quarta-feira, 22 de maio de 2024

Sobre Apocalipse 1, 10: dia do Senhor - o domingo

 

A normatividade para a guarda do domingo: analisando o que diz Lincoln e Kenneht sobre o tema

Duas visões sobre o sábado e o domingo aparecem em publicações importantes. Uma obra protestante editada por  D. A. Carson, a favor do domingo, e outra, protestante adventista, por Kenneth Strand, em defesa do sábado. Kenneth apresenta uma resenha da obra de Carson. Vejamos o que diz ambos os lados sobre Apocalipse 1,10.

Na obra de Carson, Andrew T. Lincoln afirma que os fundamentos para a guarda do domingo no Novo Testamento não são numerosos ou tão detalhados como alguém gostaria que fosse.

Diante disso, pode-se dizer, que é sabido que desde o primeiro século o domingo é o dia de culto cristão. E Lincoln concorda com isso.

O autor alude também ao fato do domingo e do sábado serem guardados pelos cristãos primitivos. Faz avaliação do lugar e status da tradição da igreja primitiva, que é essencial para o sentido dos dados do NT e para colocá-lo em um padrão interpretativo para traçar a prática emergente da Igreja.

Essa constatação protestante é importantíssima, apontado para a necessidade da tradição. Nesse ponto, o adventismo falha na sua pesquisa.

A mais clara evidência pós-canônica possui autoridade, e alguns podem a partir disso aceitar o domingo como normativo. É o que afirma Lincoln.

Aqui, o adventismo nega peremptoriamente que se possa utilizar a evidência pós-apostólica para interpretar o NT. Aliás, esse parecer está conforme a posição de todo o Protestantismo, que segue o Sola Scriptura.

No entanto, a Igreja Católica afirma que a guarda do domingo é atestada no NT, portanto na era apostólica, e que isso é confirmado na tradição da Igreja. Assim, o que se encontra nas obras dos padres da Igreja estão confirmando a tradição e não estabelecendo-a, nem sendo fonte para interpretar o Novo Testamento. Pelo contrário, estão transmitindo o que está no NT.

Andrew T. Lincoln afirma que os reformadores, querendo fazer da Bíblia a única autoridade para fé e prática, reduziram a significância do domingo como uma mera instituição conveniente.

É preciso destacar esse ponto. A obra do Protestantismo em defesa do domingo tem esse ponto frágil, que é refutado pela Igreja Adventista do Sétimo Dia.

Os adventistas corretamente entendem que o dia de repouso e culto é sagrado e cumpre um mandamento de Deus. Esse dia é o sábado, dado por sanção divina, normativo para o Povo de Deus, parte do decálogo. Dessa forma, só pode ser transferido para outro dia por autoridade divina.

Os reformadores, por sua vez, ensinaram que o dia não era necessário, mas apenas prático, e indiferente. Assim, continua o estudo, os reformadores estavam buscando sanção canônica para a prática antes de tê-la como normativa. E, então, o que é importante perceber, eles não entenderam o significado de Apocalipse 1, 10.

Aqui é necessário outra observação. Uma obra que se põe a entender melhor a força desse texto do Apocalipse encontra algo que refuta os reformadores e se coloca em convergência com a Igreja Católica.

Lincoln afirma que o dia do Senhor indica que há algo muito mais que conveniência ou praticalidade. Há muito que pode ser conhecido por meio dessa passagem. Ela mostra que há um precedente já estabelecido. É um fato que reivindica autoridade canônica.

Continua Andrew. O mais próximo que o sábado recebe status canônico é na tolerância dada em Romanos 14. Mas a direção dada no NT é para a prática do domingo, essa recebe aprovação canônica. O domingo tem um papel distintivo no Novo Testamento.

Nos dias de São Paulo o domingo ainda não era chamado de Dia do Senhor, não tinha adquirido essa distinção, que aparece nas igrejas do fim do século. Conclui afirmando que não há implicação de que o domingo em si é santo.

Ou seja, o livro de Carson defende o domingo, como dia de guarda para os cristãos, que possui autoridade na Escritura, que é dia distinto para o culto, mas que não é dia santo, ou seja, não teria recebido algo particular para esse fim, como o sábado santificado e abençoado em Gênesis. Nesse ponto a crítica adventista ganha força.

Dessa forma, a conclusão da obra deixa essa fragilidade que é criticada pelo adventismo.

Kenneth afirma que Apocalipse 1, 10 não especifica ou identifica um dia particular. O autor adventista admite que o domingo é chamado na literatura cristã de Dia do Senhor, mas não aceita que essa seja a interpretação do texto no Novo Testamento, na passagem do Apocalipse.

Afirma que a universalidade da prática do domingo é do terceiro século, não do segundo, como está na obra de Carson. E questiona se afirmar que não há suporte canônico para a teoria da transferência e de que o domingo foi desenvolvimento medieval não seria minar a própria tese.

De fato, a observação de Kenneth é importante. Não refuta a doutrina do domingo, mas enfrenta com força a posição de Carson.

O crítico adventista afirma que o que os autores protestantes na obra de Carson apresentaram uma visão que não dá ao domingo o status normativo que reivindicam na sua análise final.

O adventismo converge com a doutrina católica em reconhecer a moralidade do sábado, porém, não entendendo que a mesma atualmente é cumprida no domingo, e as outras igrejas protestantes ensinam o mesmo que a doutrina católica quando admitem a autoridade canônica do domingo, sem, no entanto, perceber que essa autoridade divina faz do domingo um dia especial. Duas verdades precisam ser conhecidas:

 O domingo cumpre o preceito do antigo sábado.

A autoridade bíblica para a guarda do domingo torna-o dia santo.

Realmente, pode-se dizer, falta na obra de Carson demonstrar mais radicalmente a autoridade do mandamento do domingo, como é encontrada no Novo Testamento e na teologia católica.

Gledson Meireles.

 

sábado, 4 de maio de 2024

Livro: Do sábado ao domingo...: Estudo capítulo 5 - Jerusalém e a origem do domingo


Livro: Do sábado ao domingo...: livro do Dr. Samuele Bacchiocchi, adventista do sétimo dia - Estudo do capítulo 5 - Jerusalém e a origem do domingo.

O Dr. Samuele Bacchiocchi afirma que estudos de então apresentavam marcada tendência de atribuir à apostólica comunidade de Jerusalém a iniciativa e responsabilidade da mudança do sábado para o domingo.

