sexta-feira, 14 de abril de 2017

A doutrina da Igreja na teologia reformada

A Igreja católica ou universal, a qual é invisível, consiste do inteiro número dos eleitos”, e “A Igreja visível, a qual é também católica ou universal sob o evangelho”, consiste daqueles que professam a verdadeira religião, e seus filhos, “fora da qual não há possibilidade ordinária de salvação”. (Confissão de Fé de Westminster, capítulo 25, I e II)

No item 4, afirma que a Igreja visível é às vezes mais ou menos visível, mais ou menos pura. No item 5 afirma que as igrejas mais puras estão sujeitas a erro nelas, mas sempre haverá uma Igreja na terra adorando segundo a vontade de Deus, e que Cristo é a única cabeça da Igreja, e que afirma que o papa não pode ser cabeça “em nenhum sentido”, mas que é o Anticristo. Essa doutrina da Igreja entre os protestantes é geralmente aceita, e é explicada pelos teólogos protestantes conforme será mostrado adiante.

Charles Hodge, teólogo reformado, na sua Teologia Sistemática, volume 2, trata da Igreja sob o título do “Reino Espiritual de Cristo”. Ele afirma que esse possui dois aspectos, pelos quais é expresso, incluindo a relação de Cristo com Seu povo de forma individual e coletiva, que é a Igreja invisível, e as relações com a Igreja visível, definida como “corpo do povo que professa”.

O texto sagrado de João 3,5 é citado como expressando as exigências de pertencimento ao reino como fé e arrependimento. Também é referida a conversão, como outra forma de expressar a mesma realidade, citando Mateus 18,3, e a pureza de vida em 1 Cor 6,9, e ao fim Gl 5,19-21. Não sendo a profissão externa garantia de pertencimento ao reino espiritual, ou à igreja invisível, afirma que a igreja é composta somente do verdadeiramente e interiormente povo de Cristo. 1 Pedro 3,21 é citado entre os textos que ensinam não ser as cerimônias externas garantidoras da salvação.

Passando a expor a Igreja visível, sob o título do “Reino visível de Cristo”, afirma que a religião é essencialmente espiritual, e assim o reino de Cristo é invisível, exceto ao ponto de que é necessário que esse tenha “manifestações visíveis”. Os cristãos precisam reunir-se para adorar, admitir e excluir membros, administrar os sacramentos, para manter e propagar a verdade. E assim, eles formam igrejas. Essas igrejas são compostas por todos os que professam a verdadeira religião.

Afirma que o “reino de Cristo é católico ou universal”. Sobre a organização diz que nem as igrejas apostólicas eram todas organizadas da mesma forma. Um exemplo é a presença fixa de um apóstolo, como em Jerusalém, em comparação com outras comunidades que não dispunham de um apóstolo vivendo entre elas, o que configuraria uma organização diversa. Umas tinham diaconisas, outras não. Disso, afirma que as igrejas sentiram liberdade para organizar, que a organização é livre, indiferente.

Começando pelas imposições dos judaizantes, por exemplo, afirma que tiveram que resistir, da mesma forma que durante os séculos resistem às coisas intoleráveis impostas por papas, concílios, etc. Então, mostra os termos de admissão na Igreja, que concordam com os termos espirituais que Cristo exige. O segundo ponto é a intolerância com a heresia, e que hereges e escandalosos devem ser excomungados.

Portanto, a doutrina sobre a Igreja, como é ensinada no Protestantismo, enfatiza os termos Igreja visível e Igreja invisível, e a distinção foi proclamada por Lutero, e por outros reformadores protestantes. Berkof, outro renomado teólogo reformado, afirma: “Nem sempre se entendeu bem esta distinção.”

Essa distinção refere-se não a duas igrejas, mas dois aspectos dela, confirmando o fato de haver uma única Igreja. Se o termo invisível é referente aos santos do céu, então é o mesmo que a Igreja triunfante, se refere-se à Igreja no fim dos tempos, inteira, completa dos salvos, então significa a Igreja que estará com o Cordeiro no último dia: todos os santos. Se é à Igreja espalhada no mundo, que não é possível vê-la reunida em um só lugar e contemplá-la, então tem-se o que a Bíblia apresenta, se é a Igreja perseguida, que está escondida aos olhos do mundo, para manter-se viva e anunciando a salvação, tem-se um aspecto que não encontra-se na Bíblia com o termo ou o conceito.

Mas, o que está sob o termo “invisível” não é relativo à Igreja triunfante. Essa é incluída na Igreja invisível também, como Berkhof afirma. Essa distinção é sobre a Igreja na terra, a Igreja militante. Berkhof diz: “Em geral, é feita essa aplicação na teologia reformada (calvinista).”. A Igreja é visível e invisível. O que isso quer dizer do ponto de vista reformado? O invisível identifica o espiritual, em conceito, não pelos olhos, já que não é possível ver o invisível, “e porque é impossível determinar infalivelmente quem não lhe pertence”, afirma Berkhof.

Somente quem foi regenerado, convertido, teve fé verdadeira e comunhão com Cristo é membro da Igreja, que é invisível por ser espiritual. Então, diz Berkhof: “Que o termo “invisível” deve ser entendido neste sentido, vê-se pela origem histórica da distinção entre a igreja visível e a invisível na época da Reforma”.

O objetivo de salientar essa doutrina é refutar a doutrina que explica a Igreja em seu aspecto externo, como instituição, representada pela hierarquia, que distribui os dons espirituais, colocando-se como “sacerdócio mediatário humano”. A Igreja seria o corpo espiritual de Jesus Cristo, de caráter invisível, encarnada de forma “relativa e imperfeita na igreja visível”, sendo perfeitamente encarnada de forma visível no final dos tempos.

