A posição de Martinho Lutero é
entendida pelos seus defensores como a opinião de que, não tendo a influência e
o poder político em suas mãos, não podia acarretar o que ocorreu ali, na guerra
onde acabaram morrendo milhares de pessoas. Aquilo ocorreria com ou sem a sua
opinião.[1]
Suas palavras não podiam fazer os príncipes agirem ou não, sendo isso de uma
importância pouco significativa.
Caso se o papa pedisse a paz, por
exemplo, escrevendo aos príncipes para deixarem o movimento sem punição, isso
supostamente seria acolhido com total unanimidade. O mesmo que ocorreria se o
papa pedisse o massacre daqueles revoltosos. Assim, o papa e a Igreja estariam
culpados pelo que ocorreu com os camponeses, não tendo como defender-se, pois o
poder estava em suas mãos. Isso é o que está por detrás da argumentação, como
se na história essa fosse a regra sempre acatada, nunca quebrada. Ou pelo menos
raramente. Sabe-se não ser isso correto, mas não é o lugar para tratar questão.
Vejamos a posição de Lutero, o pai do Protestantismo, nesse contexto.
Por essa via, seria injusto
pensar segundo a cultura moderna e julgar a posição do Reformador naquela
situação complicada, em tempo de conturbação como eram aqueles do século 16, o
que é um princípio correto. Podemos afirmar, sobre isso que: os camponeses
ultrapassaram o limite da justa reivindicação, e passando a agir violentamente,
causando transtorno da ordem social, deviam ser freados pela força militar do
império, para garantir a paz. Suas ideias eram heréticas, e o movimento não era
somente social, mas reformador. Nada mais normal o poder temporal ser usado
para conter a violência.
Para quem atualmente arrepia-se
ao pelo menos imaginar uma medida mais enérgica para conter as heresias no
passado, efetuadas pelo poder temporal com o apoio do papa, e que veem em
Lutero o homem para o seu tempo, é preciso saber como ele pensava a respeito
dos camponeses, e o que teria feito se fosse o governante, ou pudesse usar ele
mesmo o poder, e de fato como fez ao ensinar e aconselhar os príncipes a agir.
Lutero afirma[2]
que os camponeses tinham expressado sua boa vontade em ser ensinados e
corrigidos, e por isso não ia julgá-los, conforme Mt 7,1. Mas logo eles
esqueceram de sua promessa, passando a cometer crimes como cães raivosos, ao
modo de “cachorros doidos”. Os 12 Artigos que os camponeses apresentaram era de
que não passava de mentira, sob o nome do evangelho. E escreve Lutero: “eles estão fazendo a obra do diabo”.
Por isso, Lutero muda sua
opinião, e adota outro tom em sua obra, conforme acredita ser o seu dever. E
para tal, passa a fazer o que acha certo: “Eu então
devo instruir os governantes como eles devem conduzir-se nessas circunstâncias”.
Por essas palavras, não parece ele que sabia da guerra, de nenhuma medida
tomada pelo poder secular contra a revolta dos camponeses.
Pelo pecado deles, diz Lutero,
esses devem sofrer a pena de morte do corpo e da alma. Pela pilhagem que
estavam fazendo nos conventos e castelos, eles devem ser mortos, e o primeiro
que o fizer está agindo bem. Ensinou a matar os revoltosos aberta ou secretamente.
Aludindo à doutrina pregada pelos
anabatistas, afirma que o batismo não faz o homem livre em propriedade e corpo,
mas na alma. E tratando-os como hereges, escreve: “Bons
cristãos eles são! Eu penso que não há diabo deixado no inferno; todos eles entraram
nos camponeses.”
Quanto à sua posição a respeito
do poder secular, seja ele cristão ou mesmo pagão, é que os perturbadores e
desobedientes devem ser punidos. Afirma: “Esse não é um
tempo para dormir. E não há lugar para paciência ou misericórdia. Esse é o
tempo da espada, não o dia da graça.”
Dependendo de Lutero, após a
revolta dos camponeses, a sorte deles teria sido diferente? Basta pensar.
Agora, como Lutero não foi o
responsável direto de tudo isso, e chegou a criticar os príncipes por sua
crueldade naquele empreendimento, isso é visto com bons olhos, o que não seria
de forma alguma se se tratasse da Igreja Católica. De fato, Lutero é facilmente
perdoado e defendido, pois está “longe” de ser como os “papistas”. Não é mesmo?
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