O presente artigo é um
comentário de uma porção do livro O
papado e o dogma de Maria à luz da Bíblia e da história, do reverendo
Hernandes Dias Lopes, 1º edição, editora Hagnos, 2005, sobre o que a Bíblia diz
sobre a virgem Maria. O autor tenta mostrar os limites dos dados bíblicos sobre
a mãe de Jesus.
Esse é um livro de
controvérsia teológica que envolve protestantismo e catolicismo. Está no âmbito
direto da apologética. Segue um comentário a respeito de afirmações respectivas
sobre o tema. Revela o que o autor entende da doutrina católica.
A escolha da virgem
Maria para ser mãe de Jesus é graça de Deus e não mérito dela. Não há mérito no
ser humano, mas é a graça de Deus que elege, e é ela que dá o mérito.
O pastor afirma que na
cena da anunciação a ênfase está na criança e não em Maria. Realmente o
propósito do plano de salvação é revelar o filho de Deus, o salvador, e não
alguém mais. No entanto, todos os que estiverem em relação a Cristo serão
engrandecidos pela graça. E ninguém mais do que Maria esteve tão junto ao seu
divino Filho.
Interessante que
sabemos que Isabel era prima de Maria. Diferentemente, o autor afirma que era
tia. Curiosidades.
Maria era serva de
Deus, não de Gabriel, de José ou de qualquer outra pessoa, escreve o pastor.
Isso mostra a radical
crítica protestante de que todos não devemos ser servos dos santos, mas
unicamente de Deus. E está correto. O que não compreendem é que sendo servo de
Maria, por exemplo, a teologia católica enfatiza o ser igual a Cristo, aprender
o caminho de Cristo, que nasceu de Maria, esteve submisso a ela, enquanto Ele esteve
na terra, e nós, filhos de Deus, pequeninos diante dEle, querendo servir a
Jesus, nos tornamos cristãos, por pura graça, e em cristo nos tornamos servos
de Maria, no sentido de estar humildes da presença de Deus, de entregar-nos
totalmente a Ele. Dar-se a Maria não é outra coisa que seguir seus exemplos e
nos tornarmos totalmente servos de Deus.
Somente Maria recebeu a
mensagem do anjo. Não havia ninguém mais quando o anjo Gabriel apareceu. O
evangelista são Lucas recebeu essa informação de Maria, certamente, e como
inspirado por Deus escreveu essa verdade na Bíblia.
E quanto ao valor de
Maria esse é medido pelo filho que ela teve. Olhe para Cristo e verá a honra da
mãe dele. A mãe do rei era honrada com a honra da realeza em Israel. Pense agora na
mãe do Messias, do Cristo, do Filho de Deus, do Rei dos reis e do Senhor dos
senhores. Honramos o Filho e por isso honramos a mãe. Adoramos o Filho, porque
é Deus, e veneramos a mãe, por ser serva eleita de Deus para o plano da
salvação da humanidade.
Maria é bem-aventurada
entre as mulheres, não acima das mulheres, diz o protestante. Leia de novo o
evangelho e verá que ela é a bem-aventurada entre as mulheres,
o que é singularidade. Olhe para Cristo e entenderá.
O protestante não vê
que Isabel destaca Maria. É óbvio que o fundamento é Jesus. Maria é especial
por causa de Jesus. Ela é honrada porque é mãe do Senhor. Veja que Isabel
considera uma honra, um privilégio, uma grandeza, ser visitada pela mãe do
Senhor dela. E o Senhor de Isabel, uma fiel e piedosa judia filha de Israel, é
Deus. A mãe do Senhor de Isabel, a mãe do Deus de Isabel, diz a Escritura. É a
consequência da doutrina bíblica da encarnação. Deus fez-Se Homem. O pastor não
vê o que vem antes de Lucas 1, 43.
Por que João Batista
estremeceu no ventre de Isabel? Veja o que responde o pastor: “João Batista se
estremece no ventre de Isabel não por causa de Maria, mas por causa de Jesus,
que está no ventre de Maria.”
Todos conhecem a cena,
e sabemos que tudo é por causa de Cristo, nossa alegria. Nosso Salvador. No
entanto, o pastor passa para a conclusão, e toda a mensagem é verdadeira,
felizmente, mas deixa dados da Escritura sem reflexão, o que não é correto.
Por um afã em negar o papel especial da pessoa de Maria o autor coloca a ênfase no
Filho. Embora a ênfase em Cristo esteja corretíssima, desdenhar a presença da
virgem Maria na cena do evangelho não é total compreensão e aceitação da
Palavra.
