Vamos começar com o Catecismo da Igreja Católica para debater o tema.
Citando
o Diálogo com Trifão, de São Justino, temos que “Não pomos as nossas esperanças em algum outro – pois outro não existe –
mas no mesmo que vós, o Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó”. O mesmo
podemos hoje afirmar, que o nosso Senhor, de Abraão, de Isaque, de Jacó, de São
Pedro, de São Paulo, de Santo Agostinho, de Santo Antônio, e etc., é Aquele em
que pomos nossas esperanças.
Aqui
temos a veneração aos santos de Deus e a adoração a Deus. E o Catecismo (n. 2096)
afirma que adorar a Deus é, em resumo aqui, reconhecê-Lo como Deus, Criador,
Salvador, Senhor, Mestre.
Qual
a diferença prática funcional de latria
para hiperdulia? Honra e veneração a
Maria e a Deus? Há intercessão, concessão de louvor, honra, graça, oração, aceitação
no coração, prostração, tratamento de instrumento de redenção. Qual a
diferença? Segundo o pastor, não existe diferença.
A
resposta ortodoxa e católica de que a adoração envolve sacrifício não é aceita
pelo pastor. Vejamos se o pastor de fato refuta a resposta católica.
O
que é idolatria, dulia, hiperdulia, adoração? O pastor trata de diferença
FUNCIONAL. Esse é o tema. Para ele, não há diferença e isso é o importante.
Latria:
sacrifícios a Deus. Idolatria, sacrifícios a ídolos.
O
ponto fundamental que o pastor quer provar é que na Bíblia inteira não haveria
a relação exclusiva entre adoração e sacrifício, mas a adoração está atrelada
também a vários outros elementos que são comuns na veneração católico-romana.
Adoração no sentido interior.
Isso é prioritário. E antes de tudo uma subserviência interior. Percebe-se aqui
que o pastor aqui usa até a linguagem e teologia católica para ensinar essa
verdade: a adoração é uma disposição do coração. Não é comum um pastor usar
essa linguagem ao falar de adoração, como vemos entre os padres. Portanto, o
pastor Yago aprendeu bem esse ponto. Ele cita Ezequiel 14.
Como
a adoração é dependente de sacrifícios, se ela é interna? Nesse ponto o pastor
erra. Ele não entende a doutrina católica em geral, e desliza em mais um ponto
fundamental. Para o catolicismo a adoração é antes de tudo uma disposição do
coração, a adoração em espírito. A adoração não
depende do sacrifício para existir, mas funciona atrelada ao verdadeiro
sacrifício. Assim, não há novidade alguma para a fé católica essa resposta do
pastor relativa a essa questão específica.
Depois
o pastor oferece um exemplo de adoração, que é erguer interiormente algo ou
alguém mais alto do que deveria. Certamente ele pode estar pensando que o
católico ergue Maria dentro do seu coração mais alto do que deveria, de forma
exagerada, tornando-a mais alta que Deus, ou em pé de igualdade com Deus,
constituindo idolatria. Isso não existe e ninguém poderia em sã consciência
afirmar que os cristãos católicos fazem isso em seus corações.
Mais
adiante, o apologista mostra exemplo de dulia
aplicado a dinheiro, como está em Mateus 6. O que ele quer provar com isso? Que
a veneração também está atrelada ao conceito de adoração, e isso poderia
refutar a fé católica, pois o termo fala de idolatria interior. Os demais exemplos
são todos usados na fé cristã católica para mostrar que a adoração é
fundamentalmente interior, e não depende de nada exterior. Portanto, o pastor está
dando uma aula de catequese católica sem perceber.
O
desejo exagerado e desordenado é a explicação pelo pastor como idolatria. É importante
notar novamente a linguagem católica que o pastor usa para ensinar essa
doutrina. É algo que parece mostrar as boas influências da fé católica que o
pastor tem em seus estudos.
Na
parte II o pastor aprofunda a questão. A adoração envolve sacrifícios mas não
está restrita a isso. A expressão corporal, a ida ao templo e até uma festa
podem ser adoração.
