isso, reconhecendo que a eleição, a
predestinação e a salvação são momentos distintos, não se deve afirmar que
somente os salvos foram eleitos em Cristo, já que o penhor da salvação não se
dá biblicamente pela eleição, mas quando o homem crê. E muitos creem e vivem
com Cristo e não são finalmente salvos, não sendo eleitos.
Não
se pode afirmar que todo o que crê foi eleito no sentido de que recebeu com
certeza a graça eficaz. A eleição em Cristo em Romanos 8, 29 refere-se aos que
irão realmente perseverar, e mostra que o plano de Deus irá desde a eleição até
a glorificação ser aplicado neles. Esse é o plano de salvação.
O
plano de Deus é suficiente para todos, garantido em Sua justiça a todos, mas eficaz
nos que aceitarem. Os demais foram apagados do livro da vida, ou serão apagados,
já que rejeitaram radicalmente a graça.
Esse
dado bíblico já mostra o fato da graça suficiente. A recusa da graça suficiente
foi o motivo de não receberem a graça eficaz. Portanto, houve o recebimento da
graça, e houve a reposta livre.
O
eleito irá ser imagem de Jesus, e, portanto, irá tornar-se santo. Deus chama e
muitos não respondem. Somente os que respondem são justificados e somente os
que perseveram serão glorificados.
“Os que ele distinguiu de antemão, também os
predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que este seja
o primogênito entre uma multidão de irmãos. E aos que predestinou, também os
chamou; e aos que chamou, também os justificou; e aos que justificou, também os
glorificou.” (Rm 8, 29-30)
O
texto afirma que Deus chama e justifica aqueles que chama. No entanto, não
afirma que existem pessoas que Ele não chama. Uma coisa é afirmar que os que
chamou ele justificou. Mas, todos são chamados em Cristo. Há o momento em que o
homem responde ao chamado e vai até Cristo, e somente assim é que há
justificação. Ainda, os justificados precisam viver a fé, e assim, somente
depois de crer é que há a glorificação. Uma vez que há o chamado geral e o
chamado eficaz, entende-se que há plausibilidade para dizer que Deus chama a
todos. No entanto, há um motivo para a eficácia do chamado apenas dos eleitos.
A
aplicação dessas bênçãos no tempo vem após a conversão pela fé. O texto está
apenas mostrando o plano de salvação de Deus para os eleitos. Certamente, do
ponto de vista eterno, da perspectiva de Deus. A visão do futuro referente aos
eleitos não limita a redenção da cruz somente aos que finalmente serão
glorificados.
Em
sentido amplo essa eleição está disponível a todos em Cristo, mas será aplicada
somente aos eleitos conhecidos de antemão que não oferecerão obstáculo à graça.
Não se trata de que o livre-arbítrio determinará a graça, ou que a graça
limitará o livre-arbítrio, pois aqui há o mistério de como há perfeita
cooperação da liberdade com a graça. Deus é soberano e fez o homem dotado de livre-arbítrio.
A
Bíblia afirma: “O que impede que eu seja
batizado? Se crês de todo coração pode sê-lo” (Atos 8, 36-37). A descrença
é o principal impedimento. E aí vemos o livre-arbítrio respondendo à graça. No
plano temporal aparece o livre-arbítrio sendo necessário para a realização da
salvação pelo poder da graça de Deus. Isso supõe o decreto eterno.
O
eunuco foi chamado, quando lia o profeta Isaías, aprendeu do diácono Filipe,
foi levado a Jesus Cristo, creu em Jesus, e, depois disso, foi batizado. Então
foi justificado e hoje certamente está glorificado.
Segue
aquela ordem de João 6, pois aprendeu das Escrituras, que é a Palavra de Deus,
reconheceu que Jesus é o Cristo e foi salvo. Sendo assim, o eunuco era um dos
eleitos. Na cruz pode-se afirmar que todos são eleitos em Cristo, mas
eficazmente somente os que não apresentarem o impedimento pela descrença ou
pelo pecado. De fato, a descrença ou o pecado não confessado e arrependido pode
afastar de Deus.
Em
Romanos 8, 29-30, como em Atos 13, 48 são tratados os eleitos. O chamado da
graça eficaz é tratado nessas passagens. Não se trata de dizer que não há outro
chamado. O chamado geral é o chamado para a salvação a todos. Nesse chamado há
a graça suficiente para que todos respondam ao chamado.
Em
nenhum lugar a Bíblia fala que alguém é eleito para crer, mas mostra que
somente os que creem recebem as bênçãos de Deus em Cristo. Isso é importante. Assim
como em João 1, 12 os que creem recebem o poder de serem filhos de Deus, e em
João 3, 16 Deus ama o mundo inteiro e entrega o Filho para que o que crê tenha
a vida eterna.
Desde
o verso 15 não está escrito que o levantamento de Jesus na cruz foi para fazer
todo homem crer, nem que teve intenção de gerar a fé salvadora nos eleitos, mas
para que todo o que crê tenha a vida eterna. Essa afirmação já supõe o
livre-arbítrio que responde à graça. Aqui encontra-se o mistério.
“Pois Deus não enviou o Filho ao
mundo para condená-lo, mas para que o mundo seja salvo por ele”
(João 3, 17).