A pesquisa de Bacchiocchi tenta ir contra a conclusão geral acadêmica, de que o domingo é de fato uma criação cristã, como citação de J. Danidlou afirma. Por exemplo, a citação da conclusão de C. S. Mosna sobre o assunto afirma expressamente que o domingo nasceu em Jerusalém.

Bacchiocchi cita P. K. Jewett, que se coloca contra a opinião de que São Paulo tenha ensinado o domingo, porque ele se pôs contra a observância de dias. Mas, podemos afirmar que, se assim o for, não haveria guarda de sábado nem de domingo, e um dos mandamentos, que são 10, teria caído. Por isso, a opinião de Jewett é evidentemente falha.

Outra afirmação de Jewett é de que os judeus acusariam os cristãos gentios de estarem contra a Lei, caso guardassem o domingo ao invés do sábado. Contudo, como podemos observar nesse pormenor, que os dias de sábado e domingo eram respeitados desde o início, e, portanto, não havia essa questão de substituição, como se a guarda do sábado fosse proibida. E o autor também compara com o caso da circuncisão, citando Atos 21, 21. Esse ponto é importante, pois a questão do sábado está embutida nesse tema, embora os adventistas tentem negar isso.

E o que está escrito em Atos 21, 21 é o seguinte: “Eles têm ouvido dizer de ti que ensinas os judeus, que vivem entre os gentios, a deixarem Moisés, dizendo que não devem circuncidar os seus filhos nem observar os costumes (mosaicos).

Essa passagem mostra que havia o boato de que São Paulo pregava contra a circuncisão e guarda da Lei. Note bem o leitor que essa consideração geral da guarda da Lei inclui o sábado. Temos assim que os judeus cristãos tendiam a conceber a necessidade de que os gentios fossem circuncidados e guardassem a Lei para permanecer na Aliança. Contudo, tal questão já havia sido definida pelo Concílio de Jerusalém.

Também que os judeus convertidos não abandonavam o zelo pela Lei (cf. Atos 21, 20). Desse modo, a posição de São Paulo estava sendo mal entendida. Mas fica evidente que o mesmo não ensinava o sábado aos cristãos convertidos que eram de origem gentia, aliás, a maioria do público que ouvia o apóstolo dos gentios. O boato tinha a ver com o fato do apóstolo ensinar os judeus que vivem entre os gentios.

Por outro lado, São Paulo concedia aos judeus cristãos continuarem a praticar muitos preceitos da Lei, como ele mesmo o fez para exemplificar sua posição. Por isso, não existe qualquer controvérsia que envolva sábado e domingo nos escritos paulinos e nem no conjunto do Novo Testamento. O que há é o ensino da liberdade dos cristãos em relação à circuncisão e à Lei, o que inclui o sábado.

Os apóstolos poderiam ter iniciado a guarda do domingo e a autoridade da Igreja de Jerusalém foi responsável pela adoção dessa prática em todos os lugares. Isso é negado pelos adventistas, mas, de fato, foi justamente isso que aconteceu.

Cristo deve ter dado instruções diretas aos apóstolos, ou o Espírito Santo pode tê-los iluminado quanto a esse costume. O fato é que o domingo é parte da tradição apostólica. O Dr. Bacchiocchi admitiu que o princípio é válido no que foi apresentado. Os cristãos só acatariam uma doutrina se essa viesse da autoridade apostólica. Basta ao adventista reconhecer esse princípio.

A citação de Eusébio sobre os ebionitas que guardavam o domingo como nós, pode indicar de fato que aqueles hereges adotavam o domingo por saberem que essa prática era de origem apostólica. Sendo assim, esse modo de expressão de Eusébio reflete a tradição apostólica da guarda do domingo. O caso dos ebionitas é importante de fato para entender toda a questão.

O Dr. Samuele considera os argumentos persuasivos, mas testa-os à luz da informação neotestamentária e patrística sobre a composição étnica e orientação teológica da comunidade de Jerusalém. Ou seja, se em Jerusalém há predominância de judeus cristãos, acredita que o argumento perderia valor. Somente se fosse encontrado um número expressivo de cristãos gentios é que tal cenário poderia dar origem à guarda do domingo.

Contudo, é essa consideração forte o suficiente para refutar os argumentos dados pelos estudos profundos a respeito do domingo? É o que veremos.

O primeiro dado citado é a expulsão dos judeus e cristãos judeus pelo imperador Adriano. Assim, Jerusalém teria se tornado insignificante demais para influenciar o resto da Cristandade. Porém, sabemos que, ainda que Jerusalém tenha se tornado menos expressiva, os apóstolos São Pedro e São Paulo lançaram as bases da fé cristã na cidade de Roma, para onde foi transferida a autoridade de Jerusalém. Desse modo, essa constatação histórica sobre Jerusalém explica a crescente influência de Roma.

Lendo Atos 2, 46 e Atos 5, 42, o Dr. Bacchiochi conclui que pelo primeiro texto teríamos sugestão de uma diferença entre a pregação evangelística e as reuniões privadas dos cristãos. Mas entende que o segundo texto não implica essa distinção formal. Em Atos 2, 46 vemos uma reunião dos cristãos já convertidos. De fato, eles partiam o pão nas casas. Não se trata de ir às casas levar uma refeição ou ir tomar refeição nas casas, mas celebrar a eucaristia. Isso não era feito no templo.

Mas, em Atos 5, 42 há a ideia de pregação evangelística nas casas. Eles ensinavam e pregavam o evangelho de Jesus Cristo no templo e nas casas. Isso não sugere que todas as pessoas no templo se juntavam aos cristãos judeus em seu culto cristão. O mesmo pode ser dito que não é esperado que todas as casas de judeus já realizavam o culto cristão com os cristãos convertidos. Portanto, a inferência que o Dr. Bacchiochi faz na comparação dos textos não está correta.

De fato, o Dr. Bacchiochi entende essa diferença, ao continuar sua apresentação, mas afirma que não há conflito entre as reuniões do templo em relação à reuniões privadas, onde os cristãos expressavam mais livremente e completamente o conteúdo de sua fé no Senhor ressuscitado. Esse ponto merece outra observação.

É natural que fosse assim. Os judeus acostumados a frequentar o templo e as sinagogas não foram proibidos por Cristo de continuarem a praticar a Lei de Moisés. De fato, o AT é seguido pelo NT como desenvolvimento natural. O Messias de Israel e o Cristo da Igreja.