Depois,
afirma que quando o referente muda o entendimento do ato muda. Isso é
magnífico. É totalmente o que a doutrina católica ensina, e que normalmente os
pastores protestantes, e mesmo apologistas, não costumam perceber.
O
ponto básico parece ser o seguinte: não é necessário um sacrifício para haver
adoração, mas basta a prostração. A prostração de um servo diante do senhor
humano é um reconhecimento de autoridade, mas diante de Deus, por exemplo, já é
adoração. Ponto positivo, pois é justamente o entendimento católico sobre o
fato.
Aqui
mostra-se que na prática a adoração e a veneração podem ser iguais, mas há uma
diferença no sentido interior do ato, que é uma diferença invisível. É a
doutrina católica.
E
como as palavras adoração, prostração, serviço, são usadas na Bíblia? A
idolatria e a adoração se expressavam de modo muito mais amplo. Assim, a
atitude de adoração não depende da oferta de sacrifício: pode ser prostração, o
ato de curvar-se, beijo. O beijo pode ser expressão de adoração. O pastor está
tentando provar que o ato em si não depende da existência de sacrifícios, de
uma liturgia sacrificial, para serem adoração, mas sim de uma disposição
interior. Isso está correto. E qual a novidade aqui? O pastor entendeu bem o que
é adoração, e soube diferenciar o que se passa no interior e do que é feito
exteriormente, de modo que pode haver o mesmo ato, como prostrar-se, com
diferentes sentidos.
Seu
objetivo foi mostrar que o sacrifício não é necessário para haver adoração, mas
ele refuta muito do entendimento protestante que diz que a própria prostração,
por exemplo, em contexto religioso e espiritual, seria adoração. Ou seja, um
ato externo em relação a uma imagem seria adoração pelo próprio ato, sem
consideração ao que se passa no espírito do fiel. Isso já está claro, e até
aqui o pastor não apresentou nenhuma dificuldade para a fé católica.
Um
observador que olhasse um israelita prostrado diante de Deus notaria a
semelhança com um adorador de outro deus, “mas
havia uma notável diferença”, afirma o pastor. Então ele está pronto para
entender que para um cristão católico ajoelhar-se diante de uma imagem pode não
ser adoração, mesmo que o ato seja semelhante.
Ele
diz que o israelita não se prostrava diante de imagens, o que era proibido pela
lei, ainda que existissem imagens na religião dos judeus, como os querubins e
etc. Então, aparece o outro erro do pastor. Ele afirma que se o objeto ligado
ao culto passa a ser tratado como objeto de veneração, há condenação de
idolatria, citando o caso da serpente de bronze em 2 Rs 18. Isso já está
explicado em artigo neste blog, para quem tiver interesse em estudar.
A
existência de imagens é uma coisa, prestar às imagens honra religiosa, é outra
coisa, afirma o pastor.
Aqui
ele parte para outra questão: antes já entendeu que o culto de adoração é acima
de tudo interno, e transparece nos atos. Se alguém prostra-se diante de um
superior humano, seria honra, se a prostração é diante de Deus, seria adoração.
Mas, nesse ponto específico o pastor ainda não entende que há imagens que podem
ser cultuadas com gestos de veneração. É um obstáculo que o pastor Yago ainda
possui no entendimento do tema:
Atos
iguais podem ter sentidos diferentes segundo a disposição interior.
Imagens
religiosas podem existir no culto a Deus, como aquelas no templo no Antigo
Testamento.
Agora,
a ideia de que as mesmas podiam ser honradas com atos externos, com a disposição
correta de honra a objetos rituais, isso não pode ser negado.
Para
quem deseja estudar, há muitos artigos no blog sobre o tema. Em resumo, vemos
que na Bíblia quando se diz que o adorador prostrou-se diante de Deus para adorar,
ele está prostrado diante da arca, que é um objeto. Portanto, está refutado o
que o pastor afirmou sobre o caso específico das imagens. O restante o pastor está
correto e em conformidade com a doutrina católica.
A
adoração se manifesta de várias formas, uma delas é o sacrífico. Muito bem, mas
a fé católica ensina isso. Continuemos.
