A igreja dos primogênitos e os espíritos dos justos aperfeiçoados
A questão dos espíritos dos justos aperfeiçoados é muito importante no contexto de estudo sobre a imortalidade da alma.
É curioso que essa
passagem diz que nos aproximamos da cidade santa, dos anjos, de Deus, dos
espíritos dos justos, de Cristo, e do sangue da aspersão, e o mortalismo exija
a leitura de que somente os espíritos dos justos não pode ser de forma alguma
suas almas. É claro que o sangue da aspersão é o sangue de Cristo, e
aproximar-se dele é uma forma figurada de linguagem, pelo sangue o valor que é
o próprio Senhor Jesus Cristo.
Mas, e quanto aos
espíritos dos justos, que são citados entre o Monte Sião, os primogênitos, os
anjos, Deus e Cristo e seu sangue? Para o mortalismo essa é uma dificuldade
imensa. Para o imortalismo, é algo natural de ser entendido. Não é, portanto,
dificuldade alguma para a doutrina da imortalidade da alma.
Para o mortalismo, não
há ninguém no céu como alma imortal. Não existiria espírito dos mortos. A
possibilidade para isso seria apenas a ressurreição.
Mas, de fato, o texto
fala de espíritos dos justos que foram aperfeiçoados. Isso não parece tratar do
sopro de vida dos justos que foram a perfeiçoados, no sentido de se aproximar
do fôlego dos justos, nem que o próprio fôlego tenha sido aperfeiçoado, como se
fosse espiritualmente proveitoso aperfeiçoar a respiração dos justos. Nada
disso. Trata-se do espírito ou alma imortal dos justos que chegaram ao céu.
De forma geral seria o
mesmo que dizer que a Igreja se aproxima dos justos mesmos, mas isso pode levar
a uma leitura mais técnica, aproveitando essa linguagem, que explica a
realidade, pois os justos mencionados estão mortos, e somente seus espíritos
estão com Deus. Essa é a leitura mais comum.
A palavra espírito
pode, também, ter outros sentidos, como em 1 Cor 16, 18, também como sinônimo
de alma, mas no sentido de pessoa, do eu: “trouxeram alívio ao meu espírito”
significa “trouxeram alívio a mim”. O mesmo que: “trouxeram alívio à minha
alma”. Aqui o uso é diverso do que está em Hb 12, 23, já que se lido dessa
forma a Igreja estaria se aproximando dos santos vivos que chegaram à
perfeição, algo que não é compatível com nenhuma teologia protestante, diga-se
de passagem.
Diferente também é o
texto de 1 Cor 14, 32, onde o espírito dos profetas sendo submisso aos profetas não teria sentido se lido como fôlego de
vida, ou como o próprio profeta. Então, trata-se ali da inspiração e mensagem
que veio ao profeta, ou à energia inspiradora, que não deve tomar conta do profeta,
mas ser submisso a ele.
Até mesmo no próprio capítulo 14 de 1 Coríntios a palavra espírito é usada com diferente sentido nos
versos 14 e 15: ”Porque, se eu orar em
língua desconhecida, o meu espírito ora bem, mas o meu entendimento fica sem
fruto”, tratando certamente do mais profundo do ser, o espírito, no
interior da personalidade humana, mais profundo mesmo que o pensamento. No
mesmo sentido se diz que esse lugar é o coração, o espírito, o inconsciente,
talvez.
Nisso fica claro que
espírito não é apenas referência anjos ou demônios, ou respiração, fôlego,
sopro de vida, mas também sinônimo de alma espiritual imortal.
Então,
afirmar que a palavra espírito não é usada para mortos, mas apenas para os
vivos, não é uma conclusão bíblica. O conceito de espírito assim é biblicamente
apresentado. Reparemos que a própria explicação do livro implica em que o termo
espírito em Hebreus 12, 23 refere-se a mortos: “Chegar “aos espíritos dos justos aperfeiçoados” não é fazer um tour celestial e encontrar por ali as almas dos que
já partiram, mas chegar à mesma condição espiritual dos heróis da fé a respeito
dos quais ele discorreu no capítulo anterior – ou seja, chegar à estatura de
varão perfeito (Ef 4:13).”
O texto deveria ser entendido como “chegar à condição espiritual dos justos” ou “chegar à estatura de perfeição dos justos”, algo assim. Não há o que objetar ao conceito, mas à implicação, ou à base argumentativa feita pelo mortalismo aqui.
Obviamente a leitura católica dessa passagem é que aproximar-se dos espíritos dos justos é feita também já aqui na terra de forma espiritual, onde a Igreja se aproxima no da Igreja no céu, a Igreja triunfante, dos que já morreram e chegaram à perfeição. Nos aproximamos deles, nesse espírito que caminha para a perfeição da graça.
A interpretação acima mostra que “chegar à mesma condição espiritual dos heróis da fé”, “à estatura de varão perfeito”, ou seja, daqueles que foram citados em Hebreus 11, como o próprio livro reconhece, “a respeito dos quais ele discorreu no capítulo anterior”, significa, sem sombra de dúvida, de que os espíritos dos justos são os justos mortos.
Realmente significa alcançar aquilo que é remetido pelo conceito. De fato. Mas, ainda precisamos mostrar um pouco no que tange ao tema da imortalidade da alma.
Se chegar aos espíritos dos justos é apenas alcançar o aperfeiçoamento dos santos, sem implicar algo que mostre a existência da alma imortal, isso vai ficar mais claro. Do contrário, a tentativa de explicação mortalista se mostra fraca.
O texto afirma que a Igreja, ou seja, os santos da terra, chegou, espiritualmente:
1 “ao monte Sião...”
2
“aos milhares de anjos”
3
“à igreja dos primogênitos”
4
“a Deus”
5
“aos espíritos dos justos aperfeiçoados”
6
“a Jesus”
7
“ao sangue aspergido”
A figura de linguagem estaria evidente em: ao sangue aspergido, porque nos aproximamos do sangue de Jesus, que é o mesmo que dizer do próprio Jesus, desse valor que é da Sua própria Pessoa, e não teria sentido se não estivesse próximo da própria Pessoa que verteu o sangue em nosso favor.
Assim também é dito que nos achegamos à Igreja dos primogênitos, e não aos nomes dos primogênitos, embora isso fosse possível de ser assim apresentado, sem mudar o sentido.
Então, afirmar que nos aproximados dos espíritos, equivale a reconhecer que existe o espírito dos justos mortos, esse outro sentido, mas não apenas o conceito, o valor, que é o aperfeiçoamento em si, mas à proximidade espiritual dos justos que nos dão o exemplo da perfeição que alcançaram e rumo a qual a Igreja caminha. Nos aproximamos deles como modelos.
Quando se diz: o meu espírito, significa “eu”. Estejais com o meu espírito é o mesmo que dizer: Estejais comigo. Assim, aproximar-se dos espíritos dos justos é o mesmo que aproximar-se deles. Se eles não existissem, como ensina o mortalismo, o texto não teria o sentido forte que possui, perderia algo, ao que parece.
Para o mortalismo há necessidade de explicar bem o texto de forma a afastar o sentido mais natural dele ou sua implicação mais lógica.
Nos aproximamos do valor dos justos, da perfeição dos justos, da estatura dos justos. Então, não seria possível entender que nos aproximamos dos justos que são perfeitos como nossos modelos? Então, nos aproximamos dos seus espíritos.