Estudando os artigos dos apologistas Dave Armstrong e Lucas Banzoli, no debate sobre a virgindade de Maria, a partir do testemunho do historiador judeu do primeiro século Flávio Josefo, pude aprender certas coisas, que compartilho com os leitores.
No primeiro artigo
sobre o tema, do Lucas Banzoli, escrito em 2018, ele afirma ser uma lenda
católica considerar os irmãos de Jesus como primos, e cita Flávio Josefo como
prova histórica cabal dessa afirmação.
Ele afirma que Josefo
não usou a palavra irmão de forma genérica, como costume judaico, mas
diferenciou entre outros parentes de sangue, mostrando vários trechos das obras
de Josefo onde o mesmo usa a palavra primo e irmão na mesma passagem.
Afirma ainda que Josefo
é um historiador competente, e isso torna praticamente impossível que o mesmo
tenha se equivocado em apresentar um “fato” tão simples, como o da relação de
parentesco entre Tiago e Jesus, quando o mesmo utiliza o termo irmão. É o que
se pode aprender do artigo do Lucas Banzoli.
Em artigo recente, o Lucas
Banzoli afirma que o Dave Armstrong afirmou que Jose não pode ser levado a
sério por não ser cristão, mas que em outro artigo voltou atrás afirmando que é
um erro desprezar o testemunho do historiador e admitindo que o argumento que
tinha usado, a partir de Hegesipo, era fraco e que devia ser desconsiderado.
O Dave citou o erudito
Dr. James B. Protho. A esse respeito, o Lucas afirmou que o trabalho do Dr.
Protho é superficial, não lida diretamente com as obras de Josefo, citando-o
apenas três vezes, denotando a “profundidade” desse artigo católico que o Dave
utilizou.
Abrindo um parêntese,
os protestantes entendem que os católicos colocam Maria em primeiro, o que não
é o caso. Mas, prossigamos.
Outra coisa, os
“irmãos” de Jesus estarem sempre com Maria pode ser explicado na tese de que
eram filhos de José, de um casamento anterior, ou mesmo filhos da irmã de
Maria, que cresceram próximos de Jesus, e acompanhavam Maria, conforme costume
judaico.
Os evangelistas quase
não tratam do contexto familiar de Jesus, mas quando isso aparece, como na cena
da ida e volta a Jerusalém para a festa da Páscoa, o contexto é de que Jesus é
filho único. Isso é digno de nota.
O fato de que o Dr.
Protho aponta detalhes que servem para provar que os “irmãos” de Jesus podiam ser
filho de José, de um casamento anterior, não é incompatível com a doutrina
católica.
É apenas um detalhe que
a Igreja Católica aceita a tese mais correta de que aqueles parentes eram
primos, o que não muda em nada a doutrina de que Maria permaneceu virgem
perpetuamente. É livre ao católico divergir nessas questões, e o Dave parece
ter escrito isso em outro lugar, e certamente a Igreja Católica nunca defendeu
que há somente uma explicação para entender as passagens que tratam dos irmãos
do Senhor, e nem proíba estudos nesse campo. Não faz diferença.
É portanto, algo que o
católico está livre para adotar: ou os irmãos de Jesus eram filhos da irmã de
Maria, casada certamente com um irmão de José, ou eram filhos de José, etc. O
que importa é que é tradição apostólica a doutrina da virgindade perpétua, não
havendo nenhum motivo sério para negá-la.
Uma afirmação contra a
tradução dos LXX como fonte para explicar o uso do termo irmão, ficou bem
confusa, e parece que o Lucas Banzoli não entendeu bem o que escreveu.
Vamos analisar: “Como eu já expliquei muitas vezes, a LXX não
serve para livrar a barra dos papistas porque ela é apenas uma tradução...”.
Pois bem. Uma tradução
não serve. Essa tradução não tem relevância? Não tem peso algum? Mas, é uma
tradução antiga, feita antes de Cristo, e portanto próxima do texto original,
feita a partir dos originais. Então, serve ou não?