Desse modo, Jesus é o messias profetizado nas Sagradas Escrituras. Não poderia haver conflito quanto aos cristãos frequentando o templo e as casas. Entretanto, permanece o fato que, nas casas havia a celebração da santa missa, o que não poderia ser feito no templo.

Cristo ensinava nas sinagogas, e também reunia-se com os discípulos, em outro lugar, para dar-lhes instruções do evangelho e explicar-lhes o sentido das parábolas. Os apóstolos seguiram esse modelo. Após a ascensão, eles pregavam primeiramente nas sinagogas. E depois disso, iam aos gentios. Apolo não foi reunir-se com cristãos na sinagoga, mas foi ali pregar o evangelho. Os cristãos que lá estavam, Priscila e Aquila, por exemplo, tinham ido com o mesmo intuito. O verso 27 mostra que a Igreja contava com organização própria, onde os irmãos animaram-no escreveram aos discípulos que o recebessem bem.

A questão de se a aceitação do Messias criou exigência de adotar novo lugar de adoração, parece já respondida. Os cristãos se reuniam, a sós, para celebrarem os mistérios próprios do Cristianismo, para batizarem, impor as mãos, etc., não no templo e nas sinagogas.

Assim, não se deve negar a ligação da Igreja de Jerusalém com os costumes religiosos judaicos, mas apenas entender que, ainda assim, havia momentos de reunião especialmente cristãos, havia prática da doutrina cristã, como foi admitido pelo Dr. Bacchiocchi quando diz que nessas ocasiões eles expressavam sua fé mais livremente e completamente. Isso é admitido. Havia reuniões privadas complementares. E essa admissão contradiz o que o autor inferiu dos textos.

É interessante que o doutor Bacchiocchi reconhece a influência da sinagoga entre os cristãos. Isso explica muito a liturgia da Igreja Católica. Não houve abandono das sinagogas pelos cristãos, pois esperavam que todos abraçariam a nova fé. Esse ponto é pacífico e está de acordo com a doutrina católica.

A escolha do domingo seria para diferenciar dos judeus, segundo O. Cullmann, citado. C. S. Mosna afirma que os cristãos se separaram do templo e da sinagoga muito cedo devido as perseguições dos líderes religiosos. Cita At 8, 3 e 9, 2, o que faz muito sentido. Mas o Dr. Bacchiocchi afirma que isso não aconteceu drasticamente nem imediatamente. Sua tese é de que os cristãos em Jerusalém continuaram a ser zelosos pela Lei.

De fato, o eram. Mas não ensinavam a Lei aos cristãos gentios. Apenas dos cristãos judeus se esperava que continuassem com seu zelo pela Lei judaica.

Menciona a tese de que os helenistas podem ter introduzido a guarda do domingo, que é destituída de fundamento. E logo após, afirma que há muitas indicações de que os cristãos de Jerusalém guardavam o sábado regularmente.

É óbvio que o domingo veio a ser guardado pelos cristãos ao mesmo tempo em que guardavam o sábado, ainda que o sétimo dia já fosse entendido como sombra da Antiga Aliança.

Assim como os cristãos judeus batizavam e também circuncidavam seus filhos, sem notarem qualquer discrepância entre as duas práticas, sem ver qualquer tensão entre batismo e circuncisão. Também, como tinham suas reuniões em outros lugares, e frequentavam o templo e as sinagogas. Mas, não levavam os cristãos gentios ao templo. Todas essas coisas eram motivo de controvérsia somente caso se quisesse impor sua observância aos cristãos gentios.

Afirma o dr. Samuele que a Igreja de Jerusalém, ou seja, a comunidade cristã da cidade de Jerusalém, originou-se do núcleo dos doze apóstolos. Isso está correto. A atitude dos cristãos de Jerusalém, onde grande maioria era de origem judaica, era de observância das leis religiosas judaicas, segundo o entendimento do Dr. Bacchiocchi.  E cita Atos 21, 20.

É certo que São Paulo fez uma promessa a ser cumprida no templo, para que os cristãos de Jerusalém vissem que também tu guardas a Lei. Obviamente, nada disso podia ser exigido dos que creram dentre os gentios (v. 25), pois eles deviam seguir apenas as orientações do Concílio de Jerusalém quanto a esses pormenores judaicos.

Quanto aos judeus, podiam seguir prescrições legais, onde até mesmo votos, no fim dos quais devia oferecer um sacrifício a favor de cada um deles.

Lendo essas passagens isoladamente, poderia alguém afirmar que São Tiago e os anciãos de Jerusalém, e São Paulo, com eles, guardava toda a lei, como a circuncisão, os votos, as purificações, os sacrifícios. No entanto, lendo Gálatas, Romanos e Hebreus fica evidente que não era essa a mensagem da Igreja. Essa constatação já refuta drasticamente a leitura do Dr. Bacchiocchi.

Note bem o leitor que os cristãos gentios não criam nem praticavam essas prescrições. Também não podiam entrar no templo. Dessa forma, não se pode pensar que a Igreja se reunia no templo para cultuar a Deus. Veja que nos versos 28 e 29 está escrito que os judeus acusaram São Paulo de ser contra o povo e contra o templo, e de introduzir até gregos no templo, profanando o lugar santo. “É que tinham visto Trófimo, de Éfeso, com ele na cidade, e pensavam que Paulo o tivesse introduzido no templo.”. Assim, os cristãos gentios não podiam praticar a Lei sem que fossem circuncidados.

Por isso, sabemos que os cristãos judeus eram zelosos da Lei, mas não impunham as observâncias legais aos cristãos gentios. Era um modo de sepultar a lei que há tanto tempo praticavam.

Esses cristãos celebravam a ceia, batizavam, impunham as mãos (que hoje é a crisma), ungiam os doentes com óleo (a unção dos enfermos), pregavam que Jesus é o salvador, celebravam ressurreição, que são doutrinas cristãs. Portanto, guardavam o domingo.

E como judeus que eram, guardavam outras obrigações legais, como circuncisão, purificações, votos, sacrifícios, festas, que são parte do judaísmo. Não podiam fazê-lo como algo obrigatório, mas livremente. Dessa forma, igualmente guardavam o sábado, sem impô-lo a ninguém mais.