Alguns
podem pensar que o mundo refere-se aos eleitos, e que o mundo é apenas o todo
que será representado pela parte salva. Sendo os eleitos salvos, então o mundo
foi salvo em sentido expandido, não significando que todas as pessoas foram
salvas, mas somente as que creram. Essa é a visão reformada.
No
entanto, o mundo nessa passagem não pode se referir aos eleitos, porque logo é
dito que será salvo o que crê, e o que não crê já está condenado, não porque
não foi eleito, mas porque não teve fé (cf. v. 18). E não adianta tentar
justificar afirmando que o decreto eterno deve ser buscado para entender a
questão, pois o decreto segue estritamente o que a Escritura revela, e a mesma
afirma que Jesus não veio condenar o mundo, mas salvá-lo.
Ainda,
o mundo não se refere aos eleitos porque o Filho veio ao mundo e os homens
preferiram as trevas, não amaram a luz porque suas obras eram más, falando da
maioria que não acreditou em Cristo (v. 19). Os que praticam o pecado é que se
tornam escravos, e que são objetos de ira, e que recebem a condenação. É
preciso bastante atenção para a afirmação bíblica de que Jesus veio ao mundo e
os homens preferiram as trevas. Assim, esse mundo não está estritamente falando
dos eleitos, mas de todos.
Os
versos 20 e 21 afirmam que os que praticam o mal não vão a Cristo, mas os que
praticam a verdade, esses vão a Cristo. Os que praticam a verdade certamente
são os que já estavam à espera de Jesus, e por isso suas obras eram feitas em
Deus. E foram a Cristo para serem salvos e terem a vida eterna. Estando já na
graça suficiente, que é dada a todos, responderam à graça eficaz. São
preparados pela graça e pela resposta do livre-arbítrio antes de conhecerem a
Cristo.
Entretanto,
entre a doutrina reformada e a doutrina católica temos dois diferentes
cenários. Para os reformados Deus elege para a fé, onde muitos pecadores que
estão totalmente incapacitados de irem a Cristo são salvos, enquanto outros são
deixados. Esses que foram deixados não receberam a fé.
Para
os católicos, Deus elege os que não impuseram obstáculo à graça, depois de a
terem provado, depois de terem sido postos em posição de capacidade para
responder ao apelo da graça.
Antes,
todos os pecadores que estão totalmente incapacitados de irem a Cristo recebem
a graça para conhecerem o Salvador, onde muitos aceitam e são salvos enquanto
outros a rejeitam, prontamente, ou a aceitam e depois desistem.
Aqueles
que, após o chamado da graça, não oferecem obstáculo a ela, esses são eleitos.
Os demais são reprovados. Os eleitos são conhecidos em Romanos 8, 28-30. Esses
são considerados no decreto eterno de eleição e predestinação. Na eternidade,
Deus deu-lhes a graça eficaz.
Michael
Horton afirma que Deus não previu fé e obediência, mas elege mesmo na
desobediência. Isso significa que Deus não poderia prever a fé porque sem a
graça ninguém teria fé.
O
problema é que, para a fé reformada, Deus elege apenas alguns dentre os
desobedientes, e essa é a questão crucial que a Bíblia não mostra. A não ser
que se está aqui falando apenas da graça eficaz. Não há quem não tenha recebido
graça suficiente.
De
fato, entre todos os pecadores Deus elege os que recebem o dom da fé e dão
frutos, enquanto deixa aqueles que, após serem agraciados, recusam a graça que
experimentaram.
Somente
os que recusam ao chamado de Deus é que são deixados. Não há escolha arbitrária
de uns e reprovação de outros, antes que a graça suficiente seja experimentada
de alguma forma por todos.
Em
Deuteronômio 7, 6 e 9, 4-5 Deus elege Israel pelos motivos de perversidade das
nações e por causa da Sua promessa aos Patriarcas, não por causa da Sua
liberdade em escolher nações igualmente perversas.
A
Palavra não afirma que Deus escolheu um povo e deixou os demais por seu
beneplácito e vontade. Isso o reformado precisa entender. Não existe qualquer
passagem bíblica que prova tal afirmação.
Primeiro
veja o que a Bíblia fala como razão divina para a escolha de Israel nessas
passagens. De fato, são passagens que a teologia reformada utilizada para
formular sua teologia. Mas as mesmas não dizem o que os reformados tendem a
concluir.
Sabendo
que todas as nações são desobedientes, conhecendo a atitude de rebelião das
nações, Deus escolheu por meio da promessa que tinha feito desde o início ao
patriarca Abraão, antes da formação do povo, e a razão imediata para não os
abandonar era a perversidade das demais nações. Não apenas a cabeça dura de
Israel, mas as abominações constantes dos gentios. Eis o contexto.
Afirmar
que a salvação é do Senhor, ou que a salvação vem do Senhor (Jonas 2, 9) é
afirmar o mesmo que a doutrina católica. Isso não quer dizer que nada no povo é
considerado por Deus para a salvação, como se contasse só a vontade de Deus
para eleger.
Pelo
contrário, Deus faz tudo com bondade e justiça, e considera a situação de cada
povo para fazer suas escolhas. O contexto mostra o modo pelo qual a salvação
vem do Senhor, a forma com que ela atinge o povo, a maneira com que ela é
entregue ao povo.
A
condição humana pecadora é basicamente idêntica para todos, mas a presciência de
Deus não teve atenção à fé e à obediência voluntária de ninguém, mas apenas a
resposta à graça. É impossível ter fé sem a graça. Assim, Deus previu aqueles
que respondem ao chamado, com abertura de coração a Deus, depois de estarem sob
a moção da graça.