Obviamente, serve, mas
não dirime a questão totalmente. Pois bem, novamente. De fato, a tradução é
importante, muito importante, ainda mais se tratando de uma tradução bastante
antiga e feita a partir dos originais, testemunhando também a cultura da época.
“...não um texto original em primeira-mão.”.
Já foi explicado isso
acima. Então, essa afirmação de que “não serve” é fraca.
“Em outras palavras, os tradutores liam “irmão” em hebraico, e traduziam
por “irmão” em grego”.
Então, qual é o erro?
Se o tradutor encontra a palavra no original hebraico IRMÃO e traduz para a
língua grega pelo termo equivalente IRMÃO, o que aconteceu? Ele fez uma
tradução literal, perfeita para o estudo da questão.
“(mesmo quando o contexto mais distante apontava que não eram irmão de
fato, o que não é o trabalho de um tradutor mas sim de um intérprete)”.
O quê? O autor escreveu
justamente o contrário do que pretendia, suponho. É bom dar uma olhada nessa frase, pois parece que está
equivocada.
Se o tradutor encontrar
o termo irmão, e perceber que no contexto mais amplo o parentesco é primo, e
traduzir por primo, então ele fez interpretação. No caso que o autor mostrou,
ele fez de fato tradução. Então, é preciso rever esse ponto do artigo.
“Já o NT não é uma tradução grega de um original hebraico, mas foi ele mesmo escrito originalmente em
grego (e o mesmo pode ser dito a respeito de Josefo), idioma no qual sempre
existiu distinção entre irmão e primo (e para outros graus de parentesco).”
Se no grego sempre
existiu essa distinção supõe-se que nunca usa o termo irmão em vez de primo. É
isso um fato? Não. O Dave mostrou que não. Uma fez que o termo tem sentido de
parentes, pode incluir primos. É uma afirmação equivocada do Lucas Banzoli.
Precisa ser revisada. Ou a questão deve ser melhor exposta.
Outra coisa: como dito
acima, se a tradução dos LXX no caso citado acima é feita literalmente, então
ela serve muito para esse estudo.
O caso do evangelista
Lucas que não era hebreu e mesmo assim escrevia “irmão” para referir-se aos
parentes de Jesus é, talvez, explicada por se tratar de uma mentalidade judaica
mesmo, que se consagrou no tempo, pois no século quarto vemos que quem sabia
que os irmãos de Jesus eram primos e ainda assim escreviam utilizando a palavra
irmãos.
Deveria haver uma
ocasião em que primos sejam tratados como irmãos. O Dr. Protho mostrou que
irmãos traduz o termo parentes, no sentido amplo. O apologista protestante
exige que se mostre irmão sendo usado no sentido claro de primo.
Agora, uma palavrinha
sobre o que o Dave Armstrong mostrou em seus artigos, para vermos se realmente
não fadados ao fracasso, ou se de fato contêm muita coisa boa para a
apologética católica atual.
O interessante é que o
Dave mostra Gênesis 11, 26-28 e 14, 4, como prova de que o termo irmão é usado
no lugar de outro laço de parentesco, como o de sobrinho. Ló era sobrinho de
Abraão e foi chamado de irmão. Então, sendo irmão também usado no lugar de
sobrinho, mais ainda pode ser como sinônimo de primo.
Depois, usa mais textos
do AT. Um deles é o de Crônicas 23, 21-22, onde o hebraico traz “irmão” no
lugar de primo. Será que serve essa prova bíblica? Ou não serve, por ser do Antigo
Testamento? E porque não serve? De fato, a argumentação católica faz todo
sentido.
Quando Dave Armstrong
argumenta sobre Flávio Josefo não ser cristão, o sentido é que tendo uma fonte
cristã que leva a um entendimento da doutrina cristã e outra fonte não cristã
que parece negar aquele entendimento, é maior a autoridade da fonte cristão em relação
à nação cristã. Não significa que o testemunho de Josefo não vale por não ser
cristão, mas que Hegesipo contribui para a questão, e nesse ponto ultrapassa o
valor de Josefo.
Gledson Meireles.
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