São Tiago, chamado irmão do Senhor, era um dos apóstolos. De fato, ele foi chamado de Tiago menor. Era parente de Jesus, talvez um primo Seu, ou filho de São José de um casamento anterior.

Se os judeus cristãos de Jerusalém se preocupavam com as instituições judaicas como a circuncisão, não se pode por isso afirmar que estivessem guardando a Lei da mesma forma. Também não se pode afirmar que não praticavam os sacramentos e tudo o que é próprio da nova Lei de Cristo. Dessa forma, essa afirmação sobre a ligação dos cristãos de Jerusalém à lei de Moisés harmoniza-se com a guarda do domingo, pois não havia tensão entre as duas práticas, entre o que havia restado da Lei antiga e o que já estava em vigor na Lei do Evangelho.

Dessa forma, a estrita preocupação com a lei não é contrária à abolição do sábado como dia de guarda. O mesmo era praticado, mas não mais imposto aos novos convertidos, assim como tudo mais citado acima. Era uma sombra que já tinha passado.

Assim, não deve causar espanto que o sábado fosse guardado nesses termos. O sábado não havia sido substituído, pois o domingo era guardado juntamente também. Assim, entende-se o silêncio sobre controvérsias, que nesse quesito não havia.

São Paulo também celebrava o Pentecoste judaico e os pães ázimos (cf. At 20, 16. 6). Essas práticas nunca foram ensinadas na Igreja. Entretanto, isso não indica que os cristãos regulavam suas vidas pelo calendário judaico, como pensa o autor adventista, mas como visto, que os cristãos judeus ainda cumpriam preceitos da lei, sem ensiná-los aos convertidos.

O apóstolo de fato ensinava que os cristãos não deviam circuncidar os seus filhos e nem observar a Lei (cf. Atos 21, 21). No entanto, pessoalmente era zeloso da lei, como judeu fariseu que sempre foi, mas agora convertido.

A observação feita, citando R. C. H. Lenski, de que os cristãos viviam como judeus, circuncidavam seus filhos, comiam kosher, guardavam o sábado, etc., é verdadeira. No entanto, como já observado, esses eram os cristãos judeus, que também celebram tudo o que Cristo ensinou, evangelizando, crendo na salvação no Nome de Jesus, o Messias, batizando, celebrando a eucaristia, etc. Tudo isso mostra as circunstâncias de que guardar o sábado estava de acordo com a guarda do domingo também. Supor o contrário não condiz com os dados trazidos pelo autor.

São Paulo afirma que o que considerava ganho, teve-o por perda (Fl 3, 7). Isso mostra que era judeu fariseu, mas cristão acima de tudo.

As sombras representam o transitório. Essa explicação do Dr. Bacchiocchi está correta. Nada do que foi mostrado pode provar que o apóstolo tenha continuado a guardar o sábado e ensinado o mesmo aos cristãos. Doutra forma, dever-se-ia concluir que ensinasse tudo mais o que estava na Lei.

O Dr. Bacchiocchi conclui: “É portanto impossível assumir que um novo dia de culto foi introduzido pela Igreja de Jerusalém antes da destruição da cidade em 70 d. C..”. Mas isso não foi provado. Foi pressuposto que, sendo os cristãos judeus excessivamente ligados à Lei, não poderiam guardar o domingo, o que foi mostrado ser um equívoco. Basta lembrar que os mesmos cristãos judeus guardavam tudo o mais do evangelho.

Então, o domingo era guardado juntamente com o sábado, assim como a circuncisão era praticada ao lado do batismo. Mas, os cristãos gentios guardavam apenas o domingo, e batizavam seus filhos. Não havia tensão sobre a prática em si. O problema se deu quanto à obrigatoriedade dessas práticas como parte da doutrina do evangelho. Assim, nem o sábado nem a circuncisão foram ensinados pelos apóstolos aos gentios.

Os cristãos judeus de Jerusalém podiam observar as festas da Páscoa, Pentecostes e Tabernáculos, ser circuncidados, guardar o sábado e as regulações alimentares mosaicas. No entanto, nada disso contrasta com o que ensinavam e praticavam como parte do evangelho. Assim, também guardavam o domingo harmoniosamente com o sábado.

Quando Eusébio afirma que os ebionitas guardavam o sábado e o domingo, isso é evidência maior de que a Igreja observava o domingo, de modo que essa seita cristã mantinha costumes cristãos e judaicos.

Quais são as suposições gratuitas da tese que nasce do caso dos ebionitas? A primeira seria supor que os ebionitas que observavam o domingo representavam os seguidores da prática original do cristianismo judaico. Isso é de fato muito significativo, como já provado acima, e não parece nada com suposição gratuita.

E quanto ao que Santo Ireneu (130-200) afirma dos ebionitas? O Dr. Bacchiocchi não cita todo o texto de Santo Ireneu a respeito dessa seita, nem mesmo na nota. O que Santo Ireneu escreveu é importante, pois afirma que os ebionitas repudiam São Paulo, por considerá-lo apóstata da lei. Isso significa que conheciam bem que São Paulo não ensinava a lei aos cristãos.

A nota 67, citando São Justino, afirma tudo o que já está provado acima. O Dr. Bacchiochi nota que não é dito que os judeus cristãos guardassem o domingo. Mas isso não era necessário, e o contexto mostra que também não diz que praticassem quaisquer outras doutrinas cristãs. Mas sabemos que as praticavam. Do contrário, não seriam cristãos. O assunto em questão era a prática da lei pelos cristãos judeus.

Na verdade, o domingo e o sábado não estavam em oposição, e por isso São Justino não contrasta os dois dias em sua apologia.

Se São Justino não refere os judeus cristãos como guardadores do domingo, e ao mesmo tempo mostra a superioridade do domingo sobre o sábado, pressupõe isso que no seu tempo os judeus cristãos não guardavam o domingo? Isso seria um estranho demais. De fato, esses judeus cristãos seriam uma seita, e são Justino iria denunciá-los como hereges, assim como denuncia os ebionitas.

Os nazarenos seriam, aos olhos dos adventistas, herdeiros diretos da comunidade cristã de Jerusalém. No entanto, contra isso, os escritos antigos afirmam que se trata de uma seita cristã. E assim, os nazarenos ensinavam a circuncisão, o sábado e etc.

A guarda do sábado pelos nazarenos significaria que o sábado seria o dia de culto cristão em Jerusalém, conforme pensa o autor adventista.