Isso
é algo diferente, pois não é do livre-arbítrio somente que faz brotar a
resposta, mas do livre-arbítrio iluminado pela graça, sustentado e auxiliado
pela graça. A graça antecede o livre-arbítrio logicamente, mas age nele
enquanto o mesmo concomitantemente responde positiva ou negativamente ao
chamado de salvação.
Uma
coisa é saber de antemão quem é bom ou quem é mau, e outra é saber de antemão,
dentre os maus, quem irá responder livremente e perseverar após ter sido tocado
pela graça do chamado e experimentado o momento livre para decisão.
Deus
de antemão conheceu os que responderam à graça e pela graça quiseram permanecer.
A graça eficaz é dada sobre a graça suficiente recebida.
Diz
a Escritura: “Ou não tem poder sobre o
barro para fazer da mesma massa um vaso de uso nobre e outro de uso vulgar”, falando
dessa comparação do vaso e do oleiro, que diz respeito ao uso dos vasos e não à
criação dos mesmos.
Esse
seria o lugar de Deus afirmar que o oleiro cria vasos para uso nobre e vulgar
como Ele cria pessoas para salvar e condenar, mas a Escritura usa a comparação
de outra forma.
Deus
é comparado ao oleiro no uso que faz dos vasos da ira, tendo paciência para com
eles, e do uso que faz dos vasos de honra, mostrando as riquezas da sua glória
(vv. 22-23).
Primeiro,
porque a Escritura nunca diz que Deus cria algo mal, o que seria contradizer o
que toda a revelação ensina, e, portanto, aqui em Romanos 9 não está afirmando
a criação de alguém para o inferno, pois Deus não prepara nada para o mal. Por
isso, a Escritura não diz que Deus preparou os vasos da ira, mas já fala dos
vasos “preparados”, enquanto que, quando diz dos vasos de honra afirma que Ele
(Deus) preparou.
É
certo que o calvinismo considera que Deus ativamente não condena, mas que
permite a condenação. No entanto, afirma que a condenação é feita depois do
decreto de Deus determinar a reprovação certa do indivíduo, para que o
indivíduo caminhe para a perdição, o que torna o problema insolúvel. Isso
ficará mais compreensível quando voltarmos a esse texto em outras argumentações
para esse tópico da eleição.
Se
Deus apenas escolhesse alguns da massa caída em pecado, onde todos estão em
igual condição, sem fazer uma consideração universal, sem dar a graça para que
o pecador responda livremente ao chamado, em uma obra de preparação para a
salvação de todos, pois todos são parte integrante da massa caída, mas que
assim estão porque no pecado de Adão perderam a graça santificante, não seria
justo, já que todos não estão no pecado por culpa própria, mas nasceram nesse
estado por culpa de Adão e Eva, sendo uma dívida contraída.
Assim,
o início desse estado pecaminoso, a concupiscência, não pode por si só levar
alguém ao inferno antes que seja oferecida a graça para que livremente possa
escolher entre a vida e a morte.
Isso
está no princípio do amor e da justiça, e o amor é a base para Cristo vir
salvar os pecadores. A doutrina reformada nega esse ponto ao ensinar que o
pecado original por si só já é motivo da condenação ao inferno, e que os
pecados, ainda que possuam graus, sendo mais ou menos graves, todos são
passíveis da condenação ao inferno, o que tornaria a distinção inócua para fins
dessa discussão.
A
bondade de Deus não permite que pecadores nesse estado sejam condenados. Somente
após negarem a verdade, por sua própria atitude livre, e assim ficarem endurecidos,
perseverarem contra a graça.
E
essa condição é real quando há possibilidade de responder e ter acesso à
salvação. E tal condição não nasce ou é consequência de um decreto eterno.
Antes ela é a causa levada em conta na escrita do decreto eterno de condenação.
Deus não decretou que alguns não responderiam ao chamado, mas decretou que
seriam reprovados os que não respondessem.
O
leitor compreende que a diferença entre a doutrina católica e a doutrina
reformada é tão sutil que muitas vezes não é possível perceber onde está a
mesma, e tantas vezes parece coincidir com as afirmações reformadas. É por isso
que às vezes parece que os reformados têm razão, por afirmarem as mesmas
doutrinas católicas.
No
entanto, logo a seguir percebe-se que a teologia reforma faz certas afirmações que
contrariam a revelação bíblica. E então, a mesma revelação bíblica contem o
antídoto contra conclusões dos reformados.
O
que foi dito aqui parece não ter sido suficiente para convencer o reformado.
Talvez não seja possível chegar a isso, por vários motivos. Mas, esse
convencimento é possível, se o leitor reformado seguir as argumentações uma por
uma até o fim.
A
Bíblia está guiando cada raciocínio, e os argumentos analisados partem da
própria teologia calvinista, e são elaborados por abalizados teólogos. Assim, a
refutação dos mesmos afeta o cerne da teologia reformada.
Consideremos
agora o que diz Roger Olson, teólogo
protestante de confissão batista, com sua teologia arminiana, em relação à
eleição incondicional.
Roger
Olson discorda um pouco de Cottrell quando esse diz que Deus, na Sua autolimitação,
retém o controle soberano.
