sexta-feira, 21 de novembro de 2025

O debate de Lucas Gesta e Ariel Lazari

 

No debate sobre Tradição Apostólica e Sola Scriptura, o protestante Lucas Gesta veio com várias novidades. Primeiro, o grupo de apóstolos em Jerusalém não seriam os 12, mas um grupo distinto. Segundo, “o concílio” de Antioquia ensinava uma coisa que não estava em conformidade com o Evangelho. Terceiro, o Concílio de Jerusalém, em Atos 15, ensinou coisas que foram contraditas por São Paulo. Pasmem. Como prova ele que os apóstolos não foram para o concílio de Jerusalém? Qual é a prova de que houve concílio de Jerusalém que ensinava algo contrário ao que o evangelho ensina? Qual a prova de que o apóstolo São Paulo contradisse o ensino do Concílio de Jerusalém? A resposta seria o texto que o mesmo citou, mas isso faria a Bíblia se contradizer. Por isso, essas coisas não estão na Bíblia. Um texto bíblico não contradiz outro. E é isso o que o professor historiador Lucas Gesta dá a entender.

Ele cita João 14,26 e, por exemplo, Gálatas 1, para justificar a autoridade dos protestantes de interpretar a Bíblia. O primeiro texto dá autoridade à Igreja Católica e o segundo fala da autoridade de Paulo que recebeu diretamente o evangelho de Jesus e o mesmo era apóstolo em comunhão com os demais. Nada que justifique uma autoridade que não esteja em conformidade com a Igreja.

Até o minuto 49 o que o Ariel ensinou é resumidamente que: aquilo que está na prática da Igreja Católica em sua liturgia, o que é testemunhado em todo o mundo, na unidade essencial litúrgica, prova que há algo que foi deixado pelos apóstolos, uma tradição apostólica que está mantida na Igreja, não ensinada diretamente e explicitamente na Bíblia, não contradizendo a mesma, e mostrando a verdade daquilo que a mesma Bíblia ensina, mostrando que certos ensinos são apostólicos e apenas tacitamente presente no texto bíblico.

No minuto 50 o Lucas mostra não entender a infalibilidade papel em uma resposta rápida que dá ao Ariel durante sua explicação. O Ariel refuta radicalmente o Lucas.

O Lucas afirma que o Concílio de Jerusalém foi uma reunião sinagogal e as decisões que tomaram não valeram para as igrejas paulinas, para as igrejas cristãs no geral. Parece uma confusão aqui. Primeiro, os cristãos apóstolos e anciãos não eram judeus apenas, mas cristãos convertidos. Assim, nesse tempo a Igreja já estava bastante separada da sinagoga e do templo do Judaísmo oficial que combatia contra os cristãos.

Segundo, as decisões do Concílio, sendo bíblicas, obriga a todos os cristãos que existem. São Paulo não permitiu comer carne sacrificada, que seria ir contra o que ele mesmo com os demais decidiram no Concílio de Jerusalém por autoridade do Espírito Santo. Dessa forma, a fala do Lucas está bastante incorreta e introduz a ideia errada de contradição nas Escrituras, e por isso é uma interpretação equivocada.

São Pedro não ensinou que os judeus deviam sentar separados dos gentios à mesma, diz o Ariel. Mas o que ele fez ensinou, diz o Lucas. No entanto, o Ariel mostrou que um erro de atitude pode ser cometido pelo papa. Assim, São Pedro, ao agir de forma a entender que estava negando sentar-se à mesma com os gentios fez com que muitos agissem assim também. Então, a autoridade do papa diz muito, fazendo mesmo as outras autoridades segui-lo.

Portanto, o papa pode errar em sua conduta. São Pedro errou ali e foi corrigido por São Paulo. Assim, ele voltou atrás em sua atitude, pois na sua pregação havia ensinado que não há separação entre judeus e gregos, o que disse claramente em Jerusalém. Portanto, a posição do Ariel está correta e refuta o mal entendimento do Lucas. O mesmo mostrou-se bastante calmo e preparado. Às vezes empolgou-se e ultrapassou o tempo de fala.

O Concílio decidiu coisas que a Igreja não seguiu? Estranho. O Lucas deveria mostrar onde está escrito que as Igrejas “paulinas” não deveriam obedecer ao Concílio de Jerusalém.

O Lucas entende a missa, a renovação do Sacrifício de Cristo, como a crucificação de Jesus novamente. Erro rudimentar.

Afirma que a doutrina de Karl Barth está na Igreja Católica a partir do Concílio Vaticano II. É uma afirmação. Não prova.

Afirma que Pedro não foi papa mas presbítero e cita 35 antipapas que havia na Igreja. Ele prova sem querer a historicidade do papado na idade antiga.

Depois, o Lucas comenta que Apolo recebeu imposição de mãos de uma mulher, ao que logo é respondido por Ariel: aqui não está escrito que ele recebeu imposição de mãos! Realmente o Lucas foi refutado novamente.