O
ministério do sacerdócio levita se estendia em ajudar ao povo, por exemplo. O serviço
ao povo é uma forma de adoração a Deus. Ou seja, o pastor mais uma vez, sem
perceber, concorda com a fé católica de que o serviço a outro redunda em
adoração a Deus. Assim, a veneração a Maria, por ser a mãe de Jesus, é em
última instância adoração a Deus.
A
citação de David Peterson ajuda a entender melhor o que a explicação do pastor
tem em conformidade com a doutrina católica.
1º
é a atitude do coração que realmente importa.
2º
adoração como expressão de reverência ou grata submissão.
A
interpretação do autor sobre o tabernáculo, a arca e o templo:
O
ritual associado a essas instituições servia para reconhecer o poder e a
presença de Deus.
Aqui
podemos lembrar que os gestos ligados ao tabernáculo, à arca e ao templo, que
eram materiais, eram imagens, servem para adorar a Deus, que é invisível. É uma
forma de utilizar o que o pastor está afirmando, partindo da citação que faz, e
estabelecer esse ponto de contato com a fé católica.
Na
parte III que trata sobre o que adoração no Novo Testamento sem a presença de
sacrifício. O caso de Cornélio em Atos 10, 26.
A
prostração diante do anjo no Apocalipse foi vista como adoração. Mas e o que foi
dito e explicado acima: a prostração pode
ser sinal de uma disposição interior diferente e não ser adoração. Assim, está
estabelecido que o ato de prostrar-se pode ser adoração ou veneração (honra).
Segundo,
as imagens sagradas no templo, por exemplo, podem
ser tratadas com rituais associados
a elas, mas que servem para o culto de Deus. Outro conceito legítimo.
Caso
se argumente que o ato de prostrar-se diante do anjo é adoração, então a afirmação contradiz tudo o que foi dito
anteriormente. O ato em si não pode provar nada.
Adoração
como sacrifício de louvor. Correto.
Nada
que possa contradizer a fé católica.
Ao
final, o pastor usa o exemplo de cantar para a esposa, no contexto conjugal, e
introduz linguagem de culto, usando palavras que são relacionadas a Deus para
uma criatura, o que já seria idolatria.
O
problema é que de fato não se devem confundir os contextos. Também deve-se ver
que na antiguidade, desde o Antigo Testamento, a linguagem utilizada pelo povo fiel para expressar honra, reverência
no sentido cultural e adoração espiritual é muitas vezes a mesma, pois a
linguagem também é uma forma externa do culto interior, o que pode mudar
segundo a disposição do coração, o que refuta o pastor totalmente. Assim, um
elogio profundo a alguém e um louvor a Deus com palavras semelhantes não
significa idolatria, pois o fiel sabe o significado do seu ato em seu coração.
1º
Há adoração sem sacrifício real, como diz o pastor.
2º
Se os louvores, ofertas e serviços aos santos forem adoração e não veneração,
então o pastor contradiz tudo o que explicou acima, pois as palavras estariam
sendo maiores que a disposição interior. Portanto, não faz sentido. Há um lugar
para a honra aos santos servos de Deus, e um lugar à adoração a Deus, que são
totalmente diferentes.
3º
Não há um culto de veneração separado como se fosse semelhante ao de adoração,
mas todos os cultos ou atos de veneração feitos aos santos estão no contexto do
culto único de adoração dado a Deus.
Parece que o pastor continua com a mesma ideia errônea de que os atos de veneração e adoração são iguais, e que a "prática" é que seria a prova, e portanto são a mesma coisa, contradizendo o que disse em todo o vídeo, como analisado acima, ou seja, de que a disposição do coração é que faz a verdadeira adoração. Se a abstração, a doutrina, a disposição interna valem, são elas que dão sentido à prática. Se é a prática, então tudo o que o pastor disse não está valendo. Onde está então a refutação à doutrina católica? Não existe.
Os erros de interpretação mostrados ao longo do artigo levaram a essa conclusão errada do apologista protestante.
Para
quem quiser aprofundar-se no tema, leia mais artigo no blog sobre adoração e veneração.
Gledson
Meireles.