Olson
acredita que esse pressuposto não é assegurado pela sugestão que o autor fez, e
não vê conciliação entre não exercer o poder determinista e estar no controle
de tudo, e prefere afirmar que Deus está no comando.
Então,
o arminianismo de alguma forma argumenta contra o controle total, o que torna
sua defesa problemática diante do calvinismo.
É
um fato que devemos compreender, já que os argumentos arminianos em relação à
teologia Reformada são, às vezes, diversos daqueles levantados pela doutrina
católica. E, muitas vezes, são inócuos ao calvinismo, ao contrário dos
argumentos católicos, que abalam e demolem os fundamentos da fé reformada.
Outra
definição arminiana encontrada em Olson é que o livre-arbítrio libertário, como
gostam de chamar, é “a vontade não
totalmente governada por motivos e capaz de agir de maneira contrária ao que
age”, reconhecendo o mistério, mas afirmando que não é impossível ou
ilógico.
O
arminianismo, então, ensina a soberania divina autolimitadora. Interessante
que, por confrontar o calvinismo, a definição arminiana é que a vontade não é
toda governada por motivos, já que o calvinismo afirma o contrário.
Isso
significa que Deus deixa de usar o controle em certos momentos ou lugares, para
dar ação livre à vontade das criaturas. Assim, a vontade possui momentos que
podem agir sem motivos.
Parece
ser isso que é explicado pela teologia arminiana aqui, onde o livre-arbítrio
pode prescindir de motivos e Deus concede um espaço onde não há controle.
Deve-se
afirmar novamente que, embora o arminiano esteja correto na defesa do
livre-arbítrio, os argumentos são diversos do que se pode aprender da doutrina
católica. Essa argumentação arminiana não é a mesma que o catolicismo emprega
no estudo dessas questões, como já visto acima. A visão arminiana dessa espécie
de autolimitação de Deus é fraca diante da argumentação calvinista.
No
entanto, quando a Igreja Católica ensina a total soberania de Deus, e também
apresenta o livre-arbítrio, a solidez da argumentação católica é eficaz contra
os equívocos do calvinismo.
Estudando
Romanos 9, 9-33, temos que o contexto imediato é o da explicação da promessa de
Deus. Sara terá um filho (Rm 9, 9), conforme Gn 18, 10.
O
próximo exemplo é o de Jacó e Esaú, como exemplo da “liberdade de escolha de Deus” (v. 11), mostrando nos vv. 12-13 as
promessas de Gn 25, 23 e Ml 1, 3. Temos a promessa e a liberdade da eleição.
Então,
surge a pergunta: “Haverá injustiça em
Deus?”, com resposta biblicamente e logicamente negativa. A injustiça foi
sugerida na escolha de Jacó em detrimento de Esaú, e esse foi o motivo da
pergunta retórica.
Obviamente
não há injustiça em Deus, pois Ele, conforme Gn 33, 19, tem misericórdia e
compaixão a quem Ele quer. O verso 16 é profundo, pois afirma que a escolha
depende apenas de Deus, em especial, “da
misericórdia de Deus”. Esaú e Jacó não havia feito nada para merecer a
escolha. Não há nada que possa levar Deus a agir, senão Ele mesmo.
Outra
vez, surge o exemplo para mostrar a misericórdia, falada antes, afirmando que o
Faraó foi suscitado por Deus para que o poder divino seja mostrado e o Nome de
Deus anunciado em toda a terra, como está em Ex 9, 16.
O
texto do Êxodo trata do castigo de Deus sobre os egípcios, e Deus não destrói o
Faraó para que ele veja e reconheça o poder divino e o Nome de Deus seja
glorificado em toda a terra.
O
exemplo do Faraó serve para mostrar, de alguma forma, tanto a misericórdia como
a justiça, no endurecimento do coração. Deus poderia castigar logo o Faraó, mas
não quis, para mostrar o Seu poder. Agora entendemos a paciência de Deus, o
controle soberano do Senhor, e toda a Sua sabedoria, sem infringir o
livre-arbítrio que deu ao homem.
Em
nenhum momento sugere que o Faraó tenha sido determinado a agir com coração
endurecido, mas que o mesmo endureceu primeiro seu coração. Essa foi a causa da
sua reprovação.
Por
isso, voltando o olhar para o decreto divino, deve-se pensar que essa
possibilidade tenha sido permitida por Deus, que deu ao Faraó a liberdade de
vontade, e isso foi considerado e incluído no decreto eterno, de modo que tudo
o que decorre daí foi aceito pela Soberania de Deus, na mente de Deus, desde
toda a eternidade, conforme sua sabedoria, bondade e justiça.
Quem
pode resistir ao poder de Deus? Diante da pergunta, vem a resposta com a
comparação do oleiro, que faz da mesma massa vasos para usos diferentes (v.
20). O oleiro tem poder sobre o barro, então Deus tem poder sobre o homem. E
ainda esse poder vai além, pois Deus é origem de todas as coisas.
Da
mesma massa há vasos feitos para diferentes usos, e assim Deus usa do homem
para diferentes propósitos, como fez com o Faraó, que o negou e endureceu o
coração, como está revelado desde o início do livro do Êxodo. Deus usou esse
vaso mau tendo paciência com Ele para que mais tarde mostrasse sua justiça.
Deus
enderece o coração do Faraó posteriormente como castigo pelo proceder do Faraó,
que já vinha tendo atitude hostil a Deus.