De fato, a Bíblia
afirma que João Batista saltou no interior do ventre de Isabel assim que a voz
de Maria saudando-a foi ouvida. Assim que as palavras de Maria chegaram aos
ouvidos de Isabel a criança saltou no ventre, diz a Escritura.
E não somente isso.
Logo que a saudação de Maria foi ouvida, e o bebê estremeceu-se de alegria,
Isabel recebeu o Espírito Santo de Deus. Isso significa muito, mas o
protestante passa por essas linhas e nunca reflete sobre elas. Elas são
importantes também. Leia Lucas 1, 41.
Por isso, a Igreja
comemora o nascimento de João Batista, que nasceu com a santificação do
Espírito Santo. Por isso a Igreja considera Maria a dispensadora das graças,
porque Cristo veio ao mundo por ela, e o Espírito Santo veio ao precursor do
Messias usando as palavras dela. São apenas dois exemplos de introdução de
assuntos sobre Maria.
Maria é mãe de Jesus a
partir da encarnação. Essa é a verdade cristã católica. Nada a acrescentar.
É um erro afirmar que
Maria é mãe da natureza humana de Cristo. Ela é mãe de Cristo por meio da natureza
humana. Por isso, ela é mãe do Cristo enquanto homem. Essa é a correta
doutrina.
Em outras palavras, não
se pode afirmar que foi a natureza humana de Cristo que nos salvou. Porque a
natureza é apenas algo inanimado, uma matéria, um princípio, poderíamos dizer.
Mas, foi Cristo feito homem que nos salvou. Foi Deus que morreu por nós como
Homem na cruz. Por isso, Maria não é mãe da natureza de Cristo, nem é mãe do
Cristo homem, como se tivesse outro Cristo Deus, mas é mãe do mesmo Cristo que
é Deus-Homem, é mãe porque gerou humanamente a pessoa divina.
Por isso, afirmar que o
catolicismo não “percebe” a incongruência lógica e teológica de afirmar que
Maria é mãe de Deus, como se ensinasse que a mãe não pode existir depois do
Filho, isso é desconhecer a doutrina cristã católica. É algo comum entre
apologistas e teólogos protestantes. Por isso, é bom ler a fonte católica para
aprender essas verdades.
Maria é mãe de Deus
apenas no sentido de que Cristo é Deus, e nunca no sentido de Deus em sua
existência e natureza divina e eterna. Basta ler as definições conciliares, o
catecismo, etc., para compreender isso. Portanto, a crítica é inócua à doutrina
católica.
Para salvaguardar a
eternidade de Deus o autor critica o dogma contido no termo theotokos, mas não percebe que negando a
maternidade divina de Maria poderá estar negando a divindade do Filho. Pensando
em salvaguardar a divindade, na Pessoa do Pai, indica uma doutrina que fere a
divindade, ao falar na pessoa do Filho.
Ao lembrar que Maria
perdeu Jesus na casa do Pai, no templo de Jerusalém, supondo algo limitado e
falho nos cuidados maternais, para ilustrar a humanidade comum de Maria, o
autor não percebe que o evangelho não fornece nenhuma palavra negativa a Maria
e José no incidente citado, mas usa o momento para ensinar mais sobre a missão
de Jesus.
Ainda, Jesus tinha 12
anos, sabendo que na cultura judaica 13 anos era a idade que já aproximava o
menino judeu da fase adulta, o que faz compreensível Jesus estar andando longe
dos pais na caravana, conversando com outras pessoas durante a viagem, o que
foi ocasião para que seus pais não percebessem sua falta antes.
Na festa de casamento
em Caná da Galileia, onde Jesus realizou Seu primeiro milagre, o pastor
enfatiza que Jesus segue a agenda do céu, e não está sujeito a laços
familiares. Ele disse: “Mulher, que tenho eu contigo?”. No entanto, tendo
alguma verdade nisso, o autor não mostra o que todo o relato bíblico nos
ensina.
De fato, essa ocasião
foi a primeira vez que Jesus fez um milagre na Sua vida pública, inaugurando
Sua missão, com o primeiro sinal. E esse milagre foi feito a pedido da Sua mãe.
Foi Maria que fez a ocasião para o milagre.
Assim, temos mais um
dado: a encarnação foi feita através de Maria; o Espírito Santo santificou a
primeira pessoa no Novo Testamento usando as palavras de Maria e o primeiro
milagre de Jesus registrado nas Escrituras foi feito a pedido de Maria.