Mas, continua Berkhof: “Naturalmente, a igreja invisível assume uma forma visível.” A Igreja invisível está na igreja visível, pela qual se expressa. Como ela é visível? “A igreja é visível na profissão de fé e conduta cristã, no ministério da Palavra e dos sacramentos, e na organização externa e seu governo.” Para entender essa doutrina, é indicada a Confissão de Westminster, que foi comentada no início.

Agora, há outra distinção importante na doutrina Reformada: a Igreja como organismo e a Igreja como instituição. Afirma Berkhof: “Não se deve identificar esta distinção com a imediatamente anterior, como às vezes se faz.” Essa parte toca a exterioridade da igreja, tendo a ver com a igreja visível, como corpo visível.

Isso significa que a Igreja não é somente visível em seus ofícios, mas que a vida dos fieis, o seu testemunho público, em todas as partes, é a visibilidade da Igreja. Essas duas características estão fundadas na Igreja invisível. A Igreja instituição tem como fim formar a Igreja organismo.

A respeito da doutrina católica diz: “Comumente, os católicos romanos reconhecem como igreja apenas a ecclesia organizada hierarquicamente.” E ainda: “E quando os Reformadores romperam em Roma, não negaram a unidade da igreja visível, mas, antes, a sustentaram.


Vejamos agora como o teólogo apresenta a doutrina católica sobre a Igreja. Na introdução do seu estudo da Igreja, afirma da doutrina católica: “Não é Cristo que nos leva à igreja, mas a igreja que nos leva a Cristo”. Sobre a Igreja como communio fidelium ou communio sanctorum “comunhão dos fieis” ou “comunhão dos santos” afirma que a ênfase católica é a Igreja como mater fidelium “mãe dos fieis”, conceito que os reformadores romperam, para introduzir a ênfase da Igreja como organismo espiritual, “como outrora fora feito”. Por isso, na doutrina reformada, o lugar da igreja é minimizado, como mostra Berkhof.
 

A parte em que trata da Igreja na história, antes da Reforma Protestante, afirma: “O surgimento de heresias tornou imperativa a enumeração de algumas características pelas quais se conhecesse a verdadeira igreja católica.”.

Porque as heresias asssolavam, tinha-se a ênfase na Igreja como instituição externa, afirma Berkhof, que recebeu atenção e começou a ser assim concebida: “A catolicidade da igreja recebeu forte ênfase. As igrejas locais não eram consideradas como unidades separadas, mas simplesmente como partes componentes da igreja universal uma e única.[1]

Mostrando a doutrina de São Cipriano e de Santo Agostinho, afirma: “A igreja verdadeira é a igreja católica, na qual a autoridade apostólica tem continuidade mediante a sucessão episcopal.[2].

Afirma que na Idade Média a doutrina da Igreja como comunhão dos santos ficou adormecida. E falando de Hugo de São Vítor, afirma que ensinava: “O rei ou imperador é o chefe do estado, mas o papa é o chefe da igreja.”.

A doutrina da Igreja sofreu bastante na época da reforma, entre os protestantes, como igualmente ocorreu no século 18.

Apresentando a doutrina católica, o teólogo afirma: “No sentido estrito da palavra, não é a ecclesia audiens que constitui a igreja, mas, sim, a ecclesia docens.

A respeito da catolicidade da Igreja, afirma Berkhof: “Não é fácil indicar com precisão onde se acha esta igreja católica visível”.

Quando trata das marcas da Igreja em geral, ensina o teólogo protestante: “Sentia-se pouca necessidade destas marcas quando a igreja era claramente uma só.[3]

E mais: “A consciência desta necessidade já estava presente na Igreja Primitiva (...)”.

E mais adiante, vem uma afirmação que coroa o entendimento protestante sobre a Igreja: “Nesse tempo, a única igreja existente não só foi dividida em duas grandes partes, mas o próprio protestantismo se dividiu em diversas igrejas e seitas.”.[4]

Entre os reformados, os teólogos Beza, Alsted, Amesius, Heidanus, Maresius, falavam de uma marca da Igreja: a pregação da sã doutrina, enquanto outros, como Calvino, Bullinger, Zanchius, Junius, Gomarus, Mastricht, e Marck afirmavam além disso a administração correta dos sacramentos, e outros, a saber, Hyperius, Martyr, Ursinus, Trelcatius, Heidegger, Wendelinus “o fiel exercício da disciplina”. Berkhof analisa tudo isso, e chamando a primeira marca “por excelência da igreja”, confirma as três marcas.
 
Gledson Meireles.



[1] O estudo já publicado no blog em várias partes, ainda não concluído, para a identificação da Igreja, mostra isso de maneira clara.


[2] O teólogo esqueceu-se de mostrar mais. São Cipriano ensinava a necessidade de unidade, de responsabilidade de toda a Igreja, e mais em cada cátedra episcopal, em prol da unidade universal. Para isso, mostra que o modelo deixado por Cristo, como está no evangelho de Mateus 16,18, onde o Senhor inicia a unidade a partir de um: Pedro. Assim, enquanto todos os apóstolos são iguais em honra a poder, a unidade tem início em um só dos apóstolos. O princípio do papado, que é de origem divina, por estar nas Escrituras, não poderia ser mais claramente estabelecido.


[3] Que a Igreja é uma só, e de fato era assim no tempo apostólico, e fato claro mostrado nos artigos: Identificando a Igreja.


[4] As heresias que existiam não quebraram a Igreja, que foi dividida assim em 1054, e mais tarde em 1517. Ainda assim, a Igreja Católica original permanece em seu posto e possui unidade. Para isso, o artigo pode ajudar: http://heresiasrefutadas.blogspot.com.br/2017/04/a-igreja-catolica-romana-e-una.html.

 
 
 

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