Ainda,
isso mostra que não há injustiça, pois Deus suporta os vasos da ira para
mostrar Sua ira e manifestar Seu poder, e mostra misericórdia com os vasos da
misericórdia (v. 22-23). Os tempos e os modos são usados por Deus como Ele
sabiamente quer.
Os
vasos da misericórdia somos nós, que ele
chamou não só dentre os judeus, mas também dentre os pagãos (v. 24). Para
isso, o autor cita Oseias 2, 1, onde Deus chama os gentios de povo e Os 10,
22-23 e Isaías 1, 9, onde Israel recebe a promessa de que um rebento será
salvo.
O
rebento refere-se aos filhos da promessa. Os gentios que não buscavam a justiça
a alcançaram, todos eles tendo a justiça à sua disposição, devendo somente crer
para entrar no Povo de Deus, enquanto Israel que procurava a Lei que justifica,
não a encontrou (cf. v. 30), porque procurava a justiça pelas obras.
Em
todo o contexto não há eleição de uns e condenação de outros fundados no mero
beneplácito divino. O cenário é bastante outro. Há motivos para salvação e
condenação.
Pode
ser objetado que essa é a forma de ocorrer no tempo, mas que no decreto as
coisas são vistas de forma invertida. Deus teria elegido e predestinado os
filhos da promessa, que seriam iguais em pecado a todos os demais pecadores, e
agora, no tempo, eles estavam apenas usando os meios que Deus preparou para levá-los
ao fim desejado, que é a salvação.
Mas,
a situação não é simples assim. Deus não age senão na verdade, que é Sua
própria personalidade. O caráter de Deus é o fundamento da Sua ação.
Quando
os gentios encontraram a justiça pela fé, tudo já supõe que foram livres para
atingir esse objetivo, assim como os judeus agiram em liberdade para procurar a
justiça pelas obras.
Nada
disso foi decretado por Deus, o que tornaria toda a realidade uma mera
encenação. O reformado entende que as coisas não podem ocorrer dessa forma.
Então, como é muitas vezes objetado, o reformado não consegue compreender como
isso acontece, já que tem a livre agência como algo que realmente é produzido
pelo ser humano, que age livre de qualquer coerção, e responde pelos seus atos.
Em
outras palavras, a noção de livre agência, posta dessa forma, é o exemplo do
livre-arbítrio, ao mesmo tempo em que a doutrina reformada nega o
livre-arbítrio. O teólogo reformado cai nesse buraco e não consegue sair dele.
O
reformado ainda não conseguiu desfazer-se de tantos condicionamentos, o que é
compreensível, pois se trata de algo profundo e de delineações bastante sutis.
O que está sendo tratado ainda conterá muitas análises bíblicas que irão
corroborar essa realidade desde o início.
Em
relação a Ezequiel 18, 31, assim diz o Senhor: “Repeli para longe de vós todas as vossas culpas, para criardes em vós
um coração novo e um novo espírito. Por que haveríeis de morrer israelitas?”.
Nesse
momento o livre-arbítrio é considerado por Deus, e o pecador é exortado a
converter-se a fim de criar um novo coração e um novo espírito, que é efeito da
graça, pois é Deus quem cria o coração e o espírito quando o homem crê e
obedece.
Então,
“Não sinto prazer com a morte de quem
quer que seja – oráculo do Senhor Javé! Convertei-vos e vivereis!” (Ez 18,
32).
Em
todo o contexto, claramente soteriológico, vemos que Deus considera o
livre-arbítrio do homem e exorta a que nos convertamos a Ele. Tudo isso supõe
que a graça já está à disposição, o conhecimento da Palavra já nos é oferecido,
cabe-nos voltar para Deus, deixar as culpas para trás e criar coração e
espírito novos com essa graça.
Esse
é o ensino bíblico expresso nessas passagens. Em nenhum lugar Deus elege uns e
deixa outros por pura vontade. O leitor pode reler os textos para reconhecer
que Deus não elege e salva a bel prazer.
Deus
também nunca ordena o impossível, nem faz apelos apenas para que os que foram
eleitos respondam e os que foram reprovados sejam mais ainda castigados. Esse
não é o cenário bíblico.
O
que as passagens provam é que a graça precede a conversão, mas que há espaço
para o livre-arbítrio, que deve responder para que a conversão se efetive. O
povo deve responder a Deus para ter novo coração.
Na
perspectiva divina Deus sabe quem responderá ao chamado, e quem O rejeitará. No
entanto, não poderia Deus ter decretado que certo indivíduo aceitará o chamado e
outro não, quando faz o convite: “Convertei-vos e vivereis”, sabendo que Ele
mesmo decretou que um não irá aceitar o convite que Ele faz. Esse cenário seria
contraditório e desequilibrado.
Agora,
se temos que Deus deu ao ser humano o livre-arbítrio, e soube de antemão quem
iria agir a favor ou contra seus apelos de salvação, e ainda quis realizar esse
plano, pois a criatura deveria ter a liberdade total para escolher ou não a
Ele, então temos que de fato tudo ocorre pela Vontade de Deus. E nesse cenário
tudo é compreensível e equilibrado.
A
eleição é pela presciência, e Deus não vê o pecador por si só respondendo, pela
sua própria força de vontade, mas vê o envolvimento do pecador após o despertar
da graça, como age o pecador em relação à própria graça a ele oferecida, como
acontece no tempo.