Então o Lucas afirma que aqueles que receberam o batismo de João não eram cristãos ainda e estavam sendo convertidos por São Paulo. É uma interpretação, já que o texto não diz que aquele grupo cria em João Batista como messias como messias. O texto chama do grupo de "discípulos", mas os mesmos não tinham a fé completa, pois não conheciam o Espírito Santo. Ao que parece a melhor interpretação é a do Ariel, e o Lucas foi novamente refutado.

De fato, a Bíblia ensina que Apolo conhecia Jesus: ensinava com precisão a respeito de Jesus (Atos 18, 25). Ensinava a respeito de Cristo, mas não conhecia senão o batismo de João. Ele não foi ensinado por São Paulo sobre Jesus, mas sobre o Espírito Santo.

O Lucas afirma que o Espírito Santo não é recebido de homens. Isso ele diz contra a sucessão apostólica. Foi provado que a imposição de mãos era o meio de ordenar as autoridades. Mas o Lucas, ainda que não apresentasse nenhum texto contrário, não aceitou a sucessão apostólica.

Afirma que a imposição de mãos é para dons e não para autoridade. Outra interpretação estranha. De fato, o texto bíblico afirma da imposição de mãos a Timóteo para autoridade sobre as igrejas e não sobre a recepção apenas de dons. É o que diz o contexto.


Gledson Meireles.





domingo, 16 de novembro de 2025

Mater populi fidelis: o título mariano de Corredentora

O sentido do título Corredentora dado à virgem Maria

A nota Mater Populi fidelis, do Dicastério para a Doutrina da Fé, trata sobre alguns títulos marianos, e tem causado debates entre os católicos e recebido enorme atenção dos protestantes.

Na internet há inúmeros vídeos e comentários sobre o tema. Há os que dizem que a Igreja mudou a interpretação, e que Maria não é mais corredentora. Outros sugerem que a interpretação não foi radical, mas que a Igreja Católica deu passos em direção à Reforma Protestante. Ou seja, essas duas opiniões afirmam que houve mudança essencial na doutrina.

O que diz a doutrina de que Maria é corredentora? Embora não seja um dogma, muito foi escrito a respeito do tema. É fé da Igreja a corredenção de Maria. E o documento do Dicastério o afirma no parágrafo 5: “A participação de Maria na obra salvadora de Cristo está atestada nas Escrituras...”.

Parece que poucos leram essa parte que tem o subtítulo de “A cooperação de Maria na obra da Salvação”.

Aos que dizem que a doutrina mudou, está aí a própria documento afirmando que não. Maria possui um papel na redenção, ela participa, como sempre ensinou a doutrina católica, como está nas Escrituras Sagradas.

No entanto, a Igreja está tratando do “título” de Corredentora e seu significado. Como se dá essa participação. É um título que tenta expressar a doutrina de sempre, mas que foi usado no século XV até o século XVIII, conforme o documento. Por isso, não é o título a própria doutrina, mas uma forma de expressá-la. E, pelo que se diz, o título não foi usado desde o início, mas foi uma expressão utilizada no século XVI para tratar do assunto que já existe.

É justa a preocupação da Igreja a respeito dos mal-entendidos que o título pode causar? A resposta é sim. Basta ver os vídeos que o tema inspira e notar que muitos não entendem a doutrina. Muitos católicos e, obviamente, os protestantes, estão entendendo a questão.

É óbvio que para o protestante Maria “não” tem cooperação nenhuma na obra da redenção. Mas a questão é debatida no orbe católico.

Claro também que Maria não é salvadora, não é redentora, não é corredentora, portanto, ela não pode salvar a ninguém, nem a si própria, pois o único meio capaz de salvar é Jesus Cristo por seu sangue derramado na cruz. Essa é doutrina católica.

E agora, qual é então essa participação de Maria na redenção? Por que os títulos de redentora e corredentora foram usados? Que papel teve Maria na redenção, que fez muitos darem o título a ela de redentora ou de corredentora? Esse é o ponto básico.

Assim, é de se esperar que as explicações não ultrapassem o dogma de que Cristo é o único Salvador. Tudo mais deve ser exposto por uma linguagem que não cause problemas o máximo possível.

Todos temos união com Deus, Pai, Filho e Espírito Santo. Mas a doutrina católica mostra a união de Maria com Deus de forma especial, pois ela foi criada para ser o meio do Filho de Deus tornar-Se Homem. Esse é ponto básico.

A relação de Maria com Seu Filho Jesus é espiritualmente usada por Deus no mistério da salvação da humanidade. Após ser salva, Maria entra no plano da salvação associada a Jesus. Assim, como ela, e depois dela, todos os salvos.

Toda a função de Maria no mistério de Deus é ser cooperadora de Deus. É o que afirma o padre Júlio Maria, no livro Por que amo Maria?. É uma forma de desenvolver uma secundária na doutrina: “Jesus é Redentor”.

Se Maria coopera em tudo com Ele, ela é corredentora. No entanto, esse título deve ser explicado para não contradizer a verdade de que Jesus é o Único Redentor.

