sábado, 14 de janeiro de 2023

Comentando artigos sobre a virgindade de Maria

Estudando os artigos dos apologistas Dave Armstrong e Lucas Banzoli, no debate sobre a virgindade de Maria, a partir do testemunho do historiador judeu do primeiro século Flávio Josefo, pude aprender certas coisas, que compartilho com os leitores.

No primeiro artigo sobre o tema, do Lucas Banzoli, escrito em 2018, ele afirma ser uma lenda católica considerar os irmãos de Jesus como primos, e cita Flávio Josefo como prova histórica cabal dessa afirmação.

Ele afirma que Josefo não usou a palavra irmão de forma genérica, como costume judaico, mas diferenciou entre outros parentes de sangue, mostrando vários trechos das obras de Josefo onde o mesmo usa a palavra primo e irmão na mesma passagem.

Afirma ainda que Josefo é um historiador competente, e isso torna praticamente impossível que o mesmo tenha se equivocado em apresentar um “fato” tão simples, como o da relação de parentesco entre Tiago e Jesus, quando o mesmo utiliza o termo irmão. É o que se pode aprender do artigo do Lucas Banzoli.

Em artigo recente, o Lucas Banzoli afirma que o Dave Armstrong afirmou que Jose não pode ser levado a sério por não ser cristão, mas que em outro artigo voltou atrás afirmando que é um erro desprezar o testemunho do historiador e admitindo que o argumento que tinha usado, a partir de Hegesipo, era fraco e que devia  ser desconsiderado.

O Dave citou o erudito Dr. James B. Protho. A esse respeito, o Lucas afirmou que o trabalho do Dr. Protho é superficial, não lida diretamente com as obras de Josefo, citando-o apenas três vezes, denotando a “profundidade” desse artigo católico que o Dave utilizou.

Abrindo um parêntese, os protestantes entendem que os católicos colocam Maria em primeiro, o que não é o caso. Mas, prossigamos.

Outra coisa, os “irmãos” de Jesus estarem sempre com Maria pode ser explicado na tese de que eram filhos de José, de um casamento anterior, ou mesmo filhos da irmã de Maria, que cresceram próximos de Jesus, e acompanhavam Maria, conforme costume judaico.

Os evangelistas quase não tratam do contexto familiar de Jesus, mas quando isso aparece, como na cena da ida e volta a Jerusalém para a festa da Páscoa, o contexto é de que Jesus é filho único. Isso é digno de nota.

O fato de que o Dr. Protho aponta detalhes que servem para provar que os “irmãos” de Jesus podiam ser filho de José, de um casamento anterior, não é incompatível com a doutrina católica.

É apenas um detalhe que a Igreja Católica aceita a tese mais correta de que aqueles parentes eram primos, o que não muda em nada a doutrina de que Maria permaneceu virgem perpetuamente. É livre ao católico divergir nessas questões, e o Dave parece ter escrito isso em outro lugar, e certamente a Igreja Católica nunca defendeu que há somente uma explicação para entender as passagens que tratam dos irmãos do Senhor, e nem proíba estudos nesse campo. Não faz diferença.

É portanto, algo que o católico está livre para adotar: ou os irmãos de Jesus eram filhos da irmã de Maria, casada certamente com um irmão de José, ou eram filhos de José, etc. O que importa é que é tradição apostólica a doutrina da virgindade perpétua, não havendo nenhum motivo sério para negá-la.

Uma afirmação contra a tradução dos LXX como fonte para explicar o uso do termo irmão, ficou bem confusa, e parece que o Lucas Banzoli não entendeu bem o que escreveu.

Vamos analisar: “Como eu já expliquei muitas vezes, a LXX não serve para livrar a barra dos papistas porque ela é apenas uma tradução...”.

Pois bem. Uma tradução não serve. Essa tradução não tem relevância? Não tem peso algum? Mas, é uma tradução antiga, feita antes de Cristo, e portanto próxima do texto original, feita a partir dos originais. Então, serve ou não?