Então,
e somente então, Deus elege. Assim, sua eleição é certa. Somente Deus sabe como
agir e faz Sua graça eficaz ter todo o seu efeito sem limitar a liberdade. Esse
é um mistério de misericórdia.
Essa
eleição reflete o que foi decretado eternamente. Para o reformado, Deus prevê
somente Sua decisão e misericórdia de salvar alguns. No entanto, para o cristão
católico, Deus prevê e conhece os que se dispuseram e permanecerão aos cuidados
da graça para os eleger e predestinar. Essa é a Vontade Deus.
Ele
prevê aquilo que será o fato da relação entre soberania e livre-arbítrio, em
sua perfeita harmonia, conforme Sua vontade. Ele sabe que muitos terão a graça,
mas preferirão o mundo, e por isso decidiu que não teriam a graça eficaz. Isso
ocorre na eternidade.
O
amor de Deus para com todos O impele a oferecer a salvação a todos, e amar mais
os que respondem mais à sua amorosa e misericordiosa graça. Mas, dirão alguns,
os que respondem mais são os que receberam maior graça. Mas é aí que a relação
entre soberania e livre-arbítrio se encontra, não havendo total conhecimento de
como funciona perfeitamente essa relação. A graça de Deus vence sempre, mas o
livre-arbítrio nunca é limitado e desconsiderado.
Esses
foram os que Deus de antemão conheceu, predestinou, justificou e glorificou
(cf. Rm 8, 28-30). Se o amor maior de Deus por uns os faz melhores, é certo
que, de forma misteriosa, a rejeição da graça e o endurecimento do pecado gera
a ira de Deus.
Se
isso é assim, então de fato eles rejeitaram a graça de Deus, e Deus não quis
vencer essa rebeldia, já que estava no limiar da consideração do dom do
livre-arbítrio que Ele mesmo concedeu.
Para
o católico a reprovação foi permitida por Deus, mas apesar dessa desgraça Deus
tirou a maior das bênçãos, dando Cristo como salvador do pecador. Deus permitiu
a queda em Seu decreto. E, a partir da queda, Deus nos deu o Salvador.
Para
o reformado a queda é decretada, mas no sentido de determinada a ser permitida,
pode-se afirmar. Deus determina que a queda seja permitida a ocorrer. É algo
estranho, mas é assim que o reformado entende.
No
fim último, foi o decreto de Deus que determinou a queda, e a permissão entra
aí como uma forma de não cair no exagero, apenas para explicar seu
acontecimento no tempo, o que faz a fé reformada aproximar-se da verdade
católica, no entanto sem concordar com ela nesse ponto, o que é problemático.
É
um modo que o reformado tem de evitar o exagero na doutrina calvinista, levando
a adotar afirmações católicas em suas formulações doutrinais, de modo a
aparentemente estar correta em todas as etapas.
Então,
afirma a teologia reformada que a queda foi permitida, mas antes, dizem os
teólogos, Deus tornou certa a queda por um decreto que levava Adão a livremente
pecar.
E
mais. Afirmam que o decreto faz consequentemente com que o pecado seja
praticado, e não que cause o pecado. Desse modo, os reformados imaginam que não
estão tornando Deus a causa do pecado, mas somente o homem, porque foi o homem
quem pecou. No entanto, o homem estava determinado a pecar, não podendo agir de
outra forma.
Se
Deus deixasse o homem em seus próprios desejos e vontade, todos se perderiam.
Essa verdade é compartilhada por católicos e reformados.
No
entanto, sabemos que a graça permite o homem escolher a verdade enquanto
deixa-o livre nessa escolha, enquanto que o reformado acredita que o homem é
escravo do pecado, e que ao ser chamado pela graça não poderia responder se
Deus não desse a última palavra.
Isso
quer dizer que o homem escravo do pecado diria não à graça, sempre e finalmente,
mas Deus garante que no final ele responderá sim. Dessa forma, somente o que
Deus quis eleger responderá sim. É uma anulação do livre-arbítrio.
Enquanto
que, na fé católica o homem escravo do pecado sempre diria não à graça, por si
mesmo, pela sua condição de escravo do pecado, pela sua natureza maculada pelo
pecado, mas pelos efeitos da graça ele tem a possibilidade de escolher e
responder ou sim ou não a Deus. É um cenário diferente.
O
homem, por sua natureza pecaminosa e caída, sempre está em rebelião contra
Deus, ainda que chamado pela graça. No entanto, na graça ele pode vislumbrar a
misericórdia de Deus e é capacitado a converter-se ou não.
Entendemos
melhor Atos 7, 51: “Homens de dura
cerviz, e de corações e ouvidos incircuncisos! Vós sempre resistis ao Espírito
Santo. Como procederam os vossos pais, assim procedeis vós também.”
Se
o homem não fosse livre, esses não poderiam realmente responder, e iriam sempre
resistir à graça, como creem o reformado. Deus deveria decretar que alguns
fossem convertidos pela graça.
No
entanto, como o livre-arbítrio é um fato, esses homens de que fala o verso 51
estão resistindo ao Espírito Santo que os chama à conversão. Há um conflito
entre a vontade do Espírito Santo, que os quer bem, e a vontade pecaminosa
desses homens, que resistem ao Espírito. Somente a doutrina católica explica
satisfatoriamente essa passagem.