Essa verdade vem por muitas afirmações bíblicas e patrísticas: Santo Agostinho afirma que por Maria veio a salvação. É óbvio que há um sentido para essa afirmação, e não é o de que Maria é a salvadora, mas de que por meio dela nasceu Aquele que é o Salvador. É uma forma de considerar a importância de Maria na salvação.

A doutrina bíblica de que a queda veio por um homem e por uma mulher leva a entender o mesmo da salvação. As devidas proporções devem ser mantidas. Este é o cerne da doutrina, de origem bíblica.

“Só Jesus é nosso Redentor”, afirma o padre. É interessante notar como ficam perplexos os protestantes quando vêem os padres na internet comentando a doutrina mostrando que é fé cristã católica que Jesus é o único Salvador.

Eles não compreendem como pode então haver corredentora. De fato, o nome não expressa exatamente a doutrina. Por isso, o Dicastério acerta em dizer que o título é inoportuno.

Outra explicação do padre Júlio: “As preces e os méritos de Maria Santíssima são de ordem essencialmente inferior às de Jesus”. Portanto, são de outra ordem. Só Jesus possui preces e méritos de Redenção. Os de Maria são de criatura e associados a Cristo por vontade de Deus.

E, por isso, Maria tem preces e méritos essencialmente diferentes dos demais santos, ainda que todos os santos tenham preces e méritos também. É uma forma de mostrar o papel de Maria como mãe de Jesus e associada a todo o mistério da Sua vida. Apenas isso.

Então, o título de corredentora é explicado como de “associada ao Senhor”. Parece bastante claro agora.

Vamos assim tornar tão claro como o sol ao meio dia, no verão e o céu sem nuvens, para não ficar nenhuma dúvida quanto à expressão.

Deus associa criaturas à Sua obra. Deus ilumina o mundo. E como Deus faz isso? Através das estrelas, do sol e de todo foco de luz. Poderíamos afirmar que o sol não ilumina, mas é Deus que ilumina? Seria um contrassenso.  É claro que Deus é a fonte de toda a luz, mas criou um astro para iluminar a terra, e o astro serve o criador para isso.

E Deus usa também os anjos para iluminar os outros. É o ministério angélico. Quem ilumina? Deus. Mas podemos afirmar que os santos e os anjos podem iluminar o mundo. Estão associados a Deus nesse ministério.

Assim, na obra de salvação Deus associou a virgem Maria. Seguindo os exemplos percebemos o alcance da doutrina.

“O mundo inteiro é chamado a cooperar nessa obra”, afirma o padre Júlio. E nesse âmbito fala da cooperação excelente de Maria que foi chamada por isso de “corredentora”.

Assim, se alguém disser que na lógica de Maria ser corredentora nesse sentido todo nós o somos, de certa forma está correto, guardando as devida proporções, pois se fala da pessoa de Maria em união mais próxima de Cristo, pois foi a Sua mãe, ocupando o primeiro lugar entre os santos.

Todos os santos são nesse sentido “corredentores” por seus trabalhos no Reino de Deus, por seus sacrifícios, por suas preces. Maria o é em grau máximo, pois é a primeira crente em Cristo. Esse é o entendimento cristão católico. Ela não foi a causa da sua própria salvação e nem a causa da salvação de ninguém mais. No entanto, após ser salva foi associada no ministério de salvação por Cristo Senhor, onde a Igreja, em conjunto, também exerce esse múnus salvífico. Vê-se assim a que o título se refere.

Em outras palavras, Jesus agora utiliza dos santos remidos para santificar e salvar, para distribuir Sua graça uns aos outros. E Maria, sendo Sua mãe, é unida desde o início na obra da salvação do Senhor Jesus Cristo, é ela á primeira, a mais importante nessa “corredenção”.

Nada pode ser acrescentado ao infinito. A redenção de Cristo tem valor total e infinito. Portanto, a contribuição de Maria é apenas na aplicação dos méritos de Cristo, que em grau maior ou menor participam todos os santos.

A comparação com Eva é também essencial. Eva pecou, mas seu pecado pessoal não teria infectado a humanidade se Adão não pecasse. Assim, efetivamente o pecado de Adão foi o responsável pela queda geral da humanidade. A corredenção de Maria não poderia efetivar nada se não fosse a redenção de Cristo. Maria não poderia ter sofrido por ela e por alguém mais. E ainda assim, a redenção de Cristo, sozinho, salvou a todos, mesmo Maria, e somente a partir daí, já salva e santificada, pode associar-se a Jesus para cooperar na salvação das almas.

Essa é a doutrina católica. O dicastério entende um problema apenas em relação ao título, preservando a doutrina.

A Igreja nunca ensinou que Maria participou da redenção acrescentando algo, pois é impossível, mas ela recebeu na redenção operada por Cristo, a partir da obra da salvação, a capacidade de associar-se a Ele. Assim, com ela toda a Igreja.

Gledson Meireles.