Obviamente, serve, mas não dirime a questão totalmente. Pois bem, novamente. De fato, a tradução é importante, muito importante, ainda mais se tratando de uma tradução bastante antiga e feita a partir dos originais, testemunhando também a cultura da época.

“...não um texto original em primeira-mão.”.

Já foi explicado isso acima. Então, essa afirmação de que “não serve” é fraca.

Em outras palavras, os tradutores liam “irmão” em hebraico, e traduziam por “irmão” em grego”.

Então, qual é o erro? Se o tradutor encontra a palavra no original hebraico IRMÃO e traduz para a língua grega pelo termo equivalente IRMÃO, o que aconteceu? Ele fez uma tradução literal, perfeita para o estudo da questão.

(mesmo quando o contexto mais distante apontava que não eram irmão de fato, o que não é o trabalho de um tradutor mas sim de um intérprete)”.

O quê? O autor escreveu justamente o contrário do que pretendia, suponho. É bom dar  uma olhada nessa frase, pois parece que está equivocada.

Se o tradutor encontrar o termo irmão, e perceber que no contexto mais amplo o parentesco é primo, e traduzir por primo, então ele fez interpretação. No caso que o autor mostrou, ele fez de fato tradução. Então, é preciso rever esse ponto do artigo.

Já o NT não é uma tradução grega de um original hebraico, mas foi ele mesmo escrito originalmente em grego (e o mesmo pode ser dito a respeito de Josefo), idioma no qual sempre existiu distinção entre irmão e primo (e para outros graus de parentesco).

Se no grego sempre existiu essa distinção supõe-se que nunca usa o termo irmão em vez de primo. É isso um fato? Não. O Dave mostrou que não. Uma fez que o termo tem sentido de parentes, pode incluir primos. É uma afirmação equivocada do Lucas Banzoli. Precisa ser revisada. Ou a questão deve ser melhor exposta.

Outra coisa: como dito acima, se a tradução dos LXX no caso citado acima é feita literalmente, então ela serve muito para esse estudo.

O caso do evangelista Lucas que não era hebreu e mesmo assim escrevia “irmão” para referir-se aos parentes de Jesus é, talvez, explicada por se tratar de uma mentalidade judaica mesmo, que se consagrou no tempo, pois no século quarto vemos que quem sabia que os irmãos de Jesus eram primos e ainda assim escreviam utilizando a palavra irmãos.

Deveria haver uma ocasião em que primos sejam tratados como irmãos. O Dr. Protho mostrou que irmãos traduz o termo parentes, no sentido amplo. O apologista protestante exige que se mostre irmão sendo usado no sentido claro de primo.

Agora, uma palavrinha sobre o que o Dave Armstrong mostrou em seus artigos, para vermos se realmente não fadados ao fracasso, ou se de fato contêm muita coisa boa para a apologética católica atual.

O interessante é que o Dave mostra Gênesis 11, 26-28 e 14, 4, como prova de que o termo irmão é usado no lugar de outro laço de parentesco, como o de sobrinho. Ló era sobrinho de Abraão e foi chamado de irmão. Então, sendo irmão também usado no lugar de sobrinho, mais ainda pode ser como sinônimo de primo.

Depois, usa mais textos do AT. Um deles é o de Crônicas 23, 21-22, onde o hebraico traz “irmão” no lugar de primo. Será que serve essa prova bíblica? Ou não serve, por ser do Antigo Testamento? E porque não serve? De fato, a argumentação católica faz todo sentido.

Quando Dave Armstrong argumenta sobre Flávio Josefo não ser cristão, o sentido é que tendo uma fonte cristã que leva a um entendimento da doutrina cristã e outra fonte não cristã que parece negar aquele entendimento, é maior a autoridade da fonte cristão em relação à nação cristã. Não significa que o testemunho de Josefo não vale por não ser cristão, mas que Hegesipo contribui para a questão, e nesse ponto ultrapassa o valor de Josefo.

Gledson Meireles.

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