Essa
possibilidade não poderia ser desejada por Deus, como se fosse anterior a
qualquer liberdade dada aos homens, apenas para mostrar Sua justiça, onde Ele
teria decretado que esses homens resistissem ao Espírito. Nada disso.
Deus
criou tais homens livres, com uso do livre-arbítrio, e conhecendo perfeitamente
todas as possibilidades de uso da liberdade, e vendo o futuro como se estivesse
presente, soube perfeitamente que tais homens ouviriam as moções do Espírito
Santo e a pregação do evangelho, obviamente dada pela graça suficiente, e ainda
nesse estado de chamado de graça iriam resistir ao Espírito, decretando essa
realidade. Foram esses homens que determinaram sua vontade, causando sua
resistência, e não o decreto. O decreto de Deus incluiu esse cenário e
considerou essa rejeição como motivo de reprovação.
Por
isso, a passagem menciona que muitos resistiram ao Espírito Santo, e pelo
contexto mostra que a resistência foi definitiva.
Não
há ensino de que a graça é apenas momentaneamente resistível, e que no final
sempre ela venceria nos que foram predestinados, e que por isso seria sempre irresistível.
Não
há passagem que ensine isso, e não houve até o momento textos da Bíblia que possam
dar base para formular essa doutrina.
Assim,
a eleição de Jacó e rejeição de Esaú, antes de nascer, para provar a liberdade
de escolha de Deus, é uma passagem usada para a eleição incondicional.
No
entanto, esse texto não tem sentido soteriológico, mas mostra apenas a eleição
de Israel, e também não tem implicações soteriológicas, caso contrário
contradiria o que já foi expresso acima, em todas as demais passagens bíblicas.
Portanto, seu sentido místico deve estar conforme toda a revelação, e não
apenas fundamentado em alguns textos isolados.
Mais
adiante voltaremos a ler essa passagem com maior profundidade. O que o
reformado deve entender é que a passagem não diz e não conclui que Deus decreta
a salvação de uns e decreta a permissão da condenação de outros por puro
beneplácito. E isso tem sido provado a cada passo, com as devidas argumentações
bíblicas e demonstrado a falta de qualquer prova para a asserção calvinista.
Esse
ponto da eleição é também patrimônio da doutrina cristã católica. Não há o que
objetar ao se afirmar que Deus salva por pura misericórdia por meio da sua
graça, sem quaisquer obras e méritos da parte do homem. Essa é doutrina
católica desde sempre, pois está na Escritura Sagrada. Santo Tomás de Aquino a
explicou extensamente. A mesma já havia sido esboçada por Santo Agostinho.
O
que envolve esse ponto em discussão tem a ver com as afirmações calvinistas
desde o século dezesseis, principalmente quando a questão foi resolvida no
século dezessete no Sínodo de Dort, realizado na cidade de Dortrecht, em
1618-1619, pois quando já separados da Igreja Católica os protestantes
reuniam-se para tratar da suas questões internas. Esse sínodo cristaliza a
tradição reformada, em aspectos importantes e fundamentais para o
desenvolvimento dessa teologia protestante.
Anos
antes, a Igreja Católica havia dado suficiente contribuição para essa questão,
quando em 1607 impôs parâmetros ortodoxos para prevenir a heresia, deixando
aberta a discussão no campo católico, sem anatematizar nenhuma escola
teológica.
Na
Holanda a Igreja Reformada possuía a Confissão de Fé Belga e o Catecismo de
Heidelberg, como dois documentos de orientação doutrinal, de persuasão
calvinista. A partir das discussões introduzidas pelo também calvinista Jacó
Armínio (1560-1609), surgiram então questões que levaram, como era seu desejo,
mas que só aconteceu após sua morte, à realização de um sínodo, como mencionado
antes, que atingiu esfera internacional.
Ali
nasceram os cânones sinodais, o que ficou conhecido como os cinco pontos
calvinistas, em contraposição aos pontos formulados pelos seguidores de Armínio
em 1610, como uma representação, chamada Remonstrance,
nomeando seus defensores de remonstrantes. Esse são os atuais arminianos.
Portanto,
nos cânones estabelecidos ficou a doutrina reformada de acordo com a
interpretação dada por João Calvino e condenada aquela de Jacob Arminius. De
fato, a Institutas da Religião Cristã escrita por Calvino é expressão
reconhecida de autoridade da teologia reformada, como afirma Earle E. Cairns.
Tendo
essa contextualização histórica, continuaremos a tratar o ponto sobre a eleição
incondicional que é um dos cânones reformados. Sobre esse ponto não teria nada
a objetar se a afirmação fosse apenas que as obras não são causa da eleição. No
entanto, esse cânone ensina que Deus dá o dom da fé aos que foram eleitos e
predestinados desde a eternidade pelo decreto divino, mas não dá esse dom aos
que foram deixados para a perdição.
Alguns
receberão a verdadeira fé e outros não. Uns poderão até apresentar um tipo de
fé momentânea ou por algum tempo, mas logo apostatarão, porque são do número
dos perdidos que não receberão nunca o dom da fé que é instrumento de salvação.
Esse
particular está em contradição com a doutrina católica que ensina que todos
recebem a graça suficiente para serem salvos. De fato, a fé é oferecida a
todos, mas por causa da recusa de muitos, esses não exercem fé e recebem a dura
condenação. É um caso de séria divergência.