Dificilmente poderia ser. Essa seita não praticava a mesma doutrina que os demais cristãos. Esse era o ponto de discordância, e o que os fazia ser hereges.

Que os cristãos judeus iam às sinagogas, isso ficou claro e não há nada que prove que os mesmos não guardassem o domingo. De fato, como cristãos, não eram mais bem-vindos nas sinagogas, como afirma o tópico sobre a maldição dos cristãos.

Quanto ao imperador Adriano, esse proibiu o estudo da Torá, a circuncisão e a guarda do sábado. Isso mostra mais uma vez como essas coisas estão interligadas.

E a indicação de que havia distinção clara entre os bispos de origem judaica e os bispos de origem gentia é considerada pelo Dr. Bacchiocchi não apenas em consideração ao fator racial, mas também, em relação à orientação teológica, como por exemplo, em referência à páscoa e ao sábado.

No entanto, como vimos, isso não pode ser um fator de divisão, pois os bispos judeus, assim como São Paulo, não impunham a circuncisão e o sábado aos cristãos gentios.

Desse modo, tudo o que foi estudado no capítulo, avaliando cada linha de argumento, mostra que a origem do domingo em Jerusalém está estabelecida.

Gledson Meireles.


quarta-feira, 1 de maio de 2024

Sábado e Domingo: estudo de um artigo adventista de Kenneth Strand

O Sábado e o Domingo

Estudo do artigo “Como o domingo tornou-se dia popular de culto – parte 2”, de Kenneth A. Strand, Ph.D., professor adventista de teologia histórica e Novo Testamento.

Aqui será feita uma leitura diversa dos fatos históricos apresentados pelo professor Kenneth. De fato, através da sua apresentação será mostrado o fundamento bíblico do domingo.

Pelo artigo de Kenneth A. Strand podemos perceber que o domingo tem o status sagrado desde os tempos apostólicos. A origem do sábado é bastante conhecida na Bíblia, desde o AT. E no NT temos a origem do domingo. Como poderia o domingo coexistir com o sábado durante séculos, lado a lado como sagrados, se não fosse a importância do domingo conhecida por tradição apostólica? A única explicação para tamanha importância do domingo é que o mesmo foi do dia de repouso e culto cristão desde os dias de Cristo e dos Seus apóstolos. As legislações imperiais teriam se encarregado de oficializar a transição. Mas o que vemos é que sendo o domingo o dia em que os cristãos celebram os mistérios santos, as leis apenas estavam exprimindo essa realidade.

Introdução: Se o sábado e o domingo eram guardados lado a lado na Igreja, isso se deve ao fato de que o domingo é o dia de guarda do cristão, e a Igreja conversou o sábado herdado da antiga aliança. Desse modo, na teologia católica, não se vê contraste entre o sábado e o domingo.

E qual o dia “para os serviços de adoração semanal”? Segundo Kenneth esse foi o sábado. E qual a prova? Afirma que foi apresentada em seu artigo anterior.

No entanto, é muito claro que no Novo Testamente o dia de culto e adoração é o domingo.

Historicamente, o teólogo irá investigar quando, onde e como o domingo tornou-se conhecido como dia especial para os cristãos. Se tivermos em mente o fato da ressurreição, entendemos que aí está a origem do domingo. Não considerando isso, deve-se partir para outras teorias. Vejamos como isso é feito pelo teólogo adventista.

Em primeiro lugar, o autor afirma que há evidência clara, considerada a primeira evidência, da guarda do domingo, no ano 130 d. C. Nesse tempo, muito próximo à era apostólica, muitos que conheceram os apóstolos estavam vivos. A guarda do domingo não poderia ter sido introduzida como algo estranho, pois doutro modo seria iniciado intenso debate na Igreja. Portanto, o fato de nesse tempo ser admitido que há evidência clara para a observância do domingo, é um dado que está conforme a tradição apostólica. Os cristãos observavam o domingo porque esse era o dia de guarda deixado por Cristo e pelos apóstolos.

Os sábados presentes então, são mostrados como inaceitáveis a Deus, e o domingo é apresentado como dia de júbilo e da ressurreição de Jesus. A referência de São Justino, reconhecida pelo autor adventista como direta e mais claramente à observância do domingo, data do ano 150 d. C.

Sendo uma apologia cristã, refere-se à guarda do domingo como algo original, como prática da Igreja, e não indica que tenha havido mudança quanto a isso. Essa forma de expressar-se está de acordo com a tradição apostólica, pois aquilo que é transmitido como verdade revelada desde os apóstolos tem essa marca de reconhecimento unânime. Nota-se que São Justino fala do domingo como dia de reunião de todos os cristãos para celebrar a missa. Essa prática antiga e consolidada já em seu tempo.

E o autor adventista considera que São Justino escreveu algo que manifestava inclinação anti-sabática no Diálogo com Trifo. Se essa é a posição, concorda com a referência anterior, vinte anos antes, que mostra os sábados como inaceitáveis. Se São Justino mostra o domingo como dia de culto cristão e se refere à abolição do sábado, isso está conforme a tradição, pois em Colossenses 2, 16-17 os sábados estão entre as sombras.

Roma e Alexandria: Se há essa realidade, onde o domingo é o dia de guarda e o sábado recebe atitude negativa nesse quesito, essa é a tradição apostólica, e não uma inovação. Que o leitor perceba esse primeiro dado que é mostrado pelo autor adventista.

Ainda, o teólogo fala de uma regra geral de que o culto cristão era realizado no sábado em todo o mundo cristão no quinto século, com exceção de Roma e Alexandria. Se tivermos em mente as declarações de São Barnabé e São Justino, de que o domingo é o dia de guarda e o sábado não é mais observado assim, temos que há uma tensão aí. Se no segundo século é evidente que o domingo é guardado, não se pode afirmar que o sábado é o dia de guarda e culto em todo o mundo cristão.

No entanto, se se tem em mente que o sábado é também um dia respeitado e celebrado pelos cristãos, segundo o domingo o dia principal na semana, esse dado concorda com a tradição apostólica. De fato, é isso que Sócrates e Sozomen afirmam, quanto dizem que ambos os dias são guardados. Mas, na citação de Sócrates Scholasticus, ele afirma que os cristãos celebram os mistérios sagrados no sábado, e que Roma e Alexandria cessaram de fazer isso. E Sozomen afirma que em Constantinopla, em quase todos os lugares, os cristãos reúnem-se no sábado e no domingo, diferentemente de Roma e Alexandria. Assim, escreve o teólogo adventista: “Assim, “em quase todos os lugares”, através da cristandade, exceto em Roma e Alexandria, havia serviços de culto cristão, tanto no sábado quanto no domingo, no final do quinto século.

