quinta-feira, 19 de maio de 2022

O cânon do Novo Testamento e os princípios protestantes

O artigo que serviu de base para o comentário abaixo é: Qual é a primeira lista completa do Canon do Novo Testamento?

Santo Atanásio, em 367, fornece a lista de livros do Novo Testamento. É o primeiro documento que traz a lista total. O autor afirma que isso não pode ser indício de que o cânon é tardio, pois não se pode medir a existência do Novo Testamento apenas pela existência de listas. A forma como livros eram usados evidencia um cânon funcional.

Pois bem. As listas são documentos históricos, fontes que revelam o que estava ocorrendo em determinado período, e portanto se a primeira documentação é do século IV, ano 367, é porque, possivelmente, com muita probabilidade, antes disso havia dúvida e o cânon não estava fechado.

Pensando em algum dogma cristão, se um documento é do quarto século o protestante irá afirmar que é bastante tardio, e que o documento, virtualmente pode-se dizer, pois é o que substancia a argumentação protestante, o documento seria a prova de que antes tal dogma era desconhecido, tal doutrina não existia, não tinha tomado forma, não havia sido desenvolvida. E não adianta mostrar evidências indiretas de elemetos doutrinais tratados anteriormente. Mas, quando o assunto é algo em que há concordância entre católicos e protestantes, como é o cânon do NT, então as listas apenas não falam tanto.

E qual o motivo disso? É certamente porque sendo as listas bem tardias, é fato que o cânon não era de conhecimento geral na Igreja, não havia uma definição formal, os cristãos não sabiam ao certo quais eram os livros inspirados com cem por cento de certeza. No entanto, o protestante que afirma que o cânon se impôs e foi sendo recebido e reconhecido por toda a Igreja, pelas comunidades locais, sem a necessidade de uma autoridade, de concílios e etc., que definissem o cânon, então as listas de fato não podem medir tanto. É apenas para uma reflexão.

Então, continuando, ao afirmar que havia um cânon funcional, o argumento não acrescenta absolutamente nada ao que a Igreja Católica ensina. De fato, quanto mais próximo dos apóstolos são os documentos, os livros bíblicos são citados, tanto os do Antigo, quanto os do Novo Testamento, como Escritura inspirada, e portanto havia a consciência canônica, o que não necessariamente, e não factualmente, significa que o cânon fosse definido. O argumento é esse, e portanto está estabelecido, sendo impossível negar.

Se o cânon do NT era para Orígenes mais estável do que se imagina e estava amplamente resolvido, não muda o caso, já que em todo o período que se segue, até fins do século quarto, a definição geral não foi alcançada.

E quanto à infalibilidade da Igreja, em questões de fé e moral, e na questão da definição do cânon, que é imprescindível para a salvação, já que é do conhecimento da Bíblia, e de Cristo, por implicação, que está atrelado todo o processo, o autor acredita na falibilidade da Igreja, ainda que tenha certeza de que a mesma não errou ao receber os 27 livros do Novo Testamento, conforme o testemunho histórico.

Mas, o raciocínio que utiliza, ainda que interessante, não faz do argumento católicos “tão ruim”, como afirma, pois a posição católica continua solidamente de pé, mesmo diante da argumentação que o autor propõe. “Do que adianta um magistério infalível, se os fieis que terão que receber e interpretar a mensagem são falíveis? A possibilidade de se interpretar errado continua de pé.

A Bíblia é infalível, inspirada, inerrante. Coloque a Escritura no lugar de magistério infalível e perceberá que o argumento não é correto: “Do que adianta uma Escritura Sagrada infalível, se os fieis que terão que receber e interpretar a mensagem são falíveis? A possibilidade de se interpretar errado continua de pé.”. É verdade. Portanto, temos que partir de raciocínios, sobre princípios bem sólidos, que nos deem certeza de que em tal lugar podemos crer com certeza absoluta. Isso é verdade em relação à Bíblia, que sabemos ser a Palavra de Deus, como da Igreja, pelo mesmo processo.

Portanto, é um assunto bastante profundo, complexo, de sutilidade impressionante que escapou ao autor.

Se a primeira lista é de Santo Atanásio ou não, se está clara ou não em Orígenes, etc., é algo que faz parte dos estudos, muito importantes para entender o processo de decisão eclesiástica a respeito do cânon, mas não contem nenhuma dificuldade para a posição católica.

Certamente aqui, então, se tem em vista negar o papel da autoridade eclesiástica na definição infalível do cânon. Mas os mesmos princípios são usados de forma incoerente quanto se trata de provar doutrinas e dogmas, por mais claros que sejam.

E para terminar, pense a respeito de uma afirmação de um santo do quarto século. Santo Epifânio no quarto século escreveu que não era possível saber se Maria morreu ou não. Isso é interpretado pelos protestantes como sendo um testemunho de desconhecimento do dogma da assunção, que foi definido com 1950. Que o leitor reflita.

Gledson Meireles.

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