Embora
os reformados neguem o livre-arbítrio, eles crêem que o homem é livre,
possuindo livre agência, até mesmo algumas vezes usando o termo livre-arbítrio,
sendo responsável pelas suas escolhas, e ensina que todos indistintamente estão
em rebelião contra Deus.
Essa
explicação não tem, aparentemente, diferença da doutrina católica. No entanto,
afirma que somente os eleitos serão convertidos no meio dessa massa caída, por
terem sido alvos da salvação na eternidade.
O
problema é que a teologia reformada ensina que a liberdade que o homem segue
sua natureza, caída ou regenerada, o que introduz problemas sérios quando
analisada detalhadamente, pois isso não é o mesmo que livre-arbítrio. Isso é de
fato negar o livre-arbítrio. Não é igual ao livre-arbítrio que eles rejeitam,
nem igual ao livre-arbítrio que a doutrina católica ensina. Em alguns momentos
os reformados conceituam livre agência como o que se entende como
livre-arbítrio, e em outros nega-o frontalmente em suas apresentações.
Para
entender melhor, é afirmado que o decreto de Deus visaria salvar muitos dentre
os perdidos, deixando os demais seguirem o próprio caminho, ensinando que o
decreto não está impelindo ninguém para tal e nem impedindo que venha a se
converter. Portanto, essa explicação encontra lugar no coração de muitos porque
ela tem aparência de verdade e usa linguagem que transmite um conceito
verdadeiro.
É
verdade que Deus não impele ninguém ao mal, nem que impeça de ouvir e aceitar o
Evangelho. Mas, sabemos que os que não aceitam a salvação são livres para assim
agirem. Eles recebem o apelo do Evangelho, são alcançados pela graça do chamado
e, já postos pela graça em condição de responder a Deus, são capazes de aceitar
ou recusar a graça. É igualmente verdadeiro que Deus não impede que o homem
salvo escolha o mal, nem que force o ímpio a vir a Cristo.
Também
não se trata da graça preveniente colocar o pecador em estado de neutralidade
para capacitá-lo a escolher entre o bem e o mal, mas de suprir pela força
suficiente da graça o que ele não tem, e habilitar o pecador inclinado ao
pecado a vislumbrar o bem da graça e poder assim nesse estado pecaminoso
aceitar a graça ou resisti-la. Muitos resistem.
É
óbvio que Deus é soberano, e poderia vencer qualquer resistência. Não o faz em
todos. Qual o motivo? É de se esperar que seja assim se os seres humanos são
livres. Também, é de supor que a justa medida da graça eficaz é exercida de
modo a convergir com o livre-arbítrio.
Se
o reformado disser que a graça não anula a livre agência, como Olson afirma de
uma opinião de Boettner, o que se deve entender é que sendo a livre agência uma
consequência do decreto divino para agir conforme a natureza, que é pecaminosa,
a partir da queda, decretada também, causando por si mesma o pecado, se o
decreto de predestinação faz a graça vencer a resistência do pecador, sem
anular sua liberdade, mas mudando seu coração, em última análise isso seria o
mesmo que dizer que Deus fez o coração ser pecaminoso até o momento em que Ele
mesmo faria esse coração tornar-se santo, que não faz sentido de forma alguma, diante
da revelação bíblica, e do bom senso, entretanto explica de fato que na
teologia reformada na há livre-arbítrio. O livre-arbítrio é negado, tal
afirmação encontra esse problema conforme apontado acima.
Para
os católicos, a liberdade é considerada por Deus para receber a graça eficaz. Para
a teologia reformada as coisas não são bem assim. Os ímpios deixados segundo as
inclinações de sua própria natureza agem contra Deus livremente porque não
estão no decreto divino de salvação, e não recebem a graça da salvação porque
Cristo não teria morrido por eles, e a fé nunca estaria disponível para eles.
Esse ponto será refutado no respectivo lugar durante o estudo, mas já pode ser
percebido que não possui equilíbrio com a revelação bíblica.
Os
ímpios possuem natural rebelião contra Deus por viverem na natureza pecaminosa,
mas não lhes seria oferecido nada que os pudesse tirar desse estado, já que não
existiria meio disponível, pois a morte de Cristo não teria comprado nada, em
termos de salvação, para essa parte da humanidade.
No
entanto, quando lemos as Escrituras não encontramos esse cenário. Isso é típico
do calvinismo, e não da Bíblia. Encontramos ensinada na Bíblia a doutrina
cristã católica da salvação adquirida na cruz em favor de todos, em todas as
Escrituras, e nada que soe de acordo com essas terríveis afirmações acima.
Calvino afirmava que Deus predestina para a condenação pelo seu próprio prazer
e pela Sua Vontade. É o que continua a ser afirmado pelos reformados desde as
decisões do Sínodo de Dort.
Por
causa disso, muitos pensavam que não importava a vida que levassem, pois se
fossem do número dos eleitos seriam salvos, se dos reprovados seriam
condenados. Foi um equívoco de muitos, mas pensavam na lógica usando as
premissas reformadas, como fazem alguns.
Não
há muitos que creem totalmente nessa afirmação, já que logo afirmam que é
necessária uma vida de boas obras também. Esse assunto já foi tratado, e
deve-se lembrar que essa doutrina, fruto de conclusões contidas em certas
premissas reformadas, não encontram apoio nem no meio reformado histórico. A
santidade é necessária na vida cristã. Nesse ponto, o reformado concorda com o
católico.
Gledson Meireles.
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