Doutro modo, pensaríamos que a Igreja em toda parte guarda dois dias, e que não estava conforme a doutrina de Roma e Alexandria, o que não é exato, já que é unanimidade na antiguidade, como testemunha Santo Irineu de Lion, de que as igrejas em toda parte devem estar em conformidade com a doutrina praticada na Igreja de Roma.

Ainda, se em 130 d. C. e 150 d. C. temos evidências claras da guarda do domingo, não parece que Roma tenha deixado de guardar o sábado, pois isso estaria em conflito com todas as demais igrejas espalhadas em todo o mundo, causando a maior das controvérsias. Ainda, durante séculos haveria silêncio quanto a essa divergência de prática. Temos de admitir, até aqui, que o sábado podia ser guardado, mas não como obrigação para o cristão. Por esse motivo, havia o costume geral de guardar os dois dias, e isso não era causa de divisão na igreja.

E então o teólogo adventista põe-se a investigar o que levou Roma e Alexandria a adotar tão precocemente o domingo. Essa questão deve ser feita ao mesmo tempo em que se reconhece que em todos os lugares o domingo também é guardado juntamente com o sábado. Isso sugere que o mesmo ocorria em todas as comunidades cristãs, que guardavam o domingo desde os dias de Cristo e também continuavam a celebrar a missa aos sábados, honrando o dia de descanso da Antiga Aliança. Assim, trata-se de admitir que o domingo era guardado em toda a parte nos primeiros séculos.

Quanto a essa realidade, o teólogo investiga o motivo da observância dominical ter sido tão prontamente aceita pelo restante da cristandade ao lado do sábado. Se aceitamos que o domingo é de origem apostólica, isso já está respondido. O sábado judeu foi honrado pelos primeiros cristãos e permaneceu na vida da Igreja ao lado do novo dia de culto e adoração cristã, o domingo, de modo que não há tensão entre os dois dias nesse sentido. Essa tensão só aparece quando se trata de impor o sábado como dia de culto e contraposição ao domingo. Lembra a circuncisão, que podia ser feita, desde que não fosse imposta a ninguém. Do contrário, significaria estar apartado de Cristo.

E algo muito importante é constatado pelo autor adventista. O sábado não foi prontamente substituído pelo domingo após a ressurreição. De fato, ele considera assim por motivo das fontes históricas mostrarem que o sábado ainda continuava sendo observado ao lado do domingo.

Também afirma que é incorreta a opinião de que o domingo foi influência do paganismo, o que carece de prova e é absolutamente improvável. Tudo isso mostra que a teologia do domingo é muito mais profunda do que muitos pensam.

Ele admite que os cristãos nunca teriam mudado de prática subitamente por influência pagã. Cita São Justino, que foi mártir. Dessa forma, podemos afirmar que São Justino não guardaria o domingo se esse não fosse fundamentado na Bíblia e na tradição.

Festa das primícias: O autor adventista nota que o domingo foi originalmente visto como dia em honra à ressurreição de Cristo e não como um sábado. Essa distinção é interessante nos estudos adventistas. Mas, também, indica que certamente os cristãos guardavam os dias de sábado e domingo de forma diferente dos judeus.

A explicação sobre a festa das primícias, e da imolação do cordeiro pascal é valiosa. A data escolhida pelos fariseus e pelos essênios é algo importante nesse debate.

É bem provável que os cristãos, seguindo a tradição, entenderam o dia após um sábado semanal de Levítico 23 como o domingo. A afirmação de que os cristãos naturalmente continuariam a celebrar as primícias não é exata, a não ser no contexto acima aludido, onde não há mais obrigatoriedade. Quanto à teologia de Cristo como primícias e a importância máxima da ressurreição, isso corrobora a teologia dominical. Assim, a origem do domingo é eminentemente bíblica.

Início da guarda do domingo: A afirmação de que os cristãos não guardavam o domingo como festival da ressurreição semanalmente é improvável. A citação feita pelo próprio autor adventista, de São Justino em 150 d. C., afirmando que no dia chamado domingo os cristãos se reuniam, prova que isso não era uma vez por ano, mas semanalmente.

Então, refere-se à controvérsia da páscoa, irrompida no segundo século. Os cristãos deviam celebrar a páscoa numa data fixa ou não? A tradição geral apontava para a data do domingo. O próprio autor adventista mostra isso: “Mas os cristãos na maior parte do restante do mundo, incluindo Gália, Corinto, Ponto (no Norte da Ásia Menor), Alexandria, Mesopotâmia e Palestina (mesmo em Jerusalém), mantinham-se fiéis a uma Páscoa no domingo.” Mesmo em Jerusalém os cristãos celebravam a páscoa no domingo. Esse costume foi levado para Roma. E na autoridade apostólica, exercida pelo papa, mais tarde essa posição foi aceita em toda a Igreja Católica. Qual era a verdadeira posição apostólica? Certamente aquela que o magistério defendeu, a que o papa ensinava.

Eusébio de Cesareia relata a controvérsia sobre a páscoa, e menciona a tradição remota da Ásia. Mas afirma que a tradição apostólica era de que o jejum havia de ser encerrado no domingo. Aqui temos a ideia de tradições locais em comparação à tradição apostólica. Essa última é sempre presente no sentir da Igreja Católica, no consenso geral dos santos padres, dos doutores, dos teólogos, dos sínodos, das encíclicas e bulas papais e dos concílios.

Assim, prova-se que no domingo não foi inovação romana tardia. Ele tem origem bíblica.

Quanto ao mais antigo domingo cristão como prática anual, isso não ficou claro. Supõe-se que a festa das primícias continuou a ser celebrada pelos cristãos. Isso é improvável. Por meio dessa suposição, desenvolve-se a ideia de que a celebração do domingo, como a festa das primícias, era anual. O que também carece de historicidade.