Por isso a Igreja a
chama de dispensadora de todas as graças. E sabemos que as graças nos vem de
Jesus Cristo. O leitor deve estar aprendendo a ler a Bíblia com essas verdades.
Outra questão é a
passagem de João 2,5, que literalmente diz que Maria voltou-se aos que serviam
na festa e disse para que fizessem tudo o que Jesus mandasse. Essas palavras
são lidas espiritualmente, pelo reverendo, como uma ordem de Maria para nós,
para que obedeçamos a Jesus. Essa é a leitura católica também.
Impressionantemente um
protestante reformado que muitas vezes nega-se a ler a Bíblia diferentemente do
contexto histórico-gramatical-literal consegue entender que as palavras de
Maria são para nós um estímulo para obedecermos a Jesus Cristo. E não poderia
ser diferente. Mas essa constatação servirá para entendermos melhor o que será
apresento mais adiante.
Sobre Marcos 3, 20-21
não se pode pensar que Maria acreditasse que Jesus estivesse louco. Nada no
evangelho supõe isso. Por essa razão, a passagem afirma que “os seus”, tratando
dos familiares, pensavam dessa forma, mas não Maria.
A maior bem-aventurança
é obedecer a Deus, seguir as palavras de Jesus. Assim, Maria é honrada tanto
como mãe de Cristo como sua primeira discípula, pois creu em Cristo desde o dia
da anunciação do anjo Gabriel. Foi a primeira cristã.
A entrega de Maria a
João por Jesus morrendo na cruz é explicada de forma impressionante pelo
reverendo. Ele reconhece que Jesus dá exemplo de amor e cuidado para com os
pais, que José havia morrido e que João era sobrinho de Maria. Grandes
constatações.
O erro é somente pensar
que os irmãos de Jesus eram descrentes e por isso não podiam cuidar de Maria.
Sabemos que por algum tempo a maioria dos irmãos de Jesus não criam nEle. Mas,
de fato, eles eram parentes e não filhos de Maria. Eis o verdadeiro motivo para
que Jesus desse Sua mãe ao apóstolo João: ela não tinha ninguém mais para
cuidar dela, e João era o discípulo amado que permaneceu aos pés da cruz. Assim,
os desígnios de Deus mandou que fosse João apóstolo o cuidador da mãe do
Senhor.
E o pastor, mais uma
vez, não entende toda a passagem. Isso é compreensível, pois seus dogmas
protestantes não o permitem. Mas, não é impossível que essa compreensão seja
alcançada.
Jesus entrega Maria a
João como mãe, e João torna-se filho dela, o responsável por cuidar dela. Essa
cena nos ensina algo importante, espiritual, e agora esperamos que o pastor saiba
ler espiritualmente também.
A virgem Maria é entregue
como mãe ao único apóstolo que ficou aos pés da cruz. Assim, ele representava a
Igreja, os que creem em Jesus. Por isso, todos os cristãos tiveram Maria como
mãe. Foi Jesus na cruz Quem no-la deu como mãe.
Também é importante
reconhecer que Tiago e Judas foram os escritores inspirados das epístolas de
Tiago e Judas, e que eram parentes de Jesus, e não irmãos de sangue filhos da
mesma mãe. Eram mais precisamente primos do Senhor. Leia o artigo sobre a mãe dos irmãos de Jesus
e compreenderá, pois ali não são feitas apenas afirmações, mas há provas do que
é apresentado.
Enfim, Maria no
cenáculo aguardando o derramamento do Espírito Santo fala-nos mais do que o
pastor pôde notar. Maria era cheia do Espírito Santo e da força do Altíssimo
desde que foi agraciada com a maternidade divina. Ela passou a vida cheia da
presença do Espírito. Agora, estava humildemente com os apóstolos à espera da
chegada do Espírito sobre toda a Igreja. Por isso, a virgem Maria, mãe da
Igreja, é também figura da Igreja, pois foi agraciada, cheia de graça, e cheia
do Espírito Santo antes da inauguração da Igreja, como também no dia de
Pentecostes, quando toda a Igreja recebe a força para a missão de pregar o
evangelho por toda a terra.
Esse lugar humilde de
Maria na Igreja nos ensina. Sendo servos de Deus, filhos de Maria, aprendamos
com ela como servir a Jesus, como ser cristão, como servir a Deus. Essa é a
verdadeira devoção mariana. Que o leitor compreenda.
Gledson Meireles.