A tese de que não havia ambiente psicológico para celebrar semanalmente o domingo como dia da ressurreição, deixa de explicar como o domingo era celebrado semanalmente desde do início juntamente com o sábado. Que motivação tinham os cristãos para celebrá-lo? A próxima doutrina da ressurreição, que é de máxima importância, garante que essa foi a festa semanal observada no domingo. Desse modo, pensar em desenvolvimento de um domingo anual, para domingos entre páscoa e pentecostes até o domingo semanal não é tão pungente. Entretanto, ele exprime da teologia do domingo e ajuda a entender como esse dia nasceu da doutrina bíblica.

Em Roma e Alexandria o domingo semanal aparece com clareza. O autor entende que ali ele foi substituto do sábado. Mas não há razão para isso, reconhece, pois ambos os dias aparecem juntos. Assim, não desenvolvendo o argumento como está sendo feito aqui, e negando a tradição apostólica, ele se põe a procurar a origem do domingo semanal substituindo o sábado em Roma.

O domingo substitui o sábado em Roma: o autor aponta um sentimento anti-judaico no  início do segundo século. Mas, poderíamos perguntar, não foi esse sentimento o mesmo que vemos nas páginas do NT, nas controvérsias sobre a Lei, a circuncisão, o sábado, a leis alimentares e etc? É preciso considerar a natureza dessas discussões.

O imperador Adriano, em 135, proíbe a circuncisão e o sábado. A identificação com os judeus pode ter sido evitada e levado à adoção de práticas distintas por parte dos cristãos, em Alexandria, por exemplo. Essa é uma tese interessante.

No entanto, parece equivocado afirmar que os cristãos de Roma e Alexandria procuraram um substituto para o sábado semanal. Deviam apenas deixar de guardá-lo, talvez, pois já tinham o domingo, como provado anteriormente.

O fato do costume do jejum em Roma, tornando o sábado um dia triste, não pode ser entendido como o objetivo da prática. Era parte da devoção cristã realizar o jejum, para lembrar de Cristo no sepulcro.

Parece que a explicação supõe que somente o sábado era o dia de culto em Roma. Sendo assim, tornado dia de jejum, foi depois substituído pelo domingo. Essa suposição que transparece no estudo, também não explica que os dois dias apareçam harmoniosamente juntos na Igreja em geral durante séculos. Portanto, em Roma, também, o sábado era honrado com o domingo. As devoções podem ter sido diversas.

O autor fala de medidas tomadas para substituir o sábado pelo domingo em Roma e Alexandria. Conquanto tenha em mente que o domingo não entrou na Igreja por influência pagã, afirma que pode ter havido alguma influência na substituição. E, como adventista, afirma a tese de que o domingo pagão teve efeito sobre o Cristianismo pós-Constantino.

Aqui há algumas coisas a serem realçadas. Uma constatação do próprio autor adventista de que o domingo foi guardado pelos cristãos desde o século segundo, provado com evidências históricas.

Também a admissão de que o domingo tem motivações bíblicas, como mostrou no estudo sobre a festa das primícias e da importância da ressurreição. E, também, que o domingo pagão teve influência na Igreja, após Constantino.

Sendo assim, o domingo teria sido reforçado pelas leis do Estado para tornar sua observância mais efetiva, mas não teria sido jamais uma inovação, nem algo pagão entre os cristãos. O primeiro dia da semana cristão coincidiu com um costume que os pagãos tinham, sem qualquer influência mútua.

Ver nota 15

Com base nessa pressuposição, o autor adventista pensa na origem do domingo ao lado sábado na Cristandade, como se o domingo surgisse posteriormente entre os cristãos em outras localidades. Não há fontes históricas para isso.

Então, afirma que em muitos lugares os dois dias se chocassem, como havia ocorrido em Roma e Alexandria no segundo século.

Isso está mais uma vez demonstrando que o domingo vem do primeiro século. Foi guardado em Roma e Alexandria e em toda parte, com provas históricas já no século segundo.

Qual é o “dia do Senhor”?: Clemente de Alexandria chama o domingo de dia do Senhor. Ele o fez no final do segundo século. Mas isso não indica nem prova que tenha sido o surgimento dessa expressão relativa ao primeiro dia da semana.

Aliás, o próprio contexto em que São Clemente usa para expressar o conceito de dia do Senhor indica que ele está mostrando que o domingo foi profeticamente mencionado mesmo no paganismo, o que mostra que a teologia do domingo era apostólica.

Quanto à frase de Santo Ireneu, interpretada como indicando que Pentecostes e dia do Senhor seriam Pentecostes e Páscoa, eventos anuais, já foi falado algo a respeito acima.

A citação Didaquê 14,1 seria ambígua. Mas é indicativa de que se trata do domingo, dia de reunião. O contexto histórico aponta para isso. Assim, é algo a mais em favor do domingo.

Não se pode afirmar que o dia do Senhor é a páscoa. O batismo não era apenas realizado na páscoa.

Santo Inácio faz a distinção entre sabatizar e viver conforme o Senhor. A tradução comum: observância do dia do Senhor é mais convincente. O autor afirma que a tradução uma vida de acordo com a vida do Senhor é a melhor. (ver interpretação sobre o povo ser os profetas)

Quanto a sabatizar significar o legalismo, isso é correto. É o que explica o contexto de toda essa discussão, quando se encontra o sábado sendo contrastado com o domingo.

Um dia de jejum: As referências ao sábado e ao domingo aumentariam no quarto século e muitas dessas tinham implicação de controvérsia, afirma o autor. Mas as referências não mudam o que foi dito até aqui. O sábado é honrado juntamente com o domingo.

As Constituições Apostólicas, São Gregório de Nyssa e Amaséia são claros em dizer que ambos os dias são guardados pelos cristãos. Sendo assim, nesse tempo, de controvérsia, a doutrina do domingo está estabelecida e também há devoção para com o sábado.

Outros líderes são citados como anti-sabáticos: São João Crisóstomo, contemporâneo dos demais mencionados acima.

No entanto, a citação feita mostra o que já está explicado antes. O que São Crisóstomo afirma diz respeito a cristãos jejuando e guardando os sábados da mesma maneira que os judeus, o que já está no âmbito da doutrina judaizante. Esse modo não é o mesmo que é referido pelos outros autores, que certamente também eram não-judaizantes. Há aqui a mesma posição dos demais.

Tertuliano e Hipólito são citados como opondo-se ao jejum no sábado. On Fasting cap, 14. Contra Marcião IV, 12. E Santo Hipólito, no Comentário a Daniel 4, 20, alude ao jejum no sábado e no domingo que Cristo nunca indicou.

Ele fala de alguns se valem de visões e ensino dos demônios, e determinam jejum no sábado e no domingo, o que Cristo não determinou. Isso não é o mesmo que estar contra o jejum nesses dias, mas apenas refutar essa ideia de que o costume é dogmático. Havia liberdade para jejuar ou não, conforme ensina Santo Agostinho. A doutrina é a mesma.

Tertuliano afirma que não se deve galatizar, aludindo ao ensino do Novo Testamento na epístola aos Gálatas. Afirma ainda, que se há nova criação em Cristo as solenidades devem também ser novas. Essa princípio refuta a ideia de que os cristãos continuaram a praticar preceitos da lei.

A controvérsia do quarto e quinto século que teria sido intensificada não diz respeito a algo de grande importância, pois ainda que tradições locais divergiam entre si, a tradição apostólica testemunhada, como doutrina geral, era de que a doutrina sobre o jejum nesses dias não era algo imutável. O artigo ainda cita Santo Agostinho (430) refutando alguém que discordava de quem se recusava a jejuar no sábado.

Na Tradição Apostólica de Santo Hipólito de Roma é ensinado que, na páscoa, se jejue pelo menos no sábado.

O Pseudo-Inácio, na Epístola aos Filipenses, é contra jejum no sábado e domingo, exceto no sábado pascal.

Cassiano em 430 e Santo Agostinho falam do jejum em Roma. Santo Agostinho, em sua epístola 36, ensina que é livre ao cristão jejuar ou não no sábado, e afirma que em Roma é praticado o jejum no sábado, mas não no domingo. E cita o maniqueísmo, que prescrevia jejum no domingo, contradizendo a fé católica e as divinas Escrituras.

Na sua epístola 54, citando o costume da Igreja em Milão, ensina que o cristão católico é livre para jejuar ou não no sábado, seguindo o costume da igreja local onde estiver. Isso mostra uma situação bastante semelhante na observância do sábado e do domingo no quinto século. Não há uma divergência em termos acirrados, como se uma prática ou outra fosse herética. Pelo que se nota, a tradição apostólica ensina que há liberdade quando ao tema.

Leis Dominicais: aumento em referências sobre o sábado indicando uma espécie de luta. Isso teria ocorrido no quarto e quinto séculos. Constantino teria dado ao domingo “nova expressão”. Ele teria se tornado dia de descanso.

Mas como poderia isso ser novidade se os cristãos não eram predispostos a aceitar pacificamente mudanças as mais sutis que fosse, como já mencionado. Uma lei que introduzisse divergência com a doutrina seria denunciada prontamente. Também, Constantino não promulgaria Lei que estivesse contra a doutrina que havia adotado. Assim, a lei certamente não havia introduzido o descanso, mas é uma expressão de como era entendido o domingo cristão.

A lei citada manda os magistrados e o povo das cidades descansarem no domingo. O trabalho no campo era facultado. Parece que as leis seguiam motivos circunstanciais.

Reação às primeiras leis dominicais: Os cristãos teriam de descansar? Como explicação isenção do trabalho agrícola? Portanto, deve-se entender as circunstâncias.

A nota 38 é histórica, de Eusébio de Cesareia, é clara da transferência do sábado para o domingo. O mesmo diz Efraim no quarto século. A lei estatal não refletia o mandamento do sábado. Mas isso aparece nas obras cristãs.

O sábado perde importância: pela ênfase do sábado posta sobre o domingo. O autor menciona os que rebaixavam e os que honravam o sábado. Mas isso não foi provado.

Citado o fato do sábado permanecer ao lado do domingo ainda no quinto século, sugere que o domingo substituiu o sábado a partir do sexto. É apenas uma suposição que não tem fundamento, como temos tido a oportunidade de acompanhar. O domingo é guardado desde os dias de Cristo e, historicamente, pode ser comprovado já no século segundo de maneira evidente.

Afirma que o Concílio de Laodiceia em 364 d. C. ainda respeitava o sábado. Mas isso é inexato quanto ao que se pretende mostrar. De fato, todos os concílios da Igreja respeitam o sábado, por ser um mandamento do decálogo, já revelado no AT. Apenas ensina que o domingo é o dia de guarda. Quando o concílio proíbe judaizar, sabemos que se trata da questão da heresia judaizante. Não é nada contra o sábado em si. De fato, durante a quaresma a missa e a festa dos mártires podiam ser celebradas nos sábados e domingos. Em geral os sínodos testemunham a correta doutrina da Igreja.

Ainda, esse concílio é regional, refletindo algum problema não generalizado. Assim, não é de se pensar que a controvérsia estivesse em toda parte, e que sua natureza fosse grave.

Os antigos cristãos não trabalhavam no sábado, trabalhando no domingo? Não há como provar. O concílio não introduz novidade. Um dia deve ser para o repouso cristão. Esse dia é o domingo. Seis dias trabalham os cristãos (segunda, terça, quarta, quinta, sexta e sábado) e descansam no domingo (o sétimo para repouso e adoração a Deus).

Proibindo o trabalho no domingo. O sínodo de Orleans em 538 proibiu o trabalho no campo. Isso poderia ser usado como contradizendo o que havia feito o concílio citado anteriormente, e a Lei do império, já que os que habitavam o campo podiam trabalhar. Portanto, deve-se entender as circunstâncias.

O sábado nunca foi esquecido. E com isso acredita ter provado como o domingo substituiu o sábado. Pelo que vimos, o caminho percorrido e com os princípios corretos como guia, não houve prova alguma de que o sábado foi o dia originalmente guardado pela Igreja.

Para concluir esse estudo do artigo, tenhamos em mente que o preceito do sábado no decálogo é moral. O sábado é moral e cerimonial, “em parte moral e em parte cerimonial”, como ensina Santo Tomás.

Quando manda guardar um tempo para as coisas divinas, é um preceito moral. Quando ensina que o tempo do sábado é sinal da criação do mundo, é um preceito cerimonial. Também é uma lei cerimonial no seu sentido alegórico como representativo do repouso de Cristo no túmulo no sétimo dia. Dessa forma, Cristo cumpriu o sábado, e dessa forma o sábado foi sombra do que devia vir.

Como não há mandamento do sábado do sétimo dia no Novo Testamento, devemos entender a doutrina, os princípios que advém dela, e compreender que o novo dia de preceito é o primeiro dia da semana, o dia do Senhor.

Gledson Meireles.